Contrato de Amor: Segredos e Promessas
img img Contrato de Amor: Segredos e Promessas img Capítulo 5 Um casamento de fachada
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Capítulo 6 Preso na língua img
Capítulo 7 Quando tudo desabar img
Capítulo 8 Ele sabia onde apertar img
Capítulo 9 Sem deixar uma cicatriz img
Capítulo 10 Assina o contrato img
Capítulo 11 Clara chega à mansão img
Capítulo 12 Primeira ceia juntos: tensão, sarcasmos, atração contida img
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Capítulo 5 Um casamento de fachada

Clara acordou no dia seguinte com a cabeça pesada. O vestido de festa ainda jogado sobre a poltrona, o celular sem bateria, o avental pendurado na cadeira da cozinha. Fechou os olhos por um segundo, tentando afastar o gosto amargo que a noite anterior deixara.

Era sempre assim com Enzo. Cada encontro arrancava uma camada da sua resistência, como se ele fosse capaz de decifrar as partes que ela mesma tentava esconder.

Mas hoje não. Hoje, ela tinha uma pilha de contas para resolver, uma entrega de doces atrasada e nada - absolutamente nada - a faria pensar nele.

Ou foi o que prometeu a si mesma, antes de ouvir a campainha tocar.

Olhou o relógio da parede: oito e meia da manhã. Quem seria? Abriu a porta sem pensar duas vezes - e lá estava ele.

Enzo Albuquerque. Terno azul-escuro, camisa sem gravata, café na mão, sorriso preguiçoso nos lábios. Como se fosse a coisa mais natural do mundo aparecer na porta de quem você ameaça despejar.

- Bom dia, Clarinha.

Ela nem se mexeu. - Você tá louco? Vem me perseguir na minha casa agora?

- É sua confeitaria também -corrigiu ele, empurrando a porta devagar com o ombro-. Posso entrar?

- Não.

Ele entrou mesmo assim. Passou os olhos pelo balcão improvisado, pela vitrine de bolos vazia, pelas caixas empilhadas no canto. Era cedo demais para a confeitaria estar aberta, e Clara ainda usava uma camiseta larga, o cabelo preso de qualquer jeito.

Enzo encostou o copo de café no balcão e a olhou como se ela fosse parte do inventário.

- Veio me expulsar pessoalmente? - perguntou ela, cruzando os braços.

- Vim te oferecer uma saída -ele abriu o paletó, puxou de dentro um envelope grosso. Depositou sobre o balcão, como quem exibe uma carta de vitória.

Clara arqueou uma sobrancelha. - O que é isso?

- Um contrato -ele puxou uma cadeira, sentou-se sem pedir licença-. Pensei em tudo. Você continua com a padaria. Eu cubro todas as dívidas, invisto o que precisar para modernizar, reformar, contratar gente. Em troca, você aceita se casar comigo.

Ela riu. O som soou alto demais na confeitaria vazia. - Desculpa, eu ouvi bem? Casar?

- Um casamento de fachada -explicou Enzo, como se fosse a coisa mais racional do mundo-. Doze meses. Um ano. Depois, cada um segue sua vida. Enquanto isso, você tem segurança, eu tenho o que preciso.

Clara sentiu uma pontada no estômago, como se tivesse mordido vidro. - E o que, exatamente, você "precisa"?

Enzo apoiou os cotovelos no balcão, inclinando-se um pouco. Os olhos fixos nos dela. - Eu preciso mostrar estabilidade pra fechar um acordo com uma família tradicional. Investidores que querem alguém... -ele buscou a palavra- ... sólido. O solteirão mimado não convence mais ninguém. Uma esposa dedicada, um negócio familiar... tudo se encaixa. E você também ganha.

Ela piscou, incrédula. - Então eu sou o quê? Um adereço? Uma fachada pra limpar sua reputação?

- É um negócio. Um contrato -ele deu de ombros, como se fosse simples-. Você é inteligente, Clara. Sabe que não tem outra saída. Comigo, seu legado tá salvo. Sem mim, em seis meses, nem o forno velho sobra.

Clara sentiu o peito queimar. - E quem te deu o direito de achar que pode me comprar?

Ele se levantou, devagar, a postura de predador elegante. - Não tô comprando você. Tô comprando paz pros dois. É uma troca justa.

Ela pegou o envelope, abriu de um puxão, espalhou as folhas sobre o balcão. Leu por cima: cláusulas, prazos, valores. Tudo amarrado, assinado por advogados, frio como o mármore que separava os dois.

Olhou pra ele. O mesmo rosto que um dia beijou na biblioteca da universidade. O mesmo que agora falava em amor como se fosse uma planilha.

- Você não muda mesmo, né? -disse ela, a voz baixa, carregada de veneno-. Tudo pra você é um jogo. Um cheque, um contrato, uma posse.

Enzo se aproximou, parando a centímetros dela. - Clara, escuta -começou, mas ela ergueu a mão, cortando o ar.

- Você acha que eu vou vender meu nome, minha história, meu corpo, minha dignidade - ela cuspiu a palavra - pra te fazer parecer um homem de família? Eu preferia ver essa padaria em chamas do que me deitar do seu lado por obrigação.

Os olhos dele brilharam por um segundo. Raiva? Dor? Orgulho? Nem ela soube dizer. Mas não recuou.

- Não seja dramática -disse ele, tentando controlar o tom-. É só um papel.

- Pra você, tudo é só um papel. - Clara empurrou o contrato de volta. As folhas voaram no chão como confetes de uma festa triste. - Eu não sou. Eu não vou ser.

Enzo apertou os lábios, o maxilar tenso. Por um instante, parecia pronto pra avançar, segurar o rosto dela, obrigá-la a entender. Mas não fez nada. Pegou o copo de café, olhou para a bagunça de papéis no chão.

- Você vai se arrepender - disse ele, a voz baixa, quase sem emoção.

Clara sentiu um frio percorrer suas costas, mas manteve o olhar firme. - Melhor me arrepender livre do que deitada na mesma cama que um homem que não respeita nada.

Ele abriu a porta com força. A claridade da manhã inundou o pequeno salão, misturando o cheiro doce de massa com o amargor que ele deixava pra trás.

Antes de sair, Enzo virou-se, a silhueta recortada na luz. - Ainda vai me agradecer, Clarinha. Quando tudo desabar, vai se lembrar que fui eu quem tentou te salvar.

Ela não respondeu. Não precisava. Apenas viu a porta fechar-se atrás dele, abafando o som da rua.

Olhou para os papéis espalhados no chão. Por um segundo, teve vontade de chorar. Por outro, de rir. Não fez nenhum dos dois. Foi até o balcão, pegou uma espátula, respirou fundo e ligou o forno.

Se ia perder tudo, perderia de pé. Sozinha. Sem contrato. Sem Enzo Albuquerque.

E se fosse para lutar, que fosse até o último suspiro de açúcar.

                         

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