Ela se aproximou, olhando por cima do meu ombro para o meu quarto, que era o menor da casa, o antigo quarto de empregada. As paredes eram brancas, a decoração mínima. Era o meu santuário, o único lugar onde eu sentia que podia respirar.
"Sua irmã está com fome", disse ela, ignorando completamente a minha privacidade invadida. "Ela está cansada da viagem e quer comer alguma coisa gostosa. Algo feito por você."
Na minha mesa, ao lado do caderno, havia um pequeno prato com um cupcake. Eu o tinha feito mais cedo, antes de sair para a competição. Era um bolinho de baunilha com recheio de frutas vermelhas e uma cobertura de buttercream de rosas. Confeitaria era meu hobby, minha paixão secreta. Minha família sempre o tratou como algo tolo, um "passatempo de criança", muito inferior à "cozinha de verdade". Mas era o que acalmava minha alma.
Minha mãe gesticulou com a mão enquanto falava, impaciente.
"Vamos, levante-se. Faça aquele seu macarrão com camarão. Clara adora."
No movimento, o pulso dela bateu no cupcake. O bolinho voou da mesa e caiu no chão com um baque surdo. A cobertura cor-de-rosa se espatifou no piso de madeira. Antes que eu pudesse reagir, ela deu um passo e pisou em cima dele, esmagando-o completamente.
"Opa", ela disse, sem um pingo de arrependimento. Ela olhou para a sola do sapato com nojo. "Que sujeira. Era só um bolinho, de qualquer forma. Limpe isso depois."
Eu olhei para o cupcake destruído. A pequena rosa de açúcar que eu tinha moldado com tanto cuidado era agora uma mancha disforme no chão. Uma raiva fria e silenciosa começou a subir por mim. Mas meu rosto permaneceu impassível.
Eu não disse nada. Não gritei. Não chorei.
Apenas me levantei da cadeira, com uma calma que não era minha.
"Tudo bem, mãe. Eu vou fazer o macarrão para a Clara."
Minha mãe me olhou, surpresa. Ela esperava uma discussão, lágrimas, um drama. Minha submissão imediata a deixou desconcertada.
"Hum... bom", ela gaguejou, um pouco sem jeito. "Não demore. Ela está esperando."
Ela saiu do quarto, fechando a porta atrás de si.
Fiquei parada por um momento, olhando para a mancha no chão. Era mais do que um bolinho. Era meu tempo, meu cuidado, minha pequena alegria. E ela havia esmagado sem pensar duas vezes.
Com os mesmos movimentos calmos e deliberados, peguei um papel toalha, me ajoelhei e limpei a sujeira. Joguei o papel no lixo. Não havia mais vestígios do cupcake. Como se ele nunca tivesse existido.
Desci as escadas. Na cozinha, comecei a separar os ingredientes para o macarrão. Camarão, alho, azeite, tomate cereja. Minhas mãos trabalhavam de forma mecânica.
Minha mãe voltou à cozinha, ainda me observando com uma estranha desconfiança.
"O que deu em você hoje, Sofia?", ela perguntou, cruzando os braços. "Está quieta demais. Normalmente você já estaria reclamando, dizendo que está cansada."
Eu dei de ombros, sem olhá-la.
"Estou bem."
"Você está com raiva por causa do concurso?", ela insistiu. "Já te disse, sua irmã chegou. Família vem primeiro. Você precisa amadurecer e entender isso."
Eu continuei picando o alho, a lâmina da faca batendo ritmicamente na tábua de corte. Cada batida era um eco da minha raiva contida. Mas minha voz, quando saiu, era neutra.
"Entendi."
Ela não parecia convencida. A minha calma a estava deixando nervosa. Pessoas como minha mãe não entendem a calma. Elas entendem gritos, choro, reações explosivas. O silêncio é um território desconhecido e ameaçador. Elas não sabem que o silêncio, às vezes, é o prelúdio da maior das tempestades.
Ela me observou por mais um minuto, como se tentasse decifrar um código complexo. Por fim, desistiu e saiu da cozinha, balançando a cabeça, provavelmente pensando que eu estava apenas sendo mal-humorada.
Eu estava sozinha novamente. Olhei para a panela no fogão. Eu cozinharia o macarrão. Eu o serviria para minha irmã. Eu sorriria e diria "de nada".
Mas, pela primeira vez na minha vida, eu estava fazendo aquilo com um propósito diferente. Não era mais para agradar. Era uma despedida. Cada gesto, cada ingrediente, era parte de um ritual silencioso de libertação. Eles achavam que eu estava apenas cozinhando o jantar.
Mas, na verdade, eu estava planejando minha fuga.