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Estevão retornara. Tinha imaginado esse momento milhares de vezes no seu tempo de exílio, e o gosto era mais amargo que doce, agora que finalmente estava se realizando. Lembranças dolorosas da infância impregnavam cada canto da cidadezinha em que vivera, no Meio Oeste. Não fora feliz ali e só voltara por uma única razão: Carol.
Ela fora a única que o enxergara realmente e o tratara com ternura e afeto quando ainda eram crianças. Filho de mãe solteira, pobre e imigrante brasileira, Estevão era um moleque maltrapilho e encrenqueiro, que vivia sendo expulso das escolas por sair aos socos com quem fazia piadas sobre sua mãe e pelo fato de não ter um pai. Desde pequeno se acostumara a estudar e trabalhar para ajudar em casa: estava sempre mal vestido e com fome e as pessoas o evitavam e cochichavam sobre ele quando o viam. Menos Caroline.
Era pequena e magra, com uma pele tão branca que parecia porcelana. Cabelos castanho-avermelhados que viviam presos em chiquinhas e doces e bondosos olhos cor de mel que o faziam se sentir aquecido, como se ela o abraçasse com o olhar e isso sempre o fizera sorrir, mesmo nos piores dias, os mais sombrios.
Se lembrava com exatidão da primeira vez que a vira: ela estava no jardim de sua casa, numa manhã ensolarada de sábado e cheirava uma flor – os raios do sol batiam em seus cabelos e eles pareciam fogo dourado, e ela inteira parecia cintilar. Ainda ouvia o som do seu riso de contentamento quando fechava os olhos. Ela devia ter uns seis, sete anos e ele tinha dez. O impacto daquela imagem foi tão forte que Estevão se desequilibrou e caiu da bicicleta, levando junto o cesto com os jornais da entrega. Era seu primeiro dia fazendo aquela rota.
Carol se assustou com a queda e correu para junto dele e perguntara se estava tudo bem, ele, zangado por parecer estúpido diante daquela "riquinha", respondera de mal jeito, ao que ela sorriu e disse simplesmente: "-Venha, eu te ajudo." e lhe estendeu a pequena mão que, depois de certa relutância ele aceitou – não que precisasse, mas porque queria desesperadamente tocá-la e ter a certeza de que ela era real e não fruto da sua imaginação.
Ele nunca mais fora o mesmo depois daquele dia: decidira que queria aquilo para si – uma bela casa, num bairro elegante e aquela garota. E teria. Custasse o que custasse.
Então começara a trabalhar mais, aceitava todo tipo de serviço: estudara com afinco e passara a ignorar os outros meninos que zombavam dele. Progredira tanto em seus estudos que sua mãe, Marina, fora chamada a escola para ser elogiada pela repentina transformação do filho.
Sua pobre mãe. Ficara tão contente e aliviada que chorara!
Ela tinha tão poucas – ou nenhuma- alegrias na vida, que Estevão ficou comovido e jurara para si mesmo que jamais seria motivo de preocupação e angústia para sua mãe novamente. E cumprira.
Com o passar dos anos, ele e Carol se tornaram bons amigos, e enfim, havia chegado a semana do tão esperado baile e Estevão decidira convidá-la naquela manhã, assim que chegasse a escola. Mas era tarde, ela já havia aceitado o convite do Simon, que era o filho do cara mais rico e respeitável da cidade... Estevão ficou furioso e disse muitos absurdos a Carol, chegou a chamá-la de vendida e depois tomara a decisão que mudara completamente o rumo de sua vida: ir embora de Greensborough.
Decidiu que mudaria seu destino e seria rico e então voltaria para reclamar o que era seu.
Ele tinha dezessete anos então.
Quinze anos haviam se passado. Quinze anos de trabalho duro e determinação.
Todo o seu esforço valera a pena e agora retornara ao lar, não como o desajustado e sem dinheiro que partira, mas como um bem sucedido empresário, que possuia sua própria empresa e viajava não só o país, mas o mundo, a negócios. Trabalhara anos a fio na costrução civil. Fizera faculdade e se tornara um ótimo engenheiro – se destacara tanto, que uma empresa o contratara ainda no primeiro ano do curso e hoje, dez anos depois, era dono do seu próprio negócio – uma empresa inovadora no ramo da construção civil, que estava rapidamente se expandindo e ganhando o mercado.
Sua empresa ainda não havia se consolidado, apesar de tudo, mas era uma questão de tempo. E tempo era algo que Estevão tinha de sobra.
Ainda faltava uma única coisa para que seu coração sossegasse de fato: tornar real seu sonho de infância – ter uma casa e Carol.
Como será que ela estaria? Se lembraria dele? Teria alguma vez pensado nele ou sentido sua falta, esses anos todos?
Passou a mão pelos cabelos num gesto de impaciência – precisava por um fim naqueles pensamentos ou enlouqueceria. E ele jamais permitiria que isso acontecesse agora, que estava tão perto de conquistar seus objetivos.
Estacionou sua pickup na frente da casa humilde em que passara sua infância – a casa da sua mãe.
Embora houvesse insistido à exaustão, jamais conseguira levar Marina para viver consigo, em Nova York. Ela insistira em permanecer exatamente onde estava. Parece que teimosia era um traço de família.
Com um suspiro de resignação, desceu do carro, deu a volta no veiculo e parou. Olhou ao redor, para as casas vizinhas e para a própria casa de sua mãe – nada parecia ter se movido do lugar durante todos esses anos! A pintura velha, em azul claro descascando em alguns lugares, as janelas brancas, sempre muito limpas, a porta da frente amassada embaixo – onde ele batera com a bicicleta quando ainda aprendia a pedalar...a velha árvore ainda com balanço feit de pneu , a varanda pequena e atulhada de vasos de plantas por toda parte...nada mudara. Apenas algumas plantas foram adicionadas a coleção da mãe. Marina realmente amava plantas!
Estevão sorriu levemente com as recodações da mãe cuidando das suas plantas e ralhando com ele para que fosse mais cuidadoso ou ela o trocaria por uma samambaia. As ameças sempre terminavam com um largo sorriso e um beijo em sua cabeça, e uma promessa de ser mais delicado no futuro. Unica promessa que Estevão jamais cumpriu.
Quando esticou a perna para começar a andar, ouviu um suspiro e um choro atrás de si, e o barulho de sacolas caindo no chão, então virou-se e se deparou com uma mulher de um metro e meio, que tinha levado as mãos ao rosto e agora chorava copiosamente: Marina. Sua mãe era baixa, morena, tinha olhos pequenos e muito expressivos. Possuía longos cabelos negros, lisos e fartos, que viviam presos em uma trança, que era enrolada envolta da sua cabeça. Tinha um corpo mediano – não era rechonchuda e nem magra, e apesar do tempo ter deixado suas marcas, Marina ainda era uma mulher muito bonita. Sua pele morena acentuava sua beleza exótica. Ela gemeu baixinho em português:
- Estevão! Você está mesmo aqui, meu filho? E correu para abraçá-lo e cobrir seu rosto de beijos!
Estevão não sabia quanto tinha sentido falta do carinho da mãe até aquele momento. Marina, era sempre afetuosa e expansiva, como era natural do seu povo – brasileiros geralmente são assim.Infelizmente Estevão não herdara esse seu traço, era mais fechado e introvertido. Achava que isso era pelo fato de ter crescido sem pai e na pobreza. A dureza de sua situação fizera com que se fechasse em si mesmo e jamais se permitira abrir-se com ninguém, a exceção de duas pessoas: sua mãe e Caroline.
Sorrindo abraçou a mãe e a ergueu no ar por alguns instantes, o que a deixou maravilhada. Também sorrindo ela disse: "Antes era eu quem o pegava no colo, agora é você quem me pega!"
Estevão a colocou no chão e pediu sua benção, como era a tradição em que fora educado:
"- Bença mãe "– e se curvou para receber a benção da mãe, que traçando sobre ele a cruz, respondeu: " Deus te abençoe, meu filho!" e o beijou na fronte.
Ele a ajudou a recolher as sacolas que ela trazia e entraram em casa.
Estevão inspirou fundo os aromas de limpeza, flores e comida caseira que tomavam conta de toda a casa. Era muito bom estar de volta.
A sala era pequena, muito simples, com um sofá azul de frente para a porta e na parede oposta, um pequeno móvel com uma televisão muito grande, de tela plana, que ele insistira em lhe dar de presente no natal passado. A visão desproporcional o fez rir. Contemplou o velho e gasto tapete, as almofadas e manta de crochê coloridas que a mãe tecera para o sofá, a mesa de centro que estava emcimada por um vaso de suculentas e um centro de mesa também de crochê, mas de cor bege.
A um canto havia um aparador cheio de fotos e com um pequeno altar no centro, com uma imagem de São Miguel e de Nossa Senhora Aparecida, que é padroeira do Brasil. Para onde quer que olhasse havia trabalhos manuais em crochê, tricô ou ponto cruz, feitos pela mãe. A casa era pequena, mas tão aconchegante, que nem nos hotéis mais refinados em que estivera, ou nas mansões que edificara, ele sentira calor e acolhimento como ali.
Já podia ouvir sua mãe cantarolando uma de suas músicas favoritas enquanto guardava as compras na cozinha e remexia nos armários: ela iria preparar um café e biscoitos ou bolo. Isso o fez sorrir mais uma vez. A primeira coisa que a mãe fazia quando chegava uma visita, era preparar café e guloseimas.
Mas ele não era visita, era?
Foi juntar-se a ela na cozinha, que por incrível que pareça, era um dos maiores cômodos da casa. A cozinha era branca, com duas janelas amplas que davam para um pequeno jardim nos fundos e para a área de serviço externa, que Marina insistira em construir, para "não fazer bagunça ao lavar as roupas" como ela alegava. As janelas possuiam cortinas em um xadrez vermelho e branco, com algumas suculentas e alguns vasinhos de temperos nos parapeitos. Marina o fizera pendurar alimentadores de pássaros na varanda dos fundos, então sempre havia passaros cantando por ali.
Em uma parede havia armários e uma geladeira pequena e, do lado dela, um fogão que já tivera dias melhores. De frente para as janelas estava a pia e havia armários embaixo e uma bancada do lado, onde Marina preparava seus quitutes. Em um dos cantos estava uma mesa com quatro cadeiras. A mesa era de madeira clara, sempre forrada com uma toalha com motivos alegres e coloridos. O chão e as paredes eram de cerâmica branca, imaculadamente limpos.
Marina estava em frente ao fogão, colocando a água para ferver. Estevão disse:
"- Marina, agora sou visita?"
Sua mãe virou-se abruptamente e disse: " - Marina? Você pode ser um homem agora, bem sucedido, dono do próprio nariz e tudo mais, mas eu sou sua mãe e se voltar a me chamar assim eu lhe quebro os dentes!"
Estevão riu alto e abraçou a mãe, que estava de braços cruzados e parecia genuinamente zangada com ele e disse:
"- Você não mudou nadinha, hein mãe?"
Marina empertigou-se ainda mais e resmungou: "- Você?"
Ao que Estevão prontamente respondeu: " - Desculpe. A senhora não mudou nadinha. Melhor assim?"
Marina fungou: "-Rum. Um pouco. Você pode mudar em tudo, meu filho, menos no respeito com sua mãe e no caráter de um homem de verdade. Isso eu ensinei bem! Espero que não esqueça."
Estevão a beijou na bochecha e garantiu: "- Jamais, mãe. Era só uma brincadeira!"
"Tá certo. Sente-se, você não é visita, mas eu lhe servirei um café!" - disse, apontando para a mesa.
Sentaram-se e conversaram longamente sobre todas as coisas importantes que ocorreram nesses anos todos; como nada parecera mudar naquela cidade, sobre os visinhos, os amigos de longa data, as viagens que fizera, as vezes em que a mãe o fora visitar...e finalmente chegaram ao assunto que ambos estavam sendo cuidadosos em mencionar:
"- Ela vai se casar. Está noiva, Estevão. - disse Marina, olhando-o diretamente nos olhos e examinando sua reação. - É tarde demais e não há nada que você possa fazer. Esqueça-a! Há tantas...
"-Não posso! A senhora sabe bem.- disse, com uma careta de desgosto e frustração. Olhou para o fundo da sua xícara ainda fumegante e suspirou. Encarando a mãe, disse simplesmente: "- Eu darei um jeito. Caroline Darren será minha."
A mãe o encarou com preocupação e deixou escapar: "- Você é tão determinado quanto seu pai!" e tão logo dissera, se arrependera. E tentara disfarçar tirando a mesa, mas sabia que não escaparia ilesa...
"-Certo. Nunca saberei pois a senhora nunca fala nele! Nem mesmo um nome ou a razão pela qual ele saiu de nossas vidas. Ou se morreu...nada...Não pode continuar agindo como se ele nunca existira, mãe! Sou um homem agora e a senhora me deve respostas." Estevão encarou-a, esperando.
Nesse exato momento a campainha tocou e Marina foi salva pelo gongo! Mas sabia que tão certo como o sol brilhava lá fora, o filho não desistiria de ter sua resposta.
Correu para a porta da casa e respirou aliviada por conseguir algum tempo antes da tempestade.
Laila, sua vizinha e melhor amiga estava na porta, com um sorriso radiante no rosto e uma garrafa de vinho nas mãos. Assim que Marina abriu a porta para ela, foi logo entrando e tagarelando sobre algo inusitado que lhe acontecera, mas Marina não a ouvia. Não conseguia parar de pensar na conversa que acabara de ter com o filho e estava morta de medo da verdade e de como seu filho reagiria a ela... ainda assim tentava sorrir e prestar atenção ao que Laila dizia, sem muito sucesso.
Estevão ouviu a voz animada e os risos calorosos da amiga da mãe e se lembrou de todas as vezes que Laila fora presente na vida deles, nos bons e maus momentos, sempre trazendo alegria e bos risadas consigo. Ela costumava implicar com ele dizendo : "- Esse menino vai dar muita dor de cabeça para os pais das moças de toda a região. É um pecado ser tão bonito e charmoso!" e sorria lhe afagando os cabelos.
Estevão sorria de volta e afirmava sempre: "- Seus olhos não funcionam bem, tia Laila!" e ela o puxava para um abraço, sem deixar de sorrir.
Uma única vez a vira triste e o sorriso deixara aquele rosto tão alegre – quando seu marido se fora, vencido pelo câncer. Sua mãe ficara com ela e cuidara dela durante os primeiros dias e Estevão ficara devastado ao ver aquele sorriso se apagar. Ainda era um garoto de 9 anos na época e sua mãe sentira muito pela amiga, ainda jovem passando por uma situação daquelas.
Graças a Deus ela se recuperara bem, com a ajuda dos filhos e dos amigos queridos.
Ao vê-lo de pé, na soleira da porta da cozinha olhando para ela e sorrindo, Laila dera um gritinho de espanto e felicidade e virou-se para a amiga dizendo:
"Então o carrão lá fora é dele? Pensei que fosse algum namorado que estava escondendo de mim, pois estava muito estranha, mais que o normal, Mari. E virando-se para Estevão – Venha cá seu menino malvado! Deixe-me ver você um instantinho." estendeu a mão puxando Estevão para seu campo de visão e fez com que ele desse uma voltinha para vê-lo por completo. Assobiou e disse : " Garoto, eu disse e repito: você vai trazer muita dor de cabeça para os pobres pais das moças de Saint Louis! Um-um...vai sim!" e o abraçou por fim.
Estevão sorriu com gosto daquela brincadeira e disse: "- Só tenho olhos pra você, Tia Laila! Quando é que vai casar comigo?" e serrou as sobrancelhas, como se estivesse falando sério. A Senhora alta e rechonchuda, com grande olhos azuis marotos, corou de prazer com aquela brincadeira e gargalhou alto, ainda nos braços de Estevão e disse:
"- Menino, se fosse uns 20 anos mais velhos, eu bem que aceitaria!" e beijou-o nas bochechas, enquanto o olhava de alto a baixo. " Você mudou bastante, Estevão. Não é mais o rapazinho magricela e mal vestido que vi sair daqui com uma mochila nas costas e deixando sua mãe chorosa e inconsolável na rua, acompanhando você com os olhos até você sumir de vista, naquele carro velho caindo aos pedaços que você comprou do velho Bill a troco de seis meses de trabalho duro naquele ferro velho. Tá bonito, bem arrumado e com um carrão de dar inveja! Pelo que vejo, você se deu bem, garoto e estou muito feliz por isso! Agora, vá se divertir por aí, enquanto eu e sua mãe temos nossa noite das meninas." Disse enquanto o empurrava porta afora.
"- Noite das meninas? - perguntou sarcasticamente, levantando uma sobrancelha e rindo como canto da boca.
Laila não se abalou e respondeu prontamente:
" - Rapazinho, somos jovens e gostamos de nos divertir uma vez na semana, tomamos vinho, fofocamos e jogamos cartas. Sua mãe sempre perde, mas eu a amo mesmo assim. Agora vá, que não quero falar dos meus namorados e dos de sua mãe na sua frente."
Estevão parou e olhou de uma para a outra, incrédulo e ciumento: "- Namorados?"
Fechou a cara exigindo respostas.
Laila gargalhou apenas.
" Oh, ela não fala sério! - resmungou Marina, enquanto virava os olhos. Vá! Se divirta um pouco e reveja seus amigos. Lhe fará bem."
Marina sabia que Estevão não possuia amigos ali, fora os filhos de Laila. Mas eles estavam fora, um a trabalho e o mais novo, na Universidade. E Loren se casara a um ano. Mas ela precisava que ele saísse para poder respirar um pouco e desabafar com a amiga, que certamente notara seu desespero e embaraço e vira em seu socorro. Na verdade não seria problema que ele continuasse em casa e até participasse da "noite das meninas", como inventara Laila. Mas seria ótimo falar a sós com a amiga e decidir o que fazer.
Estevão não era bobo, e conhecia muito bem as duas senhoras e percebera seu estratagema. Mas decidira que ele próprio precisava de um tempo para absorver as emoções conflitantes, clarear a mente e pensar nos próximos passos. Então sem dizer mais nada, pegara as chaves e o celular no aparador e saiu porta afora.
A noite estava clara e fresca. Estevão olhou para o céu e contemplou algumas estrelas que brilhavam na noite sem lua e exalou um suspiro. Para onde iria? Fazia anos que saíra da cidade e não conhecia mais nada ali. Decidira fazer uma busca rápida na internet e encontrara um bar e pareceu ser um bom lugar para ir e relaxar enquanto pensava no que faria a seguir.
Decidido, entrou no carro e partiu.
Minutos mais tarde, ele parou a pickup preta no estacionamento do Whispering Pint e deseu. Parou diante do bar e contemplou o local: estacionamento amplo e cheio para o dia e horário – era uma quinta feira, sete e meia da noite; observou o letreiro iluminado e a fachada nova e bem cuidada, pintada de negro e vermelho, com detalhes em dourado. Era um lugar quase elegante, para ser sincero. Estevão gostara.
Marchou para dentro do bar e parecia que metade da cidade estava ali para um happy hour. Fez-se um ligeiro silêncio seguido por murmúrios e Estevão sentiu todos os olhos ali voltados para ele. Mas logo tudo se normalizou e ele correu os olhos a procura de uma mesa a um canto mais afastado e foi então que a viu, olhando-o perpelexa, sem desviar os olhos, como se não pudesse crer no que via diante de si.
Estevão sentiu como se tivesse levado um soco na boca do estômago e não conseguiu respirar por um instante. Seus olhos estavam presos naqueles imensos olhos dourados e ele não conseguia se libertar. Carol. Sua Carol.
Certa vez, em uma de suas visitas, a mãe lhe mostrara uma foto de Caroline,e ele havia ficado maravilhado com a imagem dela sorrindo, com o cabelo preso em um coque no alto da cabeça, o corpo transformado de menina para mulher e o vestido florido e leve só realçava a sua beleza natural e Estevão sonhava com aquela imagem todas as noites quando dormia. Mas aquela foto não o preparara para a realidade: a Carol que tinha diante de si era infinitamente mais bela do que a da foto; apesar de estar sentada, ele pode notar que usava um taier bege claro, com uma blusa de seda branca com um leve decote em v que deixava a mostra sua pele de porcelana e lhe moldava o corpo esguio e curvilíneo; a saia pouco acima do joelho deixava a mostra suas pernas bem torneadas e o contorno dos seios fartos se moldava á blusa, fazendo-o inspirar fundo na tentativa de controlar seus instintos. Dessa vez os cabelos avermelhados caiam como cascata ao redor do rosto delicado, de olhos esbugalhados que o encaravam e lábios entreabertos em espanto.
Com um esforço sobrehumano, Estevão apenas fez um aceno de cabeça, cumprimentando-a, desviou os olhos e foi sentar-se no canto oposto do bar longe o suficiente para conseguir se controlar, mas sem que a perdesse totalmente de vista.
Sentou-se e se empertigou na cadeira, recebendo o cardápio das mãos de uma garçonete muito jovem e bela, que batia os cílios sempre que Estevão a olhava no rosto, numa tentativa inútil de flerte.
Pigarreou e pediu cerveja e uma costelinha ao molho barbecue e fritas com queijo.