O Doador Tomou Minha Vida
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Capítulo 3

O celular de Dante vibrou alto, quebrando a falsa tranquilidade na sala. Ele olhou para a tela e seu rosto se contraiu. Ele me lançou um olhar rápido e nervoso antes de sair para a pequena varanda para atender a chamada.

Ele tentou manter a voz baixa, mas ouvi fragmentos da conversa.

"...não, está tudo bem... eu vou cuidar disso... volto logo, prometo..."

Sua voz, mesmo abafada, pingava uma ternura que revirava meu estômago.

"...claro que vou te levar aquele cheesecake que você gosta. Apenas se comporte e espere por mim."

Ele desligou e voltou para dentro, uma máscara de desculpa já estampada em seu rosto.

"Surgiu uma coisa no escritório", disse ele, sem me encarar diretamente. "Uma emergência de verdade. Tenho que ir."

Ele se inclinou para me beijar, mas virei a cabeça para que seus lábios pousassem na minha bochecha. "Vou tentar voltar para o jantar", ele prometeu.

Eu apenas assenti, em silêncio.

Caio olhou de mim para Dante, uma carranca preocupada em seu rosto. "É sério?"

"Apenas um probleminha", disse Dante com desdém. Eles eram tão bons nisso, encenando sua pequena peça bem na minha frente.

Caio decidiu sair com ele. "Vamos deixar você descansar um pouco", disse ele. Na porta, ambos se viraram.

Os olhos de Dante estavam cheios de um afeto profundo e teatral. "Eu volto hoje à noite, prometo."

Caio bagunçou meu cabelo, um gesto que costumava ser reconfortante, mas agora parecia uma violação. "Durma um pouco, pequena. Eu te levo para o seu check-up amanhã."

Eu sorri e assenti, fingindo até a porta se fechar atrás deles.

O som daquele clique ecoou no apartamento silencioso. Era o som da porta de uma jaula se trancando. Um mundo comigo de um lado, e as duas pessoas em quem eu mais confiava do outro.

Qualquer última e tola esperança a que eu pudesse estar me apegando morreu naquele momento.

O quarto vazio parecia vasto e frio. O único som era o tique-taque de um relógio na parede, cada segundo uma martelada no meu coração. Eles estavam me matando, não com uma arma, mas com seu amor, suas mentiras, seu cuidado sufocante.

Dante não voltou naquela noite. Ele mandou uma mensagem.

`Sinto muito, amor. Fiquei preso. Descanse um pouco. Eu te amo.`

No dia seguinte, Caio também não veio.

Peguei um táxi para o hospital sozinha.

Terminei meu check-up e estava andando pelo saguão quando uma comoção perto da entrada principal chamou minha atenção.

Eu olhei para cima e os vi.

Dante estava lá, com o braço protetoramente em volta dos ombros de Clara. Ele olhava para ela, seu rosto uma máscara de pura e inalterada adoração.

Caio estava do outro lado dela, sua voz baixa e ansiosa.

"O médico disse que você tem uma ameaça de aborto, Clara. Você precisa andar devagar. Tenha cuidado."

Aborto.

A palavra me atingiu com a força de um golpe físico.

Grávida. Ela estava grávida.

Clara olhou para Dante, seu lábio inferior tremendo. "Você não deveria ter me deixado sozinha ontem à noite", ela choramingou. "Eu estava com tanto medo. Acho que foi por isso que isso aconteceu."

O rosto de Dante se desfez em culpa. "Você está certa. É tudo culpa minha. Sinto muito, meu bem."

Ele parou de andar e a puxou para um abraço, uma mão acariciando seu cabelo, a outra repousando suavemente em sua barriga ainda lisa. O olhar em seus olhos... era um olhar de amor e admiração tão profundos, um olhar que ele nunca, jamais me deu.

"Eu prometo", ele sussurrou, a voz embargada de emoção. "Eu nunca mais vou te deixar sozinha."

"É bom mesmo", disse ela, um pequeno sorriso triunfante brincando em seus lábios.

Caio interveio, sua voz tentando um tom leve. "É melhor ele não deixar. Ele tem que cuidar de você."

Os três ficaram ali, uma pequena família perfeita, silhuetados contra a luz brilhante da entrada do hospital. A cena era tão dolorosa que fez meus olhos arderem.

Clara encostou a cabeça no peito de Dante. "Você sempre vai ser tão bom para mim?"

Ele beijou o topo da cabeça dela. "Claro que vou. Você é minha esposa. Você está carregando meu filho."

Minha esposa. Meu filho.

O gosto de sangue encheu minha boca novamente. Pressionei a mão nos lábios, forçando-me a engolir.

Virei-me e saí do hospital, minhas pernas se movendo no piloto automático.

Meu celular vibrou. Uma mensagem de Caio.

`E aí, pequena. Como foi o check-up? Desculpe, fiquei preso em uma reunião e não pude ir. Prometo que estarei lá no próximo!`

Eu encarei a tela, e uma risada borbulhou do meu peito, um som quebrado e histérico que era metade soluço, metade grito. As lágrimas escorriam pelo meu rosto enquanto eu andava cegamente pela rua.

            
            

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