Ela ficou lá por dois dias. Sem comida, apenas uma garrafa de água. O frio se infiltrou em seus ossos. Seu corpo doía, e uma cólica surda começou em seu baixo ventre. Era medo, ela disse a si mesma. Apenas medo. Mas cresceu, uma pulsação persistente que ecoava o vazio dentro dela.
Na terceira manhã, a porta se abriu. Uma empregada estava lá, seu rosto impassível. "O Sr. Arruda disse que a senhora pode sair agora. Mas deve ir direto para o hospital."
Anabela não perguntou por quê. Apenas assentiu, seu corpo fraco demais para discutir. Ela vestiu as roupas simples que a empregada trouxera e cambaleou para fora da mansão, piscando sob a luz forte do sol.
Ela precisava ir à clínica. Aquela que Adan havia encontrado para ela. Este bebê... ela não podia trazer uma criança para este pesadelo. Era uma decisão cruel e dolorosa, mas era a única que lhe restava.
Ela chegou à clínica, suas pernas tremendo. A enfermeira na recepção foi gentil, mas firme.
"Sinto muito, senhora. Para este procedimento, precisamos da assinatura de um cônjuge ou de um familiar direto. É uma exigência legal."
Um cônjuge. Um familiar. Joca era seu noivo. Adan estava a horas de distância. Ela não tinha escolha. Suas mãos tremiam enquanto discava o número de Joca.
Ele atendeu no segundo toque. "O que você quer, Anabela? Estou ocupado."
Ao fundo, ela podia ouvir a voz suave de Evelyn. "Joca, quem é? É ela? Diga para ela não ligar, isso piora minha ansiedade."
"É só uma ligação de trabalho, querida", a voz de Joca era doce como mel para Evelyn, depois se tornou áspera para ela. "O que é? Desembucha."
"Joca, estou no hospital", Anabela começou, sua voz falhando. "Preciso que você venha. Preciso da sua assinatura para um... um procedimento."
"Um procedimento?", ele zombou. "O quê, você se meteu em alguma encrenca? Está tentando fazer uma cirurgia plástica para consertar essa sua cicatriz feia? Esqueça. Não vou pagar pela sua vaidade."
Ele nem perguntou que tipo de procedimento. Ele não se importava.
"Joca, por favor..."
"Tenho que ir. Evelyn não está se sentindo bem."
Ele desligou.
O tom de discagem zumbiu em seu ouvido, um som final e definitivo. Ela olhou para o telefone, uma onda de náusea a invadindo. Lembrou-se de uma vez em que teve uma febre baixa, e ele fretou um especialista de outro estado. Ele segurou sua mão por horas, limpando sua testa com um pano frio, sussurrando que não suportava vê-la com dor.
Onde estava aquele homem? Quem era este estranho frio e cruel que usava seu rosto?
O amor que ela sentira por ele, a devoção profunda e inabalável, finalmente se transformou em algo frio e morto. Não havia mais nada a ser salvo.
Ela se virou para sair da clínica, seu plano em ruínas. Teria que encontrar outro jeito. Ao empurrar a porta de vidro, ela congelou.
Um Bentley preto havia parado na calçada. Joca estava saindo, abrindo a porta do passageiro para Evelyn. Evelyn parecia pálida e delicada, apoiando-se em seu braço enquanto ele a ajudava a sair do carro. Eles estavam no mesmo hospital.
Joca a viu. Um sorriso cruel torceu seus lábios. "Ora, vejam só quem está aqui. Nos seguindo, Anabela? Eu sabia que você não conseguiria ficar longe."
Ela não disse nada, apenas tentou passar por eles. Ele bloqueou seu caminho.
"Não tão rápido", disse ele. "Na verdade, é o momento perfeito. Evelyn teve outra de suas crises. O médico disse que ela está anêmica. Ela precisa de uma transfusão de sangue."
Ele a olhou de cima a baixo, seus olhos clínicos e frios. "Vocês duas têm o mesmo tipo sanguíneo. Eu verifiquei. Você vai doar."
"O quê? Não", disse Anabela, sua mão instintivamente indo para o estômago. "Eu não posso. Eu... não estou bem."
"Não seja egoísta", ele retrucou. "Evelyn tentou cortar os pulsos de novo esta manhã por causa do que você disse. Isso é o mínimo que você pode fazer."
"Joca, estou grávida", ela sussurrou, as palavras um apelo desesperado e de última hora. "Não posso doar sangue."
Ele a encarou, depois jogou a cabeça para trás e riu. Um som áspero e feio. "Grávida? Não seja ridícula. Você só está dizendo isso para se livrar. Você é sempre tão dramática."
Lágrimas escorriam por seu rosto, mas ela não emitiu nenhum som. Apenas ficou ali, seu coração se partindo repetidamente.
Ele agarrou seu braço, seu aperto machucando. "Você vai fazer isso."
Ele a arrastou de volta para a clínica, ignorando seus protestos. Empurrou-a para uma pequena sala, forçando-a a sentar em uma cadeira. Uma enfermeira entrou com uma agulha.
"Por favor", Anabela implorou, olhando para Joca. "Por favor, não faça isso."
Ele não olhava para ela. Apenas encarava a janela, a mandíbula tensa. "Tire 400ml", ele ordenou à enfermeira.
A agulha deslizou em sua veia. Ela sentiu uma onda de tontura enquanto seu sangue, a própria força vital que precisava para seu bebê, era retirado de seu corpo. Sentiu-se fraca, sua visão embaçando nas bordas.
Quando terminou, ele nem olhou para ela. Apenas pegou a bolsa de sangue e saiu da sala. Ela o observou caminhar pelo corredor, com o braço ao redor de uma Evelyn de aparência triunfante, e a deixou lá, drenada e vazia.