Era sempre sobre o Ricardo. Tudo o que ela fazia era pelo Ricardo.
"Não quero ir para a sua casa. Apenas me deixe na cobertura."
"Não", disse ela simplesmente.
O carro parou em frente a uma elegante casa nos Jardins. Ela saiu e marchou até a porta sem esperá-lo. Ele permaneceu no carro, em um protesto silencioso.
Ela se virou, os olhos brilhando de impaciência. "Você vai me fazer te arrastar para fora de novo?"
Ele suspirou em derrota e a seguiu para dentro.
A casa era linda, cheia de arte e móveis caros, mas parecia tão fria e impessoal quanto um museu.
"Tudo o que estou fazendo", disse ela, virando-se para encará-lo no hall de entrada, "é para proteger o Ricardo. Você entende? Isso não tem nada a ver com você."
Ela desapareceu por um momento e voltou com um cobertor de caxemira grosso e um kit de primeiros socorros. Ela jogou o cobertor para ele.
"Tire sua jaqueta molhada."
Ele fez o que lhe foi dito, envolvendo o cobertor macio em seus ombros trêmulos. Era um pequeno conforto em um mar de miséria.
Ele pensou no contrato de casamento que o esperava. O casamento seria em algumas semanas. Então ele estaria livre disso, livre dela. Só precisava sobreviver até lá.
Isadora abriu o kit de primeiros socorros. "Sente-se", ordenou, gesticulando para uma poltrona de veludo.
Ele se sentou. Ela se ajoelhou na frente dele, limpando o corte em sua testa com um lenço antisséptico. Seu toque era áspero, clínico.
Ele podia sentir o calor da mão dela através do pano fino. Sua respiração engatou. Ele tentou se afastar.
"Fique quieto", ela ordenou, pressionando a cabeça dele de volta contra a cadeira. Ela começou a limpar a ferida, seus movimentos eficientes e distantes.
"Assim que estiver remendado, você vai embora", disse ela, a voz tão afiada quanto a ardência do antisséptico. "Tenho um jantar para ir."
Um nó se formou em sua garganta. "Você realmente me odeia tanto assim?"
Ela não respondeu. Apenas continuou seu trabalho, o rosto uma máscara de concentração.
O silêncio era sufocante. Ele podia sentir o calor irradiando dos dedos dela onde tocavam sua pele. Por um segundo louco e estúpido, pareceu como nos velhos tempos. Parecia que ela estava cuidando dele.
Ele sabia que era uma ilusão.
"Isa", ele sussurrou, a voz quebrando. "Você realmente não se lembra de nada? Se você apenas... se você apenas não me ama mais, eu posso aceitar. Eu vou embora e nunca mais te incomodo. Mas isso... não se lembrar... não é justo. Nem para você, nem para mim."
Suas palavras pairaram no ar entre eles. Ele viu as mãos dela pararem. Seu olhar, fixo no corte acima do olho dele, vacilou. Ele viu algo nos olhos dela, um lampejo de dor, de confusão. Era o mesmo olhar que ela tivera na joalheria quando viu sua própria caligrafia.
Ela estava sendo tocada. Alguma parte dela, enterrada fundo, estava respondendo a ele.
Mas então ela piscou, e aquilo se foi. Ele viu o flash de outra imagem em sua mente: Ricardo, sorrindo para ela, confiando nela. A culpa de trair essa confiança, mesmo que por um segundo, era demais.
Ela se convenceu de que aquilo era mais um dos truques de Elias. Ele estava tentando manipulá-la, enfraquecer sua determinação.
"Eu só amo o Ricardo", disse ela, a voz dura e final, um escudo contra sua própria confusão. Ela terminou de enfaixar o corte dele e se levantou abruptamente. "Pronto. Você pode ir agora."
Ele a encarou, a última centelha de esperança morrendo em seu peito. Um sorriso amargo tocou seus lábios.
"Eu entendi agora", disse ele em voz baixa.
Ele se levantou, deixando o cobertor caro cair no chão. Não disse mais uma palavra. Apenas se virou e caminhou em direção à porta, seus movimentos rígidos e deliberados. Ele não queria ficar na presença dela por mais um segundo. Ela era veneno.
Isadora o observou ir. Observou suas costas retas, a determinação em seus ombros. Ela esperava que ele implorasse, discutisse, tentasse outra tática patética. Não esperava isso... essa finalidade.
Quando a porta da frente se fechou atrás dele, sua elegante sala de estar de repente pareceu vasta e vazia. As palavras dele ecoaram em seus ouvidos. "Não é justo."
Ela presumiu que ele estava jogando um jogo de gato e rato, um homem desesperado tentando reconquistá-la. Mas a partida dele pareceu diferente. Pareceu que ele realmente desistira.
Um sentimento estranho e inquietante invadiu seu coração. Um sentimento de perda.
Ela o descartou irritadamente. Era apenas o sentimento de perder um admirador, disse a si mesma. Um incômodo, mas um admirador mesmo assim. Seu ego estava ferido, só isso.
Uma dor aguda atravessou sua cabeça. Ela pressionou os dedos nas têmporas, fazendo uma careta. Acontecia às vezes quando ela tentava pensar demais no passado, nos espaços em branco de sua memória.
Ela parou de pensar. A dor diminuiu.
Ela alisou o vestido e verificou seu reflexo no espelho do corredor. Ricardo estava esperando por ela. Era tudo o que importava.
Elias acabara de chegar ao portão da frente da casa, onde o carro de Beatriz o esperava para levá-lo de volta à cobertura, quando uma figura saltou das sombras.
Era Ricardo. Seu rosto estava contorcido de raiva.
"Seu desgraçado!", ele gritou, e seu punho conectou-se com o queixo de Elias.
Elias cambaleou para trás, pego de surpresa.
"Qual é o seu problema, caralho?", ele gritou, sentindo o gosto de sangue.
"Meu problema?" A voz de Ricardo era um grito agudo de fúria. "Meu problema é você! Eu vi o carro dela te trazer aqui! Eu vi você entrar na casa dela! Eu sei que ela te tocou!"
Seu ciúme era uma coisa crua e feia. Ele não estava com raiva porque Elias estava ferido; estava furioso porque Isadora lhe mostrara um pingo de bondade.
"Ela estava limpando um corte, seu psicopata!"
"Você está tentando reconquistá-la! Está usando a pena dela!" Ricardo estava completamente descontrolado. Ele deu um tapa no rosto de Elias, uma, duas vezes. Os golpes eram fracos, patéticos, mas alimentados por uma raiva aterrorizante. "Eu não vou deixar! Ela é minha!"
Ele recuou, respirando pesadamente. Estava segurando um pequeno galão de gasolina.
Os olhos de Elias se arregalaram quando Ricardo desatarraxou a tampa e jogou o conteúdo nele. O cheiro forte e químico de gasolina encheu o ar, encharcando suas roupas.
"O que você está fazendo?", Elias gritou, o coração batendo com um novo tipo de medo. Isso ia além de espancamentos e ameaças. Isso era loucura.
Ricardo tirou um isqueiro do bolso. Seus olhos estavam selvagens, sua mão tremendo enquanto o acendia. Uma pequena chama dançou no escuro.
"Vou te queimar da vida dela para sempre."