Algumas horas depois, uma empregada bateu em sua porta. Era Marta, uma mulher que trabalhava na cobertura há anos e sempre fora gentil com ela. Hoje, seu rosto era uma máscara fria e formal.
"O Sr. Monteiro instruiu que você retire seus pertences deste quarto", disse Marta, sem encontrar os olhos de Helena.
Helena apenas assentiu, seu coração uma pedra entorpecida e pesada no peito.
"Uma nova hóspede chegará em breve para ocupar esta suíte", acrescentou Marta, sua voz seca.
"Eu entendo", disse Helena. Ela não sentia nada. Nenhuma raiva, nenhuma tristeza. Apenas um vazio vasto e oco. Ela tomou um banho, deixando a água quente escorrer sobre ela, tentando esfregar a sujeira dos últimos oito anos. Vestiu um simples par de jeans e um suéter, roupas que pareciam mais sua própria pele do que os vestidos de grife jamais pareceram.
Enquanto ela estava embalando o último de seus materiais de arte em uma caixa, a porta da suíte se abriu. Uma mulher estava lá, banhada pela luz da manhã. Ela era linda, com os mesmos cabelos escuros e traços delicados de Helena. Era como olhar para um reflexo distorcido.
"Então você é a substituta", disse a mulher, sua voz pingando uma mistura de diversão e desprezo. Ela entrou, olhando ao redor do quarto como se fosse a dona. "Eu sou Karina Lacerda. É um prazer finalmente ver a isca pessoalmente."
Helena finalmente entendeu. Não era apenas sobre proteção. Arthur a escolhera porque ela se parecia com Karina. Ele passara oito anos transformando-a em uma cópia perfeita, uma substituta para a mulher que ele realmente queria.
Os olhos de Karina percorreram Helena da cabeça aos pés. "Arthur estava ficando impaciente para eu voltar da Europa. Acho que olhar para você não era mais suficiente para ele."
Helena não disse nada. Pegou sua caixa, com a intenção de passar por Karina e deixar este pesadelo para trás.
Ela tentou oferecer um aceno educado, um gesto final e sem sentido.
Ao passar, Karina de repente ofegou e tropeçou, seu braço se agitando como se tivesse perdido o equilíbrio. Foi um ato desajeitado e óbvio.
"Oh!", gritou Karina, caindo em direção ao chão.
Naquele exato momento, Arthur apareceu na porta. Ele se moveu com a velocidade de um raio, seu rosto uma máscara de puro pânico. Ele passou correndo por Helena, empurrando-a para o lado para pegar Karina antes que ela atingisse o chão.
O empurrão foi forte. Helena tropeçou para trás, sua cabeça batendo na quina afiada de uma mesa com tampo de mármore. A dor explodiu atrás de seus olhos, e ela viu estrelas. Ela deslizou para o chão, sua visão embaçando.
"Karina! Você está bem?", a voz de Arthur estava cheia de um terror frenético que Helena nunca tinha ouvido antes, nem mesmo quando ela sofreu um acidente de carro. Ele segurava Karina como se ela fosse feita de vidro fiado.
"Estou bem, Arthur", murmurou Karina, agarrando-se a ele e lançando um olhar triunfante e venenoso para Helena por cima do ombro dele. "Acho que... acho que a Helena pode ter me empurrado. Foi um acidente, tenho certeza. Ela deve estar chateada por eu ter voltado."
A cabeça de Arthur se virou para Helena, seus olhos ardendo com fúria fria.
"Peça desculpas a ela", ele ordenou.
Helena o encarou do chão, sua cabeça latejando. A injustiça era tão profunda que era quase absurda. "Eu não a toquei", disse ela, sua voz fraca.
"Eu disse, peça desculpas." Sua voz foi um estalo de chicote.
Ela balançou a cabeça, a incredulidade lutando com a dor. "Não."
"Ótimo", rosnou Arthur. Ele pegou Karina nos braços como se ela não pesasse nada. "Você pode ficar na sala de reflexão até aprender boas maneiras."
Ele levou Karina embora, murmurando palavras suaves e reconfortantes para ela. Ao saírem, Karina olhou para trás, para Helena. Seus olhos brilhavam de vitória, um pequeno sorriso cruel brincando em seus lábios.
Dois seguranças apareceram e puxaram Helena bruscamente para seus pés. Eles a arrastaram por um longo corredor até um quarto no final da cobertura. Era um espaço pequeno, sem janelas, mobiliado com nada além de uma única cadeira dura. Eles a empurraram para dentro e trancaram a porta.
Uma das empregadas, uma mulher mais jovem que sempre tivera ciúmes de Helena, destrancou a porta alguns minutos depois.
"O Sr. Monteiro disse que você não merece conforto", a empregada zombou, puxando a cadeira para fora do quarto. "E sem comida ou água até que você esteja pronta para se desculpar com a Srta. Lacerda."
A porta bateu novamente, mergulhando Helena na escuridão absoluta. O ar estava frio e viciado. Ela deslizou pela parede até o chão, abraçando os joelhos. A dor latejante em sua cabeça era uma batida surda e constante. Ela estava com fome, com frio e presa no escuro.
Ela pensou no passado. Arthur tinha fobia do escuro. Ele não conseguia dormir sem uma luz acesa. Uma vez, durante um apagão, ele ficou quase frenético, e ela segurou sua mão a noite toda, contando-lhe histórias até a energia voltar. Ele a chamara de sua luz.
A memória era uma ferida fresca e profunda. Era tudo mentira.
Lágrimas que ela não sabia que ainda tinha começaram a escorrer por suas bochechas. Ela chorou silenciosamente no frio e no escuro, lamentando a garota que fora e o amor em que acreditara.
Horas depois, a porta finalmente se abriu. Arthur estava lá, silhuetado contra a luz do corredor. Seu rosto era ilegível.
"Levante-se", disse ele, sua voz seca. "Vista-se. Vamos sair."
Helena tentou se levantar, mas suas pernas estavam fracas de fome e frio. Ela tropeçou, seus joelhos cedendo.
Karina apareceu atrás de Arthur, parecendo fresca e bonita em um vestido novo. "Oh, Helena, olhe para você", disse ela, sua voz cheia de falsa simpatia. "Você deveria ter apenas se desculpado. Arthur estava tão preocupado comigo."
Ela olhou para um relógio na parede. "Vamos nos atrasar para o leilão de caridade. É um evento muito importante."
Os olhos de Arthur estavam frios. "Vistam-na", ordenou ele à empregada que estava atrás de Karina. Duas empregadas vieram e puxaram Helena bruscamente para seus pés, tirando suas roupas simples e forçando-a a vestir um vestido elegante e desconfortável. Elas arrumaram seu cabelo e maquiagem com mãos rudes e impacientes, como se ela fosse uma boneca.
O leilão foi um borrão de luzes brilhantes e vozes altas. Helena se sentia tonta e enjoada. Sua cabeça ainda doía, e seu estômago era um nó apertado de fome. Ela sentou-se ao lado de Arthur, um acessório silencioso e bonito.
Ela não prestou atenção às joias reluzentes e à arte cara que estavam sendo vendidas. Nada daquilo importava.
Então, um novo item foi apresentado. Era uma peça pequena e despretensiosa. Um medalhão de prata em uma corrente simples.
A respiração de Helena ficou presa na garganta. Ela o reconheceria em qualquer lugar. Tinha um arranhão minúsculo e único no fecho. Era de sua mãe. Fora roubado de seu antigo apartamento anos atrás, uma perda que ela lamentara profundamente.
Era a única coisa no mundo que era verdadeiramente dela, a última peça de sua vida antiga, de seu verdadeiro eu. Mas ela não tinha dinheiro. Arthur controlava cada centavo. Ela era um pássaro em uma gaiola dourada, e a porta da gaiola estava trancada.
Ela se virou para Arthur, sua compostura cuidadosamente construída finalmente se quebrando. Ela agarrou sua manga, seus dedos cravando no tecido caro de seu terno.
"Arthur, por favor", ela implorou, sua voz um sussurro desesperado. "Você tem que conseguir isso para mim. Por favor."
Nesse momento, Karina se inclinou para o outro lado de Arthur. "Oh, que bonito", disse ela, sua voz leve e musical. "Acho que eu gostaria disso, Arthur."