Capítulo 7 Convocado

Enquanto Liam percorria as ruas tranquilas e esverdeadas por jacarandás de ambos os lados de Glean Eagles, um subúrbio afluente ao norte de Rock Castle, não era o encontro com seu pai que ocupava seus pensamentos. Ainda estava possesso com Eden, ultrajado com a coragem dela em deixá-lo daquela maneira.

Teria sido cômico caso a sensação não fosse tão mortificante.

Ele parou do lado de fora do enorme e pesado portão de ferro forjado, em frente à grande mansão naquele beco sem saída e abaixou o vidro, pressionando o interfone com irritação.

Ele bateu os nós dos dedos contra o volante impacientemente ao ritmo da música dançante e frenética que retumbava pelas paredes de metal da sua Ferrari, enquanto aguardava uma das várias governantas e mordomos permitirem sua entrada. O Lamborghini que dirigiu ontem à noite estava na garagem agora. Se lembrava vagamente de Steven, seu motorista, mencionar algo sobre precisarem fazer uma manutenção antes de ele sair novamente com o carro.

Alguns segundos depois, o portão rangeu, se voltando para dentro e Liam adentrou na estrada circular e rodeada por gramados bem cuidados e jardins imaculados. Essa casa onde passou sua infância, era tão vibrante agora nos meses de inverno quanto no auge do verão. O exército de paisagistas que vinha duas vezes por semana garantiam esse efeito. Movido pelo seu amor pelas plantas, era a única coisa que sua mãe não abria mão. Era uma pena que não tivesse o dedo verde, caso contrário faria tudo sozinha.

Richard permaneceu parado, alto e orgulhoso em seu uniforme de mordomo, enquanto esperava na porta da frente para receber Liam na casa, "Mestre Anderson", o mordomo-chefe cumprimentou com um sorriso, lhe dando um abraço de urso e um aperto de mão firme. Durante toda sua vida, Richard tinha sido um homem afetuoso, mas à medida que seus cabelos foram ficando grisalhos, foi se tornando cada vez mais sentimental.

"É bom ver você de novo, Rich!", Liam exclamou, retribuindo a saudação efusiva, embora os dois tivessem recém se visto na semana passada, quando foi obrigado a comparecer ao jantar de família que ele e suas duas irmãs mais novas eram obrigados a ir semanalmente, sem exceção.

"Você deixou seu pai esperando e ele não está nada feliz com isso", o mordomo falou, rindo conforme o levava para dentro.

O estômago de Liam roncou ao sentir o cheiro de algo delicioso no ar, conforme caminhava, passando pela cozinha gourmet até a sala de jantar formal e o lounge. Provavelmente frango assado, que era o prato típico daquela casa aos sábados. Fora a cura para a ressaca que recebera de Dave, não havia ingerido mais nada desde a noite anterior.

Ele enfiou a cabeça dentro do estúdio da sua mãe, que ficava na frente do banheiro de hóspedes.

Lois Anderson estava sentada em frente ao cavalete, fitando a fonte colossal que jorrava do lado de fora da sua janela. Seu cabelo preto e grisalho pendia nas suas costas em uma longa trança francesa, contrastando contra a blusa de cetim rosa claro que ela vestia acima das suas calças de algodão branco. Sapatilhas de balé delicadas e combinando com sua camisa adornavam seus pés. A julgar pelos ombros desanimados dela e a tela em branco, Liam podia dizer que a inspiração não estava em alta hoje.

"Lá está ela!", ele exclamou procurando arrancar um sorriso com sua voz. "A mulher mais bonita do mundo!"

Sua mãe se virou e um sorriso brilhante iluminou seu rosto ao vê-lo parado junto à porta. Contudo, seus olhos verdes pálidos permaneceram úmidos e carregados de lágrimas. Ela as enxugou rapidamente e dançou até os braços estendidos dele.

"Lá está ele, o filho mais bonito do mundo!", respondeu.

Liam deu um beijo em sua bochecha e a fragrância luxuosa, mas familiar dela fez cócegas em seu nariz. Era um dos primeiros cheiros de que se lembrava da infância, quente e reconfortante. Se precisasse descrever o amor em uma palavra, seria o cheiro da sua mãe.

"Ainda lutando para pintar?", ele indagou, assim que se afastaram do abraço.

Lois apenas assentiu com a cabeça, sem dizer nada e, com uma expressão triste nos olhos, cruzou os braços, indo com seu filho até o escritório no final do corredor.

"Talvez você só precise descansar um pouco", Liam sugeriu. Porém, ela já estava de folga, faziam seis meses.

"Talvez eu devesse desistir e procurar outro hobby", ela replicou.

"Ei, a criatividade não funciona sob pressão", ele procurou consolá-la, apertando seu ombro para junto de si.

Clarke Liam Anderson Senior estava sentado do outro lado de uma mesa executiva de mogno no centro da sala, e tinha suas espessas sobrancelhas franzidas numa carranca conforme analisava alguns documentos em suas mãos. A forte luz do sol que adentrava pelas enormes janelas atrás dele o banhavam num brilho suave, lhe dando uma aura quase etérea. E, verdade seja dita, aquele homem havia conquistado para si o status de deus entre seus pares por conta das suas realizações.

Assistir ao seu pai naquele momento era como ver a si mesmo com quarenta anos ou mais no futuro. Com seus cabelos ruivos, suas cores claras e olhos azuis, os dois eram como imagens espelhadas. Além disso, também compartilhavam da mesma estrutura atlética e imponente de seus corpos.

No entanto, a semelhança toda só ia até aí.

Clarke era bem conhecido e adorado por sua generosidade, compaixão e liderança visionária.

Liam, por sua vez, fazia jus a todos os clichês sobre ruivos e seus temperamentos fogosos. Não precisava muito para irritá-lo, o que explicava porque o comportamento de Eden o enfureceu tanto.

Aos 28 anos, já havia acumulado muito sucesso em sua carreira. Contudo, os escândalos constantes em que se metia e os tabloides denunciavam, obscureciam todas suas realizações e ele suspeitava que essa era a verdadeira razão por trás do plano de seu pai acelerar a sucessão.

"Onde estão seus óculos e por que você não os está usando?", Liam indagou enquanto sua mãe o empurrava para frente.

Clarke levantou o olhar para ele por um segundo, antes de obedientemente puxar os óculos pendurados em um cordão preto ao redor do seu pescoço.

Liam se sentou na poltrona marrom Chesterfield à esquerda da grande lareira. Sua mãe se acomodou no assento de três lugares que ficava em frente ao fogo. Ela pegou uma edição da revista Business Insider e folheou suas páginas distraidamente.

Parecia apática ao ambiente, como se tivesse coisas demais em sua mente e Liam se questionou se aquela atitude era apenas pela incapacidade dela de pintar.

Ele estendeu a mão até a dela e a apertou, seu olhar percorrendo a série de fotos de família dispostas sobre a lareira, que mostravam décadas de memórias, principalmente dos três filhos de Anderson durante vários marcos importantes e momentos de grande orgulho nas suas vidas. Primeiros e últimos dias de escola, bailes, formaturas. Eram todos momentos importantes e definitivos. Porém faltavam muitos desses eventos naquela linha do tempo perfeitamente organizada e quase todos estavam relacionados a ele, a sua foto mais recente era de uma vitória em sétimo lugar num torneio.

Liam descansou os braços sobre o estômago faminto enquanto se reclinava na poltrona e apreciava o fogo; não havia percebido o frio que fazia nesse dia até sentir o calor que emanava dali.