- Oi, pequena, como foi seu dia? - ele perguntou, o sorriso gentil, a voz grave como o som de árvores balançando.
- Eu e Mary assistimos a alguns filmes - ela disse, a voz quase um sussurro, tímida diante da grandiosidade dele.
- Quais filmes vocês assistiram? - Zane perguntou, sentando-se na beirada da cama, a cama que era branca como neve.
- Frozen, A Pequena Sereia e A Bela e a Fera - Lyra respondeu, os títulos deslizando facilmente de sua língua.
- Isso quer dizer que você se divertiu?
A pergunta de Zane fez a pequena Lyra pensar. Ela havia se divertido. Os filmes, os biscoitos, a companhia de Mary... mas, sob a diversão, havia uma pontada, um espaço vazio em seu peito que não doía como um machucado, mas como uma ausência. Seus olhos se encheram de lágrimas, grossas e quentes, que rolaram por suas bochechas.
- Ei, pequena, o que foi? - Zane disse, já a puxando para um abraço. A força de seus braços era reconfortante, um porto seguro no meio da tempestade de suas emoções.
- Eu sinto falta da mamãe - ela soluçou, o cheiro de floresta e força dele se misturando às suas lágrimas.
- Eu sei, pequena, eu sei que sente - ele respondeu, a voz mais suave agora.
- Mas sua mãe infelizmente se foi.
- Eu nunca mais vou vê-la? - Lyra perguntou, a voz embargada pelo choro. Aos quatro anos, ela não compreendia a finalidade da morte. Acreditava que, se desejasse com força suficiente, a mãe voltaria.
- "Nunca" é um tempo longo demais, pequena. Mas ela estará sempre com você.
Aqui - Zane apontou para a cabeça dela -, e aqui - ele apontou para o coração.
- Mas ela nunca mais vai me contar histórias para dormir, ou cantar para mim, ou cozinhar meu bolo favorito - Lyra disse entre soluços.
- Ela não irá, mas estará sempre olhando por você, te protegendo ao lado da Deusa da Lua - Zane explicou, a voz cheia de uma certeza.
- E quem é a Deusa da Lua? - Lyra questionou, os olhos violetas inchados de lágrimas.
- É a mãe de todos nós, a criadora - Zane disse.
- Mas mamãe disse que foi Deus quem nos criou - Lyra respondeu, a confusão nublando seus olhos.
Zane notou a confusão em seu rosto. - Vamos conversar melhor sobre isso mais tarde, ok? Agora, eu preciso que você venha comigo.
- Para onde? - Lyra perguntou, agarrando-se mais firmemente ao pescoço dele.
- Se despedir da sua mãe, Lyra - Zane respondeu, a voz cheia de uma ternura que ele nem sabia que possuía.
Ele a pegou no colo, e a sensação de segurança a fez se aninhar ainda mais.
Enquanto caminhavam pelas ruas arborizadas da cidade, Lyra observava tudo com olhos arregalados. Pequenas casas cercadas de árvores davam a impressão de uma cidade mágica. Mais adiante, uma fogueira se erguia, com chamas que dançavam ao vento, e centenas de pessoas reunidas ao redor.
- Quem são todos eles? - Lyra perguntou, intrigada e um pouco assustada pela multidão.
- Eles são família - Zane respondeu.
- Eles são todos da sua família? - Lyra questionou, a mente de criança tentando encaixar as peças.
- Não de sangue, mas de coração. Todos nós somos uma família aqui - explicou Zane.
Quando chegaram ao centro, Lyra viu que o corpo da mãe estava cuidadosamente colocado sobre uma plataforma de madeira. Ela estava vestindo um vestido diferente, um vestido branco. Os olhos de Lyra se encheram de lágrimas novamente. Sua mãe parecia que estava dormindo, mas ela sabia que não estava.
Lyra, com a mãozinha trêmula, tocou o rosto frio da mãe.
- Adeus, mamãe. Eu te amo - ela sussurrou, a voz quebrada.
Ela se afastou e se aninhou no peito protetor de Zane. Zane pediu à Deusa da Lua para acolher a mãe de Lyra de braços abertos. Então, um homem que ela nunca tinha visto antes colocou fogo no corpo de sua mãe.
O fogo começou a se espalhar, a fumaça subindo ao céu. O cheiro de queimado embrulhou o estômago de Lyra, e ela colocou a mão no nariz para se proteger. Ela se aninhou mais fundo no peito de Zane, que a apertou com mais força.Ela viu pedacinhos de fogo subindo ao céu, e, lá longe, uma estrela brilhou forte. Lyra soube, com a certeza inocente de uma criança, que era sua mãe, brilhando só para ela.