O poder que ele irradiava não havia mudado, mas a emoção que antes ele transmitia a Ana havia desaparecido, substituída por uma sombra de incerteza que a paralisava.
Um leve movimento na mesa a trouxe de volta ao presente. Era um dos executivos sentados perto de Lucas, que a olhava com um sorriso educado, embora um tanto forçado. Provavelmente, ele a reconheceu. Todos pareciam saber que Ana era alguém "do passado" para o CEO, alguém que havia sido importante antes que as rodas do destino as separassem.
- Posso ajudá-los com algo? - perguntou Ana, tentando soar o mais profissional possível, embora sua voz denunciasse certa tensão. Ninguém respondeu de imediato, e um segundo depois, Lucas levantou os olhos e a observou com uma frieza que a fez sentir ainda mais desconfortável.
A reunião estava começando, ou ao menos foi o que Ana pensou inicialmente, mas quando Lucas abriu a boca para dar seu primeiro comentário, algo inesperado aconteceu.
- Bem-vinda, Ana. Que prazer te ver aqui, finalmente - disse Lucas, com sua voz firme, mas sem um pingo de calor. Era estranho. Apesar de suas palavras, não havia afeto algum em seu olhar. Não era o Lucas que ela conhecia, aquele que costumava sorrir para ela com o olhar.
Ana assentiu com um sorriso pequeno, sem saber como responder a suas palavras. Decidiu não dar muita importância aos seus comentários; seu papel ali não era reviver o passado, mas demonstrar o que ela poderia agregar à empresa. Afinal, Lucas havia sido o que escolheu a distância, e ela não poderia se permitir sucumbir aos sentimentos antigos agora.
- Obrigada, Lucas. Espero poder contribuir com minha experiência - respondeu, mantendo o tom profissional.
Mas o ambiente na sala de reuniões se sentia diferente. Tudo estava muito organizado, meticulosamente planejado, como se alguém tivesse disposto cada detalhe para que tudo transcorresse de forma impecável. Na verdade, algo não estava certo. Ana não conseguia deixar de notar que os olhos dos outros executivos estavam focados nela, observando-a com um brilho curioso e expectante, como se soubessem algo que ela não.
Ela se sentou em uma das cadeiras vazias ao redor da mesa, e, embora tentasse se concentrar no conteúdo da reunião, seus pensamentos continuavam voltando para Lucas. Perguntava-se se ele a olhava daquela forma porque realmente não se importava ou se, talvez, havia algo mais por trás daquela frieza aparente. O que havia acontecido nesses anos? Como ele havia mudado tanto? Por que ela não havia descoberto isso antes?
A reunião continuou com apresentações e detalhes operacionais sobre os novos investimentos da empresa, o crescimento dos projetos em andamento e as possíveis colaborações futuras. No entanto, em vez de ouvir atentamente, Ana sentia como se um véu invisível tivesse caído sobre ela. Sua mente continuava divagando, perguntando-se como Lucas havia chegado ali, a esse lugar onde ela jamais o imaginara.
Quando chegou o momento de uma nova apresentação no projetor, Ana desviou o olhar para a tela. A próxima diapositiva mostrava as estatísticas de desempenho da empresa, algo rotineiro para os executivos já acostumados com esse tipo de gráfico, mas quando seus olhos se focaram nas cifras, algo fez com que ela parasse. No canto superior esquerdo da diapositiva, quase imperceptível, havia uma sequência de números pequenos, como uma nota de rodapé, com um código que parecia um número de conta. A curiosidade tomou conta dela.
Ana inclinou discretamente a cabeça, tentando entender o que significava aquela pequena sequência de números. Era tão irrelevante à primeira vista que ninguém mais na sala pareceu notar, mas ela não conseguia desviar o olhar. Em sua mente, a imagem foi se formando lentamente: um número de conta bancária. Por que colocariam isso em uma apresentação? E, mais importante, por que estava relacionado a Lucas? Um suor frio começou a percorrer sua espinha.
Enquanto Lucas falava sobre os investimentos, Ana se concentrou no gráfico, mas seus pensamentos estavam em outra direção. Aquela sequência de números não podia ser apenas uma coincidência. Algo não estava certo. Havia um padrão por trás de tudo aquilo, e o que parecia ser um simples número sem importância estava começando a ter um significado muito mais profundo, algo que desafiava sua compreensão.
Não era apenas um número de conta. Era uma conta vinculada a uma série de transações suspeitas, transações que não envolviam apenas a empresa, mas alguém com um poder significativo dentro dela. Ana não conseguia acreditar no que estava vendo. Será que Lucas estava envolvido em algo maior? Será que ele tinha mudado tanto, tanto que agora manipulava a empresa para seu próprio benefício? A verdade parecia inalcançável, mas agora algo se movia dentro dela, uma necessidade urgente de entender o que realmente estava acontecendo.
Enquanto Lucas seguia falando sobre os novos planos de expansão, Ana levantou-se discretamente de sua cadeira. Precisava de um momento para pensar, para processar o que havia descoberto. Pediu desculpas brevemente, alegando que precisava revisar alguns documentos importantes, e saiu da sala de reuniões sem que ninguém dissesse nada.
Foi em direção à sua mesa no andar onde trabalhava. Suas mãos tremiam ligeiramente ao abrir o computador portátil, procurando o documento da apresentação. A diapositiva havia sido digital, então ela a encontrou facilmente no sistema. Vasculhou os arquivos até que encontrou a mesma diapositiva, a mesma apresentação.
Mas desta vez, Ana ampliou a imagem, focando-se no código da conta bancária. Anotou rapidamente os números em um pedaço de papel. Seus dedos se moviam rapidamente, mas sua mente estava a mil por hora. Sabia que precisava descobrir a quem aquela conta pertencia. Não podia deixar que fosse apenas uma coincidência. A informação estava ali, à vista de todos, mas nem todos conseguiam ver o que ela havia descoberto.
À medida que Ana começava a digitar o número no motor de busca de seu computador, um golpe de adrenalina percorreu seu corpo. Se ela estivesse certa, o que tinha encontrado poderia mudar tudo o que pensava saber sobre Lucas, sobre a empresa, e talvez, sobre si mesma.
A tela do computador piscou algumas vezes antes de o resultado de sua pesquisa aparecer. Os olhos de Ana se alargaram com incredulidade. O número da conta estava vinculado a uma fundação beneficente, mas não era uma fundação qualquer. Era uma fundação registrada em um paraíso fiscal, vinculada a uma série de empresas fantasmas nas quais vários executivos de alto nível da empresa estavam envolvidos. E o que mais a surpreendeu foi descobrir que essa mesma fundação estava sendo usada como fachada para uma série de investimentos pessoais que Lucas havia feito em várias indústrias.
Ana ficou ali, olhando para a tela, sem saber se deveria se sentir aliviada por ter descoberto a verdade ou aterrorizada pelas implicações que isso teria. A fachada impecável de Lucas Ortega, o homem que ela havia deixado para trás, já não era tão clara quanto antes. A distância emocional que ele havia colocado entre eles parecia ser apenas um reflexo de uma distância muito maior, uma distância de poder, dinheiro e segredos obscuros.
Sabia que aquilo era só a ponta do iceberg. O que ela acabara de descobrir poderia ser muito maior do que imaginara. E o pior de tudo era que agora ela se via presa em uma rede de segredos que não envolvia apenas Lucas, mas toda a empresa. O caminho à frente não seria fácil, e Ana sabia que estava prestes a tomar decisões que poderiam mudar tudo.
O retorno à cidade, a esta empresa, não era apenas para avançar em sua carreira. Agora, ela tinha uma missão: descobrir o que mais estava escondido, e qual seria seu papel em tudo isso.