Ela silencia por um segundo. Ao fundo, escuto uma voz masculina e risinhos abafados.
"Para... não... devolve meu sutiã!" - ouço, revirando os olhos diante da cena que consigo imaginar.
- Claire? Ainda tá aí? - pergunta, ofegante.
- Não saí da linha nem por um segundo - respondo, brincando. - Estava me divertindo.
Ela ri, sem vergonha alguma.
- Então... Will me falou que a prima dele trabalha numa empresa no Centro. É grande, bem conceituada. Estão contratando para vários setores. Tem uma vaga urgente. Acho que seria uma boa você tentar.
O silêncio domina a linha por alguns segundos.
- Claire?
- Quem é Will? - pergunto, arqueando a sobrancelha mesmo sem ninguém para ver.
Ela solta uma risada.
- Will é o meu inv... é... o cara com quem estou saindo. Eu acho.
- Ele não sabe que é um investimento? - digo, com ironia na voz.
- Cala a boca! - rebate, rindo.
Consigo imaginar o rosto dela ficando vermelho e acabo rindo junto.
- Como eu dizia... acho que vale a pena tentar. Mas o currículo precisa ser entregue pessoalmente no RH, até às onze da manhã de amanhã.
- Amanhã? E... por que pessoalmente? - pergunto.
- Não sei. Cada empresa tem suas burocracias.
- Então vou te mandar o endereço. Acorda cedo, coloca uma roupa nem muito social, nem muito casual. Uma maquiagem leve. É só entregar o currículo, não é entrevista formal. - Ela fala como se fosse minha consultora de imagem.
- Tudo bem - respondo, sem muita convicção. - Estarei lá.
- Ótimo! E eu não volto pra casa hoje.
- Quer que eu envie seus pertences? - pergunto num tom fingidamente sério.
- Não seja ridícula! Agora, se me der licença, vou voltar aos meus negócios - diz, rindo maliciosamente.
Alguns segundos de silêncio.
- Sério, Claire... essa pode ser uma boa chance pra você.
O tom brincalhão dela some por um instante, e percebo: ela está realmente torcendo por mim.
- Tudo bem. Boa noite, Amber.
- Boa noite, Claire.
Desligo o telefone. Me espreguiço no sofá, alongando o pescoço tenso. Caminho pelo corredor estreito até o quarto.
Olho a tela do celular: vinte e duas horas.
- Como o tempo passou rápido... - murmuro, sentindo um aperto no peito.
O tempo sempre corre mais depressa quando o amanhã carrega alguma expectativa.
Abro o guarda-roupa e passo os olhos pelas opções.
Pego uma blusa social preta de botões, mangas três quartos. Uma calça jeans de lavagem escura. Cinto de couro preto. Preciso de um casaco - o clima está esfriando. Os sapatos? Decido amanhã.
Sigo até a escrivaninha, abro a gaveta e tiro a pasta com meus documentos e currículos impressos. Deixo tudo separado sobre a mesa.
Um sentimento conhecido começa a crescer no estômago.
Ansiedade.
Meu coração acelera. As mãos suam.
Respira, Claire.
Um. Dois. Três. Quatro. Cinco. Só respira.
Luto contra os pensamentos que tentam me dominar: a preocupação antecipada, o medo de falhar, a sensação de não ser boa o suficiente.
- Você só vai entregar um currículo, Claire. Não há o que temer. Se não conseguir esse emprego, virá outro melhor. - sussurro para mim mesma.
Só respira, Clarissa. Vai dar tudo certo.
Depois de lutar por longos minutos para vencer a batalha silenciosa, começo a me preparar para dormir. Já passa das onze.
Coloco o despertador para 7h30. Me arrasto até a cama, me enrolo no cobertor e me aconchego no travesseiro.
Fico encarando o teto.
Mesmo depois do esforço para me acalmar, ainda há um peso no peito. Uma inquietação. Um medo... Como se essa fosse minha última chance. Como se, se eu falhar agora, nada mais vá dar certo.
Eu sei que sou jovem. Mas, às vezes... me comparo.
Com outras pessoas.
Com gente da minha idade.
Com quem estudou comigo.
Com a Amber.
Não, eu não tenho inveja dela.
Sou grata por tê-la na minha vida.
Mas, às vezes, olho pra ela e desejo ter um pouco da facilidade que ela tem.
De conseguir o que quer.
De se prender. De se desprender.
Ela saiu da faculdade direto para um emprego. Tudo meio que... se encaixou.
Não que ela não tenha lutado. Lógico que sim. Ralamos muito durante o curso.
Mas depois... os caminhos se dividiram.
E a estrada dela parecia pavimentada, enquanto a minha ainda era de terra batida.
E ela nunca está sozinha.
Somos diferentes.
Ela se apaixona e desapaixona na mesma velocidade.
Beija quem quer. Vive intensamente.
Eu?
Sou mais contida. Preciso de sentimento.
Não deixo qualquer um se aproximar. Não consigo.
Eu sei que me cobrar assim é injusto.
Mas é difícil evitar esses pensamentos quando cada tentativa parece mais um fracasso.
Balanço a cabeça, tentando expulsar a negatividade.
Não é hora pra isso.
Volto a encarar o teto.
Inicio meus exercícios de respiração.
Depois de alguns minutos...
- Vai dar tudo certo... - repito em voz baixa, como se essas palavras pudessem me abraçar.
E então, adormeço.