Noventa e Nove Cartas, Mil Mentiras
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Capítulo 5

Ponto de Vista de Aubrey Burris:

As luzes brilhantes do salão de gala queimavam meus olhos. Cada flash de câmera parecia uma agressão física. Minha cabeça latejava. O mundo girava em uma névoa. Mas mantive os dentes cerrados. Minha espinha rígida. A mão do Cadu, um peso sufocante, repousava na base das minhas costas. Forçando-me para frente.

"Sorria, Aubrey", ele murmurou, sua voz uma ameaça sedosa contra meu ouvido. "Você é uma Sampaio. Você tem uma reputação a zelar."

Meu corpo se movia por conta própria. Uma marionete em suas cordas. Vestida com um vestido cintilante que não escolhi. Meu cabelo penteado em um coque intrincado que eu não queria. A esposa troféu perfeita.

Do outro lado do salão, Kennedy brilhava. Seu vestido era de grife. Seu sorriso, brilhante e predatório. Ela se movia pela multidão como uma rainha. Cercada por jornalistas bajuladores e titãs da indústria. Ela encontrou meu olhar. Um lampejo de triunfo. Um sorriso presunçoso e conhecedor. Ela estava aqui. Presente. Inegavelmente real. Enquanto eu me sentia como um fantasma.

Um silêncio caiu sobre o salão. Cadu deu um passo à frente. Pigarreando. Ele bateu em um microfone. O tilintar ecoou pelo salão opulento.

"Senhoras e senhores", ele começou. Sua voz suave. Confiante. "Esta noite marca um novo capítulo. Para minha empresa. Para nosso futuro. E para minha família."

Ele fez uma pausa. Seu olhar varrendo a multidão. Então, brevemente, para mim. Meu coração martelou. Que nova humilhação me aguardava?

"Vocês devem ter notado", ele continuou, um sorriso sutil brincando em seus lábios, "uma certa... marca na minha linda esposa, Aubrey." Ele gesticulou vagamente em direção ao meu pescoço. Minha mão instintivamente voou para cima. Cobrindo o chupão vermelho e irritado. O que ele fez na noite passada. Com força brutal. Depois da clínica. Uma marca de sua posse. Uma exibição distorcida de domínio.

As câmeras piscaram. Um murmúrio percorreu a multidão. Minhas bochechas queimaram. Uma onda de vergonha me invadiu. Ele estava me expondo. Publicamente. Para sua própria narrativa distorcida.

"Alguns podem especular", Cadu riu. Um som falso e despreocupado. "Mas deixem-me assegurar. É simplesmente um testemunho da... paixão que compartilhamos. Uma pequena lembrança da nossa celebração de aniversário." Ele piscou para a multidão. Uma performance. Uma mentira grotesca.

Meu estômago se revirou. Um gosto de bile subindo na minha garganta. Eu queria gritar. Rasgar o vestido. Expô-lo como o monstro que ele era. Mas eu estava presa. Sua mão ainda nas minhas costas. Seus olhos, um aviso silencioso.

"E falando em novos começos", Cadu continuou, sua voz ganhando impulso, "esta noite, tenho a distinta honra de apresentar a vocês a força por trás do nosso próximo empreendimento inovador. A mulher que liderará nossa nova divisão de inovação arquitetônica. A visionária. A mente brilhante. A verdadeira herdeira do legado Olsen. Kennedy Patel."

Ele gesticulou para Kennedy. Ela deu um passo à frente. Banhada pelo holofote. Seu sorriso radiante. Seus olhos, fixos nele, cheios de adoração. E triunfo.

"Kennedy liderará nossa nova filial europeia, focando no desenvolvimento urbano sustentável, em parceria com a Corporação Olsen. Uma iniciativa inovadora, impulsionada por seu talento inigualável e sua herança familiar única." Cadu sorriu. Orgulhoso. Possessivo.

Aplausos irromperam. Um som estrondoso que vibrou através dos meus ossos. Jornalistas se aglomeraram. Flashes estouraram. Kennedy se deleitava com isso. Ela era a estrela. A queridinha. A falsa herdeira. E eu era o adereço silencioso e machucado.

Um repórter, ousado e atrevido, abriu caminho pela multidão. Enfiando um microfone na minha cara. "Sra. Sampaio! Sobre aquele chupão... é realmente de um aniversário apaixonado? Ou é um pedido de socorro?"

Minha fachada rachou. Apenas por um segundo. Meus olhos encontraram os do repórter. Um lampejo de dor crua. Medo.

O braço do Cadu apertou minha cintura. Puxando-me para mais perto. "Minha esposa está simplesmente sobrecarregada esta noite", ele disse. Sua voz suave. Controlada. "Ela sempre foi uma pessoa reservada. Mas sim. Foi um aniversário muito apaixonado. E pretendo mantê-la muito, muito feliz." Ele apertou minha cintura. Um aviso. Uma promessa.

Então, antes que o repórter pudesse fazer outra pergunta, ele se inclinou. Seus lábios roçando meu ouvido. "Não me decepcione, Aubrey." Sua voz era um sussurro frio. "Lembre-se da Joana."

As palavras eram uma coleira em volta do meu pescoço. Puxando-me de volta da beira do abismo. Forcei um sorriso. Um gesto frágil e sem sentido. Meu corpo parecia entorpecido. Minha mente se retirou para um lugar seguro e escuro. A dor era demais. A humilhação, profunda demais. Eu não era nada além de um adereço. Uma mentira viva e respirante.

A mídia, é claro, engoliu tudo. "A demonstração apaixonada de Cadu Sampaio por sua esposa na gala!" "Aubrey Sampaio: Machucada, mas linda!" Eles glorificaram sua possessividade. Romantizaram minha dor. Era uma doença.

Mais tarde naquela noite, Cadu estava em outra festa. Brindando ao sucesso da Kennedy. Enquanto eu estava sentada sozinha na suíte opulenta. Ele havia deixado uma pequena caixa de veludo na penteadeira. Dentro, um colar de diamantes. Um suborno. Uma oferta de paz. Outro símbolo de seu controle.

"Você é uma boa menina, Aubrey", ele disse mais cedo, sua mão demorando na minha bochecha. "Coopere, e não lhe faltará nada."

Observei meu reflexo no espelho. Meus olhos, sombreados e assombrados, me encaravam de volta. Eu não era uma boa menina. Eu era uma prisioneira. Mas o fogo ainda estava lá. Uma pequena e bruxuleante brasa de desafio. Eu não quereria nada. Eu quereria tudo que ele havia roubado.

No dia seguinte, encontrei a Joana. Ela parecia frágil. Pálida. Mas seus olhos ainda continham aquela centelha feroz. Nos encontramos em um café tranquilo. Longe de olhares curiosos.

"Sinto muito, Aubrey", Joana sussurrou. Sua voz embargada de vergonha. "Ele me ameaçou. E então... as fotos. Em todos os lugares. Senti-me tão exposta. Tão violada."

"Eu sei, Joana", eu disse. Minha mão alcançando a dela sobre a mesa. Apertando-a. "Sinto muito. Eu deveria ter te protegido melhor."

"Não!" ela insistiu. "Não é sua culpa. É dele. Ele é um monstro. E a Kennedy... ela é uma víbora." Seus olhos se estreitaram. "Mas o que você vai fazer? Você não pode simplesmente deixá-lo sair impune."

"Não vou", eu disse. Minha voz baixa. Firme. Olhei diretamente nos olhos dela. "Estou indo embora. Em breve. E vou expor tudo. A fraude do casamento. O roubo de identidade. Tudo."

O queixo da Joana caiu. Seus olhos arregalados de choque. "Aubrey! Você está falando sério? Mas... como? Ele vai te arruinar!"

"Ele já tentou", respondi. Um sorriso amargo tocando meus lábios. "Mas ele não conseguiu. Ainda não. Estou aceitando o emprego na filial europeia da Corporação Olsen. Minha família de verdade. E vou até eles com tudo."

Joana me encarou. Então, lentamente, um sorriso se espalhou por seu rosto. Um sorriso feroz e predatório. "Meu Deus, Aubrey. Você é um gênio. Uma guerreira." Ela apertou minha mão. Com força. "Estou com você. O que você precisar. Custe o que custar."

Uma onda de profundo alívio me invadiu. A lealdade inabalável da Joana era uma tábua de salvação. Um farol na escuridão. Sua crença em mim era o combustível que eu precisava.

Deixei a Joana. Sentindo um renovado senso de propósito. Uma resolução fria e dura se instalou no fundo do meu ser. Voltei para a casa. Para a prisão que ele construiu para mim. E comecei a embalar o resto das minhas coisas.

Quando estava prestes a sair do quarto, senti uma dor aguda. Um solavanco repentino. Tropecei. Minha cabeça bateu no batente da porta. Estrelas explodiram atrás dos meus olhos. Caí no chão. Minha visão embaçou.

Kennedy. Ela estava lá. Um sorriso perverso no rosto. Uma escultura pesada na mão. Uma das peças novas e minimalistas.

"Ops", ela arrulhou. Sua voz pingando falsa preocupação. "Tão desajeitada, Aubrey. Você está bem?"

Minha cabeça latejava. Sangue escorria pela minha têmpora. Minha visão nadava. O rosto da Kennedy, distorcido pela dor, sorria para mim.

Então, uma reviravolta súbita e horrível. Outra figura. Um homem de terno escuro. Ele agarrou a Kennedy. Empurrando-a rudemente contra a parede.

"Que porra foi essa, Kennedy?!" Sua voz era baixa. Furiosa. Não era o Cadu.

"Ela estava tentando me machucar!" Kennedy gritou. Sua voz tremendo de medo falso. "Ela tentou me atacar!"

Minha cabeça estava girando. O homem a ignorou. Ele se ajoelhou ao meu lado. Seu rosto, gravado com preocupação, era um borrão.

"Você está bem, senhora?" ele perguntou. Sua voz profunda. Urgente.

Tentei falar. Mas apenas um suspiro engasgado escapou.

Então, ouvi a voz frenética do Cadu do andar de baixo. "Kennedy? O que está acontecendo aí em cima?"

O homem olhou para cima. Seus olhos, duros e frios, encontraram os da Kennedy. Ela ainda estava pressionada contra a parede. Um olhar de puro terror em seu rosto.

Ele pegou um pequeno dispositivo. Falou rapidamente nele. Em uma língua que eu não entendi.

Cadu correu para o quarto. Seus olhos captando a cena. Eu, sangrando no chão. Kennedy, parecendo aterrorizada. O homem estranho.

"O que aconteceu?!" Cadu exigiu. Seus olhos fixos na Kennedy. "Você está bem, meu amor?"

Ele nem sequer olhou para mim. Nenhuma vez. Nem mesmo enquanto eu estava ali. Sangrando. Meu coração, o que restava dele, se solidificou em um bloco de gelo. Ele só se importava com ela. Sempre com ela.

O homem me ajudou gentilmente a sentar. Seu toque firme, mas cuidadoso. Ele pegou um lenço limpo. Pressionou-o na minha têmpora sangrando.

O quarto era um borrão de rostos. Olhos curiosos. Sussurros. O público. Reunindo-se como abutres. Minha humilhação estava completa.

"Estou bem", murmurei. Minha voz fraca. "Apenas desajeitada." As palavras eram uma mentira amarga. Mas eu não lhe daria a satisfação. Eu não daria a ela a satisfação.

Joana. Minha melhor amiga. Abriu caminho pela multidão. Seu rosto uma máscara de horror. "Aubrey! Meu Deus!" Ela correu para o meu lado. Seus braços me envolvendo. Sua presença, um calor no frio desolador.

"O que aconteceu?" Joana exigiu. Seus olhos ardendo. Ela olhou para a Kennedy. Depois para o Cadu. "Foi ela que fez isso?"

Balancei a cabeça. Uma negação silenciosa. Não pelo Cadu. Não pela Kennedy. Mas por mim mesma. Eu não permitiria que eles vissem minha dor. Não mais.

"Preciso de um médico", eu disse. Minha voz mais forte agora. "Apenas... me leve a um médico."

Mais tarde, de volta ao meu quarto, após a visita ao pronto-socorro e alguns pontos, eu o encontrei. O laptop dele. Aberto na mesa de cabeceira. Ele deve tê-lo esquecido no caos. Meus dedos, ainda trêmulos, pairaram sobre o teclado. Uma curiosidade sombria. Uma necessidade desesperada de saber.

Cliquei no e-mail dele. Uma mensagem recente. De um remetente desconhecido. O assunto dizia: "Herdeira Olsen - Detalhes Finais."

Minha respiração falhou. A tela brilhou. Revelando a verdade chocante.

            
            

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