Meu corpo parecia pesado. Minha cabeça latejava. O sedativo que Cadu me forçou na clínica ainda se agarrava ao meu sistema como uma mortalha sufocante. Meus membros eram de chumbo. Meus pensamentos, lentos. Tentei me afastar da mulher inconsciente, mas meus músculos se recusaram a obedecer. Eu estava presa. Forçada a este quadro grotesco.
Uma esperança desesperada e irracional piscou. Cadu. Ele não poderia estar ciente disso. Ele não poderia ser tão cruel. Tão monstruoso. Ele viria. Ele pararia isso. Ele me salvaria. Minha mente, agarrando-se ao fantasma do homem que um dia amei, me traiu com essa esperança tola.
Então, um pensamento arrepiante. Meu celular. Minha tábua de salvação para a Dra. Thorne. Para a Joana. Para o resgate. Tateei meus bolsos. Vazios. Eles haviam levado tudo. Deixando-me totalmente isolada. Totalmente indefesa.
O pânico, frio e agudo, arranhou minha garganta. Era diferente do desespero esmagador. Isso era primal. O medo cru de estar completamente à mercê de outra pessoa. Senti-me como um animal pego em uma armadilha.
Meus olhos varreram a sala. Desesperados. Meu olhar caiu sobre uma pequena e ornamentada caixa de música em uma mesa próxima. Antiga. Fora de lugar nesta sala moderna e opulenta. Talvez... apenas talvez.
Com uma onda de força emprestada, lancei-me em direção a ela. Meus dedos se atrapalharam. A tampa rangeu ao abrir. Dentro, aninhado em veludo, havia um discreto e antigo celular de flip. Não inteligente. Não rastreável. Mas um celular. Um sussurro de esperança.
Eu o peguei. Meus dedos, desajeitados de medo, discaram o número do Cadu. Minha respiração falhou. Ele sequer atenderia? Ele se importaria?
Chamou. Uma vez. Duas. Então, uma voz arrastada e irritada. "Quem diabos é?"
Era o Cadu. Bêbado. E irritado.
"Cadu, é a Aubrey!" ofeguei. Minha voz tensa. "Você tem que me ajudar! Estou na festa. Em uma sala privada. Há uma mulher inconsciente aqui. E alguém está tirando fotos!"
Uma risada áspera e zombeteira. "Aubrey? Do que você está falando? Você deveria estar no escritório. Sendo uma boa menina. E eu estou na festa. Com a Kennedy. Me casando." Sua voz estava embargada de álcool. "Pare de inventar histórias."
"Não, Cadu, me escute!" implorei. O desespero arranhando minha garganta. "Não estou no escritório! Eles me trouxeram aqui! Isso é uma armação! Você precisa vir! Agora!"
"Uma armação?" ele zombou. "Sempre a rainha do drama, não é? O que, outra de suas amiguinhas tentando chamar a atenção? É a Kennedy de novo? Por que você é sempre tão obcecada por ela, Aubrey?" Sua voz adquiriu um tom cruel. "E quem se importa com alguma mulher inconsciente? Provavelmente apenas um dos antigos casos da Kennedy. Ela é rodada, sabe. Antes de eu a domar."
Meu sangue gelou. Ele não conseguia nem compreender o perigo. Sua mente estava muito nublada pelo álcool. E pela Kennedy.
"Cadu, não é a Kennedy!" eu gritei. "Isso é sério! Não sei quem é essa mulher, mas ela está drogada! E eles estão me armando! Você tem que acreditar em mim!"
"Acreditar em você?" ele zombou. "Você? A mulher que mentiu sobre sua advogada? A mulher que tentou roubar a herança da Kennedy? Você acha que vou acreditar em você, Aubrey?" Sua voz estava carregada de desprezo. "Você só está com ciúmes. Sempre esteve."
"Não!" gritei no telefone. As lágrimas finalmente vieram. Quentes e amargas. "Você está errado, Cadu! Você está tão errado!"
De repente, ouvi um estrondo do outro lado da linha. Uma maldição abafada. Então silêncio. O celular do Cadu havia caído.
"Cadu? Cadu!" eu gritei. Minha voz rouca. Nenhuma resposta. Apenas o som fraco de música do salão principal.
Então, uma nova voz. Suave. Sedosa. E totalmente arrepiante. "Oh, Aubrey. Ainda se agarrando a ele? Que patético."
Kennedy.
Meu coração despencou. "Kennedy! O que você fez?!"
"O que precisava ser feito", ela ronronou. Sua voz pingando malícia. "Você estava se tornando um incômodo. Uma complicação. E eu não tolero complicações. Não quando estou tão perto de tudo que sempre quis."
"Você fez isso?!" ofeguei. Minha voz tremendo de horror. "Você drogou essa mulher? Você me armou?"
"Claro", ela riu. Um som sombrio e triunfante. "Um pequeno 'acidente'. Você, encontrada com uma mulher inconsciente e drogada. Um escândalo para os tabloides. Uma desculpa perfeita para o Cadu finalmente te largar. E consolidar minha posição. Quem acreditaria em uma mulher desequilibrada e ciumenta como você, Aubrey?"
"O Cadu vai acreditar em mim!" insisti. O desespero se agarrando às minhas palavras. "Quando ele estiver sóbrio, ele vai ver! Ele vai saber quem você realmente é!"
"Oh, doce Aubrey", Kennedy zombou. "Você ainda não entendeu, não é? Ele sabe quem eu sou. Ele sempre soube. Ele me ama por causa disso. Porque eu o impulsiono. Porque sou ambiciosa. Diferente de você. Sempre tão certinha. Tão chata." Sua voz endureceu. "E além disso. Quando ele estiver sóbrio, será tarde demais. Você terá sumido. Perdida. E ninguém nunca vai te encontrar."
"Sumido? O que você quer dizer com sumido?" Um pavor frio envolveu meu coração. "O que você está planejando, Kennedy?"
"Um pequeno acidente trágico", ela sussurrou. Sua voz cheia de um júbilo arrepiante. "Um acidente de carro. Uma queda. Um afogamento. Realmente não importa. Contanto que você desapareça. Permanentemente."
O telefone estalou. A voz do Cadu, distante e abafada, de repente cortou. "Kennedy? Com quem você está falando? O que está acontecendo?"
Kennedy, assustada, derrubou o telefone novamente. "Cadu! Querido! Nada! Apenas... apenas um número errado!" Ela riu. Um som forçado e nervoso. "Está tudo bem, meu amor. Volte para seus convidados."
Então, silêncio. Meu coração martelava contra minhas costelas. Ela ia me matar. Ela ia fazer parecer um acidente. E o Cadu? Ele nunca saberia. Ou não se importaria.
Ouvi a porta ranger ao abrir. Passos. Pesados. Se aproximando. A figura sombria do canto. E outra. Dois homens. Ombros largos. Rostos sombrios.
Meu sangue gelou. Era isso.
Eles me agarraram. Rudemente. Meu corpo fraco ofereceu pouca resistência. Eles me puxaram em direção à porta. Então, agarraram a mulher inconsciente. Arrastando sua forma inerte entre eles.
Fomos levados por um corredor dos fundos. Longe da festa. Em direção a uma saída traseira. O ar noturno, frio e úmido, me atingiu como um choque. Uma van preta esperava. Suas portas se abriram. Fomos empurrados para dentro. As portas se fecharam. Escuridão.
A van partiu em alta velocidade. Minha cabeça batia contra o assento duro. A mulher inconsciente jazia ao meu lado. Inerte. Respirando superficialmente.
Lembrei-me das palavras do Cadu. *Você me pertence, Aubrey. Sempre pertenceu.* Ele não queria apenas me controlar. Ele queria me possuir. Me quebrar. Me apagar.
Lembrei-me da minha própria esperança desesperada. *Ele virá. Ele me salvará.* Que ingênua. Ele não viria. Ele estava muito fundo em seu próprio engano. Sua própria obsessão.
A van deu uma guinada. Uma curva súbita e violenta. Então, o cheiro de água salgada. O som das ondas. Uma doca.
As portas se abriram. Eles nos arrastaram para fora. Em direção à beira do píer. A água escura e rodopiante abaixo. Eu podia ouvir o bater das ondas contra os pilares. O ar frio e úmido mordia minha pele.
Era isso. Meu fim.
Eu queria gritar. Lutar. Abrir caminho de volta à vida. Mas meu corpo estava falhando. Minha mente, entorpecida de terror e exaustão, só conseguia registrar a realidade brutal.
Eles me seguraram sobre a beirada. Meus pés balançavam sobre a escuridão tinta. A mulher inconsciente, um peso morto, já estava amarrada a mim. Um ato cruel e final. Um afogamento compartilhado.
Minha vida passou diante dos meus olhos. Não os grandes momentos. Mas os silenciosos. A mão da minha avó. A risada da Joana. A sensação de chuva suave no meu rosto. O cheiro de livros velhos. Uma lágrima escorreu pela minha bochecha. Um adeus silencioso.
Então, um rugido distante. Faróis. Brilhando. Cortando a escuridão. Um carro. Acelerando em direção ao píer.
"Parem!" Uma voz. Profunda. Autoritária.
Os homens congelaram. Eles olharam em direção ao carro. Um SUV preto elegante. Ele derrapou até parar. Figuras emergiram. Altas. Imponentes. Armadas.
Meu coração saltou. Um lampejo de esperança impossível. Quem eram eles?
"Isaac!" um dos homens gritou. "Peguem eles!"
Isaac. O nome ecoou em minha mente. O chefe de segurança da família Olsen. Dra. Thorne. Ela havia agido. Ela os havia enviado.
Uma mão forte agarrou meu braço. Puxando-me de volta da beira do abismo. A mulher inconsciente foi rapidamente desamarrada. Seu corpo inerte cuidadosamente carregado para longe.
Fui puxada para um abraço poderoso. Um peito largo. Um braço musculoso. "Você está segura agora, Aubrey", uma voz profunda murmurou contra meu cabelo. "Guillermo nos enviou. Ele sabe de tudo."
Guillermo Olsen. Meu avô. Minha família de verdade. Eles me encontraram.
Agarrei-me a ele. Meu corpo tremendo. Lágrimas, não mais de desespero, mas de puro alívio, escorreram pelo meu rosto. Eu estava viva. Eu estava salva.
Os homens que tentaram me afogar foram rapidamente subjugados. Algemados. Levados embora.
O homem que me salvou, Isaac, me segurou firme. Sua presença, uma âncora sólida na tempestade furiosa. Ele era mais alto que o Cadu. Mais largo. Seus olhos, escuros e intensos, continham uma proteção feroz.
"Precisamos tirar você daqui", ele disse. Sua voz calma. Aterradora.
Eu assenti. Minha voz havia sumido.
"A outra mulher", consegui coaxar. "Ela está...?"
"Ela vai ficar bem", Isaac me assegurou. "Apenas um sedativo forte. Vamos providenciar atendimento médico para ela."
Voltamos para a casa. A casa do Cadu. Minha casa, por mais um tempo. Isaac e sua equipe se moveram com eficiência silenciosa. Eles recuperaram meus poucos pertences embalados. Levaram o celular quebrado. E o laptop. Todas as provas necessárias para expô-lo.
Andei pela casa uma última vez. Não parecia mais uma prisão. Parecia um palco. Meu ato final. Deixei minha aliança de casamento na mesa de cabeceira do Cadu. Um círculo frio e duro de metal. Um símbolo de um amor que nunca existiu.
Não deixei mais nada. Nenhum vestígio de Aubrey Burris. A mulher que amou Cadu Sampaio. Aquela mulher estava morta. Enterrada fundo sob as mentiras.
Saímos da casa. As luzes da cidade se tornaram um borrão no espelho retrovisor. Eu estava deixando o país. Deixando para trás os pedaços estilhaçados da minha antiga vida. E entrando em uma nova. Como Aubrey Olsen. Herdeira. Sobrevivente. Lutadora.
A família Olsen me recebeu de braços abertos. Uma reunião formal, mas profundamente emocional. Guillermo Olsen, um homem de imenso poder, olhou para mim com lágrimas nos olhos. "Minha neta", ele sussurrou. "Finalmente te encontramos."
Passei por extensos exames médicos. Sessões de terapia. Treinamento físico. Isaac, sempre presente, tornou-se minha sombra. Meu confidente. Meu protetor. Ele me ensinou autodefesa. Como rastrear. Como lutar. Como sobreviver.
Meu corpo se curou. Minha mente endureceu. A dormência começou a recuar. Substituída por uma determinação feroz e inflexível. Cadu e Kennedy tentaram me apagar. Roubar minha vida. Me enterrar. Mas eles apenas despertaram uma fera.
Eu voltaria. Não como Aubrey Burris, a esposa injustiçada. Mas como Aubrey Olsen. A verdadeira herdeira. E eu desmantelaria suas vidas. Pedaço por pedaço doloroso. Eles pensaram que tinham vencido. Eles não faziam ideia da tempestade que haviam desencadeado.