Passei por eles, meu corpo se movendo no piloto automático, e fechei a porta do quarto atrás de mim. Eu só precisava deitar, escapar da realidade sufocante da minha vida. Minha mente, no entanto, se recusava a ser silenciada, repassando as palavras cortantes de Caio, o desdém cruel de Cristiano.
Uma batida. Então, a porta se abriu rangendo. Era Karina. Ela estava parada na soleira, um sorriso presunçoso brincando em seus lábios, seus olhos brilhando com um triunfo malicioso. "Já dormindo, Juliana? Que esposa você é." Sua voz era um ronronar baixo, feito para provocar.
"O que você quer, Karina?", perguntei, minha voz plana, desprovida de emoção. Eu estava além da raiva, além do medo.
Ela deslizou para dentro do quarto, seu olhar varrendo o espaço como se já fosse dela. "Só vim ver como você está. O Cristiano está preocupado, sabe. Ele realmente se importa com a reputação dele. Ele disse que você estava tentando fazê-lo parecer mau." Ela riu, um som frágil e zombeteiro. "Mas, de novo, você sempre fez isso."
"A reputação do Cristiano?", ecoei, uma risada amarga escapando de mim. "É assim que você chama? Ou é a necessidade patética dele de ter duas mulheres orbitando ao seu redor, uma para mostrar e outra para o prazer?" Eu a observei, uma estranha sensação de desapego me invadindo. "Você pode ficar com ele, Karina. Você já o tem. E o Caio também, ao que parece. Você roubou com sucesso toda a minha família."
Seu rosto se contraiu, a presunção substituída por um lampejo de irritação. "Não se atreva a falar do Caio assim. Ele me ama. Ele me escolheu. Ele me vê como sua mãe agora." Seus olhos se estreitaram. "E o Cristiano? Ele sempre me quis. Você foi apenas... conveniente." Ela deu mais um passo, sua voz baixando para um sussurro venenoso. "Eles são meus agora, Juliana. Todos eles. Não há mais nada para você aqui."
Fechei os olhos, uma onda de exaustão me invadindo. "Então saia", eu disse, minha voz quase inaudível. "Apenas me deixe em paz." Eu não queria mais lutar. Eu só queria que tudo acabasse.
"Ah, eu não vou a lugar nenhum", ela ronronou. "Mas você vai." Ela tirou um objeto pequeno e afiado do bolso. Um pequeno e ornamentado abridor de cartas. E então, em um movimento rápido e repugnante, ela o arrastou por seu próprio antebraço. Uma fina linha vermelha surgiu, brilhante contra sua pele pálida. Seus olhos, fixos em mim, brilhavam com pura malícia.
"Que porra é essa?", eu encarei, estupefata, sua ferida autoinfligida.
Antes que eu pudesse processar o que ela estava fazendo, ela soltou um grito agudo. "Juliana! O que você está fazendo?!" Sua voz estava cheia de um terror teatral.
Passos pesados ecoaram pelo corredor. "Karina!", a voz em pânico de Cristiano.
A porta se abriu com um estrondo. Cristiano estava lá, Caio ao seu lado, ambos com os rostos marcados pelo alarme. Karina desabou no chão, segurando o braço sangrando, seus olhos fixos em mim com um olhar de acusação aterrorizada. "Ela... ela me atacou! Ela tentou me machucar com isso!" Ela apontou para o abridor de cartas, agora inocentemente ao seu lado.
"Juliana!", Cristiano rugiu, seu rosto contorcido de raiva. Ele viu o corte, o sangue, e sua mente imediatamente preencheu as lacunas. Seus olhos, geralmente tão calculistas, estavam nublados por uma fúria cega alimentada pela performance de Karina.
Ele se lançou sobre mim, sua mão atingindo meu rosto com uma força brutal. O impacto me jogou para trás, minha cabeça batendo na parede com um baque surdo. A dor explodiu atrás dos meus olhos, um caleidoscópio de luz ofuscante e escuridão esmagadora. Meu corpo, já fraco, desabou no chão.
"Como você pôde, mãe?", Caio chorou, sua pequena voz cheia de traição. Ele correu para Karina, seus braços envolvendo-a protetoramente. "Ela está machucada, pai! A mamãe fez isso!" Seu rosto estava manchado de lágrimas, lágrimas por Karina, não por mim.
Minha cabeça girava. A dor latejante no meu abdômen se intensificou, espelhando a dor no meu coração. Olhei para Caio, seu rosto torcido de ódio, e depois para Cristiano, sua mão ainda levantada, seus olhos desprovidos de qualquer humanidade.
"Ela é louca, pai!", Caio gritou, apontando para mim. "Ela sempre foi louca! Apenas se divorcie dela de uma vez! A Karina deveria ser minha mãe!" Suas palavras, afiadas e deliberadas, foram projetadas para infligir a dor máxima. "Você é gorda. Você é feia. A Karina é bonita e sempre brinca comigo!" A referência ao meu corpo, às estrias de carregá-lo, pareceu uma profanação final.
Cristiano assentiu, seu rosto sombrio. "Ele está certo. Você é um monstro, Juliana." Ele me olhou com puro nojo. "Saia da minha casa. Agora."
Mas naquele momento, enquanto as acusações choviam sobre mim, algo mudou. A dor, a humilhação, a exaustão - tudo se fundiu em uma clareza profunda e arrepiante. Eles estavam certos. Eu tinha acabado. Acabado com essa farsa, acabado com essa família, acabado com esta vida. Meu coração, verdadeiramente, havia morrido. O entorpecimento que eu sentira antes se solidificou em uma determinação inabalável.
Eu me levantei, lenta e dolorosamente. Meu rosto latejava, um fio quente de sangue escorria do meu nariz. "Tudo bem", eu grasnei, minha voz quase inaudível. "Divorcie-se de mim. Cansei de lutar."
Cristiano zombou. "Você acha que é tão fácil? Acha que vou simplesmente deixar você ir embora depois dessa palhaçada? Falaremos sobre divórcio quando eu estiver bem e pronto. E quando eu estiver, você vai se arrepender de cada momento que passou sob o meu teto." Ele agarrou o braço de Karina, levantando-a. "Vamos, Karina. Vamos te levar a um médico." Ele a conduziu para fora, seu braço protetoramente ao redor dela, Caio seguindo atrás, sua pequena mão agarrada à saia de Karina.
Eu os vi partir, um retrato de família da minha ruína. Minha mão instintivamente foi para o meu baixo-ventre, traçando a cicatriz tênue. A vida que foi, a vida que poderia ter sido. Tudo se foi. Tudo.