Heitor e eu, namorados de colégio, construímos nossas vidas inteiras um ao redor do outro. Nosso amor era a base da minha existência, uma corrente profunda e inabalável que nos carregou pela adolescência, faculdade e vida adulta. Quinze anos. Uma vida inteira, parecia. Como uma conexão tão profunda pôde ser estilhaçada, tão facilmente, por Kiera Matos, uma mulher que entrou em sua órbita como um satélite perdido?
Os sinais foram sutis no início, facilmente ignorados. Heitor, o empreendedor de tecnologia sempre motivado, começou a trabalhar mais horas. Ele chegava em casa tarde, com um cheiro fraco de algo desconhecido, que não era do seu escritório, nem meu. Quando minhas amigas, meio brincando, perguntaram se eu estava preocupada com ele tendo um caso, eu ri.
"Um caso?" eu disse, com um encolher de ombros casual. "Com o Heitor? Nunca. E se ele fizesse, se ele se 'sujasse', eu simplesmente o deixaria. Simples assim."
Ah, como aquela Audra mais jovem era ingênua. Eu superestimei sua lealdade, convencida de que nossa história era um escudo impenetrável. Mas, mais devastadoramente, eu subestimei profundamente a profundidade aterrorizante do meu próprio amor por ele. Um amor tão absoluto que se tornaria minha ruína. Dizem que quem ama demais, recebe o carma. Meu carma, ao que parecia, chegou com uma precisão implacável.
A verdade, quando veio, foi como um golpe físico. Foi em uma pequena reunião com amigos em comum. Um deles, depois de algumas bebidas a mais, deixou escapar: "O Heitor realmente gastou uma fortuna na abertura da galeria da Kiera, não foi? Aquela escultura sozinha deve ter custado uma grana." As palavras pairaram no ar, um silêncio súbito e ensurdecedor caindo sobre a mesa. Todos olharam para mim, depois rapidamente desviaram o olhar. Os olhares de cumplicidade, o constrangimento imediato - confirmou tudo o que meu instinto vinha gritando.
Foi no mesmo dia. Naquela mesma manhã, na verdade, eu segurava o teste de gravidez positivo na mão, meu coração explodindo com uma alegria que eu nunca conhecera. Eu havia planejado um jantar surpresa, um anúncio sussurrado, um futuro se desdobrando diante de nós. Em vez disso, soube de sua traição. A agonia requintada daquela dupla revelação - a maior alegria e a dor mais profunda colidindo em um único momento brutal - me deixou em pedaços.
Eu o confrontei, não com a dignidade silenciosa que imaginei para mim, mas como uma megera desesperada e de coração partido. Gritei, chorei, exigi saber cada detalhe sórdido. Ele olhou para mim, seus olhos frios, e então se colocou na frente de Kiera, protegendo-a como se ela fosse a vítima. Ele realmente me repreendeu, bem ali, na frente dela.
Kiera, com facilidade praticada, ofereceu um pedido de desculpas trêmulo. "Ah, Audra, sinto muito. É tudo culpa minha. Eu nunca quis... eu só precisava de ajuda." Seus olhos, grandes e inocentes, encheram-se de lágrimas que pareciam se materializar sob comando.
Minha fúria, um grito primal no meu peito, finalmente se libertou. Minha mão disparou, acertando sua bochecha com um estalo agudo e ardente. O som ecoou no silêncio atordoado.
Heitor explodiu. Ele me agarrou, seus dedos cravando-se no meu braço, me afastando de Kiera. Ele a embalou instantaneamente, seus olhos furiosos queimando nos meus. "Qual é o seu problema, Audra?!" ele rugiu. "Como você pôde tocar nela? Ela é frágil! Você é sempre tão agressiva, tão forte. Não vê que ela está sofrendo?"
Suas palavras, mais frias que qualquer gelo, mergulharam no meu coração. Minha força agressiva, meu sofrimento? Para ele, minha força era uma falha, e a fraqueza dela uma virtude. Meu coração, já machucado, transformou-se em um caco de vidro congelado.
Uma guerra fria brutal começou. Todos, nossos amigos, sua família, sussurravam que Heitor voltaria rastejando, como sempre fazia. Eles sabiam o quanto ele dependia de mim, como eu era sua âncora. Mas ele não voltou. Não desta vez. Semana após semana, o silêncio se estendia, uma ferida aberta entre nós.
Meu desespero cresceu, um medo sufocante de que eu o perderia para sempre. Eu não suportava. Não depois de descobrir que estava grávida. Eu estava tão convencida de que nosso bebê, nosso futuro real e tangível, seria o que o traria de volta. Que seria o suficiente. Engoli meu orgulho, reprimi a humilhação e revelei meu segredo.
"Heitor", eu disse, minha voz tremendo, crua com uma vulnerabilidade que eu odiava. "Estou grávida. Do nosso bebê. Você vai mesmo jogar isso fora por ela?" As palavras pairaram no ar, um apelo desesperado e uma aposta manipuladora, na esperança de puxá-lo de volta do abismo, mesmo que isso significasse sacrificar o último resquício da minha dignidade.