Seis Anos Preso em um Voto Quebrado
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Capítulo 4

O silêncio após a saída tempestuosa do Caio mais velho era denso, mas não opressivo. Era o silêncio de uma batalha vencida, mesmo que a guerra não tivesse acabado. O jovem Caio ainda estava ao meu lado, sua mão quente e firme em meu braço, um contraste gritante com as palavras frias e cruéis que acabaram de ser lançadas contra mim.

"Ele se foi", eu disse, as palavras soando estranhas em minha língua. Não era uma pergunta, mas uma constatação, uma confirmação de uma verdade que eu ansiava.

O jovem Caio assentiu, seus olhos ainda queimando com uma indignação que era ao mesmo tempo comovente e fortalecedora. "Ele não vai mais te machucar, Alana. Eu não vou deixar." Sua voz estava rouca, crua do confronto.

Olhei para ele, esta versão jovem e imaculada do homem que havia estilhaçado meu mundo. Ele era tudo o que seu eu mais velho não era: ferozmente protetor, genuinamente empático e totalmente devotado. Ele era o fantasma de um amor que perdi, agora ao meu lado, ajudando-me a recuperar minha vida.

O período de "reflexão" de 30 dias começou. O Caio mais velho foi fiel à sua palavra, de uma forma distorcida. Ele não voltou para casa. Mas os presentes começaram a chegar. Não os presentes impessoais de seu eu traidor, mas ecos do nosso passado. Uma primeira edição do meu romance favorito, um vinil raro que costumávamos ouvir repetidamente, um pequeno e intrincado pássaro de porcelana que se assemelhava a um que ele me deu quando começamos a namorar. Cada item era uma lembrança cuidadosamente escolhida de uma história compartilhada, uma tentativa sutil de puxar as cordas nostálgicas do meu coração.

Ele queria me lembrar dele. Do jovem que eu me apaixonei. Ele queria que eu acreditasse que o fantasma do passado ainda estava lá, escondido sob as camadas de seu eu atual, esperando para ser redescoberto. Ele queria que eu visse o jovem Caio como um mero substituto, um substituto temporário até que eu recobrasse o juízo.

Mas eu sabia melhor. Olhei para o jovem Caio, que meticulosamente organizava meus livros antigos, que limpava cuidadosamente o vinil com um pano macio, que delicadamente colocava o pássaro em uma prateleira como se fosse de vidro fiado. Ele não era um substituto. Ele era o verdadeiro. A personificação do amor puro que uma vez existiu entre nós. Ele era a razão pela qual eu finalmente estava me libertando.

Uma noite, o jovem Caio e eu fomos a uma pequena e despretensiosa cantina italiana no centro. Era um lugar que costumávamos frequentar em nossos primeiros dias de namoro, um local aconchegante com toalhas de mesa xadrez e o aroma de alho e manjericão. Ele havia sugerido, uma esperança tímida em seus olhos.

A dona, uma senhora italiana idosa com um sorriso caloroso, me reconheceu instantaneamente. "Alana, cara! Há quanto tempo! E você trouxe seu belo marido de novo!" Ela piscou para o jovem Caio. "Ainda tão devotado como sempre, vejo."

O jovem Caio corou, um vermelho profundo se espalhando por suas bochechas, mas um sorriso genuíno iluminou seu rosto. Ele olhou para mim, seus olhos cheios daquele amor puro e não adulterado. Senti uma dor agridoce no peito. Se ao menos. Trocamos um olhar, um entendimento silencioso passando entre nós. Este era um momento frágil, um vislumbre roubado de uma vida que poderia ter sido.

Depois do jantar, enquanto saíamos, percebi que meu pequeno medalhão antigo - um presente da minha avó, uma herança de família - estava faltando. Deve ter escorregado.

"Eu volto para pegar", disse o jovem Caio imediatamente, sua mão já alcançando a porta do restaurante. "Espere aqui, Alana." Ele não hesitou, correndo de volta para o restaurante mal iluminado.

Fiquei na calçada, pegando meu celular, rolando por manchetes sem sentido para passar o tempo. Meus dedos pararam em uma notícia local. A manchete me chamou a atenção: "Fernanda Vasconcelos, funcionária da Martins Corp., presa por agressão." Meu coração deu um pulo. Cliquei nela.

O artigo detalhava uma briga em um bar local. Fernanda, fortemente intoxicada, havia se envolvido em uma altercação violenta com outra mulher, acusando-a de flertar com Caio. A polícia foi chamada e Fernanda resistiu à prisão, resultando em acusações de agressão e embriaguez em público. Sua foto de registro policial apareceu na tela, seu rosto inchado e manchado de lágrimas, muito longe da colega júnior polida e ambiciosa que eu lembrava.

Uma voz, aguda e familiar, cortou a noite silenciosa. "Ora, ora, se não é a esposa descartada."

Eu olhei para cima. Fernanda. Ela estava a poucos metros de distância, os olhos injetados, o cabelo desgrenhado. Ela parecia... diferente. Magra, suas roupas caras pendendo frouxamente em seu corpo. A fachada cuidadosamente construída de vulnerabilidade havia desmoronado, revelando uma raiva frágil por baixo.

"Ainda esperando por ele, estamos?", ela zombou, uma risada cruel escapando de seus lábios. "Não se preocupe. Ele provavelmente já está com alguma outra vadia. Ele sempre foi um cachorro."

Eu não senti nada. Nenhuma raiva, nenhuma dor. Apenas um cansaço profundo. "Olá, Fernanda", eu disse simplesmente, minha voz fria.

Ela pareceu surpresa com minha falta de reação. Seu sorriso endureceu. "O quê, sem lágrimas? Sem drama? Pensei que você estaria de coração partido. Afinal, ele me escolheu. Ele escolheu nosso bebê." Ela deu um tapinha em sua barriga lisa, um brilho triunfante em seus olhos.

"Ele também escolheu continuar casado comigo por seis anos depois que começou a dormir com você", contrapus, um pequeno sorriso irônico tocando meus lábios. "E na semana passada, ele anunciou publicamente seu filho com você, enquanto ainda era legalmente casado comigo. Você parece ter esquecido essa parte."

Seu rosto se contorceu, sua voz se tornando estridente. "Sua vadia! Você deliberadamente tentou nos impedir! Você o manteve amarrado a você, sabendo que ele não te queria!"

Eu ri então, uma risada genuína que surpreendeu até a mim mesma. "Fernanda, querida. Eu pedi o divórcio a ele 99 vezes. Noventa e nove vezes, ele recusou. Ele se agarrou a mim, não porque me amava, mas porque amava a ilusão de controle. E você, em seu desespero, comprou essa ilusão. Você pensou que estava ganhando, mas era apenas uma ferramenta no jogo dele."

Seus olhos arderam de fúria. "Você se acha tão esperta, não é? Tão superior!" Ela deu um passo mais perto, as mãos cerradas em punhos. "Ele nunca te amou! Ele apenas teve pena de você! Ele me disse!"

"E você acreditou nele?", levantei uma sobrancelha, um divertimento frio em minha voz. "Engraçado, porque o homem que te ama tanto ainda não assinaria os papéis do divórcio por seis anos. Ele só o fez quando seu eu mais jovem e mais honrado apareceu e fez por ele."

Seu rosto se contorceu em algo feio, selvagem. "Você está mentindo! Ele nunca faria isso! Ele me ama! Ele me prometeu um futuro!"

"Ele prometeu, Fernanda?", minha voz era suave, mas afiada. "Porque eu acho que você sabe, no fundo, que ele nunca teve a intenção de realmente se casar com você. Você foi uma conquista, uma distração. Uma júnior bonita e ambiciosa que inflou seu ego. Ele precisava de alguém para fazê-lo se sentir poderoso, e você estava disposta a fazer o papel."

Isso foi o suficiente. Seus olhos ficaram completamente selvagens. "Você só quer me machucar, não é?", ela gritou, e então ela estava sobre mim, empurrando, arranhando, um grito primal rasgando sua garganta. "Você arruinou tudo! Você arruinou minha vida!"

Ela me empurrou com força, me fazendo tropeçar para trás, para fora da calçada e para a rua. A buzina de um carro soou, alta e penetrante, seguida pelo guincho de pneus. Faróis me cegaram, uma luz branca e ardente que encheu minha visão. Eu congelei, paralisada pelo medo, o som do veículo se aproximando ensurdecedor.

"Alana!", ouvi duas vozes gritarem meu nome, uma desesperada, outra cheia de um terror que ecoava o meu.

Em um borrão, uma figura passou por mim. Era o jovem Caio. Ele me derrubou, me puxando para trás com uma força incrível, nos jogando no asfalto. O carro parou a centímetros de onde minha cabeça estivera.

Ficamos ali, emaranhados, meu coração batendo um ritmo frenético contra minhas costelas. Olhei para cima e vi o Caio mais velho, congelado na beira da calçada, o braço estendido, o rosto pálido de horror. Ele estava prestes a me alcançar também, mas o jovem Caio fora mais rápido.

O Caio mais velho, ainda visivelmente abalado, reflexivamente alcançou Fernanda, que havia desabado na calçada, soluçando histericamente. "Meu bebê! Meu bebê!", ela lamentava, embora sua barriga estivesse lisa. Era uma performance ensaiada, um apelo desesperado por atenção.

Eu a ignorei, o ignorei. Minhas mãos foram para o jovem Caio, gentilmente limpando a poeira de sua jaqueta, verificando se havia ferimentos. Ele olhou para mim, os olhos arregalados, a respiração ofegante.

"Você está bem?", sussurrei, a voz trêmula.

Ele assentiu, uma leve luz retornando aos seus olhos. "Estou bem, Alana. E você?"

Eu apenas assenti, incapaz de falar. Peguei sua mão e, sem olhar para trás para a cena caótica na calçada, o puxei para cima. Nós nos afastamos, de mãos dadas, deixando o Caio mais velho para lidar com a histérica Fernanda e o motorista furioso.

No dia seguinte, o divórcio foi finalizado. O período de espera de 30 dias havia acabado. Ficamos diante do juiz, um processo silencioso e solene. O jovem Caio ficou ao meu lado, sua presença uma âncora reconfortante. Quando o juiz anunciou a dissolução do nosso casamento, senti uma estranha mistura de alívio e vazio. Acabou. Realmente acabou.

Segurei a certidão de divórcio em minha mão, um pedaço de papel frágil que representava anos de dor e sonhos desfeitos, mas também um futuro de possibilidades. Minha visão embaçou, lágrimas que eu não percebi que estava segurando ardendo em meus olhos.

O jovem Caio me abraçou, me segurando com força. "Está tudo bem, Alana", ele murmurou, a voz embargada de emoção. "Realmente acabou agora." Ele se afastou, os olhos avermelhados. "Sinto muito. Por tudo que ele te fez passar." Ele fungou, um som infantil que partiu meu coração. "Nunca o perdoe, Alana. Não ouse."

Enquanto ele falava, sua forma começou a tremeluzir, como o calor subindo do asfalto em um dia de verão. Ele estava desaparecendo. Esta versão pura e devotada de Caio, que havia vindo inesperadamente do passado para me salvar, estava desaparecendo. Ele estava voltando.

Minha visão nadou, lágrimas finalmente escorrendo por minhas bochechas. Estendi a mão, tentando agarrá-lo, mas meus dedos passaram por ele como névoa.

"Alana?", uma voz, aguda e fria, cortou meu torpor. "O que está na sua mão?"

Era o Caio mais velho. Ele estava na entrada do tribunal, os olhos estreitados, o rosto gravado com uma nova onda de suspeita. Ele nos encontrou. De novo.

            
            

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