Capítulo 2

O cheiro estéril do hospital ainda grudava nas minhas roupas enquanto eu saía, o aroma fraco um lembrete do drama que eu havia deixado para trás na sala de cirurgia três. Karina estava estável e o bebê estava seguro. Meu trabalho estava feito. Para eles, pelo menos.

Eu esperava a onda usual de alívio, o peso familiar se dissipando enquanto eu tirava meu pijama cirúrgico. Mas esta noite, um novo tipo de tensão se enrolou no meu estômago. Um resíduo persistente de Caio.

Quando cheguei ao estacionamento dos funcionários, um carro preto e elegante estava parado na entrada, seus faróis cortando a penumbra do início da noite. Caio estava encostado na porta do motorista, com o celular na mão, mas seu olhar estava fixo na entrada do hospital. Em mim.

Ele me viu, endireitou-se e guardou o celular no bolso. O ar instantaneamente crepitou.

"Alana." Sua voz atravessou a distância, um som baixo e suave que costumava fazer meu coração disparar. Agora, apenas arrepiava os pelos da minha nuca.

"Caio," eu o cumprimentei com um aceno de cabeça curto. Não parei de andar. Eu só queria ir para casa. Para minha casa de verdade, meu refúgio seguro.

Ele se juntou a mim, suas passadas longas facilmente acompanhando as minhas. "Eu queria te agradecer de novo. Pela Karina. Pelo bebê."

"É o meu trabalho," eu disse, minha voz seca. "Você não precisa ficar esperando por isso."

"Eu sei," ele disse, uma nota estranha em seu tom. "Mas eu... eu pensei que talvez pudesse te levar para casa. Está tarde."

"Eu estou bem," contestei instantaneamente. "Eu tenho planos." Eu não tinha, na verdade. Meu clube do livro havia cancelado de última hora devido a uma tempestade que se aproximava. Mas eu preferiria andar no meio de um furacão a passar mais um minuto na presença dele.

Nesse momento, o uivo de uma sirene de ambulância perfurou a noite. Estava se aproximando da entrada do hospital, mas o carro preto e elegante estava bloqueando parcialmente o caminho. A ambulância diminuiu a velocidade, suas luzes piscando impacientemente.

Caio olhou para o carro, depois para o veículo de emergência que se aproxima. Ele praguejou baixinho. "Droga." Ele olhou para mim, um brilho de algo que eu não consegui decifrar em seus olhos. "Parece que você vai ter que me aturar por mais alguns minutos, então."

Ele gesticulou vagamente em direção ao carro. Eu suspirei, uma exalação cansada. Era um padrão familiar com ele. Ele sempre dava um jeito de conseguir o que queria, mesmo quando eu resistia. Eu não tinha energia para um espetáculo público.

"Tudo bem," eu cedi, minha voz mal passando de um sussurro. Observei enquanto ele movia rapidamente o carro, criando um caminho livre para a ambulância. Ela passou por nós, sua sirene desaparecendo na distância.

Caminhei em direção ao carro dele, a porta do passageiro já aberta. Foi um reflexo, um velho hábito. Deslizei para o assento de couro rico, o cheiro familiar de carro novo misturado com seu perfume caro me envolvendo. O carro saiu suavemente do estacionamento.

Uma melodia suave e melancólica flutuava dos alto-falantes. Era uma música antiga, uma que costumávamos ouvir em longas viagens, quando nosso futuro parecia infinito e brilhante. Meu estômago se contraiu. Ele ainda conhecia meus gostos.

"Então," ele começou, sua voz casual, quase casual demais. "Como você tem passado, Alana? De verdade."

"Ocupada," respondi, olhando pela janela para as luzes da cidade que passavam. "Trabalho. Vida." Era uma resposta genérica, projetada para encerrar qualquer investigação adicional.

Ele riu, um som baixo em seu peito. "A mesma de sempre, pelo visto. Sempre se enterrando no trabalho." Ele fez uma pausa, depois acrescentou: "Você parece... bem, no entanto. Saudável." Havia um estranho alívio em seu tom, quase como se ele esperasse que eu estivesse definhando.

"E você?" perguntei, virando o jogo. "Ainda conquistando a Faria Lima?"

"Algo assim," ele disse, mas seu foco rapidamente voltou para mim. "Eu me perguntei se você... se você encontrou outra pessoa. Depois de tudo."

Minha cabeça se virou bruscamente para ele. "O que isso tem a ver com qualquer coisa, Caio?" Minha voz estava mais afiada do que eu pretendia.

Ele agarrou o volante, seus nós dos dedos ficando brancos. A tensão familiar em suas mãos. Sempre aparecia quando ele estava agitado.

"Você ainda está com raiva de mim, Alana?" ele perguntou, sua voz inesperadamente baixa. "Sobre... tudo? Sobre minha mãe?"

A menção da mãe dele. Era um nervo exposto. Minha avó havia morrido de um ataque cardíaco, o estresse da traição deles, de Caio e Karina, demais para seu coração frágil. E a mãe de Karina estava lá, atiçando o fogo.

Ele se interrompeu, as palavras presas na garganta. Ele quase disse demais. A história não dita pairava entre nós, densa e sufocante.

Minha respiração falhou. Os familiares tentáculos gelados de luto e raiva começaram a se enrolar no meu peito. "Encosta o carro, Caio," exigi, minha voz tremendo. "Aqui mesmo."

"Alana, não," ele disse, seus olhos piscando para o retrovisor. "Está tarde. Esta parte da cidade não é segura. E você não mora mais aqui, não é? Seu antigo apartamento ficava a algumas quadras daqui."

Ele ainda se lembrava. Ele ainda se lembrava da minha vida antiga, aquela que ele ajudou a destruir.

"Eu disse para encostar o carro!" Minha voz falhou, crua de emoção. As memórias estavam voltando, nítidas e dolorosas.

Ele me ignorou. O carro acelerou. Meu coração martelava contra minhas costelas. Ele não ia me deixar ir. Ainda não.

"Caio, destrave a porta!" sibilei, minha mão já na maçaneta, tentando destravar.

Ele apertou um botão no console, e eu ouvi o clique. As portas estavam trancadas. Minha respiração ficou presa na garganta. Ele estava me prendendo. Como sempre fez.

O carro acelerou pela cidade, e então, sem aviso, virou em uma rua familiar, arborizada. Minha rua antiga. Minha casa antiga. Aquela com o balanço na varanda e as venezianas azuis desbotadas.

Meu estômago despencou. "O que você está fazendo?" sussurrei, minha voz quase inaudível.

Antes que eu pudesse reagir, o carro parou no meio-fio. Ao lado, a luz da varanda da casa de infância de Karina, agora sua casa, piscou. A porta da frente se abriu.

Karina estava lá, envolta em um roupão de pelúcia, o rosto pálido, mas os olhos surpreendentemente brilhantes. Ela ofegou, a mão voando para a boca.

"Alana? O que você está fazendo aqui?" Sua voz era suave, tingida de falsa preocupação. "Você está bem? Está tudo bem com... com a mamãe?"

A mãe dela. A mulher que seduziu meu pai, que levou minha própria mãe ao túmulo.

"Não se atreva a falar da minha mãe," rosnei, abrindo a porta do carro com uma onda de adrenalina.

Não esperei por Caio. Não esperei por Karina. Apenas comecei a andar, meus pés batendo no pavimento familiar. Eu precisava escapar. Desta rua, deles, dos fantasmas que assombravam cada tijolo.

"Alana, espere!" Caio estava de repente atrás de mim, sua mão se fechando em meu pulso. Seu toque era como uma marca de ferro.

"Onde você vai, Alana?" ele perguntou, sua voz tingida de exasperação. "Você não tem para onde ir, não é? Não de verdade. Você está sozinha."

Suas palavras foram um soco no estômago. Foram projetadas para cortar, para me lembrar do vazio desolador que eu senti após nosso término.

"Eu tenho uma casa," afirmei, minha voz tremendo com calma forçada. "Eu tenho uma família."

Ele zombou, um som amargo. "Uma família? Quem? O homem de quem você fugiu no nosso casamento? Aquele que você incendiou, Alana?"

As memórias voltaram. O fogo. O caos. A ordem de restrição. O mundo me viu como a vilã, a mulher instável. E ele, Caio, interpretou a vítima tão bem.

"Não foi assim que aconteceu," comecei, mas parei. Qual era o sentido? Ele nunca acreditaria em mim. Eles nunca acreditaram.

"Apenas volte, Alana," ele insistiu, seu aperto se intensificando. "Esta é a sua casa. Sempre foi. Você pertence aqui, conosco. Podemos consertar as coisas."

Karina estava na varanda, os olhos arregalados, uma espectadora silenciosa de seu apelo desesperado. Seu olhar oscilou de Caio para mim, uma satisfação presunçosa escondida sob sua falsa inocência. Eu vi. Eu sempre via.

Lembrei-me da noite anterior ao nosso casamento. A discussão. As acusações. Minha mãe, apenas algumas semanas antes, havia morrido por suicídio. Meu pai, envolvido com a mãe manipuladora de Karina. Minha avó, seu coração cedendo após testemunhar a traição de Caio e Karina. Meu mundo havia se despedaçado. E Caio havia descartado minha dor, seu foco já se deslocando para Karina, seu conforto, suas lágrimas.

Um arrepio frio percorreu minha espinha, mesmo no ar quente da noite. Apertei meu casaco fino em volta de mim, tentando suprimir o tremor que ameaçava explodir.

"Eu tenho uma família," repeti, minha voz mais forte desta vez, mais firme. "Uma de verdade. Eu pertenço lá agora. Não aqui."

Puxei meu braço com força, surpreendendo-o com a força do meu movimento. Virei as costas para eles, para a casa, para toda a fachada tóxica. Não olhei para trás. Apenas andei, cada vez mais rápido, até que suas vozes, suas sombras, seu passado venenoso, desapareceram atrás de mim. As luzes da rua se estendiam diante de mim, um caminho longo e solitário. Mas era o meu caminho agora. Não o deles.

            
            

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