"Oi, meu bebê, como você está? Os meninos estão se comportando?" Minha mãe deu uma risada, mas eu não ri com ela. Eu não estava com vontade de rir. Não era hora de rir. Eu olhei em direção a Cauã, que acenou para mim lentamente. Por algum motivo, eu sabia exatamente o que ele queria dizer com aquele aceno.
Adicionei aquilo à lista dos vários mistérios da minha vida.
"Eu estou bem, e sim, os meninos têm sido ótimos." Eu respondi com uma carranca. 'Nem todos eles', eu não pude deixar de pensar comigo mesma. Pelo canto do olho, vi Cauã sorrindo para mim antes de sair do quarto.
"Bebê, tem alguma coisa errada? Você parece chateada." Minha mãe perguntou e eu suspirei.
"Não foi nada. Eu só estou cansada."
"Ah, tudo bem... Eu falo com você hoje mais tarde então, ok? Eu te amo."
"Também te amo." Eu respondi e finalizei a chamada. Ao colocar minha mão na cabeça, eu senti uma lágrima deslizando pelo meu rosto.
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Despertei com o som do alarme tocando e abri os olhos, apertando o botão 'desativar'. Eu coloquei minhas pernas para fora da cama e andei até o banheiro. Ao me olhar no espelho, eu passei o dedo sobre o hematoma que estava claramente visível na minha bochecha. Decidi deixar isso pra lá, já que ninguém nunca me nota na escola mesmo. 'Como eu amo a minha vida', pensei comigo mesma.
Lavei meu rosto com água morna e sequei com o paninho que estava cuidadosamente dobrado na beira da pia. Ao sair do banheiro, eu peguei meu uniforme e me vesti. Quando eu terminei de me aprontar, eu desci as escadas. Vendo Cauã sentado à mesa, eu me sentei ao lado dele.
"Oi", eu murmurei.
"Bom dia." Ele resmungou de volta, olhando para seus dedos que estavam ligeiramente tremendo.
"Você quer ir a pé para a escola hoje?" Cauã sugeriu e eu não pude deixar de concordar. Naquele momento, percebi que Leonardo e Guilherme estavam descendo as escadas. Eu acenei para os dois e eles brevemente acenaram de volta. Então, meus olhos foram até o outro garoto, que descia as escadas com a mão pressionada em sua testa. Apavorada, eu voltei a olhar para Cauã.
"Que tal a gente ir agora?" Eu sugeri e ele assentiu com a cabeça, se levantando da cadeira.
Eu dei tchau para Leonardo e Guilherme, pronta para ir atrás de Cauã, mas eles começaram a vir em nossa direção. Foi quando Douglas de repente agarrou Guilherme pelo pulso, fazendo com que ele grunhisse. Para piorar o desconforto que eu sentia em meu estômago, os eventos da noite passada voltaram a aparecer em minha mente quando eu me lembrei dos ferimentos de Guilherme.
"Douglas, solte ele!" Eu gritei, fazendo com que Douglas olhasse para mim.
"Não me faça te dar outro hematoma." Douglas rebateu, com um sorriso malicioso no rosto, e quando eu estava prestes a responder, Leonardo jogou suas mãos para o ar.
"Douglas, cale a boca! Você tem sorte de eu não ter contado para a mamãe sobre o que você aprontou bêbado na noite passada!" Leonardo gritou e Douglas revirou os olhos, gesticulando para que Guilherme fosse embora com ele. Segundos depois, ouvimos o carro dando ré e eu suspirei aliviada, ciente de que Douglas tinha ido embora.
"Você não vai esconder isso?" Leonardo perguntou, se referindo ao hematoma no meu rosto. Eu balancei a cabeça negativamente.
"Ninguém liga pra mim na escola e, mesmo se eles notassem, eles não vão se importar, já que eles só se importam com fofocas." Eu respondi, um pequeno sorriso aparecendo em meu rosto, Cauã e Leonardo sorriram de volta.
Naquele exato momento, eu soube que Leonardo e Cauã eram pessoas em quem eu podia realmente confiar.
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"Aquele ali é o Igor?" Eu perguntei, apontando para o cara que está andando do outro lado do rua. Cauã assentiu com a cabeça.
"Venham, vamos atravessar." Eu sugeri e eles concordaram com a cabeça enquanto atravessávamos para o lado da rua onde Igor estava.
"Ei!" Eu gritei, chamando a atenção dele. Ele se virou para encarar Leonardo e Cauã, mas quando percebeu que eu estava aqui, ele sorriu e começou a caminhar em nossa direção.
"Ele não parece chateado..." Eu sussurrei e Leonardo riu.
"Isso é porque você está aqui." Ele sussurrou de volta e, antes que eu tivesse oportunidade de responder, Igor estava na nossa frente.
"Oi, gatinha", ele disse, balançando as sobrancelhas para mim, e eu acidentalmente dei um passo para trás e me encostei contra o peitoral de Leonardo. De repente, eu notei a forma como os olhos de Igor brilharam de irritação e ciúmes ao ver os braços de Leonardo em volta da minha cintura, me puxando para perto dele.
Espere, o que está acontecendo agora?
"Você está com esse idiota?" Igor indagou e eu pausei ao ouvir a risada de Cauã. Cauã andou até Igor e passou o braço em volta do ombro dele, olhando para o céu.
"Sabe, Gogo, tem muita mulher solteira por aí... mas nós dois sabemos que você não vai se satisfazer com um relacionamento real porque tudo o que você quer fazer é trepar com alguém e fazer dela seu novo brinquedinho da semana. Mas, para responder a sua pergunta, ela está comprometida." Ele falou, dando uma breve piscadela para mim, antes de voltar para o meu lado.
"Não me chame de Gogo, e isso não..."
"É cem por cento verdade, meu amigo com tesão." Cauã interrompeu com um sorrisão no rosto, e eu não pude deixar de rir.
"Vá se foder." E com aquilo, Igor se virou e foi embora em direção à entrada da escola. Senti os braços de Leonardo soltarem a minha cintura e me virei para olhar para os dois garotos, uma risada escapando dos meus lábios.
"Por que você colocou seus braços em volta de mim?" Eu perguntei a Leonardo e ele revirou os olhos, um pequeno sorriso no rosto.
"Para que ele não desse em cima de você." Ele respondeu e eu assenti com a cabeça, finalmente entendendo. Eu me virei para Cauã, um sorriso se espalhando pelo meu rosto.
"Aquilo foi hilário!" Eu falei e Cauã sorriu, se curvando para nós. Quando terminou, ele voltou a sorrir para mim.
"Mas nossa, aquela sua cara quando Leonardo colocou os braços em volta de você... Eu quase morri!" Cauã gargalhou e eu dei um tapinha de brincadeira no braço dele.
"Vamos, nós vamos nos atrasar." Leonardo interrompeu o papo e nós assentimos, começando a andar em direção à entrada.
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"Ei, veja! É a 'Nadine, a Vadia'." Eu ouvi alguém falar e notei Andréa Vaz e suas amiguinhas sorrindo de maneira debochada pra mim.
'Meu deus, eu só quero fugir agora.' Eu estava ficando cansada daquele joguinho que ela continuava a jogar!
Ignorando-as, eu continuei a pegar meus livros do meu armário e a jaqueta que deixei ali ontem. Assim que terminei de pegar tudo, fechei a porta e, ao invés de ir para a sala de aula como eu planejava fazer, eu fui repentinamente empurrada contra o meu armário, com minha cabeça batendo na saída de ar. Eu pude sentir as lágrimas começando a brotar nos meus olhos, mas me esforcei para não deixá-las cair.
"O que há de errado, Nadine? Você vai chorar como a bebezinha que você é?" Eu ouvi as palavras de Catarina e cerrei meus dentes. Catarina era a melhor amiga de Andréa, e ela adorava perturbar todo mundo, especialmente eu.
"Sempre foi muito fácil mexer com você, sabia? Você sempre foi sensível e sem noção de coisa alguma." Catarina falou, batendo com seu calcanhar contra a parte de trás do meu joelho, o que me fez cair no chão. Meus livros se espalharam pelo corredor e a minha jaqueta agora estava caída no meu colo. Quando eu olhei para o grupo em frente a mim, não pude deixar de choramingar baixinho.
Catarina sorriu maliciosamente para mim, dando um passo à frente e levantando sua perna para trás..
'Ah, Deus...'
"Você nunca foi especial...", senti o seu chute: "nunca foi amada...", outro chute: "nunca mereceu o tempo de ninguém...", mais um chute. Eu senti uma lágrima escorrer pela minha bochecha, e foi naquele momento que eu ouvi Catarina gargalhar. Ela se agachou próximo de mim e passou um dedo na minha bochecha, no local onde o hematoma estava.
"Quem fez isso? Os meninos decidiram fazer de você o novo saco de pancadas deles?" Catarina e as outras começaram a rir e eu olhei para baixo, tentando evitar que ela visse o resto das lágrimas que estavam a cair, mas eu tinha consciência que ela sabia que eu estava chorando.
"Te vejo mais tarde, vadia." Andréa cuspiu, e se afastou. Eu me enrolei em posição fetal, sentindo cada centímetro do meu corpo latejando de dor com os chutes de Catarina.
'Sozinha de novo', eu pensei comigo mesma enquanto deixava as lágrimas escorrerem pelo meu rosto.
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Eu me levantei, sem me preocupar em enxugar as minhas lágrimas, e comecei a pegar meus livros. Quando terminei de recolhê-los, fui em direção ao banheiro mais próximo.
Eu entrei e para minha surpresa, o local estava completamente vazio. Larguei meus livros e coloquei minhas mãos na beirada da pia, olhando meu reflexo no espelho.
"O que eu fiz para merecer isso?" Eu me perguntei, permitindo que minhas lágrimas continuassem a cair.
Eu ouvi a porta abrindo e me virei em direção ao som. De repente, vi a pessoa que eu menos esperava ver entrando ali.
"Laura?"
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