Jack não havia me acordado provavelmente passou a noite acordado, mas me sinto bem melhor depois de dormir. Abro os olhos sentindo a claridade bater em meu rosto e invadir minha visão, olho para o local onde Jack estava com a irmã de noite e é lá ele continua, cheio de olheiras e com um sorriso contido no rosto.
Me espreguiço me levantando, não sei qual a desse garoto, nos tínhamos um trato e ele não cumpriu, me levanto dobrando o cobertor e colocando de lado, caminho até ele que continua com a irmã deitada em seu colo.
-Achei que tínhamos combinado de você me acordar para que pudesse dormir. -digo brava, ele não sabe que ficar sem dormir vai prejudicar sua saúde.
-Você parecia bem mais cansada que eu. Posso dormir um pouco agora, ainda é bem cedo, não tá vendo que quase ninguém acordou ainda. -me responde como se isso não fosse nada, esse cara me tira do sério e mal nos conhecemos.
-Durma agora então, irei dar uma olhada ao redor para ver se reconheço onde estamos, caso eu não volte não ousem me procurar, sigam caminho sem mim. -aviso me afastando, vou ate minha mochila e a pego, estou bem acostumada a andar com uma mochila por todo lado, vou me afastando em meio as árvores e plantas com as folhas ainda molhadas do orvalho da manhã.
Deve ser por volta das seis da manhã, o orvalho ainda está nas folhas, ouço um barulho e olho para o lado vendo um veado, ele vai ser bem bom para a primeira refeição do dia, o café.
Sempre fui boa em caçar e andar na mata, por várias vezes depois que meu pai se foi eu fui acampar sozinha e voltava com algum animal para mamãe fazer. Um dos locais que eu mais gostava era a mata e tudo que podia ver nela, explorar é uma de minhas paixões, principalmente quando descubro coisas novas.
Espero pacientemente em cima da árvore pela minha presa, a única arma que tenho é uma adaga, somente improvisei uma armadilha e o veado se aproximava para pegar as frutinhas que coloquei ao centro, quando ele coloca o focinho nas frutas um grande galho fura o seu pescoço espalhando sangue para todos os lados, desço da árvore satisfeita pelo meu trabalho.
Agora preciso fazer a sangria, retirar o couro porque é útil para fazer sacolas e mapas, quando estou cortando as partes que vão ser mais fáceis de fazer, ouço uma movimentação, subo rapidamente a primeira árvore que vejo em minha frente, algo está muito suspeito por aqui.
-Alfa zero cinco. -escuto, parece ser a voz de um homem adulto, isso é estranho o que eles fazem nessa parte da mata em tal hora da manhã.
-Alfa zero cinco. -pareciam dois guardas. -A entrega foi feita?
-Não senhor. Fomos atacado pela nova criatura, a grande maioria dos jovens com marca morreram senhor. -as vozes parecem vir do leste, o veado que matei está ao norte, se eles se moverem para o norte terei sérios problemas.
-Não há problema, todos seriam executados de qualquer jeito mesmo. -essas palavras fazem meu coração acelerar e minha respiração fica pesada. O que ele quer dizer com isso? Seriamos executados?
-Alguns entraram na mata, mas creio que tenham morrido para os lobos, vimos marcas de sangue quando fizemos a vistoria ontem. -o guarda continua falando, preciso descobrir mais, o que mais eles sabem? O quanto sabem? Mas não posso arriscar.
-Certo, vamos voltar ao posto, ninguém pode saber essa conversa, são ordens diretas do rei, se o povo ficar sabendo das mortes propositais de alguns jovens será nosso fim. -depois que escuto isso vem o som de passos se afastando. Eles estão indo rumo a sul onde fica a estrada principal na qual fomos atacados ontem.
Acho que finalmente posso descer da árvore, não parece ter mais ninguém por aqui o que é ótimo. Mas não consigo acreditar no que acabei de ouvir, uma ordem direta do rei? Execução de crianças marcadas? Mas porque? Droga você tá pensando demais Zoe, vamos cortar o resto da carne e voltar.
Termino de cortar o veado colocando os pedaços em folhas grandes que sei não serem venenosas, vou em direção a onde escutei os soldados conversando, se eles estavam aqui deve ser por conta de água, os cavalos e os outros soldados precisar estar bem hidratados para chegar até a capital.
Caminho um pouco e então escuto o barulho de água, finalmente sei onde estou, depois de algum tempo chego as margens do rio, se eu somente vim reto do sudoeste então onde estão os outros agora é ao sudeste do Rio Tempestuoso, isso quer dizer que não estamos longe da vila, mas se voltarmos iremos ser capturados de novo ou eles podem até mesmo nos matar.
Pego meus cantis na mochila e encho no rio, começo a refazer meu caminho para o acampamento, eu vim até aqui marcando as árvores com um trevo, assim fica mais fácil de se localizar onde fica o acampamento.
Continuo andando seguindo as marcas, mas quando passo perto da enorme árvore roxa que tem bem ao centro de uma clareira na mata vejo uma pequena trilha de sangue, começo a segui-la e paro perto de um arbusto que tem uma árvore com buraco como as que usamos para dormir.
Pego o isqueiro e ilumino dentro, assim que meus olhos se acostumam vejo alguém segurando uma faca e ensanguentado, um rapaz de cabelos avermelhados como os meus, nossa única diferença é a cor dos olhos, os dele de um verde quase da cor de uma folha recém nascida, já os meus de um azul quase como as águas mais profundas de um lago.
-Calma aí, sou amiga. -falo erguendo as mãos. -Está ferido? -pergunto e ele não diz nada. -Estamos em um acampamento, deixe-me te ajudar. -me aproximo e ele abaixa a faca, vejo sua perna machucada e pego meu vestido na mochila, era um vestido bonito mas não vou usar algo assim em uma mata, rasgo um pedaço e começo a enrolar na perna dele.
-Quem é você? -ele pergunta ainda meio tenso, acho que ele esta sobe adrenalina porque nem ao menos grita quando aperto o tecido em volta do machucado.
-Muito prazer Zoe. -término de estancar o sangramento e ele nem ao menos emitiu um som além do de sua respiração cansada. -Consegue se levantar? -ele faz que sim com a cabeça, acho que consigo dar apoio para ele até o acampamento. -Irei te dar apoio e vamos até o acampamento, não podemos ficar aqui, há soldados por perto. Nunca se sabe quando seremos pegos. -assim que saímos do buraco na árvore ele começa a reclamar pela dor na perna, acho que a adrenalina e o medo da mortes que mantinham o machucado anestesiado está passando.
Ele até tentou se fazer de forte mas não deu certo, depois de andarmos um pouco já estava com a respiração pesada e ofegante pela dor, além de fazer caretas de tempos em tempos, ele está se fazendo de forte eu acho.
-Falta muito? Acho que não aguento mais andar, estou com sede e fome, além de uma dor muito forte. -fala e paro fazendo ele se sentar em uma pedra, pego o cantil e um dos bolinhos que ainda estava guardado em um saquinho de pano, entrego para ele que bebê da água e come como se fosse a coisa mais gostosa do mundo, acho que agora sei porque ele parecia tão pálido.
-Não podemos ficar parados por muito mais tempo, vamos. -assim que ele acaba de comer já o ajudo a levantar e começamos a andar, ele anda apoiado em mim mesmo o seu peso sendo quase o dobro do meu e seu tamanho também, quando chego onde já vejo algumas pessoas do meu novo grupo.
-PESSOAL! -chamo alto e vejo Jack vindo em minha direção, sua cara é de surpresa ao ver o que eu carrego, além de também de admiração, quem vê esse monte de sangue pesa que é só dele mas também é do veado que matei antes.
-Explico quando todos estiverem juntos, me ajude, ele é muito pesado. -digo e Jack o ajuda a chegar até o meio do acampamento onde ele senta em um dos troncos que estão em volta da fogueira, paro tentando recuperar o fôlego, acho que fiquei muito relaxada depois de algum tempo parada.
-Algumas pessoas já acordaram, estávamos começando a ficar preocupados com a sua demora, o que faríamos sem nossa líder. -ele diz depois de voltar e pegar minha mochila da minhas costas, sem dizer mais nada começa a andar em minha frente indo até o círculo de novo.
-Quem disse que sou a líder? -pergunto ao me juntar com todos eles e o mesmo da risada enquanto balança a cabeça em negativo.
-Está agindo como líder, eles te consideraram a líder pelo que fez ontem. -sai puxando o desconhecido para dentro de uma das árvores, acho que vai ficar tudo bem, além do mais precisamos ajudar uns aos outros.
Passo a mão pelos cabelos frustrada, esse Jack tem uma língua solta mas pelo menos ele é bem direto e gosto disso apesar dele ser irritante para burro. Olho ao redor começando a puxar algumas coisas, preciso adiantar o café logo.
Depois de alguns minutos todos já estavam acordado, estou reacendendo a fogueira para preparar a carne de veado, vou fazer uma sopa leve com carne, já que não temos muitos ingredientes por aqui.
Apenas sal, vou usar a vasilha de minha mãe, e o sal que carrego comigo por ser enjoada com comida sem gosto, e também é uma coisa que meu pai me ensinou quando ainda estava conosco.
"Quando for para um lugar desconhecido sempre tenha o necessário para sua própria sobrevivência."
Sorrio triste enquanto mexo os condimentos, vou ter que fazer isso algumas vezes até conseguir fazer para todos, também estou usando algumas coisas que as meninas tinham achado perto do lugar onde estamos, são alguns cogumelos e batatas, alguns rapazes pegaram todos os cantis e seguiram minhas instruções para buscarem água no rio.
Tudo que falta agora é todos estão se sentarem e comerem, apesar de ser desconfortável comer já que estamos fazendo isso em cascas de cozalo, uma fruta que nasce entre as raízes das árvores menores, e que quando aberta a casca se torna grossa como pedra, seu suco é gostoso mas não há mais nada de útil para elas além de servirem de vasilhas, além de que se elas forem ingeridas de forma errada ou em grandes quantias pode ter um leve veneno que te causa uma dor de estômago infernal.
Quando eu falei isso pra todos eles quase que param de comer na hora e correm pata longe, acho que devia ter avisado antes mas eu fiz o processo de desintoxicação dessas cascas antes de começar a servir, é um processo bem simples, basta queima-las e depois deixar esfriar.
-Então, agora que comeu, descansou, seu ferimento foi tratado, poderia nos dizer seu nome? -me direciono ao rapaz que ainda não conhecemos, ele estava tão pálido antes que parecia um fantasma mas agora está bem melhor.
-Eu sou Cameron Hopkins Burton, primeiro Príncipe na linha de sucessão do Terceiro Reino Colossos. -arregalo os olhos e vejo que a reação dos outros não foi diferente da minha, um príncipe? Sério mesmo? Um rapaz da realeza está sentado em nossa rodinha de amigos comendo em uma casca de cozalo enquanto conversa animado com todos. Acho que meus olhos estão me enganando.
-Calma aí... o que um príncipe fazia no meio dos plebeus e tão longe de casa? Lembro de ter visto você na caravana. -me levanto indo até onde Rick e Sam estão sentados. Quero verificar se Sam está melhor, quando cheguei mais cedo me disseram que Sam estava quente hoje quando acordou, talvez passando pela segunda etapa da doença, se é que isso é uma doença.
-A exatamente duas semanas meu Reino foi atacado não sabemos por quem, mas por ordens do meu pai o rei fui enviado para cá com três pessoas responsáveis por minha segurança, nós passamos por camponeses, mas aí ontem na vistoria perguntaram da marca, disse que tinha uma e eles pediram para acompanha-los, depois vocês sabem o que aconteceu, os meus seguranças devem estar desesperados. -ele passa a mão pelo cabelo e vejo Madelyn o encarando com as bochechas coradas, acho que ela está imaginando coisas.
-Aaah. -o grito estridente me faz virar a cabeça, quando olho para o lado vejo Rick se contorcendo, droga logo agora. Me aproximo dele rápido vejo que sua testa e corpo estão muito quente, olho para os outros que já começam a agir, hoje mais cedo Sam teve uma reação parecida, acho que por eles serem mais novos a doença está indo mais rápido, o pego no colo e o levo ele a árvore e o deito logo Sam está ao lado dele segurando sua mão assim como ele havia feito com ela, parece que os dois tiveram uma ligação forte pela manhã.
-Alguém me trás água e um pano. -fico observando suas reações, sinto um pano ser colocado em meu ombro, não vejo quem me trás o que pedi só me viro vendo sua agonia, começo a limpar o suor que sai dele, sua reação está muito pior do que a de Sam.
-Zoe, eu faço isso, pode deixar que eu cuido dele. -Sam pega minha mão. -Ele me prometeu não morrer, vamos voltar pra casa juntos. -ela diz e afirmo saindo do tronco e deixando ela cuidando dele, não podemos dar bobeira ou um de nós pode acabar morrendo.
-Gente vamos fazer uma reunião, temos que decidir o que fazer, tenho algumas informações importantes para passar a todos. -digo e vejo todos voltando sérios, Madelyn senta ao lado de Cameron que lhe dá um sorriso, ainda bem que ele não esta sendo excluído por ser um príncipe.
-Quais informações você tem? -Eva pergunta se sentando no chão, acho que estão mais relaxados depois de comerem, mas ainda sinto a tensão no ar depois do que viram.
-Quando estava caçando hoje encontrei dois guardas, eles conversavam sobre nós, o guarda que parecia ser o general falou ao outro que se nossas marcas fossem confirmadas seríamos executados ou dados como mortos pela doença, tudo as ordens do rei. -começo a falar tudo que ouvi e vejo o medo em alguns, depois de algum tempo conversando resolvemos montar uma espécie de plano para descobrir a verdade.
-Então preparem-se, nós iremos até a capital, daremos um jeito de passar despercebidos, assim podemos ver, se o que eu ouvi é verdade, caso seja retornaremos para o acampamento. -finalizo e todos concordam. -Agora vamos descansar um pouco mais, depois arrumaremos tudo e partiremos ainda hoje, achamos um lugar para acampar no caminho. -eles começam a se dispersar.
Mesmo que o medo nos ronde, vamos rumo a capital, precisamos desvendar esse mistério e acabar com isso de uma vez, essa dúvida do porque fomos separados de nossas famílias.