Adela e Arabella sorriram também. A primeira derramou café na mesa, o que fez nosso pai olhar torto em sua direção, a segunda derrubou uma faca no chão com um estrondo.
- Bom, é melhor eu ir. – ele ficou em pé – Não quero atrapalhar a rotina de vocês. Muito obrigado por tudo. Fred, até mais.
Nós nos despedimos, mas minhas duas irmãs se atrapalharam tanto que pareceram duas bobas. Anastasia acenou para ele com empolgação.
Pensei que haveria uma longa conversa sobre Patrick, mas aparentemente seus bons modos impediram demais perguntas. Meus pais rapidamente se ocuparam com suas tarefas diárias e o visitante foi esquecido.
Quando saí para acompanhar minha mãe até a escola, ela parecia distraída.
- Está tudo bem? – perguntei, mesmo sabendo que deveria ficar quieto. Eu não queria ter que contar que havia escondido Patrick.
- Sim, querido. – ela respondeu, mexendo na bolsa cheia de atividades infantis – Só tenho uma porção de coisas para fazer com as crianças hoje.
Não conversamos mais. Então, assim que ela atravessou entre as crianças e sumiu dentro da escola, dei meia volta e comecei a voltar para casa.
O caminho estava cheio de gente correndo com seus afazeres e algumas crianças brincando. Nada diferente de quase todos os dias, ao não ser por um garoto loiro sentado em uma pedra e observando tudo.
- Patrick? – quase parecia alucinação vê-lo ali.
- Olá, caro Fred. – ele sorriu para mim e pulou da pedra – Se encrencou com seus pais por minha causa?
- Não, acho que eles gostaram de você. – respondi com sinceridade – Principalmente minhas irmãs. – acrescentei mais baixo, sem muita vontade de que ele escutasse.
- Então fiz um bom papel. – Patrick parecia orgulhoso de si mesmo.
Continuamos andando juntos pela rua, como se fôssemos velhos amigos. Para mim, que nunca tivera amigo algum, era uma sensação nova e boa.
- Patrick, o que está fazendo aqui? – questionei, curioso – Não tem pais? Irmãos?
- É complicado. – ele desvencilhou-se – Então, o que vai fazer agora?
- Provavelmente ajudar meu pai na plantação, com Adele. Minhas outras irmãs foram para a escola.
Ele pensou por um tempo, coçando o queixo.
- Acha que consigo passar um tempo em sua casa? – eu abri a boca, não querendo recusar, mas sabendo que não poderíamos alimentar mais uma boca – Pagando, é claro. – ele se apressou em acrescentar – Tenho minhas economias.
Isso me animou. Meus pais com certeza adorariam um dinheiro extra, e Patrick poderia dormir no meu quarto.
Levei-o até a horta de meu pai, que já estava coberto de terra e impaciente com a minha demora. Ficou surpreso quando viu o garoto ao meu lado, mas não teve tempo de dizer qualquer coisa porque Patrick foi mais rápido.
- Senhor, fiquei sabendo que há a possibilidade de me alugarem um quarto por um tempo. – ele sorriu, tirando um maço de dinheiro do bolso – Eu gostaria muito de ficar e colaborar com outras coisas, também.
Quando minha mãe voltou para casa na hora do jantar, Patrick já estava posicionado no mesmo lugar da manhã, com minhas irmãs risonhas ao seu redor, e um prato servido. Ela arregalou os olhos, mas como meu pai estava com o maior sorriso de todos os tempos, optou por não fazer perguntas no momento.
Na hora de ir para os quartos, arrumei uma cama para mim no chão, mas Patrick fez questão de que eu não abandonasse o meu lugar de sempre.
- Boa noite, meninos. – minha mãe nos disse, não deixando que minhas irmãs espiassem para dentro do quarto – Por favor, não façam barulho.
- Com certeza, senhora. – ele respondeu, puxando a coberta até o queixo.
Assim que a porta fechou, Patrick pulou para fora e foi até a janela, onde sentou em meu lugar de costume. Ainda sem entender nada sobre ele, o imitei silenciosamente e me posicionei na outra ponta da janela.
- Realmente parece ter um sol lá, não é? – ele suspirou.
- Pode me contar sobre o bairro? – eu tinha esperado o dia todo para fazer essa pergunta.
Patrick sorriu, ainda olhando para as casinhas do outro lado do rio. Parecia perdido em pensamentos ou lembranças.
- O que posso dizer? – deu de ombros – É colorido, principalmente. As casas são grandes, pintadas em amarelo, laranja, vermelho...
- Muita gente vive lá? – institivamente inclinei meu corpo em sua direção.
- Sim, mas não tanto quanto parece haver aqui. – Patrick sorriu para mim – É bem diferente, Fred. As casas tem quintais com grama e flores, as pessoas estão sempre bem vestidas...
- Uau... – arregalei os olhos – Parece incrível.
- Nem tanto. – Patrick voltou a olhar pela janela – As pessoas são mais distantes, menos acolhedoras. Ninguém se preocuparia em ajudar um desconhecido como você fez.
- E por que não? – fui mais para perto dele.
- Porque ninguém se preocupa com outra pessoa além de si mesmo.
Com isso, Patrick deixou a janela e voltou para sua cama improvisada. Eu esperava tirar mais informações dele, mas logo percebi que seria inútil. Voltei para minha cama também, e minutos depois nós dois estávamos dormindo.