-Primeiro de tudo, eu quero me desculpar. Entendo que eu fui completamente grosseiro contigo quando te puxei daquele jeito para o carro. -Coçou o nariz e começou a andar pelo cômodo. -No entanto, eu precisava fazer isso para que a Ayanna entendesse que não estou aqui de brincadeira.
Consegui erguer minha cabeça para ele mas o meu cabelo está me impossibilitando de enxergar as coisas ao meu redor.
-Você acredita que ela teve a audácia de se esconder durante esses 6 anos para simplesmente não me devolver tudo o que está me devendo? -Sorriu e se aproximou de mim mais uma vez. -Acontece, minha querida, que eu não esqueço de quem tem uma dívida comigo. -Segurou em meu cabelo e o puxou para trás, me forçando a te olhar. -Então eu vi vocês duas, juntinhas. -Sorriu mais uma vez. -E eu percebi que essa era a oportunidade perfeita para um acerto de contas.
Minha respiração começou a ficar pesada por conta do pano em minha boca e eu comecei a ficar desesperada.
-Até porque se vocês duas estavam juntas, então isso quer dizer que vocês se conheciam...
Neguei repetidas vezes e continuei tentando respirar.
-Então irei te deixar aqui comigo. -Começou a alisar a minha cabeça. -Até o dia em que eu enjoar da sua cara.
Senti um medo enorme tomar conta do meu corpo e tentei gritar, isso o fez rir.
-Espero que aproveite bem o seu novo quarto. Ele vai ser seu por muito, muito tempo. -Dito isso se levantou e começou a caminhar em direção a saída.
-Não, não, não, não. -Tentei dizer mas tudo o que saiu eram apenas palavras mal formadas.
Ele saiu e a escuridão tomou conta do lugar mais uma vez.
Zack narrando:
-Eu tenho que falar com você. Agora. -Falou assim que notou que eu não seria o primeiro a abrir a boca.
-Zack, entra. -Disse o senhor Gomes já dentro do carro.
-Por favor. -Insistiu.
Olhei para os dois e o pouco de sanidade dentro de mim respondeu.
-Eu tenho que fazer uma coisa. -Falei pra ele. -Encontro o senhor mais tarde.
(...)
-Zack. -Me chamou assim que eu já estava bem a sua frente na calçada. -Meu filho.
-Meu filho? -Me virei para ela. -Desde quando eu me tornei seu filho, hein? Porque pelo que eu saiba as mães de verdade não abandonam um filho de 3 anos de idade e depois faz ele acreditar que você estava morta esse tempo todo!
Ela respirou fundo e tentou me tocar.
-Olha, eu entendo a sua raiva. Entendo mesmo.
Puxei o meu braço assim que sua mão encostou nele.
-Mas será que a gente pode conversar em um lugar mais reservado?
Neguei e fiquei encarando seu rosto. Tão diferente do da foto. Seus cabelos que antes eram curtos agora estão até o meio das costas e a sua franja a deixou bem mais jovem do que provavelmente deve ser. Ela é bem mais alta do que imaginei e por incrível que pareça os nossos olhos são completamente idênticos.
-Como pôde mentir pra mim durante todo esse tempo? -A frase saiu mais baixa do que eu planejei.
-Se eu pudesse fazer tudo diferente eu com certeza faria, filho. -Sua expressão ficou triste. -Eu jamais tive a intenção de deixar você e a sua irmã. Mas nem tudo o que o seu pai te contou é verdade.
-Ainda quer que eu acredite na sua versão?
-Olha, eu nunca quis que vocês dois pensassem que eu morri. Eu não... -Passou as mãos no cabelo, provavelmente tentando encontrar as palavras certas. -Eu fui presa.
-O que? -O choque de suas palavras me fizeram ficar sem reação.
-Eu não tive a intenção de deixar você e a Grace com o seu pai. Jamais quis que vocês dois crescessem no mesmo lugar daquele canalha.
-Não fala assim do meu pai. -Apontei um dedo em sua direção.
-O que? Você realmente acha que ele é o bonzinho da história? -Sorriu e negou em seguida. -Por que é que ele mentiria pra vocês sobre mim? Por que é que ele te colocou naquela escola? Acha mesmo que era pela qualidade de ensino? É claro que não, Zack. Foi pra te manter longe o suficiente de mim. E quanto a sua irmã, você realmente acredita que ela mora lá com a sua tia por conta própria? Seu pai a obrigou para que não vissem que sua "filhinha" estava grávida.
-Como é que você... como sabe disso tudo?
-Ah, por favor, já fazem seis anos que eu venho tentando ter contato com vocês. É claro que não poderia ser de uma forma direta por conta do rolo em que me meti, então eu sempre tentava de alguma forma acompanhar a vida de vocês. A primeira vez que consegui falar diretamente com você foi lá na sua escola no começo do ano letivo.
-Então era você...
-Eu não podia deixar você saber que era eu. Isso estragaria completamente tudo o que venho fazendo durante todo esse tempo.
-E o que é?
-Zack, olha...
-Fala logo, Ayanna. -Ao escutar o seu nome vindo de minha boca, isso a fez respirar fundo, provavelmente estava esperando que eu a chamasse de mãe. Só que isso não vai acontecer.
-Eu me meti em um rolo há 14 anos atrás. Me envolvi com pessoas erradas.
Cruzei os braços.
-Cacete. -Deixei escapar.
-Graças a isso eu acabei presa e fiquei durante 8 anos lá dentro. Nos outros 6 eu fiquei me escondendo porque estou devendo muita grana para essas pessoas erradas.
-Puta merda. -Passei a mão na cabeça. -Por favor me diz que você não tem nada haver com o desaparecimento da Alexia.
-Eu não queria que isso acontecesse.
Neguei repetidas vezes e voltei a andar. É loucura. Tudo isso é uma loucura.
Eu só queria acordar desse pesadelo e voltar a minha vida antes da Alexia ter recebido aquela notificação lá na escola.
-Zack, eu juro que não fiz de propósito.
-E você acha que isso ajuda!? -Gritei. -Acha que por não ter sido de propósito isso vai trazer ela de volta? Ela pode estar morta agora! E tudo isso é culpa sua.
-Eu só queria conversar com ela.
-Vai se fuder. -Me virei mais uma vez. -Eu vou te denunciar.
-E vai dizer o que? -Pegou em meu braço e me virou para ela. -Como é que eles vão pensar que você ficou sabendo disso? Agora você também é cúmplice.
-Eu te odeio. -Olhei em seu rosto. -Não sei nem por que é que me dei ao trabalho de tentar te escutar.
-Eu sei o quanto tudo isso está doendo em você, Zack. E sei que grande parte disso é minha culpa. Mas por favor, eu estou quase te implorando, você tem que me ajudar.
-Te ajudar no que? Quer que eu comece a vender droga também?
-Pra Alexia sair viva de lá, nós temos que pagar o valor que ele mandar.
-Nós? Como assim nós? Foi você quem se meteu nisso. Além de se meter ainda fez a minha namorada ser feita de refém!
-Acontece que eu não tenho o dinheiro. -Gritou também. -Não tem como eu fazer isso sozinha.
-Ah, tá. E então você veio até mim porque pensa que eu tenho. -Ri. -Eu sequer tenho uma casa aonde morar. -Ela ficou me encarando, como se estivesse surpresa. -O que? Você achou mesmo que meu pai ainda tinha a empresa? Nós estamos completamente falidos, no fundo do poço.
-Mas como...
-Meu pai está preso, Ayanna. Eu e Valentina estamos nos virando da forma que conseguimos para conseguirmos uma casa para podermos sair da casa do senhor Gomes.
-Eu não entendo.
-Não tem como eu te ajudar. -Me aproximei dela. -E assim eu estou dando a sentença de morte para a pessoa que eu estou apaixonado. -Dei um chute na cerca que está ao nosso lado. -Eu nunca mais vou vê-la. Sequer tive a chance de dizer o quanto ela é importante pra mim. -Me abaixei no chão e tentei controlar a respiração.
-Zack. -Se abaixou ao meu lado. -Nós vamos dar um jeito. Vamos dar um jeito, entendeu?
Senti sua mão tocando o meu ombro e dessa vez eu não tirei.
-Eu só quero ter ela do meu lado. -Senti uma lágrima caindo então a sequei o mais rápido que consegui. -Eu não vou aguentar ver ela morta.
-Vai ficar tudo bem, filho. -Ela se aproximou mais e envolveu seus braços ao meu redor em um abraço. No começou eu demorei a retribuir mas logo fiz o mesmo.
Apesar de todo esse caos, sentir pela primeira vez o abraço de minha mãe é uma coisa completamente inexplicável e eu não tenho palavras pra descrever o quanto isso está curando uma ferida que foi aberta há muito tempo dentro do meu peito.
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