- Ah, é? Já tivemos um encontro secreto? Será que você é uma das mulheres do meu passado? - Tocou o rosto dela. - Deve estar enganada. Eu me lembraria, sem dúvida.
- Já sei! Numa revista! Não, não foi. Coisa parecida... - Desceram, ele pegou sua mão e foram andando. - Não, não está certo também. Você tem barba e o homem que eu estava pensando não tinha.
- Se fosse você, eu desistia.
Zander andava tão depressa que ela precisava correr ao lado dele. Estavam perto do restaurante da cobertura. Lá dentro quase não havia luz e parecia cheio de gente. Na semi-obscuridade, chegaram a um terraço coberto.
O vento quase tirou a respiração de Lisa. Bem que podia ter trazido um casaco, pensou, estremecendo. Zander não percebeu: olhava para fora, mas seus pensamentos não pareciam estar nas montanhas escuras de cinza e lava, à distância.
- Quanto da ilha você viu? - perguntou, afinal.
- Só o que dá para avistar do meu terraço, de dia. Passamos o resto do tempo na praia.
- Para se bronzear? Não acredito. Foi para isso que veio? Só para ficar morena?
- Faço parte de um grupo de três. Se sou minoria, tenho que ir junto com os dois, não é? Eu duvido que meus amigos vejam muito, além dos próprios narizes. Além disso, ainda é muita bondade deles deixarem que eu vá atrás, atrapalhando os dois.
- Gosta de ir atrás deles?
- Eu... Não, não gosto. Mas também não acho a menor graça em andar com um bando de turistas barulhentos que não conheço.
- Suas férias não estão lá grande coisa, não é? Sabendo que ia sobrar, por que não cancelou sua reserva?
- Fiz o possível, mas insistiram para que eu viesse. Disseram que depois de cinco semanas de casados seriam como um velho casal, mas ainda não conseguem parar de se olhar apaixonadamente.
- Não sei por que se espanta com isso, se tinha um namorado há até tão pouco tempo.
Ela corou.
- Era um namorado, não era meu amante. Pode fazer essa cara de quem não acredita, que nem me importo. Estou falando a verdade.
Ele ajeitou seus cabelos despenteados pelo vento. Não adiantou nada, as mechas voltaram a cair no rosto. Zander afastou-as outra vez, agora usando as duas mãos, e se inclinou de repente beijando-a nos lábios: um beijo de amigo, beijo que não pedia nada, sem grande desejo. Foi por isso que ele gostou e sorriu.
- Você é uma coisinha fofa e macia - ele murmurou com um forte sotaque escocês.
- A quantas mulheres já disse isso nos seus passeios pelo mundo? - Lisa perguntou, meio de brincadeira, mas querendo muito saber a verdade. Era perigoso gostar desse estranho de olhos vivos, muito perigoso mesmo, e a maior bobagem sentir tanto prazer num único beijo.
Ele não gostou nem um pouco da pergunta e ela percebeu pelo olhar que esfriou.
- Centenas, milhares de mulheres. Minhas mulheres estão espalhadas pelo mundo todo. - Percebeu que ela enrijeceu o corpo e puxou-a para mais perto, abraçando-a pela cintura. - Eu estava brincando. Não é meu costume correr atrás de mulheres, aproveitar o que posso, e depois deixá-las para trás.
Lisa sentiu um frio no estômago.
- Mas agora vai fazer uma exceção à regra?
- É o que quer? - Estava sério.
- É claro que sabe a resposta, não é?
- Pelo seu encorajamento de hoje, achei que ia dizer "sim", se eu perguntasse.
Ela se desvencilhou com um empurrão.
- Sinto muito se lhe dei essa impressão. - Olhou para a noite escura e, para seu desapontamento, a voz saiu engasgada. - Não entendo por que uma mulher não pode mostrar que gosta de um homem, sem que ele imediatamente tome isso como sinal de que ela quer ir para cama.
- Ah, então gosta de mim. Já é um bom começo. - Passou o braço por seus ombros. - Vamos, vou levar você para seu quarto.
- É um bom começo de quê? - perguntou ela, ao entrarem no elevador.
- Da amizade que você parece prezar tanto.
De volta ao salão de baile para pegarem suas coisas, passaram pelos três homens com quem Zander havia jantado. Um voltava da pista, abraçado com uma garota bonita e falou bem alto:
- Oi, chefe!
Lisa notou que Zander não respondeu.
- Um de seus amigos lhe chamou.
- Chamou? - foi a resposta desinteressada. Vestiu o casaco e levou-a até a porta por um caminho diferente.
- Por que ele lhe chamou de chefe?
- Alguém tem que dirigir uma construção.
Entraram no elevador.
- Então é você que toma conta? - perguntou, impressionada.
- Bem, não está escrito "patrão" no meu capacete de segurança, mas é o que sou. - Lisa sorriu. - Qual é a graça?
- Homens de alto nível precisam da companhia de mulheres de alto nível, o que significa - olhou-o, desafiadora - que já fui descartada. Vai me deixar e procurar alguém de um nível social mais alto do que uma mera secretária. - Saíram do elevador e ela olhou em volta. - Mas pode não ter sorte. Não há muitas mulheres administradoras dando sopa por aqui, nem mesmo nesses dias ensolarados.
Abriu a porta do quarto, e ele entrou sem ser convidado, agarrando-a pelos ombros.
- Não precisa ser tão agressiva para me ofender. Ainda mais, quando não entende nada do assunto que está falando. - Os olhos castanhos dele fuzilavam. - Homens de alto nível procuram mulheres inferiores em suas escapadas.
Lisa tentou se desvencilhar, mas ele a abraçou com firmeza, deixando que sentisse seu desejo que aumentava, e ela gritou:
- Não faça isso! Não sou quem você pensa!
A boca de Zander impediu qualquer protesto, poderosa, lutando contra os lábios apertados da moça. No fim, ele ganhou, forçando sua cabeça para trás e saboreando a doçura da sua boca, até ela engasgar, sem ar.
Quando se afastaram, Lisa viu que havia raiva nos olhos dele e ficou intrigada. Ela é que tinha sido usada; não seria mais lógico que ela ficasse furiosa?
Seu coração batia, agitado; não, de raiva, mas de excitação. Tirou os braços do pescoço de Zander e descobriu que o bom humor dele, ainda que cínico, havia voltado.
- Homem de classe acaba de encontrar mulher de classe. E, melhor ainda, mulher sem pretensões administrativas. Bem, Lisa, qual é a resposta? Sim ou não?
- Por que tudo isso? - perguntou, sem encará-lo.
- Então, devo entender que sua resposta é não. Sinto muito, Lisa. Boa noite.
Ele a soltou e foi embora. Para tristeza dela, não olhou para trás nem uma vez.
Lisa estava sentada à mesa, sozinha, com a cafeteira vazia sobre a bandeja e um guardanapo amassado do lado. Há muito desistira de procurar os amigos. Com certeza, tinham tomado o café da manhã no quarto.
Continuou de olho na entrada, procurando a figura alta e bronzeada do homem em quem não parava de pensar. Depois de rejeitá-lo na noite anterior, provavelmente nunca mais o veria.
Seus amigos desciam a escada de mãos dadas. Correram para ela, cheios de desculpas, que Lisa aceitou com um sorriso alegre, mas que não vinha do coração. Tudo bem, dizia seu ego mais intolerante, eles estão em lua-de-mel, mas sabiam que ela estava sozinha. Será que não podiam se esforçar um pouco para lhe fazer companhia, como no começo?
- Sem ninguém? - perguntou Phil.
Myra viu Lisa franzir a testa e disse, um pouco ansiosa:
- Você é que vai fazer os planos para hoje.
- Se vocês dois querem ficar sozinhos não se preocupem comigo. Vou ficar muito bem, na piscina, tomando sol.
- Era exatamente o que íamos fazer - falou Myra, e Lisa notou o alívio em sua voz.
Na realidade, não queria passar outro dia de suas preciosas férias se bronzeando. A estranha e misteriosa paisagem da qual só vira pedaços aqui e ali, a atraía irresistivelmente. E aquilo que havia dito a Zander Cameron, de sentir-se muito mal no meio de turistas desconhecidos, era a pura verdade.
- Vou vestir o maio - disse a Myra - e encontro vocês no lugar de sempre.
Ao subir a escada, passou por dois homens com rostos conhecidos. Estavam de macacões brancos e eram os amigos de Zander. Quando se cruzaram na escada larga, um deles, louro e muito jovem, piscou para ela. Lisa ficou espantada e um pouco ressentida com a intimidade, mas retribuiu o sorriso. Ele levantou o indicador, num sinal de "tudo em ordem". Ela não entendeu absolutamente por quê.
Foi ao encontro dos amigos perto das rochas de lavas que despontavam do mar formando um pequeno recife na areia dourada. Sentou-se e colocou a sacola de roupas e as toalhas ao lado. Os dois estavam nadando. Myra a viu e acenou, gritando qualquer coisa que ela não entendeu.
Resolveu dar um pouco de sossego ao casalzinho e foi nadar quando eles voltaram. Demorou bastante tempo dentro d'água. Quando saiu, encontrou-os abraçados na areia e sorriu. "Sorte a de vocês por terem se encontrado", pensou. Negava-se veementemente a pensar que existisse inveja em seu coração. Será que havia?
Já era meio-dia e Lisa estava inquieta. Myra e Phil pareciam dormir, agarradinhos como sempre. Ela se levantou devagar, amarrou os cabelos ainda úmidos num rabo-de-cavalo, e foi andando em direção ao recife de lava. Subiu nas pedras e encontrou um lugar bom para sentar, com os pés na água gelada.
Alguém gritou e ela virou a cabeça, automaticamente. Um homem estava ali perto, na areia. Reconheceu-o na hora: era o louro que tinha piscado para ela. Sorriu para ele e virou-se de novo para a água clara. Por alguma razão que não podia explicar, não gostava dele. "Se eu o ignorar, ele vai embora".
Mas o homem não foi. Logo, estava sentado a seu lado, puxando conversa:
- Sozinha?
Lisa ficou quieta.
- Está aproveitando as férias?
Ela fez que sim com a cabeça.
- Sorte sua. Eu estou aqui a trabalho.
- Não parece.
Ele riu, satisfeito por ter conseguido umas palavras dela.
- Todos precisam se divertir pelo menos um pouco, não? Você não parece estar se divertindo muito. - Tocou o braço dela de leve. -Não podíamos nos divertir juntos?
Sem responder, Lisa entrou na água e atravessou a barreira de pedras que levava a baía.
- Ei! - gritou o rapaz. - Não fuja de mim assim!
- Obrigada por conversar comigo - gritou por sobre o ombro -, mas estou feliz com meus amigos! Não estou atrás de um namorado de verão. Sinto muito.
- Ora, muito bem. - O rapaz suspirou. - Não dá para ganhar todas. Tchau! - Afastou-se.
Lisa pegou uma toalha e curvou-se para enxugar as pernas e os pés. Sem querer, levantou a cabeça e viu o rapaz fazer um sinal com o polegar para baixo para um homem alto, magro, bronzeado... e barbudo.
Olhavam para ela e conversaram. Zander Cameron concordava com o que o outro dizia, com acenos de cabeça. Lisa sentiu uma onda de fúria dominar seu corpo. Então, ele a estava testando, usando um dos amigos como isca!
Virou-se de costas para os dois, soltou os cabelos e começou a secá-lo. Duas mãos seguram as delas de repente.
Desvencilhou-se e o encarou, furiosa.
- Agora que já me testou e me achou de bom nível moral, acha que pode me dar a honra de sua companhia outra vez, não é? Pois não quero, obrigada. Pode ir fazer esse favor a outra mulher. Há muitas, escolha à vontade...
Os olhos dele ficaram frios como o vento da praia. Girou nos calcanhares e começou a subir o declive que levava ao hotel.
Ia embora. E tinha que encarar o fato de que estava indo embora de sua vida. No momento em que percebeu isso, que ia perder aquele homem por causa de um orgulho bobo, percebeu também que havia sido mais tola ainda de deixar que em tão pouco tempo ele se tornasse tão importante para sua felicidade.
- Zander, não vá! - O pedido foi feito com toda a espontaneidade e ela se recriminou por revelar sua vulnerabilidade. Havia posto uma arma na mão dele e, sendo o homem que era, com certeza a usaria.
Zander parou imediatamente, mas não se virou. Sem fôlego, Lisa esperou que ele continuasse, mas não foi o que aconteceu. Virou-se e parou a uma certa distância dela.
- Por quê? Me acha útil, é isso? Uma companhia? Ou resolveu achar que você e eu fazemos um casal simpático, afinal de contas?
Seu distanciamento e ironia, deixaram Lisa sem fala por um instante. Estava usando a arma que ela lhe dera. Mais alguns momentos e a golpearia.
- Gosto de você, Zander, já lhe disse. Gosto da sua amizade.
"É muito mais do que amizade o que sinto por ele", dizia seu coração. "Muito mais. Como posso ser burra a ponto de me envolver tão depressa? Será que não aprendi nada com Don sobre a inconstância dos homens?"
Só que esse homem não se parecia com Don. De jeito nenhum. Era só ficar perto dele para sentir sua força, que a envolvia toda.
Zander aproximou-se, sorriu para ela e abriu os braços. Lisa refugiou-se neles, o rosto encostado em seu peito. A barba picava sua testa, e ela riu.
- Atrapalha muito. Por que não raspa isso?
- Isso eu não faço.
- Mas quero ver o homem escondido atrás dessa barba.
- Talvez não gostasse do homem.
- Talvez eu o amasse.
Uma sombra de amargura passou pelo rosto dele.
- Aposto que não. Você o odiaria. - Beijou-a. - Um dia, vou pegar esse sorriso e guardar no bolso.
- Para sempre?
- Para sempre.
Lisa sorriu, mas sentiu-se perturbada.
- Você nunca o jogaria fora, nem mesmo quando as férias acabassem e a gente não se visse mais? - Continuou a olhá-lo dentro dos olhos. - Mesmo quando for casado e cheio de filhos?
- Já lhe disse: sou um cidadão do mundo. O que um homem como eu ia fazer com mulher e filhos?
Era uma pergunta que ela não sabia responder. Fechou os olhos para esconder a pontada de dor que sentiu. Ele diminuíra a força de seu abraço e ela pôde perceber, então, Myra e Phil no alto das rochas, observando-os.
Sabia que os dois iam mostrar todo o tato que tinham e desaparecer, de modo que acenou convidando-os a se aproximar.
- Meus amigos estão ali.
- Deixe-os em paz. Só podem querer um ao outro. Com certeza, estão encantados por você ter encontrado um par.
Quando Lisa se deu conta, os amigos já tinham ido embora. Dessa vez, teve que admitir um certo alívio por se comportarem com tanta discrição?
Zander desceu as mãos pelas costas dela, acariciando-a, com o olhar perdido no mar. Sem saber por que, Lisa teve a impressão de que ele sofria e pensava em outra pessoa. Era como se acariciasse uma lembrança penosa.
- Zander? Quem você está agradando? Não sou eu. Você está tão longe! Alguma antiga namorada?
Ele sorriu, de leve.
- Uma garota que conheço.
Lisa fez que sim com a cabeça, esperando demonstrar que compreendia que ele não queria excitá-la, mas que estava com saudade de alguém. Depois, sentou-se na areia e ele se deitou a seu lado.
- Está de folga hoje?
Zander correu o dedo por sua espinha, fazendo com que se arrepiasse toda.
- Eu sou o patrão. Fico de folga quando quero.
Lisa desenhava com o dedo na areia dourada.
- Deve ser gostoso poder fazer o que a gente quer.
Um braço musculoso a agarrou pela cintura, puxando-a para trás.
- Não faço sempre o que quero. Só às vezes. - Começou a acariciar seus seios. - Você é tão macia...
- Como é que sabe? - perguntou, e só então percebeu o desafio em suas palavras.
Protestou quando ele a fez virar e deitar em seus braços, bem juntinho, coração batendo contra coração.
- Estou com sede - anunciou Lisa, só para ser tomada de surpresa quando ele levantou o corpo um pouco e beijou-a.
- Melhorou?
Ela sacudiu a cabeça, muda, ganhando outro beijo, mais ousado ainda.
- E agora?
- Melhorei, melhorei. - Desvencilhou-se dele. - Mas eu não quis dizer isso, você sabe muito bem. - Começou a mexer na bolsa e perguntou: - Essa barba não incomoda, neste calor?
- Você não tem nada com isso, o problema é meu. - Vendo-a franzir a testa, magoada com a grosseria, continuou, mais delicado: - Além disso, já disse que você não ia gostar do homem atrás dela.
Lisa tirou uma garrafa de água mineral da bolsa e respondeu:
- Pura bobagem. Você é o mesmo homem com barba ou sem barba.
- Pensei que estava com outro tipo de sede.
Lisa sorriu e tirou a tampa de borracha.
- Concordo em mudar de assunto. - Quando ia levar a garrafa à boca, parou. - Não trouxe copo. Se importa se eu não me comportar como uma garota bem educada?
- Sabe de uma coisa? Gostaria que fizesse isso o tempo todo. De preferência, numa noite de lua cheia, sem ninguém por perto.
A única resposta dela foi um sorriso rápido. Zander ajoelhou-se e segurou seu rosto. Os olhares dos dois cruzaram, e uma emoção diferente começou a brotar entre eles.
Passaram-se alguns segundos nervosos. Os lábios de Lisa tremiam, antecipando o beijo. Beijo que não veio. O momento passou. Zander soltou-a e ela bebeu um gole de água, oferecendo depois a garrafa a ele, que também bebeu.
Lisa ficou olhando para o mar, abraçando os joelhos. Era demais u prazer que sentia de estar com esse homem. Parecia conhecê-lo há anos, era como se ele a completasse. Impossível saber o que sentia por ela. Mas seria bobagem acreditar que representava algo mais do que outra mulher em sua longa lista de conquistas.