- Por favor, desculpe. Obrigada pelo passeio e por agüentar a minha simplória companhia.
Ele segurou seu braço.
- Desça do pedestal. Se eu a ofendi, sinto muito, mas sabe que qualquer homem reagiria assim às suas perguntas.
- Tomarei mais cuidado da próxima vez. Se houver uma próxima vez.
Começou a subir a escada e ele foi atrás.
- Jante comigo hoje.
- Não quero saber se é uma ordem ou um convite. A resposta ia ser a mesma: não, obrigada.
Zander deu de ombros e foi embora.
No quarto, Lisa jogou-se numa cadeira, tremendo de raiva e frustração.
Graças aos céus, Myra e Phil. estariam lá para dividir a mesa. Quando Zander entrasse com os amigos, ela teria o maior prazer em virar as costas para ele e ficar rindo e conversando. Assim, esconde ria sua profunda mágoa por ele ter encarado com tanta displicência sua recusa.
Fez exatamente como planejou. Quando ele entrou, ela mudou para a cadeira do lado, fazendo barulho e sabendo que atrairia atenção de Zander. Depois, fingiu adorar as graças de Phil, rindo mais alto do que Myra.
No fim do jantar, Phil convenceu a mulher a ir dançar.
- Venha conosco - insistiu Myra. - Seu amigo barbudo vai procurar você lá. Aliás, ele está olhando para suas costas como se quisesse esganá-la. Brigaram?
Lisa levantou os ombros já bronzeados,
- Ele queria jantar comigo e recusei. Só isso.
- Só isso? Meu Deus! - exclamou Phil. - Não é à toa que ele está com aquela cara fechada. Deve ter ferido o orgulho do cara.
Lisa não explicou que era exatamente o contrário, ele é que tinha ferido o dela.
- Eu não vou, obrigada. Divirtam-se. Vou escrever uns cartões para alguns amigos.
- Tem certeza? - perguntou Myra, ao se separarem na recepção. Lisa concordou, enfaticamente, e eles foram embora, de mãos dadas.
Ela não escreveu os cartões como pretendia. Inquieta, foi para o terraço e ficou olhando o pessoal que gostava de tomar banho de mar à noite. Logo se juntaria a eles, mas para um passeio a pé pela areia da praia. Primeiro, ia ler um pouco.
Era mais fácil decidir do que levar a avante a intenção: o livro que tinha comprado era até bom, mas não prendia sua atenção. Tentou uma revista. Folheou, leu uns artigos e dois pequenos contos. A inquietação voltou.
''Saia desse quarto. Vá fazer alguma coisa, andar, passear." Obedeceu ao instinto porque não agüentava mais ficar ali. Ia sair, quando o telefone tocou. Seu coração disparou.
- Alô?
- Quer dançar comigo? - A pergunta foi direta como se ela estivesse sentada na mesa perto da pista. A voz baixa e rouca trouxe o charme sensual de Zander para dentro do quarto. Assim mesmo, a resposta foi incisiva e curta:
- Não, obrigada. Ache outro par.
Desligou, cruzou as mãos no colo e ficou esperando outra chamada. Nada, a não ser silêncio. Ficou zangada por ele, pela segunda vez naquele dia, não tentar convencê-la com mais insistência.
Irritada, resolveu ir nadar.
Alguns minutos depois, descobria como o mar estava gelado. Mas era melhor do que ficar trancada no quarto. Foi até as rochas semi-submersas nas quais tinha estado com o amigo de Zander. Só de pensar nisso ficava com raiva, o que lhe aumentava a força das braçadas.
- Cuidado com as pedras! - O grito veio de longe. Reconheceu a voz, mas não ligou para o aviso. Aliás, ele não precisava chamar sua atenção, pois se lembrava muito bem da textura e das arestas pontudas das rochas.
Apesar disso, arranhou a perna ao subir. Na semi-obscuridade, não dava para ver direito o machucado. Nem o nadador que se aproximava com largas braçadas. Só o percebeu quando sentou-se ao lado dela.
- Por que veio atrás de mim? Todas as outras mulheres já arranjaram par?
- Quem disse que segui você? Vim porque quis. Para dar um mergulho.
- Então, o que está fazendo, sentado ao meu lado?
- Você, que se parece com a deusa Vênus, precisa perguntar isso a um homem?
Enfrentou o olhar dele, decidida a não permitir que a deixasse embaraçada.
- O que é? Está me olhando tanto para ter a certeza de que sou homem? Não preciso fazer isso para saber que é bem feminina. Ainda mais, vestida assim.
Num impulso, Lisa escorregou para dentro da água e nadou para a praia. Ele a seguiu imediatamente. Alcançou-a na areia e tirou a toalha de suas mãos.
- Estou com frio, Zander. Por favor, deixe eu me enxugar. - Quase não conseguia vê-lo, no escuro. A praia estava vazia.
Ele não respondeu e começou a secá-la devagar.
- Chega, está bom. - A sensação de ser tocada por ele, mesmo através da toalha, era demais para agüentar sem ter vontade de tocá-lo também. - Agora, preciso secar o cabelo.
Zander deixou a toalha cair no chão e puxou Lisa pela cintura para baixo, de modo que se deitaram sobre ela. Abraçou-a com força e beijou-a com uma fúria que até machucou.
Agora não podia deixar de retribuir seu ardor. O corpo movia-se. junto com o dele, coxas com coxas, quadris com quadris. Só quando sentiu a barba dele roçando os seios, percebeu que havia tirado o sutiã de seu biquíni. Mas já não ligava para mais nada.
- Meu Deus, como eu quero você, Lisa. - As palavras saíram roucas. - Eu quero você, entendeu?
O mar quebrava em ondas murmurantes, chegando às pernas deles. A maré subia. Uma meia-lua brilhava no céu estrelado.
- A maré, a maré, Zander!
- Deixe a maré subir. Deixe que ela nos pegue e nos leve embora, abraçados, para a eternidade.
- Zander, nossas coisas vão ficar encharcadas, e estou morrendo de frio.
Arrepiou-se toda, e seu corpo trêmulo nos braços dele fez com que voltasse à realidade. Levantou-se e puxou-a. Sorrindo, ela pediu que ele abotoasse o sutiã do biquíni. Depois, vestiu o roupão atoalhado e esperou que ele também se vestisse.
Voltaram para o hotel devagar e tomaram o elevador sem conversar. Na porta do quarto, ela disse:
- Obrigada por me trazer até aqui. Boa noite.
Zander pegou a chave de sua mão, abriu a porta, fez com que entrasse e a seguiu.
Lisa estendeu a mão.
- Você está com minha chave - lembrou, com um sorriso inseguro.
- Vou devolver, quando conseguir o que quero.
Ela baixou os olhos para esconder as emoções conflitantes. Era imperativo que Zander não visse o quanto queria ceder ao desejo. Os braços dele a envolveram pela cintura, puxando-a contra si.
- Você não falou, mas juro que está acontecendo muita coisa aqui dentro. - Tocou a cabeça dela.
- Só estou pensando no melhor jeito de pedir desculpas, porque é uma coisa que não faço.
- Não faz o quê?
- Não dou aos homens o que eles querem,
Ele riu e seu rosto se iluminou. Ela franziu a testa, estranhando um homem rir quando lhe davam o fora.
- Nem quando o que eles querem é um simples sorriso?
Lisa sorriu, ao mesmo tempo aliviada e desapontada.
- Ela riu! Vou pegar esse! - Abraçou-a apertado e beijou-a.
Gostava de ser apertada assim. Quando ele levantou a cabeça, seus olhos castanhos lhe diziam de todo o seu prazer e desejo não realizado.
- O que vai fazer com meu riso? Colocar numa página inteira do álbum?
- Vou fazer melhor do que isso. Vou gravar e pôr para tocar nos momentos mais tristes e solitários.
- Solitários? Não é mesmo casado?
Zander ficou sério de repente e soltou-a.
- Não, não tenho uma mulher. Boa noite, Lisa.
Não podia deixar que fosse embora sem combinar um novo encontro.
- Amanhã você vai trabalhar?
Ele tocou seu rosto de leve.
- Não, vou passear. Passear pela ilha com uma mulher.
Lisa ficou tão desapontada que poderia ter chorado. Virou-se e disse, displicentemente:
- Ah, entendo.
- Não entendeu nada. Vou passear com você.
Ela não se importou de demonstrar toda sua alegria.
- Estarei pronta. A que horas?
- Lá pelas dez. Encontro com você na recepção, está bem?
- Está bem, na recepção.
Zander roçou os lábios nos dela.
- Não fique tão escandalosamente contente com a idéia! O homem gosta de ser o caçador.
Lisa deu um puxão na barba dele, que pegou sua mão e beijou. Ela ficou olhando, enquanto ele atravessava o corredor em direção ao elevador.
No café da manhã, Lisa explicou a Myra e Phil que passaria o dia com Zander.
- Então, afinal descobriu o homem especial que procurava - comentou a amiga, sorrindo para o marido e pegando sua mão. Era um gesto possessivo, que queria dizer que ele era o dela, o que Lisa achava comovente. Fez um muxoxo e empurrou a xícara vazia.
- Talvez. Mas não tem muito sentido, não é? No fim das férias não o verei mais. É um andarilho, foi o que me disse.
Phil fez uma expressão de aviso. Zander estava ao lado de Lisa, ora, sorrindo.
O coração dela bateu mais depressa e ficou vermelha. Será que ele escutado a conversa?
- Acabou o café? - perguntou Zander, depois de cumprimentar o casal. - Vamos? - Lisa concordou com a cabeça e se levantou. Sempre fazendo exatamente o que ele queria. Será que percebia o poder tinha sobre ela?
- Ela comeu feito um passarinho - comentou Phil.
- Acho que está apaixonada - acrescentou Myra, brincalhona, e escondeu o rosto com as mãos quando a outra a fuzilou com o olhar.
Zander riu, divertido com a irritação de Lisa. Foram andando e pegou a mão dela.
- Então, sou o homem especial por quem você estava procurando? É bom saber.
- É bom para o seu orgulho, tenho certeza.
Chegaram ao estacionamento do hotel.
- Se não tivesse tanta gente por aqui, eu te dava umas palmadas, para deixar de ser malcriada.
Ela entrou no carro e respondeu:
- Claro que seu orgulho está satisfeito. Como não? Para nós, não há futuro nem passado, o que nos deixa só com o hoje.
- Vamos, então, fazer o máximo com o hoje. O amanhã está chegando.
Lisa fechou os olhos. Como podia apreciar qualquer coisa dessa ilha fascinante, agora que o homem a seu lado a fizera lembrar o curto espaço de tempo que tinham juntos?
- Minha máquina! Eu queria ter trazido, minha máquina! O que é que eu faço, Zander?
- Tenho a minha, ali no banco de trás. É só me dizer a foto que quer tirar, que eu bato para você. Se me der seu endereço, mando depois.
Ela concordou e o coração bateu um pouco mais alegre ao pensar que a ligação com ele não se quebraria totalmente. Mas logo percebeu que não adiantaria nada manterem contato, estando tão longe um do outro. Seria só prolongar a agonia?
- Onde vamos?
- Até onde o carro nos levar. Estamos saindo agora - informou Zander -, e indo para o interior.
- Parece cada vez mais fantástico. É incrível essa terra coberta de cinza!
- As cinzas foram postas pelos fazendeiros. Espalham sobre o chão onde as sementes foram plantadas.
- Quer dizer que as ajuda a crescer?
- Para começar, protege as sementes do vento. Pode imaginar a importância disso num lugar em que não há fontes nem chuva.
- Como aprendeu tudo isso? - Olhou-o, admirada.
- No meu serviço preciso saber as coisas. Mas qualquer guia de turismo podia lhe dar essa informação.
- Então, tenho meu próprio guia.
- Cobro mais caro para turistas atrevidas.
A terra preta começou a se manchar de verde. Subiram ao topo de uma montanha e Lisa deslumbrou-se com a paisagem.
- São as vinhas da ilha - explicou Zander. - É, eu sei que é difícil acreditar que aqui crescem parreiras.
Pararam num restaurante. Lisa seguiu Zander por uma subida íngreme, de pedregulhos, até uma sala grande, escura e cheia de pessoas alegres.
- Você pode tomar quantos copos de vinho quiser - disse ele. - Contanto que eu não tenha que carregá-la de volta, em coma alcoólica.
- É muito doce - comentou Lisa, depois de provar um grande gole - e já está me subindo à cabeça.
- Então, chega. Senão não vai chegar à cidade andando.
Passaram por salinas onde bombas acionadas pelo vento puxavam a água do mar.
- Depois da evaporação - disse Zander -, os depósitos de sal são deixados aqui em grandes pirâmides. Há também uma indústria de dessalinização. Agora, com os turistas, tornou-se uma realidade.
A paisagem mudou de novo. Era a zona vulcânica. Lisa viu, atônita, que as montanhas haviam mudado a cor, de preto para tons de rosa, vermelho e verde.
- Logo estaremos na região das Montanhas del Fuego.
Almoçaram num restaurante circular, de vidro, construído para turistas. A comida era boa e o vinho ótimo.
Contente só por estar com Zander, Lisa aproveitou cada momento. «O passado estava seguro, preso em sua memória, e o futuro era um, vazio infinito. Só tinha o presente.
Depois, Zander tirou todas as fotos que ela pediu: da montanha e da praia lá embaixo.
- Apesar da linda paisagem, está faltando alguma coisa - disse ele. - Alguma coisa ainda mais bonita. - Sorriu ao vê-la intrigada.
- Posso demonstrar? - Deu-lhe um beijo, e, quando acabou e ia se afastar, ela o puxou e retribuiu com outro. Ele ficou de olhos brilhantes e depois enigmáticos, com uma expressão que ela não soube decifrar. Nunca, nunca mais seria tão feliz quanto hoje.
- Não tiramos nenhuma foto nossa. Vamos dar um jeito nisso.
- Primeiro eu! - disse Lisa, esticando a mão para a máquina, mas ele a impediu, bruscamente.
Ela se afastou alguns passos, mostrando sua mágoa pela grosseria. Zander riu.
- Não faça beicinho, menina, eu não queria ofender. É que essa máquina é cara, você precisa aprender a usá-la.
O rosto dela se desanuviou. O homem que conhecia tinha voltado:
- Então, me ensine. - E ele mostrou exatamente o que devia fizer.
Em pé a uma certa distância, ela o focalizou e o viu, por um segundo amedrontador, como a câmera não o veria: de terno cinza, com ar de autoridade, distante e frio. Rapidamente, abaixou a máquina e o encarou, para se assegurar que não estava ficando louca ou bêbada.
- E agora, o que há de errado?
- Nada. Só estou me ajeitando, como fazem os grandes fotógrafos.
Zander riu e ela esperou até que o riso se apagasse. Então, bateu a foto. Pronto, agora ele estava ali, dentro da máquina. Quando mandasse as fotos para ela, e alguma coisa lhe dizia que cumpriria a promessa, poderia segurá-lo, dormir com o retrato emoldurado na mesinha da cabeceira.
- Eu gostaria de ter uma foto de nós dois juntos.
- Não vai ser difícil. - Zander olhou em volta e escolheu um jovem pai de família. Trocou umas palavras com ele, que concordou em bater a fotografia.
- Mais uma! - gritou o homem, e pegou-os abraçados, Lisa com a cabeça no ombro de Zander.
Ele riu, virou-se, pegou-a pela cintura e beijou-a. A máquina fez clique de novo. Separaram-se, e só então ela viu que não era o mesmo fotógrafo.
O homem que segurava a câmara era o colega de Zander, o tal loiro.