Mas o chá esfriou. Scarlett pousou a xícara no aparador, com um ruído.
Não sabia o que a amedrontava mais. A lembrança da carranca de Blaise ou o medo do que Vin
Borgia faria agora, tomando posse de seu futuro, e do futuro de seu bebê.
Devia fugir.
Devia fugir agora.
Fugir seria a única forma de garantir sua liberdade.
Durante sua vida, Scarlett tinha vivido em mais de 20 lugares diferentes, cidadezinhas escondidas em
florestas e montanhas, às vezes em cabanas sem eletricidade ou água corrente. Raramente podia ir à
escola, e, quando podia, tinha de pintar o cabelo ruivo de castanho e usar outro nome. Coisas que são
comuns para crianças normais, como ter uma casa de verdade, amigos, ir à mesma escola o ano inteiro,
eram luxos que Scarlett apenas sonhava em ter. Ela nunca tinha praticado esportes, cantado no coral da
escola, e nem ido ao baile de formatura. Ela não havia sequer saído de verdade com alguém.
Até os 24 anos. No dia em que conheceu Vin Borgia, estava fraca, emotiva e vulnerável. E ele a
apanhou como quem pega uma borboleta em uma rede.
Olhou pela janela, para o jardim na parte de trás, cheio de rosas e hera. Um jardim secreto, rodeado
pelos arranha-céus de Nova York. Um lugar estranhamente calmo, verde, que parecia estar a
quilômetros do tráfego barulhento e da buzina dos táxis da Quinta Avenida. Levantou-se e começou a
caminhar.
Em uma tarde cinzenta e gelada do último mês de fevereiro, tinha ido buscar uma medicação para a
sra. Falkner, quando recebeu uma mensagem de um velho amigo de seu pai em Boston, com notícias
que a abalaram.
Alan Berry acabava de morrer em uma briga de facas inconsequente, em um bar sulista. O homem
que traiu seu pai 17 anos atrás, que fez um acordo para sua liberdade e forçou Harry Ravenwood a
fugir com a esposa doente e a filha pequena, teve uma morte idiota, depois de uma vida idiota.
De pé na farmácia, Scarlett sentiu os joelhos enfraquecerem. Ela se sentiu mal.
Cinco minutos depois, estava junto ao balcão de um bar do outro lado da rua, pedindo sua primeira
bebida. O gosto forte e ardido a fez tossir.
– Deixe-me adivinhar. – Uma voz grave e com um toque de humor vinda da banqueta de couro
vermelho no canto a alcançou. – É a sua primeira vez.
Virou-se. O homem saiu devagar das sombras. Olhos e cabelo negros. Ombros largos
impressionantes. Rosto anguloso. Terno preto. A noite nem havia caído e já havia uma sombra de barba
no rosto dele. Parecia um herói, ou um vilão bonitão, de um filme, tão masculino, imponente e bonito,
que a balançou mais que a dose de vodca.
– Foi um dia... difícil. – Sua voz tremeu.
Um sorriso irônico ergueu os cantos da boca dele, cruel e sensual.
– Por que outro motivo você estaria bebendo à tarde?
Scarlett enxugou os olhos com uma risada.
– Diversão?
– Diversão. Essa é a ideia. – O homem tinha se aproximado o suficiente para ver seus olhos
avermelhados e o rosto marcado de lágrimas no bar escuro. Tinha se preparado para perguntas, mas ele
apenas sentou-se na banqueta ao lado dela e chamou o garçom.
– Vamos ver se a segunda dose desce mais fácil.
Apesar do que sabia sobre ele agora, Vin Borgia ainda tinha esse efeito sobre ela. Quando Scarlett
viu-o no altar com sua noiva, todas as lembranças de sua noite juntos retornaram, quando ele a levou à
sua cobertura elegante caríssima, decorada em estilo minimalista. Ele a seduziu facilmente, tomando
sua virgindade como se fosse dele. Ele fez sua vida explodir em cores e alegria.
Scarlett sabia o nome de Vin, já que o porteiro o cumprimentou com o maior respeito, chamando-o
de "sr. Borgia". Mas nunca disse a ele seu sobrenome. Alguns hábitos não são facilmente esquecidos.
Um telefonema da enfermeira da sra. Falkner acordou Scarlett enquanto Vin ainda dormia. Só o seu
senso de dever a forçou a sair do calor de sua cama. Retornou à mansão dos Falkner, entregou a
medicação e procurou por informações de seu único amante na internet enquanto sonhava acordada.
Mas acordou rapidamente. Ficou horrorizada com o que encontrou.
Vincenzo Borgia era um cruel bilionário da aviação, surgido do nada, e que não dava a mínima para
quem machucasse em sua busca pela dominação mundial. Não conseguia imaginar como um homem
daqueles a havia seduzido, já que era sempre visto ao lado de socialites e supermodelos. Mas ficou grata
por não ter lhe dito seu sobrenome. Não o deixaria machucá-la.
Mais tarde, quando descobriu que estava grávida, imaginou se havia tomado a decisão correta. Mas
ver o anúncio do noivado de Vin no jornal selou o acordo.
Scarlett não esperava rever Vin. Planejava criar sozinha o bebê.
Não tinha medo da solidão. Havia crescido em meio a fugas, e seu pai lhe ensinou algumas coisas
quando sua mãe ficou doente demais para perceber. Coisas como bater carteiras, abrir fechaduras, e
principalmente, como ser invisível e sobreviver com quase nada.
Comparado com o que já tinha vivido, criar uma criança sozinha seria fácil. Não era uma fugitiva,
nunca havia cometido crimes, e sempre poderia trabalhar como assistente de enfermagem. Tinha até
algum dinheiro guardado. Não precisava mais se esconder.
Ou precisava?
Iria realmente arriscar-se a descobrir se Vin Borgia, o homem sobre quem leu tantas coisas horríveis,
poderia ser um bom pai? Ousaria arriscar só porque amava tanto seu próprio pai?
Podia ver o brilho leve dos grãos de poeira através de um raio dourado e fraco de sol da janela.
Pousou as mãos delicadamente sobre a barriga.
Vin a salvou de Blaise, mas homens ricos e poderosos têm algo em comum: querem estar no
controle. E Vin Borgia era mais rico e mais poderoso do que a maioria.
Ela devia ir embora antes que ele voltasse.
Agora.
Scarlett deu um passo e parou, lembrando-se de que suas mala e bolsa ainda estavam na limusine de
Blaise, com seu dinheiro, identidade, cartão de crédito, telefone. Como iria fugir sem dinheiro e
passaporte?
Desolada, baixou os olhos, seus dedos nus enfiados no tapete felpudo. Não tinha nem sapatos!
– Qual é o seu nome?
Virou-se para a porta. Vin havia entrado na sala, com sua mandíbula de granito, enquanto afrouxava
a gravata. Só olhar para seu corpo musculoso já lhe causava uma reação física, fazia-a tremer com uma
mistura de medo e desejo. Nem o smoking conseguia dar a Vin uma aparência completamente
civilizada. Não quando ele tinha aquele olhar duro e quase selvagem.
Engoliu em seco.
– Você sabe meu nome. Scarlett.
Ele olhou-a com raiva.
– Seu sobrenome.
– Smith – tentou.
Vin trincou os dentes. Virou-se. Pegou uma garrafa de água que estava em uma bandeja, em uma
mesa próxima. Encheu um copo.
– Seu nome é Ravenwood.
Abriu a boca em choque.
– Como você...
Colocando a mão no bolso do paletó, ele segurou a carteira dela, seu rosto bonito impassível.
– Como você conseguiu isso?
– Falkner mandou sua bolsa para mim. E a sua mala.
– Mandou? Você quer dizer jogou na rua?
– Quero dizer que os guarda-costas dele as trouxeram pessoalmente para mim, empilhadas, e com os
cumprimentos dele.
Oh, era bem pior do que ela temia. Scarlett suspirou:
– O pior homem que eu conheço tem medo de você?
Ele sorriu com arrogância.
– Não é incomum. – Estendeu a carteira para ela. – Aqui está. Dezessete dólares em dinheiro e um
cartão de crédito. Com limite de 800 dólares.
– Ei! – Scarlett agarrou a carteira. Seu rosto queimava. – Como você sabe o limite do meu cartão de
crédito?
Levantando o copo, Vin girou a água límpida cuidadosamente.
– Eu queria saber com o que estava lidando. Uma órfã que nunca morou por muito tempo em um
mesmo lugar, veio para Nova York para um trabalho humilde, guardou todo o dinheiro que ganhou
nos últimos dois anos, não fez novos amigos, trabalhou o tempo todo e não saiu nem uma vez. –
Inclinou a cabeça, olhando-a com olhos negros fechados enquanto murmurava: – Com uma rara
exceção.
Uma onda de calor atravessou-a, e então uma de frio. Não podia pensar naquela noite. Não agora.
– É muita audácia sua...
– Os Falkner mal pagavam salário-mínimo, mas você economizou cada centavo que pôde. Ética de
trabalho impressionante, considerando o seu pai fora da lei...
– Não ouse chamá-lo assim! – disse Scarlett perdendo a calma. – Meu pai era o melhor e mais gentil
homem que já viveu!
– É sério? – Os lábios de Vin curvaram-se. – Ele foi um ladrão de banco que se tornou fugitivo,
arrastou você e sua mãe para uma vida de fugas. Você não tinha dinheiro, mal foi à escola, sua mãe
morreu de uma doença à qual poderia ter sobrevivido com os cuidados adequados. Eu perdi alguma
coisa?
– Pare de julgá-lo – disse enraivecida. – Meu pai largou essa vida quando eu era bebê, mas um amigo
o convenceu a tentar uma última vez. Quando minha mãe descobriu, deu a ele um ultimato. Ele
devolveu o dinheiro ao banco de forma anônima!
– Por que ele não se entregou?
– Porque não queria deixar minha mãe. Nem a mim. Teríamos ficado bem, mas Alan Berry foi pego
gastando sua metade do dinheiro seis meses depois, e denunciou meu pai como suposto mentor do
crime! Depois que ele tentou fazer a coisa certa...
– A coisa certa seria seu pai se entregar logo no início – disse Vin de forma cruel –, em vez de esperar
dez anos para tomar coragem e arrastar você e sua mãe em uma vida miserável em fuga. A única
atitude realmente decente que seu pai já tomou foi morrer em um acidente de avião quando saiu da
prisão, deixando para você um acordo multimilionário oferecido pela companhia aérea. – Vin olhou-a
com curiosidade. – Você doou aquele dinheiro todo. Por quê?
– Eu não queria dinheiro sujo de sangue – sussurrou. – Doei tudo para caridade.
– Sim, eu sei. Pesquisa do câncer, defensoria pública para os pobres e ajuda a crianças de pais
encarcerados. Todas ótimas causas. Mas não entendo por que escolheu doar todo o dinheiro.
– Algumas coisas importam mais que dinheiro.
– Como, por exemplo, um bebê? Você me deixou seduzi-la e tirar sua virgindade, e fugiu enquanto
eu dormia. Nunca se incomodou em me procurar. Esperou até o dia do meu casamento para me contar
a novidade de que estava grávida.
– Eu não tive escolha.
– Havia muitas escolhas, Scarlett. Diga-me a verdade. Se Falkner não a tivesse ameaçado hoje, você
nunca teria me contado sobre o bebê, não é?
Ela o encarou por um longo momento e, por fim, sacudiu a cabeça.
– Por quê? – perguntou ele. – Você até se recusou a me dizer seu sobrenome naquela noite. Por quê?
Foi porque você também estava encorajando a atenção de Falkner?
– Nunca! Eu sabia que ele me queria, mas nunca pensei que fosse me atacar enquanto me dava uma
carona após o enterro de sua mãe!
– Ah. Isso explica o vestido preto. Mas por que você está descalça?
– Arranquei meus sapatos enquanto corria na Quinta Avenida. Eu sabia que seu casamento era aqui,
hoje. – Scarlett suspirou. – Desculpe-me por tê-lo estragado.
– Sim. Bem... Acho que eu é que devia agradecê-la.
– Você não sabia que sua noiva o estava traindo?
– Ela me convenceu de que era virgem e queria esperar o casamento.
Uma risada saiu de seus lábios.
– Você achou que ela era virgem? A essa altura do campeonato?
– Por que não? – disse friamente. – Você era.
Seus olhos encontraram-se, e o corpo de Scarlett aqueceu-se. Contra a sua vontade, lembranças
daquela noite a invadiram, estar nos braços dele, em sua cama, sentindo seu corpo forte, quente e cheio
de desejo contra o dela. Tentou sorrir.
– Sim, mas eu não sou normal.
– Verdade. – Seu olhar escuro prendeu o dela. – Eu sou realmente o pai do seu bebê, Scarlett? Ou
você mentiu porque precisava da minha ajuda?
– Claro que o filho é seu!
– Vou descobrir se não for verdade.
– Você é o único homem com quem dormi, então tenho bastante certeza!
– Então, o que você quer de mim agora? Dinheiro?
– Mostre-me onde está minha mala e eu vou embora – disse ela.
– Você não vai a lugar algum enquanto isso não for resolvido.
– Veja, estou extremamente agradecida por sua ajuda com Blaise, e perdoe-me por ter arruinado seu
grande casamento, mas não gostei de você investigar a minha vida e depois assumir que eu sou uma
estelionatária ou uma alpinista social. Não sou nenhum dos dois. Só quero criar meu bebê em paz.
– Vou pedir um exame de DNA – ameaçou ele. – E chamar meus advogados.
Ela o encarou com horror.
– Advogados? Para quê?
– Para definirmos as regras.
Scarlett sentiu uma onda de pânico que a fez perder o equilíbrio. Sua voz tremeu.
– Você quer dizer que vai pedir a guarda?
– Isso não será necessário. – Scarlett expirou aliviada, antes que ele concluísse: – Porque, assim que
eu tiver provas de que o filho é meu, Scarlett, você vai se casar comigo.
COM AQUELAS palavras, Vin tomou as rédeas do caos daquele dia.
Ele estava enganado quanto a Anne Dumaine. Havia se convencido de que ela era discreta e tímida
quando, no fim das contas, ela o estava traindo.
– Perdão – sussurrou Anne na última vez que a viu, quando lhe devolveu a aliança de noivado de
dez quilates. Mas não pareceu arrependida quando se virou alegremente para seu amante, um garoto
de uns 23 anos, com quem deixou a catedral de mãos dadas.
E ainda teve de ouvir do pai dela, obviamente muito irritado:
– Se você tivesse se incomodado de dar a atenção à minha filha, ela não teria se apaixonado por
aquele zé-ninguém!
A fusão com a Transatlantique estava obviamente cancelada.
Erro de Vin. Ele nunca pensou em olhar além do exterior louro e lindo de Anne. Deveria ter feito
seus investigadores checarem sua noiva com mais cuidado. Não confie em ninguém era seu mantra
desde jovem. Não confie em ninguém, e controle tudo.
Scarlett Ravenwood era diferente. Ela não tinha a educação ou o pedigree de Anne, seus modos
eram lamentáveis e ela não sabia se vestir. Seu único dote seria a criança que carregava.
Um bebê. Seu bebê. Depois de sua própria infância terrível, havia decidido há muito tempo que
qualquer filho seu conheceria o pai, teria um lar estável, segurança e amor. Vin jamais abandonaria seu
filho. Preferiria morreria antes.
Vin olhou para Scarlett, que parecia luminosa com sua pele branca e o cabelo vermelho.
Os cílios escuros sobre seus olhos verdes, da cor de todas as primaveras e verões de sua infância
italiana, pareciam tremer. Quando a viu pela primeira vez naquele bar, há quase oito meses, logo antes
do dia dos namorados, engasgando com seu primeiro gole de vodca, foi como ser atingido por um raio
de sol depois de uma longa noite fria, um amanhecer tão brilhante e vermelho como seu cabelo,
enchendo-o de calor... e fogo.
Pensou rápido. Ela não tinha dinheiro, mas talvez isso fosse uma vantagem. Não haveria um sogro
gritando em sua orelha. Scarlett não tinha nada a oferecer, fora o bebê. E seu corpo sexy. E o melhor
sexo de sua vida.
Tremeu só de lembrar-se daquela noite...
Não era, pensou ele, a pior forma de começar um casamento. Poderia fazer dela o que quisesse.
Scarlett poderia ser a esposa perfeita, sob encomenda. Não tinha dinheiro, era grata por ele tê-la salvo
do imbecil do Falkner. Ele já tinha total controle.
Agora, faltava ela perceber isso também.
– Você quer se casar comigo?
– Sim. – Vin esperou que ela ficasse feliz. Em vez disso, ela caiu na risada.
– Você bebeu? Jamais me casarei com você!
– Se o bebê é meu, esta é nossa única atitude razoável.
– Espere, casamento é um item na sua agenda, uma tarefa que precisa ser cumprida de sua lista,
antes de pegar a roupa na lavanderia e pagar a conta de luz?
– Scarlett, acho que você não está levando isso a sério.
– Lógico que não! Por que diabos eu me casaria com você? Eu nem o conheço!
Vin irritou-se com aquela resposta absurda, mas lembrou-se de que Scarlett estava grávida e deveria
ser tratada com gentileza.
– Você teve um dia cansativo – disse ele com a voz mais calma que conseguiu. – Devíamos ir ao meu
médico.
– Por quê?
– Só para ver se está tudo bem com você. E para fazemos o teste de paternidade.
– Você não pode acreditar na minha palavra de que o bebê é seu?
– Você obviamente pode estar mentindo.
Por alguma razão, ela pareceu se chatear. Olhou para ele.
– Não vou fazer um teste idiota de paternidade se for colocar o bebê em risco...
– O médico só tira um pouquinho de sangue do seu braço e do meu. Não há qualquer risco para o
bebê.
– Como você sabe?
Vin nem se preocupou em contar a história sórdida de uma garota que há pouco tempo tentou dizer
que esperava um filho dele, apesar de Vin ter usado camisinha e ela ter dito que usava pílula. O teste
de DNA não foi necessário, porque a moça sequer estava grávida. Aquela experiência o traumatizou.
Por uma ironia do destino, após se livrar da golpista, Vin tinha entrado no bar onde conheceu
Scarlett e acabou fazendo um bebê com ela.
Olhando agora para Scarlett, sentiu seu corpo enrijecer.
Ela não tinha o direito de estar tão bonita: cachos ruivos caindo sobre os ombros, olhos tão vivos e
luminosos, lábios tão naturalmente cheios e rosados. Os seios dela forçando o decote discreto do
vestido preto simples, e sua barriga grávida a fazendo parecer mais voluptuosa e sexy.
Grávida. Dele.
Se fosse verdade, Vin devotaria sua vida para dar a esse bebê uma infância bem diferente da que
teve. Seu filho sempre estaria seguro, e seria amado. Seu filho sempre saberia quem era o pai.
Se essa criança fosse realmente dele, lembrou-se. Ela podia estar mentindo. Ele precisava de provas.
Estendeu sua mão.
– Vamos.
Com visível relutância, Scarlett aceitou a mão que ele oferecia.
– Se eu for com você ao médico, e você tiver a prova de que é o pai, fazemos o quê?
– Vou pedir aos meus advogados para minutar um acordo pré-nupcial.
– Um acordo pré-nupcial? Por quê?
– Eu não posso me casar com você sem ter controle.
– Controle de quê?
– De tudo – disse ele com honestidade.
Percorreram a nave da catedral agora vazia, enquanto as flores murchavam e a equipe de limpeza
colocava tudo em ordem. Scarlett hesitou antes de perguntar:
– O que especificamente vai constar nesse acordo?
– O de sempre. – Vin deu de ombros. – A decisão final sobre educação, religião e onde moraremos
será minha. Coisas assim. Minha base é Nova York, mas tenho casas em todos os lugares. Com
frequência, preciso viajar para gerir a SkyWorld, às vezes por meses. Eu não quero ficar longe de meus
filhos.
– Filhos? Eu não estou grávida de gêmeos.
– Obviamente, nosso filho precisará de irmãos. – O barulho que Scarlett fez parecia um guincho, mas
ele a ignorou e continuou – Espero que você viaje comigo, quando e para onde eu quiser.
– Mas como vou manter um emprego?
– Dinheiro não será mais um problema. Como minha esposa, sua única tarefa será me apoiar. Vamos
frequentar a sociedade. Você vai aprender a receber pessoas poderosas adequadamente para promover
os melhores interesses da empresa. Você vai precisar de lições de etiqueta.
– O quê?
– E, claro, em caso de divórcio, o acordo simplifica o processo. Vai explicitar o que acontece se você
me trair ou se um de nós decidir se separar. Você saberá quanto receberá baseado nos anos...
– De trabalho?
Ele sorriu.
– De casamento, eu ia dizer. Obviamente eu ficaria com a guarda automática dos nossos filhos.
– O quê?
– Não se preocupe. Você ainda poderá visitá-los.
– Quanta gentileza – murmurou ela. – Antes de ir ao seu médico e fazer o teste de paternidade, você
me faria um favor? Podemos parar em uma loja de sapatos?
Ora, ela era como Cinderela, pensou Vin, surpreso com a tranquilidade que, de repente, Scarlett
parecia abraçar. A forma como olhava para ele, indefesa, tão bonita. Ela seria fácil de ser moldada como
a esposa perfeita.
– Claro. Perdão. Eu deveria ter pensado nisso antes. – Ele a pegou nos braços e a carregou. Apesar de
a gravidez estar avançada, Scarlett parecia não pesar nada. Gentilmente, Vin a colocou no carro, ainda
enfeitado com flores. – Alguma preferência de loja?
– Qualquer uma, desde que tenha sapatos bons para correr.
– Você ouviu – disse ele ao motorista.
Dez minutos depois, Scarlett experimentava tênis em uma loja esportiva gigante. Ela escolheu seu par
favorito, juntamente com meias, agradecendo a generosidade de Vin durante todo o tempo.
– Obrigada – sussurrou ela, abraçando-o repentinamente. Por um momento, ele fechou os olhos.
Sentiu o cheiro de menta de seu hálito, e respirou o perfume de flor de cerejeira de seu cabelo. Ela
soltou-o abruptamente. Mirando-o de olhos arregalados, mordeu o lábio. Vin imaginou a carícia
sensual daqueles lábios cheios e suculentos.
Então ela sorriu e cerrou os olhos.
– Vou calçar meus tênis novos. Com licença.
Vin assistiu-a caminhar em direção ao banheiro feminino, passando pelas vitrines de tênis e
equipamentos caros. Seus olhos pousaram contemplativamente sobre a curva das nádegas, o balanço
dos quadris. Scarlett fazia até um vestidinho preto de enterro cair bem.
Que esposa ela seria. E quanto à lua de mel... Ele estremeceu.
Determinado a voltar logo para o carro, foi até o caixa.
Logo haveria mais compras, pensou. Sapatinhos de bebê. Um berço. Faria com que suas casas fossem
seguras. Aumentaria a equipe de segurança.
Seria o pai que nunca teve. Seu filho jamais saberia o que é ser abandonado. Usado. Negligenciado e
solitário.
Levou a mão ao bolso do paletó e procurou sua carteira. Enrugando a testa, tateou nos
compartimentos. Vazios. Pediu que um de seus guarda-costas pagasse a conta, e disse ao outro para
procurar a carteira. Sentado em um banco próximo, Vin ligou para seu médico para agendar uma
consulta. E então, impacientou-se.
Scarlett estava demorando.
– Vá ver se está tudo bem – ordenou a um dos guarda-costas.
Vince andou para lá e para cá. Checou novamente o celular. Parou.
E então se deu conta.
Ela não podia. Não iria.
Ela fez.
– A srta. Ravenwood não está em lugar algum, chefe – disse Larson quando voltou. – Verifiquei o
banheiro. Vazio – hesitou. – Há uma porta ao lado dele, que leva a um depósito, e daí para um beco.
Praguejando baixo, Vin correu pela loja seguido de seus dois guarda-costas. Nos fundos, próximo ao
banheiro feminino, achou o depósito. Funcionários da loja encolheram-se sob seu olhar enquanto ele
escancarava a porta dos fundos com uma batida raivosa.
Do lado de fora havia um beco de paredes de tijolo grafitadas. Vin caminhou lentamente, passando
pelas latas de lixo até alcançar a movimentada Avenida Madison, cheia de gente e carros presos no
engarrafamento. Olhou em volta, chocado.
Scarlett Ravenwood não só tinha fugido dele, mas também, provavelmente, havia roubado sua
carteira. E ela o havia avisado antes! "Sapatos bons para correr", de fato!
Correndo as mãos pelo cabelo escuro, deu uma risada incrédula. Ele havia sido enganado duas vezes
em um só dia. Duas mulheres diferentes mentiram para ele.
A perda de Anne era aceitável. Só envolvia dinheiro.
Scarlett era diferente. Ele nunca deixou de desejá-la. E agora ela estava grávida dele.
Será que estava? Talvez tenha mentido. Esfregou a testa. Por que qualquer mulher fugiria depois de
um pedido de casamento, com a promessa de uma vida luxuosa? A menos que estivesse com medo do
teste de paternidade. Era a única explicação racional: o bebê não era dele. Essa ideia enjoou-o.
Então se lembrou do olhar raivoso nos olhos verdes de Scarlett.
Não gostei de você investigar a minha vida e depois assumir que eu sou uma estelionatária ou uma
alpinista social. Não sou nenhum dos dois. Só quero criar meu bebê em paz.
Parado ali enquanto pedestres passavam correndo por ele, Vin cerrou seus olhos.
De qualquer maneira, precisava saber.
De qualquer maneira, iria achá-la.
E, dessa vez, Scarlett não o enganaria tão facilmente. Nada o impediria de conseguir o que queria.
Não ouviria suas desculpas. Da próxima vez, faria com que ela se curvasse aos seus desejos.
Descalça, se necessário.