mundo, escalando as pirâmides e os Pirineus. Suas histórias engraçadas sobre as aventuras de seu urso
finalmente a fizeram sorrir através das lágrimas. Nas noites frias de inverno ao Norte de Nova York,
enquanto sua família tremia em quartos não aquecidos e o vento gelado fazia o vidro das janelas
estremecer as janelas, Harry cantava canções sobre a liberdade.
Liberdade. Mesmo naquela noite sombria em que Scarlett, aos 12 anos, perdeu sua mãe na sala de
emergência de um hospital em uma insignificante cidade industrial na Pensilvânia, o pai beijou Scarlett
enquanto as lágrimas escorriam abaixo seu rosto resistido.
– Pelo menos agora sua linda mãe está livre de dor.
Scarlett estava livre agora. De Blaise Falkner. De Vin Borgia. Ela e o bebê que carregava estavam
livres.
Mas havia um preço a pagar por aquela liberdade.
Para começar, seu voo de Boston para Londres, duas semanas atrás, teve um pequeno problema
quando sobrevoava o Atlântico.
Um princípio de incêndio no compartimento de bagagem obrigou o avião a desviar sua rota para um
pequeno aeroporto na Costa Oeste da Irlanda. Enquanto o avião finalmente fazia sua descida, ela viu
bandos escuros de pássaros através da janela de seu assento, passando pelo avião.
– Ataque de pássaros! – gritou um passageiro, e enquanto uma das comissárias de bordo corria para a
cabine de pilotagem, outra murmurava palavras tranquilizadoras e pouco convincentes aos passageiros.
De olhos arregalados, Scarlett agarrou-se aos braços de sua poltrona, apavorada, sentindo o avião vibrar
e estalar no ar.
Scarlett só conseguia pensar que não deveria estar naquele avião. mulheres grávidas não deviam voar
depois do sétimo mês de gravidez. Ela estava quase no oitavo. Tinha fugido de Nova York, com uma
breve parada em Boston, porque achava que essa era a única maneira de escapar de Vin. Mas agora o
risco que corria parecia pequeno frente à possibilidade de ela e seu filho morrerem em um acidente
aéreo. Assim como seu pai tinha morrido naquele acidente de avião no inverno, há um ano e meio
atrás. Ela nunca deveria ter entrado ali.
– Preparem-se para a colisão – anunciou a voz do piloto vinda do intercomunicador. – Protejam-se
como puderem do impacto.
As comissárias de bordo, correndo para se acomodar e afivelar os cintos de segurança, repetiram as
palavras do piloto:
– Mantenham a cabeça abaixada! Prepararem-se para o impacto! Protejam-se!
Scarlett se preparou para o pior abraçando sua barriga e pensando, por favor, não deixe meu bebê
morrer.
Miraculosamente, o avião afinal recuperou um dos motores e conseguiu alguma estabilidade,
aterrissando com um estrondo quase no limite da pista de pouso. Ninguém se machucou e os
passageiros e a tripulação aplaudiram e deram vivas, abraçando e beijando uns aos outros.
Deslizando para fora do avião pelo escorregador inflável, Scarlett caiu de joelhos na pista, deixando
escapar soluços altos.
Nunca deveria ter entrado em um avião. Qualquer avião. Depois da morte de seu pai, ela deveria
saber.
Mas, da mesma forma que havia aceitado a carona na limusine de Blaise Falkner, havia ignorado sua
intuição e se convencido de que seus medos eram bobos. E tanto ela quanto seu bebê quase tinham
morrido como resultado.
Scarlett decidiu jamais ignorar sua intuição de novo.
E, acima de tudo: ela nunca, jamais entraria novamente em um avião.
Mas por que Scarlett precisaria fazer isso? Não tinha família em Nova York. Nenhuma razão para
voltar. Vin Borgia havia lhe prestado um enorme favor avisando-a antecipadamente que pretendia
controlar sua vida e a do filho com punho de ferro e separá-la de seu bebê se algum dia fizesse objeção
a isso ou se tentasse deixá-lo. Não se sentia culpada em deixá-lo, de modo algum.
Mas realmente se sentia culpada por ter roubado a carteira dele. Roubar nunca era certo, e sua mãe
devia estar se revirando no túmulo. Scarlett disse a si mesma que não teve escolha. precisava cobrir seu
rastro. Vin não só era um bilionário implacável, mas também possuía uma companhia aérea e tinha
conexões em toda parte. Se ela entrasse a bordo de qualquer avião no mundo com seu próprio nome,
ele ficaria sabendo.
Então tinha entrado em contato com um dos velhos conhecidos de seu pai em Boston para comprar
um passaporte falso. Isso custava dinheiro.
Por isso tinha pegado, emprestado, algum dinheiro de Vin. E, logo após chegar à Suíça, assim que
recebeu seu primeiro pagamento no novo emprego, tinha enviado de volta a carteira de Vin pelo
correio, devolvendo tudo como ele havia deixado, até mesmo acrescentando alguns euros como
compensação pelo dinheiro que havia emprestado.
Pagou tudo que lhe devia. Ela e o bebê estavam livres.
E tinha esperança de que Vin acabaria por se esquecer de ambos.
Era o meio de outubro, e o ar da manhã já estava gelado nas montanhas que cercavam a elegante
estação de esqui suíça de Gstaad. A primeira nevasca era esperada diariamente.
Scarlett também tinha um evento próprio para aguardar. Acariciou sua barriga, que atualmente não
permitia que ela abotoasse o casaco. Só faltavam duas semanas e meia para a data prevista para o parto.
Seu corpo parecia mais pesado e lento. Mas, por sorte, seu novo emprego lhe dava muitas
oportunidades para caminhadas suaves pela manhã.
Teve sorte em conseguir o emprego. A melhor amiga de sua mãe, Wilhelmina Stone, tinha
trabalhado como governanta de um milionário na Suíça. Scarlett não a via desde o funeral da mãe, mas
nunca se esqueceu do abraço e das palavras de Wilhelmina:
– Sua mãe era minha melhor amiga. Se um dia precisar de alguma coisa, venha até mim, ouviu bem?
Quando Scarlett apareceu, sem convite e trêmula junto ao portão da enorme villa nos arredores de
Gstaad, a mulher rechonchuda e gentil provou ser fiel à sua palavra.
– Meu chefe acaba de me pedir para contratar um bom cozinheiro para a temporada de esqui. Ele
ama a comida do Sul dos Estados Unidos. Você consegue fazer mingau de milho e frango frito?
Jambalaya? Arroz com miúdos?
De olhos arregalados, Scarlett balançou a cabeça. Wilhelmina suspirou.
– Certo, normalmente ele vem em de dezembro, depois do começo da temporada. Então você tem
seis semanas, talvez mais, para aprender a fazer um frango frito incrível e todo o resto.
Nas últimas duas semanas, Scarlett vinha tentando aprender a cozinhar usando livros de culinária e
vídeos da internet. Ainda não havia aprendido tudo, mas...
Mas aprenderia. Ser cozinheira na casa de férias um milionário que aparecia poucas semanas por ano
era o trabalho perfeito para qualquer mãe solteira com um recém-nascido. Poderia descansar depois do
parto, e trabalhar com o bebê por perto, quase como se estivessem em sua própria casa.
Por um breve momento, ela fechou os olhos, virando o rosto para o sol. Seu coração estava cheio de
gratidão.
Então ouviu algo estalar na floresta à sua frente.
Abriu os olhos e o sorriso sumiu do seu rosto.
– Scarlett – saudou-a Vin.
Ele estava bem ali, na frente dela, acompanhado de três guarda-costas, uma muralha impenetrável
de dinheiro e poder.
Scarlett tropeçou e quase caiu. Em segundos ele estava a seu lado, agarrando seu punho.
– Não me toque! – gritou Scarlett.
O aperto se intensificou, os olhos dele como fogo negro.
– Você me roubou.
– Paguei tudo o que peguei!
– Não estava falando apenas sobre o dinheiro.
Ela colocou a mão livre sobre a barriga, protegendo-a.
– Você não é o pai do meu bebê. Eu... eu menti!
– Acho que você está mentindo agora.
Scarlett tentou soltar o punho da mão dele.
– Deixe-me em paz!
– Não entendo seu comportamento, Scarlett. – Ele a puxou para mais perto. – A maioria das
mulheres acharia uma sorte estar grávida de um bilionário.
– Um bilionário que destrói as pessoas? – Ela balançou a cabeça. – Você não só compra empresas,
mas também esmaga e aniquila seus rivais sem pena. O casamento deles, suas famílias, até suas vidas.
O silêncio caiu na floresta suíça. O único som era o cantar dos pássaros.
Então ele falou, a voz baixa e inexpressiva.
– Então você pesquisou um pouco sobre mim, não é?
– Por que você acha que eu nunca tentei entrar em contato com você depois de nossa noite juntos? –
Ela inspirou profundamente. – Tive uma boa razão para deixá-lo naquela manhã. Uma enfermeira
ligou e precisavam de mim na mansão dos Falkner. Esperava vê-lo de novo. Até que busquei você na
internet. – Ela o olhou com raiva. – Se acha que vou deixar meu precioso bebê ser criado por um
homem que se compraz com o sofrimento de outras pessoas...
– Se acha que sou um bastardo, por que me pediu ajuda?
– Estava aterrorizada com Blaise.
– E agora está aterrorizada comigo?
– Depois que interrompi seu casamento, pensei que talvez devesse lhe dar uma chance. Meu próprio
pai não era perfeito, mas eu o amava. – Ela estreitou os olhos. – Então você deixou suas intenções
claras.
– Do que você está falando? Minha intenção de assumir a responsabilidade, de me casar com você e
de ser um bom pai?
– Se eu honestamente acreditasse que poderíamos ser uma família, eu me casaria com você em um
segundo. Mas prefiro criar meu filho sozinha a fazê-lo com um homem que pode me machucar!
– Machucar você? – perguntou Vin, incrédulo. – Nunca machuquei uma mulher na minha vida!
– Com seu coração frio? Aposto que machucou muitas.
– Oh. Você quer dizer emocionalmente.
– Sim, emocionalmente. Acha que isso não conta?
– Não, realmente não.
– E é por isso que eu não quero me casar com você.
Vin soltou o punho dela abruptamente, os olhos estranhamente iluminados.
– Nunca matei ninguém, não importa o que digam os rumores. Nunca envenenei ninguém ou
sabotei um motor. Nem contratei ninguém para isso. Um repórter simplesmente percebeu que, em
alguns pontos da minha carreira nos negócios, coincidentemente houve problemas com alguns homens.
– Espera que eu acredite nisso? Foi pura coincidência?
– É a verdade. Um homem teve um caso descoberto enquanto fazia negócios comigo. É difícil que
seja minha culpa se a esposa se magoou e colocou veneno no uísque matutino dele. Outro homem teve
um ataque cardíaco por estresse durante uma abordagem hostil que fiz. Ele poderia ter saído de cena
em qualquer momento, mas escolheu lutar e assumir o risco. Outro homem escolheu começar uma
disputa com a irmã quando ela vendeu suas ações para mim. A família se separou, sim... Mas, de novo,
não foi minha culpa.
– Então por que Blaise tinha tanto medo de você? E por que você esperava que ele tivesse?
– Sei dos rumores sobre mim. Não são verdadeiros, mas as pessoas acreditam neles. Eu seria um
idiota se não tirasse vantagem disso.
– E você não é nenhum idiota.
– Não. E não gostei que você tenha me feito parecer um. Duas vezes. E ainda quero um teste de
paternidade. Você tem uma consulta hoje com um médico em Genebra.
– Já tenho meu médico no vilarejo, obrigada.
– A dra. Schauss tem uma clínica mundialmente renomada. Foi obstetra de uma princesa da Suécia e
fez o parto de metade dos bebês das casas reais do Golfo Pérsico. Ela é bem qualificada.
– Eu não vou viajar até Genebra só porque você quer que eu me consulte cm uma médica da realeza.
– A escolha não é sua.
– E se eu me recusar?
– Sou conhecido de Kassius Black, o dono desse chalé. O que ele diria ao saber que sua governanta
contratou uma ladra fugitiva e ambas conspiraram para roubar de seus convidados na próxima
temporada de esqui?
– Você não faria isso! Não é verdade!
Vin deu de ombros.
– Você é uma ladra e mentirosa convicta. Poderia ser verdade. Mas o ponto é: você deseja pagar a
delicadeza de sua amiga provocando a demissão dela?
– Você é desprezível.
O rosto dele endureceu.
– Não, cara. Você é desprezível. Não fiz nada além de tentar corresponder à minha responsabilidade.
Estou tentando fazer a coisa certa, a coisa nobre. Você que é a ladra.
– Eu paguei cada centavo!
– Sim, com uma taxa de correção anual de 30 por cento. O dinheiro que você pagou rendeu mais do
que muitos dos meus outros investimentos. Então foi lucrativo. – Ele fez uma saudação leve e irônica. –
Obrigado por roubar minha carteira.
– Ah? – disse ela, esperançosa. – Então você não vai...
– Roubar meu filho é algo diferente.
A breve esperança de Scarlett desapareceu. O que ela poderia fazer? Não podia deixar Wilhelmina se
ferir por sua lealdade e gentileza.
A clínica em Genebra. Aquela podia ser sua rota de fuga. As clínicas tinham saídas nos fundos. Ela
poderia se esgueirar antes mesmo que tirassem seu sangue.
Scarlett deixou os ombros caírem, esfregando os pés no cascalho, esperando parecer adequadamente
desanimada. Seu coração batia acelerado.
– Você venceu.
– Sempre venço. A viagem até Genebra levará duas horas de carro, e em seu estado de gravidez
avançada, estou preocupado que isso possa ser desconfortável para você. Posso chamar um helicóptero
em dez minutos...
– Não! – disse ela, um pouco rápido demais. Quando ele franziu a testa, ela falou em uma voz mais
calma, tentando sorrir – De carro teremos a chance de conversar. É tão bonito perto do Lago Genebra
nessa época do ano.
Vin a encarou por um longo momento, depois deu de ombros.
– Como quiser.
Cinco minutos depois, quando um guarda-costas subiu para arrumar seus escassos pertences, Scarlett
foi à cozinha dizer adeus a Wilhelmina.
– Vai desistir do emprego, Scarlett? Dessa maneira?
– Sinto muito, Wilhelmina. Você me ajudou e me sinto mal em partir, mas...
– Por mim, está bem. Honestamente, seu frango frito é horroroso. O sr. Black pensaria que estava
maluca ao contratá-la. É com você que estou preocupada. – Ela olhou para Vin, em dúvida. – Então
esse homem é o pai do seu bebê, mas você realmente quer ir com ele? Ou ele a está forçando?
ESTAVA CLARO que Wilhelmina tinha experiência suficiente com os ricos para saber que a feiura podia se
esconder sob um estilo de vida glamoroso.
– Vou tomar conta de Scarlett e do bebê – disse ele a ela. – Prometo.
A governanta o encarou, depois seu sorriso irônico lentamente desapareceu.
– Acredito em você.
– Bom. – Vin lhe deu seu sorriso mais charmoso. – Pretendemos nos casar logo.
Ela olhou Scarlett acusadoramente.
– Vocês estão noivos?
Scarlett parecia um pouco confusa.
– Não decidimos nada ainda...
– Sra. Stone – interrompeu Vin. – Aprecio sua lealdade e gentileza com Scarlett. Quando quiser
trocar de emprego, por favor, nos informe.
Vin entregou um cartão à governanta e pegou Scarlett pela mão. Conduziu-a para fora do chalé,
enquanto um segurança os seguia com a escassa bagagem de Scarlett, que consistia em uma bolsa e uma
mala de mão. Vin observou enquanto o funcionário colocava tudo no porta-malas de um dos carros
que alugara. Ele se lembrou de seus próprios poucos pertences quando partiu da Itália aos 15 anos,
depois da revelação devastadora de sua mãe e da morte dela, para viver em Nova York com um tio que
mal conhecia. Ele se sentia tão sozinho. Tão vazio.
Afastou a lembrança, com raiva. Não era mais aquele garoto. Nunca mais se sentiria tão vulnerável, e
seu filho também não.
Vin abriu a porta do passageiro do carro esporte vermelho, depois se virou para Scarlett.
– Entre.
– Você vai dirigir? Você mesmo?
– Os guarda-costas vão nos seguir no outro carro. Está um lindo dia para um passeio.
Já a caminho, Vin olhou de soslaio para Scarlett. Ela estava vestida bem casualmente: um casaco
desabotoado sobre uma camiseta enorme, calça cáqui folgada e botas forradas de pele. Mas, ainda
assim, os olhos dele se encantaram com ela. Seu cabelo vermelho caía em cachos grossos por seus
ombros. Seus olhos luminosos eram verdes como uma floresta alpina. Ele se lembrava como era ter
aqueles lábios cheios e rosados se movendo sobre sua pele, sufocando-se de êxtase...
Vin estremeceu.
Por que Scarlett tinha tanto poder sobre ele?
Nas últimas duas semanas, desde que ela o deixou parado na Avenida Madison com um olhar
espantado no rosto, Vin não conseguia pensar em qualquer outra coisa. Todos os seus consideráveis
recursos tinham sido dedicados a uma tarefa: encontrá-la.
Scarlett estava em seu sangue. Ele não tinha sido capaz de esquecê-la. Não desde o primeiro
momento em que a viu naquele bar. Do momento em que a teve nos braços pela primeira vez. Do
momento em que ela desapareceu de sua cama, depois do melhor sexo de sua vida.
Do momento em que ela invadiu seu casamento e lhe disse que estava grávida de seu filho.
Scarlett Ravenwood era meio anjo, meio demônio. Havia uma razão pela qual não havia seduzido
nenhuma outra mulher por mais de oito meses, eternidade para um homem como Vin. Estava
assombrado por Scarlett, assustado de corpo e alma, e tinha sido levado quase à loucura pelas
lembranças dela nua em seus braços.
Scarlett era a mulher para ele. Aquela que ele queria. E Vin pretendia tê-la.
– Como você me encontrou na Suíça? – perguntou Scarlett baixinho.
Erguendo uma sobrancelha, Vin concentrou-se na estrada à sua frente.
– Foi um erro seu enviar minha carteira pelo correio de um vilarejo italiano. Ainda tenho contatos
naquele país. Foi fácil rastreá-la através do postino que a ajudou. Ele se lembrou de ver seu carro com
placas suíças, um carro antigo, muito raro.
– Escolhi aquele carro da garagem do chalé porque pensei que fosse o mais velho – disse ela,
parecendo zonza. – Então, deduzi que fosse o mais barato. Se eu tivesse apanhado o sedã novinho...
– Eu não a teria encontrado. – Vin agarrou o volante e a olhou. – Você ainda se pergunta se sou
digno de confiança. Posso me perguntar o mesmo sobre você, exceto que já tive a resposta. Você mentiu
descaradamente, roubou minha carteira. Sequestrou meu filho...
– Sequestrei!
– De que mais você chamaria isso? Como saberei que nosso bebê vai estar seguro com você? A filha
de mente criminosa de um marginal?
– Marginal! Meu pai nunca deveria ter ido para a cadeia. Se o cúmplice não o tivesse traído...
– Poupe-me das desculpas. Ele era um ladrão de banco.
– Ele devolveu todo o dinheiro. Você pode dizer o mesmo?
– Do que você está falando?
– Estou falando sobre você e Blaise Falkner e de todos os outros bilionários. São vocês quem
realmente deveriam estar...
Ela se interrompeu abruptamente.
– Continue – disse Vin, no mesmo tom. – Você estava prestes a me acusar de alguma coisa?
Scarlett o olhou diretamente nos olhos.
– Nenhum dos homens ricos que eu já conheci tinha coração. Meu pai, em seu pior momento, era
menos bandido que todos os jogadores de Wall Street, com seus desvios corporativos, seus esquemas
que destroem quem tem fundos de pensão, as economias e a esperança das pessoas!
– Você está me comparando a eles?
– Você não sacrificaria uma das suas abotoaduras de platina... – Ela olhou pensativamente para o
punho dele –, que dirá arriscar sua vida ou sua felicidade, para salvar alguém.
– Você não sabe disso.
– Ora, você mesmo me disse. Você não pensa duas vezes antes de causar dores emocionais. Aposto
que nunca amou ninguém em sua vida. E ainda me pede para casar com você!
– O amor não é fundamental em uma relação.
– Esse é um modo distorcido de olhar as coisas. É como dizer que não há sentido em provar comidas
que têm gosto bom. Casamento sem amor não seria como comer mingau pelo resto da vida? Por que
comer mingau quando se pode comer bolo?
– Bolo é uma ilusão. No fim, descobrimos que tudo era mingau.
– Essa é a coisa mais triste que já ouvi e me sinto mal por você. Um bilionário que se contenta em
comer mingau pelo resto da vida.
Vin mal podia acreditar que essa garota pobre, que não tinha nada e que um dia roubou sua carteira,
sentia muito por ele.
– Melhor uma verdade dura do que o doce conforto das mentiras.
– Não, é pior que isso. Você é um cínico que alega não acreditar na existência do amor. Alguma
mulher deve tê-lo magoado demais.
Sim. Uma mulher o havia magoado. Mas não era o que Scarlett pensava.
– Então ela me fez um favor. Ensinou-me a verdade sobre a vida.
– Ensinou errado. – Ela acariciou a barriga, olhando pela janela enquanto se aproximavam de
Genebra.
– Certo ou errado, uma vez que o teste de paternidade comprovar que sou o pai de seu bebê, vamos
celebrar nosso casamento.
– Não, obrigada. Não sou fã de mingau.
Vin trincou os dentes.
– Você está tentando me dizer que seus sonhos infantis e idiotas sobre amor são mais importantes
que o bem-estar de nosso filho? Um bebê merece um lar estável.
– Você não acha que eu sei disso? Tudo o que sempre quis em toda a minha infância era ter um lar
de verdade, fincar raízes, ter amigos, ser parte de uma comunidade. Mas sabe de uma coisa? Ainda
éramos felizes, mesmo em fuga. Porque meus pais se amavam. E eles me amavam.
Ele não saberia como era aquilo, pensou Vin. Tinha crescido em uma villa degradada, negligenciado
e ignorado por uma mãe que só estava interessada em seus casos românticos. Seu filho era valioso por
apenas uma razão: extorquir dinheiro de seu pai.
Seu suposto pai.
Os ombros de Vin ficaram tensos.
Qualquer um que amasse, ele perdia. A mãe o havia usado friamente como uma moeda de barganha
para financiar seu estilo de vida, antes de morrer violentamente. Babás contratadas partiam ou eram
demitidas. Seu avô gentil teve um derrame quando Vin estava com 8 anos. Ele fora afastado de seu pai
e da madrasta aos 15. Às vezes, Vin se sentia como se estivesse sozinho a vida toda. Tão sozinho quanto
naquela véspera de Natal, quando só tinha 8 anos e foi deixado completamente só na villa, esquecido,
no escuro...
Afastou a lembrança. A vida de seu filho seria bem diferente. E ele garantiria que a mãe de seu filho
fosse uma influência amorosa, estável, estimulante... ou não seria influência alguma.
– Por que você fugiu de Nova York, Scarlett? Foi por tudo o que descobriu sobre mim?
– Você está brincando? Foi aquele acordo pré-nupcial.
– Você queria evitar o acordo pré-nupcial?
– Você realmente pensou que eu assinaria papéis para lhe dar poder total, não só sobre mim, mas
também sobre nosso filho? Achou que eu ficaria tão feliz de ser sua esposa-troféu, que jogaria fora
minha liberdade pelo resto da vida?
– O acordo foi aprovado por meus advogados, por ser completamente justo...
– Justo? Com você tomando todas as decisões sobre nossas vidas? E se decidíssemos nos divorciar,
por qualquer razão, você teria automaticamente a custódia total de nosso filho?
– O divórcio não está nos meus planos – disse ele, bruscamente. – Mas sei que não poderia evitar que
você quisesse partir. O que quer que você possa pensar, não há calabouços na minha cobertura. O
acordo pré-nupcial é meramente um instrumento para minimizar o impacto de todas as suas decisões
potencialmente ruins sobre nossos filhos inocentes.
– Minhas decisões ruins? E essa é só o que há no acordo sobre o que você me contou. Quem sabe o
que estaria escondido nas letrinhas pequenas. Uma exigência para que eu faça sexo oral em você cinco
vezes por semana?
Foi um comentário bruto. Não havia nada sensual ou sugestivo em seu tom. Quando muito, Scarlett
quis insultá-lo, afastá-lo.
Mas a reação do corpo de Vin foi instantânea. Ele passou de frio e furioso para incendiado de paixão
em um segundo, o sangue correndo para seu membro enquanto imagens daquela boca cheia e rosada,
quente e molhada em torno de sua ereção invadiam sua mente... Ele tentou limpar a cabeça daquela
imagem excitante enquanto mudava de posição desconfortavelmente no assento de couro do carro.
– Não era essa a minha intenção. – Embora agora fosse, tão certo quanto o inferno. Vin imaginou
qual seria expressão de seu advogado se lhe dissesse para acrescentar uma exigência de sexo oral.
– Você me acusa de ser infantil e idiota. Mas, ao recusar me casar com você, estou protegendo nosso
bebê.
– Como pode dizer isso? Posso oferecer tanto a você quanto ao bebê. Um estilo de vida com o qual
você nunca poderia sonhar. Seis casas ao redor do mundo, escolas particulares, joias, carros. Jatinhos
particulares...
Scarlett estremeceu ao ouvir a menção dele sobre jatos, o que Vin estranhou.
– Estou protegendo nosso bebê de um homem que só ia querer nos controlar – disse ela
mansamente. – Não nos amar.
Aquilo fez Vin se calar.
Quando chegaram à clínica, ele saiu e abriu a porta para ajudar Scarlett a descer.
Com relutância visível, ela ofereceu a mão para ele segurar.
Vin sentiu um choque com o contato. Enquanto caminhavam juntos em direção à porta da frente da
clínica, ele não ia, e não poderia, largar a mão dela. Ele parou, levantando-a até os lábios, e gentilmente
beijou as costas da mão dela. Sentiu-a tremer.
– Você nunca poderia amar alguém – disse ela –, porque nunca confia em alguém. Só o fato de me
obrigar a fazer esse teste...
– Acredito em você, Scarlett – disse ele, delicadamente. – Só estou insistindo em um teste de
paternidade porque já mentiram para mim a esse respeito.
– O quê?
– Uma mulher, há algum tempo, alegou que eu era o pai de seu bebê inexistente, tentando me
obrigar a me casar com ela. Mas, dessa vez, em meu coração, já sei a verdade. Você está carregando
meu bebê.
– Vin...
Esticando a mão, ele enfiou uma mecha do cabelo vermelho dela atrás de sua orelha. Seus olhos
verdes estavam arregalados.
– Gosto quando você me olha assim – murmurou ele. – Você é tão linda, cara. Seus olhos são de um
tom profundo de esmeralda. Como uma floresta. – Ele gentilmente acariciou o rosto dela. – Seus lábios
– sussurrou ele – são vermelhos, e cheios, e maduros como uma fruta. Eu nunca vou me esquecer... –
Ele correu a ponta do dedo por toda a extensão de seu lábio inferior – de como foi prová-los...
Scarlett estremeceu parecendo tão vulnerável, tão assolada, tão envolvida... Ela, que poderia ter tido
qualquer homem que quisesse com sua beleza! Vin percebeu que também tremia.
O sangue dele estava acelerado com a necessidade de tomá-la.
Então ele se lembrou dos guarda-costas que os observavam do estacionamento, e da consulta.
Logo, ele jurou a si mesmo. Logo ia se saciar completamente com ela.
– Você está certa sobre uma coisa. – Ele envolveu o rosto dela. – Não acredito no amor. Ao menos
não do tipo romântico. Mas eu acredito de verdade – sussurrou – no desejo. Nunca parei de desejá-la.
Desde o momento em que nos encontramos pela primeira vez.
– Mas você ia se casar com outra...
– Porque pensei que você estava perdida para mim. Pensei que não podia ter você. Agora... sei que a
terei. – Vin passou as pontas dos dedos de leve ao longo da borda do maxilar dela, até os lóbulos de
suas orelhas, até as ondas vermelhas cascateantes de seu cabelo. – Eu a terei, Scarlett – rosnou ele. – A
qualquer custo.