Se ele estivesse sentindo metade da minha dor quando entrou naquele carro tem muita sorte de ainda estar vivo.
- Por favor, Liam diga que ele vai ficar bem! - imploro - Farei qualquer coisa. Salve-o!
- Ajudaria muito se voltasse para o seu quarto.
- Eu prefiro ficar aqui e esperar por notícias.
- Liam tem razão Jenny - Paige se aproxima de mim e segura meu braço - Lembra quando você foi operada. Neil parecia um leão enjaulado, isso não ajudou muito, ajudou? Não há nada que possa fazer agora.
- Mas eu não estava morrendo Paige! - insisto.
- Nem o Neil - argumenta Liam - Se quer mesmo ajudá-lo volte para o quarto. Eu não posso lidar com vocês dois ao mesmo tempo. Prometo que vou mantê-la informada. Agora preciso avisar aos pais dele e encontrar uma forma de contar a Anne.
Anne? Havia me esquecido completamente dela. Como posso ser tão egoísta? Há uma garotinha
inocente que poderia perder o pai que idolatra. O que seria de Anne?
- Está bem - murmuro - Não deixe de me avisar.
As horas se arrastam amargamente enquanto aguardo em desespero. O quarto parece me sufocar a cada minuto que passa. Há mais de uma hora que não tenho notícia alguma. Liam apareceu apenas uma vez para avisar que os pais de Neil estão a caminho do hospital e que ele ainda se encontra na sala de cirurgia.
Ele sofreu um trauma grave e estão operando-o para reduzir a pressão intracraniana. Pelo que disse estão realizando pequenos orifícios no cérebro para liberar uma hemorragia interna. Ainda não se sabe se terá algum dano permanente e irreparável, mas que é comum em casos como esse. Os danos mais comuns são convulsões, paralisias e alterações de personalidade. Também há riscos de outros distúrbios como problemas de concentração, dores de cabeça ou tontura, que podem sumir rapidamente ou durar por anos. Esse tipo de lesão pode ou não ter consequências graves, mas não há como avaliar até que ele acorde. Rezo fervorosamente para que nada parecido com o que aconteceu comigo ocorra a ele.
≈≈≈
Uma enfermeira entra no quarto com o almoço, sopa de legumes, suco de maça e salada de frutas como sobremesa. Não tenho fome, nem ânimo para comer. No entanto, Kevin que já havia voltado, Paige e a enfermeira insistem para que eu coma pelo menos um pouco. Como sei que preciso estar forte para quando Neil acordar provo um pouco de cada coisa.
Tento manter a fé a cada segundo de espera, mas confesso que está cada vez mais difícil. Por minha culpa ele poderá ter alguma lesão irreversível, isso se sobreviver. E se não andasse ou falasse novamente? Se nunca mais acordar? São tantas as possibilidades que me levam as vias do desespero. Nunca poderei me perdoar por qualquer coisa que venha acontecer a ele.
- Agora sei como você se sentia Kevin - pronuncio com a voz trêmula - É terrível saber que destruímos a vida de alguém que amamos.
- Não diga isso Jenny - abraça-me e choro em seu peito - Nada disso foi culpa sua. Vamos ter
fé.
- Desculpe ter sido tão dura com você! - soluço.
- Nunca foi dura comigo. Foram minhas escolhas e com elas vieram as consequências.
- Não posso perdê-lo - choro intensamente.
- Você não vai. Eu prometo.
Suas mãos massageiam minhas costas tentando me tranquilizar. Aos poucos o meu choro
desesperado viram suspiros e não sei quantos minutos depois, adormeço.
Eu sonho. O rosto não é o mesmo que me aterrorizava quando estava cega, mas o que eu vi essa manhã, embora sejam iguais, o calor em seus olhos e o sorriso sincero me mostram o quanto são diferentes. Como fui cega em não me dar conta disso.
Nesse sonho estamos sentados em um banco. Há um belo jardim repleto de rosas brancas. Ele me sorri com carinho e coloca uma flor em meu cabelo. Seus olhos me encaram novamente e eu vejo tristeza em seu olhar. Neil se levanta e caminha para longe de mim. Quero gritar para que volte. Ele para e me olha com tristeza.
Eu te amo - sussurra ele com tristeza e parte.
Quero me levantar e correr até ele. Não consigo me movimentar, parece que estou colada ao banco. Levo as mãos aos lábios e eles parecem selados.
- Não! Não vá!
Algo sacode meus ombros, sinto que estou sendo puxada. Eu não quero ir, preciso encontrá-lo. Há muitas rosas, não consigo vê-lo...
- Jenny acorde! – ouço uma voz ao fundo - Acorde querida!
Abro os olhos novamente e por alguns segundos me sinto desorientada. Onde estão as rosas? Onde está o Neil e onde eu estou?
- Teve outro daqueles pesadelos? – Paige alisa meus cabelos.
Balanço a cabeça em negativa. Agora já consciente de onde estou e de tudo o que aconteceu.
- Sonhei com ele - encaro-a com tristeza - Mas eu não tive medo Paige. Não era o Nathan era o Neil. Eu queria ficar com ele, mas ele partiu.
- Claro que era o Neil - Ela me sorri - Liam esteve aqui há alguns minutos.
- Por que não me acordou? - salto da cama com pressa - Por quanto tempo eu dormi?
- Apenas por duas horas - murmura - Liam pediu que a deixasse dormir um pouco mais.
Disse-me para avisar que a cirurgia já terminou.
- Como Neil está? - pergunto, ansiosa - Preciso vê-lo.
- Calma Jenny! Neil está na UTI e ainda não pode receber visitas. Aparentemente tudo ocorreu bem, ainda temos que esperar que acorde, mas não há risco de morte.
Respiro aliviada, ainda terei que esperar algum tempo para poder ficar perto dele novamente, mas só fato de saber que está fora de perigo me tranquiliza.
- Eu quero falar com Liam - O pedido soa como uma suplica.
- Ele já foi embora - diz Paige - Pretende voltar à noite. A mãe de Neil também esteve aqui no quarto, mas já foi. Foram contar a Anne o que aconteceu. Lilian parecia muito angustiada.
A mãe de Neil esteve em meu quarto? Se antes não gostava de mim agora com certeza me odeia. Por minha causa quase perdeu o único filho. E Anne? Também me odiará se algo acontecer ao pai? Agora vejo que não prejudiquei apenas o homem que amo, mas todas as pessoas a sua volta e essa certeza me entristece amargamente.
- Ela disse alguma coisa? - pergunto, angustiada.
- Não - Paige balança os ombros - Apenas perguntou como você estava. Foi embora em seguida.
Isso me soa estranho. O que a mãe de Neil queria comigo? Por que veio me ver? Terei que esperar para ter todas as perguntas respondidas e espero que eu esteja preparada para o que vier.
- Onde está o Kevin?
- Saiu para comer.
- Aposto que você ainda não comeu nada, não é?
- Comi alguma coisa.
Ela está mentindo. Aposto que ficou ao meu lado o tempo todo. Não sei o que fiz para ter uma amiga tão dedicada como Paige e ter um homem que me ama como Neil, mas eu juro que daqui para frente eu vou merecer toda confiança e amor que eles me dedicam.
- Vá para casa Paige, descanse um pouco.
- Eu...
Antes que ela possa continuar eu protesto.
- Prometo que ficarei bem - insisto - Kevin pode tomar conta de mim.
Embora ela esteja muito receosa em me deixar, acaba concordando. Promete que estará aqui amanhã bem cedo. Eu não tenho dúvidas disso, tenho muita sorte em estar rodeada de pessoas que me amam e apoiam em momentos tão difíceis como esse.
Não há muito que fazer em um quarto de hospital. Então procuro olhar em volta e observar cada
detalhe. Estive tão perdida em todas as emoções das últimas horas que só agora me dou conta do milagre que estou vivendo.
Eu posso ver! Cada objeto, cada cor, cada forma. Não preciso lembrar ou tentar imaginar como são. Eu as vejo agora. Fecho os olhos por um segundo e abro-os rapidamente. Nunca mais estarei condenada a escuridão.
Há uma TV fixa a parede em frente à cama. Quantas vezes ouvi seu som e desejei ver as cenas que passavam nela. Como uma criança, pulo da cama e vou até a mesinha, pego o controle remoto e ligo a TV. Está em um canal de culinária, o canal seguinte é um canal infantil. Deixo ali mesmo, sempre gostei de desenho animado.