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CAPÍTULO 2
Aline Tavares
Ver o Pedro caído no chão segurando o braço foi assustador.
Assim que ele foi atendido pelos paramédicos, já preparados para esse tipo de acontecimento. Fomos para o Hospital e eu só conseguia me sentir culpada por não ter desconsiderado meus instintos.
Algo me dizia que ainda não era hora, e agora meu menino estava machucado. Senti Pedro apertar minha mão e levantei a cabeça do colchão.
- Mãe, quando vamos embora? - Vi os olhos azuis de Otávio em nosso filho e suspirei.
- Só estamos esperando o raio-x, se estiver tudo ok, ai receber alta ainda hoje. - Olhei seu braço enfaixado pensando que nada estava OK ali. Mas pelo menos ele não parecia ter sofrido danos maiores.
- Já disse que não bati a cabeça... - Ele estava ansioso por odiar hospitais.
- E eu já disse que os médicos precisam ter certeza. - Falei com firmeza, Pedro bufou e fechou os olhos com força.
Suspirei e tentei anima-lo.
- Quer comer algo da cantina? - Ele negou e eu levantei. - Bom, vou pegar algo para mim, volto logo!
Ele assentiu e eu ajeitei o travesseiro dele antes de sair.
**
Uma semana se passou, o braço de Pedro já estava quase bom, considerando que nada quebrou, ele apenas caiu de mau jeito e causou uma luxação.
Nós dois evitávamos falar do ocorrido e, eu estava decidida a não deixa-lo participar de competição alguma novamente.
Considerei que pelo silêncio dele, concordava comigo. Talvez estivesse com tanto medo quanto eu.
Isso era bom, tudo o que eu menos precisava naquele momento era um pré-adolescente discordando de mim.
Na hora do jantar, o vi montando a mesa enquanto eu terminava de ferver nossa sopa, quando terminei, coloquei a panela em cima de um apoio de madeira. Em silêncio coloquei a comida dele e depois a minha.
- Você quer agradecer? - Ele assentiu e grudou as mãos.
- Obrigado, Deus, por essa refeição e por nossas vidas, amém!
- Amém! - falei e peguei a colher soprando a sopa. - Parece desanimado...
- É, por que eu estou... - Suspirei.
- Quer conversar? - Ele franziu os lábios e depois os apertou juntos, assentindo, mas parecendo receoso, demorou alguns minutos até que suspirou e me encarou.
- Mãe, eu quero tentar de novo! - Franzi a testa sem entender - Competir, eu quero competir de novo - Engoli em seco e soltei a colher devagar, para que o objeto não denunciasse o pequeno tremer que assolou minha mão, meu coração se encolheu no peito.
- Eu decidi que não o deixarei competir novamente... - relatei minha decisão com toda calma que consegui. Pedro arrastou a cadeira com força e levantou da mesa. - Pedro, volte aqui para comer. - Eu falei encarando o prato a minha frente, minha voz saindo num tom ameaçador.
- Até na minha fome você quer mandar agora? - Ele falou de forma agressiva e levei minha mão ao coração, ele nunca falou assim comigo. Meus olhos refletindo a mesma confusão que parecia haver na dele.
- Pedro, o que está acontecendo? - Vi lágrimas brotarem dos olhos do meu filho.
- Eu sabia, sabia que você não ia me deixar mais competir, e eu estou com raiva, por que eu tinha que ter alguma decisão nisso, é a minha vida!
- Sua vida que ainda é responsabilidade minha! - Suspirei tentando fazer minha voz parar de tremer. - Pedro, entenda, você poderia ter morrido se o Delegado pisasse em você! - Não importava o quanto tentava, minha voz ainda saiu estrangulada de medo só de pensar naquilo.
- Ele me conhece e não me machucaria, sabe disso, está arrumando desculpas para não permitir que eu compita, sabendo o quanto é importante pra mim! - Ele bufou de raiva, estava furioso. - Por que você não admite que eu forcei o cavalo e ele só me obedeceu, não foi culpa dele eu cair e também não foi sua, eu quero isso, é a minha escolha e não é justo só por que você é minha mãe, ter o poder de me tirar isso. Ter o poder de tirar de mim o que eu mais quero na vida. Eu te odeio, eu odeio que você mande em mim e nas minhas vontades.
Lágrimas rolaram pelo meu rosto, e não era somente por que eu estava chocada com a reação de Pedro, mas por que eu percebi uma coisa, ele estava crescendo, e logo eu ficaria sozinha.
Era desesperador pensar que eu não tinha mais o Otávio e que ele nunca mais voltaria.
Levei minha mão ao peito e tentei me controlar. Mas foi impossível, principalmente quando ele simplesmente saiu da sala de estar batendo os pés e resmungando palavras incoerentes que se eu não confiasse em minha educação poderia dizer que eram palavras sujas.
O conhecimento de que meu filho estava crescendo e que eu não tinha mais um marido para me consolar quando ele fosse embora me abateu com força. Como os pais sobrevivem a isso, juntos? E como faria para sobreviver aquilo sozinha?
Quando me recompus tirei a mesa e pensei em ir para o quarto, mas no último segundo mudei de ideia e fui para o estabulo. Lá, peguei minha égua, selei e montei. O nome dela é Pérola, pois ela é branquinha e, é muito preciosa para mim, já que ganhei do Otávio e a criamos desde que era uma potra. Comecei trotando com ela e sem perceber dei marcha e começamos uma cavalgada mais rápida.
Senti meu corpo em sintonia com a égua, nossa corrida cada vez mais rápida. O vento começou a pinicar meu rosto e quando, enfim, paramos, Pérola e eu estávamos ofegantes. Sem perceber nos guiei para o lugar onde Otávio e eu amávamos ficar e namorar. Era o pico de uma montanha, dava para ver toda cidade dali, e a iluminação mesmo artificial dava uma sensação de que podíamos tocar cada luzinha com a ponta dos dedos.
Fechei os olhos e lembrei, que sempre levávamos uma toalha para forrar e olhar o céu.
A tristeza era tão grande que doía como uma dor física, como era dolorida a saudade, ainda mais quando vinha acompanhada do desespero de não saber o que fazer.
Pedro era minha responsabilidade e eu sentia que estava perdendo algo que eu necessitava muito.
Precisava arrumar um jeito de voltar ao comando e tinha que ser logo!
*
Pedro não estava falando comigo no dia seguinte. E eu tentei me manter neutra quanto a isso, se ele queria ficar com raiva por eu querer protege-lo, não tinha muito que eu pudesse fazer.
Nós morávamos no sítio dos meus pais. Eu cresci ali e Pedro também!
Conseguíamos criar alguns animais, mas não muito e eu tenho reservado um espaço, onde uso como consultório veterinário de emergência quando alguns vizinhos precisam de atendimento, já que tenho um consultório oficial na cidade.
Todos os dias nossa rotina era essa, acordar cedo, cuidar dos cavalos, galinhas, e enquanto ia trabalhar, Pedro seguia para o colégio.
Hoje uma das minhas pacientes mais fieis, entrou no consultório querendo ver se a saúde do gato dela estava boa e como sempre, o que de fato ela queria era jogar conversa fora.
Dona Solange era amiga da minha mãe. E me conhecia como ninguém, mas não era a pessoa que eu mais gostava de conversar. E quem disse que adiantava alguma coisa a minha tentativa de fugir da conversa?
- O Pedro está um menino lindo, não é minha filha? - Sorri educada.
- Está sim, dona Solange, e muito esperto. - Ela assentiu.
- Pena que perdeu a competição, mas você poderia mudar isso, arrumando um pai para ele que o treine para ser um vencedor. Sozinha é difícil mesmo...
- O Pedro teve um pai, e eu não estou a procura de um marido, até por que eu não quero um para ser pai do meu filho, ninguém tem essa obrigação e eu gostaria que parasse de falar como se ele precisasse de um homem para guia-lo para se tornar um cidadão decente, ele tem a mim, é o suficiente. - Sabia que tinha sido grossa, mas também achei muito grosseiro da parte dela falar daquele jeito.
- Se acalme, Aline, eu só queria ajudar.
- Sabe quem muito ajuda, senhora Solange? - Ela sabia o que eu iria falar e levantou as mãos.
- Nossa, menina, você precisa mesmo de um homem para descarregar toda essa energia. - A senhora riu inconveniente, pegou a casinha do gato dela e saiu rebolando a bunda gorducha dela para longe de mim.
Esfreguei os cabelos e olhei para Andreia, minha secretária que tinha o olhar espantado.
- Você está bem agitada hoje. - Observou Andreia e suspirei esfregando o rosto.
- Desculpe, este não é o meu normal, mas é que essa mulher...
- É, ela toma conta da vida de todo mundo, mas achei que já estivesse acostumada. - Sorri de leve.
- É um dia ruim para ela vir falar de marido para mim. Mas vou ficar bem. - Suspirei e olhei para a porta quando um homem alto entrou, não reparei muito nele, que foi até o balcão, onde Andreia ficava e aproveitei para terminar de preencher a ficha do atendimento do gato da Solange. Decidi ir para minha sala, mas a voz grossa e firme do homem chegou aos meus ouvidos com uma pergunta que me travou no lugar.
- Boa tarde. Eu vim a procura de Otávio Alcântara. Disseram que poderia encontrar informações sobre ele aqui.
E apesar do sobrenome de Otávio não ser aquele, eu senti que era o meu marido morto, e que eu não gostaria de saber o que aquele homem queria com ele.
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Com amor,
Maitê Sombra!