Achou inúmeros registros, como arquivos e vídeos, algumas pessoas falando sobre o assunto e ensinando sobre um pouco do mesmo. Mostrando como era vivenciar isso no dia a dia, e surpreendeu-se com o tanto de coisa que aprendeu em apenas alguns minutos.
Woojin era uma mulher transgênero?
Ou melhor, Lucy era?
Não sabia ainda a resposta para ter certeza, e achava estranho ainda perguntar tal coisa para a garota.
Sempre havia visto Woojin como um garoto, o garoto no qual ele se apaixonou, mas, agora, tudo mudava...
Ele não podia mais continuar apaixonado por Woojin?
Porque, Ryeon sempre foi claro quando dizia não gostar de garotas. Já que a única pessoa no qual seu coração bateu forte foi Woojin, e esse agora não existia mais, certo?
Bom, talvez fosse isso.
Ele não sabia como agir ou se expressar agora, então estava indo para a escola sozinho, chegando cedo e sentando algumas cadeiras à frente da de Lucy. Dando para si mesmo, um pouco de tempo, tentando entender tudo aquilo.
Mas Lucy sentia. Todas às vezes que chegava à parada de ônibus e não encontrava Ryeon lá, a garota sentia-se como um monstro, porque era nítido que Ryeon estava assustado com ela.
Assustado com o monstro que com certeza ele agora a enxergava.
E sempre o via afastado em suas manhãs. Doía em si, perceber que estava distante do amigo no qual ela sempre o viu, e doía ainda mais em perceber que ela era a culpada de tudo.
Mas Lucy ainda sentia falta de seu melhor amigo.
Ryeon era o melhor de todos.
ㅡ Aigoo, o que aconteceu com você naquele hospital? ㅡ perguntou Jaesun. ㅡ desde que saiu você está triste...
Lucy suspirou, apoiando-se na parede ao seu lado e virou para o amigo.
ㅡ Eu contei a ele.
Seus olhos ainda miravam Ryeon, mas Jaesun pouco se importou, chegando mais perto com sua cadeira e cutucando a garota.
ㅡ Contou a Ryeon?
ㅡ Sim...
ㅡ E como foi?
Lucy olhou-o, dando de ombros.
ㅡ Eu não sei... Ryeon não falou nada a respeito.
ㅡ Ele foi arrogante?
ㅡ Não. ㅡ negou sorrindo, tornando a olhá-lo. ㅡ Ele se declarou.
ㅡ Declarou? ㅡ Jaesun abriu seus olhos, sorrindo. ㅡ como assim? Ele gosta de você?
ㅡ Do mesmo jeito em como eu gosto dele, oppa.
ㅡ Então isso é bom, não é?
Lucy instantaneamente entristeceu-se. Não queria voltar a pensar naquilo, já havia chorado muito em suas noites solitárias.
ㅡ Não.
ㅡ Não?
ㅡ Ryeon não gosta de garotas, oppa, e eu sou uma. Foi por isso que contei, não quero mais guardar isso dentro de mim.
ㅡ Poxa...
Jaesun, que, por um instante, deixou de apreciar seu precioso Mark, olhou para Ryeon, sentindo a dor que sua amiga estava sentindo por tudo.
ㅡ Eu queria poder somente ser feliz, Jae. ㅡ disse ela, abaixando o olhar. ㅡ Nos beijamos, e foi tão incrível... Ryeon faz-me sentir-me bem com pouco, mas, não podemos ficar juntos somente porque nasci errada.
ㅡ Você não nasceu errada, lu. ㅡ disse buscando suas mãos. ㅡ você é você e ponto. É perfeita.
Lucy sorriu, sentindo o calor de ter alguém tão bom quanto Jaesun ali consigo.
ㅡ Você é minha alma gêmea. ㅡ findou Jaesun, encostando-se na amiga. ㅡ E você sabe que eu te amo demais. Não fique assim. Eu tenho certeza que ele vai te entender e...
ㅡ Novo casal aqui? ㅡ perguntou Sun, aproximando-se e sentando à frente, interrompendo por completo o assunto.
Lucy bufou.
ㅡ Da o fora daqui, garota. ㅡ falou Jaesun, ríspido.
ㅡ Eu sei que você não gosta de mim, mas, eu realmente acho que ambos formam um casal bem bonito, já que você é gay e... ㅡ olhou para Lucy. ㅡ Woojin tem esse jeito feminino dele.
ㅡ Garota como você é nojenta. ㅡ cuspiu Jaesun, rosnando para ela. ㅡ só sai daqui.
Lucy apenas encarava a garota, não tendo sequer o que falar.
ㅡ Você não gosta de mim por causa do Mark, não é?
ㅡ Mais uma palavra e você vai se arrepender de não ter saído daqui.
Jaesun ameaçou.
Lucy sabia que o amigo jamais machucaria alguém do modo em como ameaçava, principalmente uma mulher, mas sabia do desdém em que Jaesun e sun tinha a anos, e já tinha como rotina aquelas alfinetadas.
Então viu Sun se erguer, sorrindo, cheia de sarcasmo, e indo para o outro lado da sala de aula. Sentando bem ao lado de Mark.
Lucy outra vez bufou.
ㅡ Ainda bem que esse é o nosso último ano. ㅡ falou.
ㅡ Não liga pra nada que essa cobra do deserto de karakum falar. ㅡ respondeu o amigo, voltando a encostar-se a ela.
ㅡ Deserto de Karakum? ㅡ perguntou rindo.
ㅡ É só um deserto qualquer que vi na internet ㅡ respondeu-a. ㅡ Lu, o fim do ano letivo está chegando e esse é o nosso último ano. Você já sabe o que você vai fazer depois da formatura?
ㅡ Se tudo der certo vou a Seul. Quero tentar lá, você sabe.
ㅡ Eu também quero, então, vamos prometer que se passarmos juntos, nós ficaremos juntos?
ㅡ Seul? Eu também quero ir a Seul. ㅡ disse Kuan, sentando-se à frente e intrometendo-se na conversa.
ㅡ Isso aqui virou feira, foi? ㅡ outra vez perguntou Jaesun, ríspido e sem paciência. ㅡ todo mundo se intromete. Que merda.
Lucy riu alto. Não conseguiu se conter, mas parou no momento em que viu Ryeon olhando-a.
Seu coração disparou quando viu os olhos do acastanhado fitar os seus.
ㅡ Você é muito enxerido, Kuan, tenha modos.
ㅡ Eu tive. ㅡ respondeu a Jaesun, sorrindo ladino. ㅡ lembra-se? Foi no seu quarto.
ㅡ Ugh. Por que não fala desses dias sombrios mais alto, uh?
ㅡ Por que me odeia tanto? ㅡ Kuan semicerrou os olhos.
ㅡ Eu não te odeio, só não gosto do seu jeito enxerido de ser.
ㅡ Aigoo, parem de brigar. ㅡ pediu Lucy, perdendo totalmente sua paciência. ㅡ E olhem, a professora chegou.
Olhando a frente e vendo que de fato a mulher adentrava, Jaesun afastou-se e levou consigo sua cadeira, ajeitando-se a carteira. E Kuan apenas se virou de frente, sorrindo ao ver o namorado adentrar a sala às pressas, totalmente atrasado.
ㅡ Atenção todos. ㅡ pediu a professora, sorrindo quando teve todos os olhares voltados para si. ㅡ o fim do ano está próximo e o baile de encerramento também, sei que todos estão animados com seus pares e com suas apostas para as faculdades, mas, se quiserem mesmo ficarem felizes, prestem atenção aqui, ok? Preciso de toda atenção, pois hoje farei uma revisão para a prova final. ㅡ vendo que não havia nenhuma objeção sobre sua fala, à mulher prosseguiu. ㅡ abram seus livros na página duzentos e dois.
Lucy ouviu o muxoxo de Kuan e o bufar de Jaesun, mas prosseguiu, abrindo o livro e focando apenas no que importava.
Se ela quisesse mesmo ir a Seul, todas as suas notas teriam que ser as melhores.
E elas seriam.
[...]
Caminhando de volta a casa, Ryeon continuava pensativo. Havia ouvido sem querer o comentário de Lucy sobre ir a Seul, e, instintivamente, sentiu-se estranho.
Passou ligeiramente por sua mente que não teria mais a pessoa que mexia consigo perto, já que suas apostas eram nas universidades locais de Busan.
Nunca pensou em ir para tão longe, queria mesmo ficar perto de sua mãe, mas, sabendo agora que Lucy iria, temia que tudo realmente estivesse acabando.
Então sentou-se na parada de ônibus cabisbaixo, triste e confuso, querendo apenas uma luz para toda a sua confusão.
ㅡ Oi.
Ryeon ouviu a voz tímida e instintivamente ergueu o olhar, sentindo seu coração bombear o sangue com mais força.
Ele respirou fundo.
Lucy, ainda sem respostas, sorriu, sentando ao lado de Ryeon e insegura, olhou para seus próprios pés.
ㅡ Oi. ㅡ Ryeon respondeu.
Sentiam-se estranhos, sequer haviam trocado mensagens.
ㅡ Eu ia te chamar para vir. ㅡ Ryeon tomou a frente, vendo que a garota não iria puxar assunto. Conhecia-a bem para saber que a garota não estava à vontade. ㅡ mas eu não sabia se você iria vir comigo...
Lucy olhou-o rápido, desviando o olhar em seguida.
ㅡ Eu viria sim. ㅡ mordeu o lábio inferior. ㅡ mas eu não pensei que você ainda iria querer falar comigo.
Ryeon franziu o cenho, desta vez aproximando-se mais da garota.
ㅡ Como eu devo te chamar? ㅡ perguntou baixo, confuso.
ㅡ Ninguém além de você e Jaesun sabem, então... Me chame do jeito como quiser. ㅡ deu de ombros.
ㅡ Não. ㅡ Ryeon negou fraco. ㅡ eu preciso te chamar do modo em como você se sinta bem.
Lucy sorriu fraco, sentindo-se boba por ainda ter park ali, preocupado consigo e em como ela queria ser chamada.
ㅡ Eu te disse, meu nome é Lucy. ㅡ sorriu olhando-o.
ㅡ Lucy... ㅡ Ryeon repetiu fraco. ㅡ é um bonito nome, você quem escolheu?
A garota assentiu.
ㅡ Desde os meus seis anos.
ㅡ Seis? ㅡ Ryeon abriu os olhos, espantado.
ㅡ Sim, com o filme as panteras. ㅡ sorriu fraco, escondendo seu rosto.
Ryeon abriu a boca.
ㅡ Não me diga que foi por isso que você sempre escolheu ser a Alex Munday.
A garota sentiu-se envergonhada, mas contente. Lucy, ainda com seu rosto coberto, assentiu.
ㅡ Lucy Liu era a minha favorita Ryeon.
ㅡ Woah... Estou tão surpreso. ㅡ negou sorrindo fraco.
ㅡ E você, sempre quis ser a Dylan. ㅡ lembrou ela.
ㅡ Ah... Mas era somente porque eu queria ser ruivo! ㅡ respondeu-a. ㅡ eu sempre quis pintar meus cabelos no tom ruivo...
Lucy avistou o ônibus dobrar a esquina, e ficou de pé, fazendo Ryeon fazer o mesmo.
Em silêncio, adentraram o ônibus como sempre fazia desde a infância, sentando nos últimos lugares.
ㅡ Você ficaria muito bonito. ㅡ disse a garota, ajeitando sua mochila sobre as pernas.
ㅡ Como? ㅡ Ryeon olhou-a, não entendendo seu dito.
ㅡ O cabelo. ㅡ apontou. ㅡ Você ficaria muito bonito se pusesse o ruivo...
ㅡ Ah... ㅡ Ryeon corou, abaixando vergonhosamente o olhar. ㅡ valeu.
A garota não conseguia ainda se expressar muito bem, e sequer conseguiu se concentrar na música que tocava em sua playlist.
Encaixou apenas um dos lados do fone de ouvido, esperando ouvir mais da voz de Ryeon, mas como esta não veio, apenas permaneceu quieta, sentada ao lado de quem lhe bagunçava toda, e vendo através da janela como o tempo passava junto com as casas a cada novo segundo.
Quando desceram da condução, caminharam até a esquina ainda em silêncio, e quando chegou o momento de se despedirem, sorriram um para o outro.
ㅡ Bom, eu... ㅡ Ryeon iniciou, vendo os olhos da garota mirarem os seus. ㅡ até amanhã.
ㅡ Até amanhã. ㅡ ela sorriu, virando-se.
Lucy sentia um rebuliço imensurável dentro de seu estômago, mas estranhamente se sentia melhor por ver que talvez Ryeon entendesse um pouco de si.
E caminhando ainda a passos esquisitos, sentiu o toque suave em seu ombro.
Virando-se, outra vez ela viu o sorriso de Ryeon.
E sem perguntas, sentiu o corpo dele abraçar o seu, forte, enquanto suas mãos afagavam as costas.
ㅡ Eu não quero parar de falar com você. ㅡ disse.
A garota ainda mantinha seu corpo quieto, assustada com o toque inesperado, mas sentiu o encaixe que suas mãos tiveram até as costas de Ryeon, apertando-o de volta.
Afastando-se, ambos os olhares se encontraram.
ㅡ Eu também não quero Ryeon...
ㅡ Então... ㅡ Ryeon olhou ao redor, vendo sua casa logo à frente. ㅡ vem a minha casa hoje à noite. A gente pode assistir a um filme.
Ela sorriu, não querendo lembrar-se dos beijos de ambos, mas inevitavelmente tendo-os em suas memórias.
Talvez ficassem gravados para sempre.
Mas, assistir a um filme com Ryeon, depois daqueles beijos, não era uma ideia boa. Além do mais, que mesmo conhecendo cem por cento de Ryeon, ele poderia estar confuso com tudo o que ainda vinha acontecendo e com todas as coisas que havia falado, então, pensando pelo lado da razão, a garota falou:
ㅡ Não sei, não, oppa.
Ryeon não se entristeceu, sequer notou a negativa para seu convite, pois tudo o que ouviu em alto e bom som foi a forma em que a garota o chamou.
ㅡ Eu nunca percebi isso. ㅡ riu. ㅡ o "oppa", Quer dizer, uma vez eu percebi sim, mas achei que era coisa da minha mente apaixonada. Mas eu realmente nunca vi que você me chamava assim, tão naturalmente. É gostoso de ouvir, sabia?
Lucy ainda o olhava e sorriu pequeno.
ㅡ Eu faço sem perceber...
ㅡ Você nunca me chamou de hyung. ㅡ Ryeon fez a observação.
ㅡ Deve soar engraçado...
ㅡ Deveria, mas é realmente gostoso de ouvir. Quer dizer, se você me chama de oppa, quer dizer que eu sou o garoto mais velho que te protege. ㅡ piscou.
A garota observava ainda as palavras e expressões corporais de Ryeon, e vendo-o sorrindo de forma tão aberta, e livre, constrangeu-se.
Ryeon estava certamente brincando consigo.
ㅡ Eu preciso ir. ㅡ disse logo.
Ryeon cessou o sorriso no imediato momento, vendo-a dar as costas.
ㅡ Ei. ㅡ chamou. Mas ela fingiu não ouvir, sentindo suas bochechas esquentarem de tamanha vergonha. ㅡ Lucy! ㅡ gritou.
A garota gelou.
Um choque subiu por seu corpo e atingiu até seu último fio de cabelo.
A garota arrepiou.
E como se uma nuvem de borboletas que voam livres num vasto campo de flores nas tarde de primavera adentrassem seu estômago, Lucy sentiu-se enjoada.
Não enojada, apenas enjoada. Aquela era a primeira vez em que ouvia seu nome ser chamado alto.
Alto e sem medos.
Chamado por Ryeon.
Virando para si, a garota viu-o aproximar-se incerto.
Ryeon sentia sua garganta seca, não sabia se podia de fato chamar por aquele nome daquela forma, mas queria mostrar que de fato não se sentia estranho com aquilo.
ㅡ Eu tenho algumas perguntas para você. ㅡ disse ele, parando de frente a garota novamente.
ㅡ Perguntas?
ㅡ Sim, sobre... Sobre tudo. ㅡ confessou e sorriu. ㅡ eu pesquisei na internet, mas... Eu queria saber de você. Pode ser?
De todas as reações que Lucy imaginou Ryeon ter, aquela não era sequer uma.
A garota sempre imaginou o pior, não sabia que Ryeon a aceitaria, ou tentaria aceitá-la de forma fácil assim.
E perceber que a reação dele não era prevista por si, fez-lhe sorrir mais.
ㅡ Eu não posso hoje. ㅡ falou a verdade, apertando entre os dedos as alças de sua mochila. ㅡ Marquei de ir a... Hm, um lugar com Jaesun.
ㅡ Ah... Que pena. ㅡ lamentou-se Ryeon. ㅡ tudo bem, então.
Pronto para se despedir e virar-se para ir, Ryeon ouviu-a falar:
ㅡ Mas posso ir no fim de semana. Talvez, quer dizer, se você ainda quiser.
O garoto apenas assentiu, saltitante por dentro.
ㅡ Ótimo. ㅡ respondeu-a. ㅡ Vou separar o seu filme favorito.
ㅡ Não precisa. ㅡ a garota negou, envergonhada por agora Ryeon saber de onde veio seu nome.
ㅡ Nada disso, assistiremos às panteras com certeza.
Sorrindo, Ryeon viu-a assentir, e por um segundo, perdeu-se a bela imagem que era a dela.
ㅡ Então, tudo certo? ㅡ ela perguntou.
ㅡ Tudo. ㅡ ele assentiu. ㅡ tudo certinho.
ㅡ Então, tchau, Ryeon.
Afastando-se, ela abanou a mão.
Ryeon continuou parado ali, vendo-a cada vez mais longe. E não estranhou estar sentindo naquele momento o mesmo que sempre sentiu.
O mesmo que sentiu há anos apenas por Woojin.
Mas sorriu quando viu a garota sumir de sua visão, tomando o rumo de sua casa, e daquele modo, enfim, se despediu:
ㅡ Tchau, Lucy.