ㅡ Então usa. ㅡ Jae respondeu simples. ㅡ põe aquele com glitter, é simplesmente perfeito. Fica lindo em você.
A garota fitou Jaesun através do espelho, vendo-o sentar-se e assentir. Caminhou incerta até sua cama e buscou sua caixa que ficava debaixo. De lá, retirou do fundo o seu laço rosa, sutil, mas encantador.
ㅡ Lucy, que saia linda! ㅡ Jaesun buscou o tecido verde, erguendo-o no ar para olhá-lo melhor. ㅡ e curta! ㅡ sorriu.
ㅡ Eu comprei há um tempo. ㅡ respondeu a garota também olhando o tecido. ㅡ A moça da loja me vendeu M, mas acho que deveria ter pegado a G, ela fica muito curta.
Jaesun olhou mais uma vez a saia, em seguida, olhou para a amiga e abriu um de seus sorrisos cúmplices.
Não precisou de mais. Lucy buscou o tecido das mãos do amigo e correu para trancar a porta de seu quarto.
Jaesun fechou a janela e voltou a sentar na cama, animado quando viu a garota já retirar o short que usava.
ㅡ Woah, que bonita. ㅡ apontou o garoto para a cueca que a garota usava. ㅡ É feminina, não é?
ㅡ É sim. ㅡ sorriu contida. ㅡ mamãe nem percebeu.
Jaesun cobriu a boca com a mão e prendeu o riso. Gostava de ver a garota animada daquele jeito, e ver que um simples pedaço pequeno de pano intitulado "feminino" deixava-a feliz, pelo simples fato de poder usá-la livremente.
A garota passou o tecido por suas pernas com facilidade, erguendo-o e prendendo em sua cintura fina, logo passando a mão por cima da saia e a ajustando em seu quadril, encantada demais com a peça.
ㅡ Você é a garota mais bonita que já vi. ㅡ Jaesun disse, com seus olhos brilhantes.
ㅡ Eu sou sim. ㅡ disse sorrindo, vendo o amigo revirar os olhos.
ㅡ Veste aquele cropped de lã, acho que combina.
A garota assentiu outra vez animada, correndo para sua caixa e buscando-o. Retirou a camisa larga que vestia e o pôs, sentindo a ausência de seios quando tocou o próprio busto, mas imaginando como aquilo ficaria lindo quando um dia tivesse.
Jaesun suspirou.
ㅡ Você precisa mostrar tudo isso ao mundo, lu. É lindo.
A garota olhou-se no espelho, analisando suas pernas e parte de suas coxas desnudas. Não tinha muitos pelos por aquelas partes. Na verdade, não tinha muitos pelos por todo o corpo. Sua cintura com parte da pele a mostra também e seus ombros, tudo graciosamente puro e seu, encantando-a de modo que a fez sonhar e imaginar, como seria sair com aquela roupa pelas ruas.
ㅡ Me passa a bolsa verde. ㅡ pediu.
Jaesun logo buscou-a, entregando e ficando ao lado dela, vendo-a pôr e analisar-se, sorrindo ao buscar o celular.
ㅡ Vou tirar uma foto.
Jaesun se afastou, dando-lhe espaço para não atrapalhar a foto, e enquanto a garota fazia poses com seu celular em frente de um espelho, Jaesun sorrateiramente buscou o seu próprio aparelho, tirando discretamente uma foto dela enquanto sorria, e guardando para si.
Era um momento único de sua amiga sendo ela mesma.
ㅡ Woojin?
Ambos sobressaltaram com o susto do som de batidas na madeira da porta e o som da fechadura sendo forçada.
ㅡ Por que está trancado?
A garota desesperou-se. Jaesun pensou rápido e puxou-a para o banheiro. Jogando-a lá com todas as roupas que havia retirado do corpo. Em seguida, chutou a caixa e abriu a janela, respirando fundo até que enfim destravou a porta.
E ele sorriu na maior cara de pau para a mulher.
ㅡ Desculpe-me, senhora jeon. Eu estava contando um segredo a Woojin, acho que quando fechei a porta acabei trancando-a sem querer.
ㅡ Onde está Woojin? ㅡ a mulher perguntou ao adentrar.
ㅡ Fazendo o número dois. ㅡ foi o que o garoto respondeu.
A mulher olhou-o confusa, em seguida mirou a porta do banheiro e foi até lá.
ㅡ Woojin? ㅡ chamou rente a porta.
ㅡ Estou aqui. ㅡ respondeu a garota.
ㅡ Está tudo bem?
ㅡ E por que não estaria, mamãe?
Outra vez a mulher mirou Jaesun, e o garoto que olhava aflito para a mulher sorriu outra vez.
ㅡ Não deixe a porta trancada, ouviu? ㅡ falou para Lucy, mas fitava Jaesun. ㅡ eu não gosto disso aqui em casa, sabe bem.
ㅡ Desculpe-me mamãe.
Jaesun comprimiu os lábios, assentindo e fingindo uma falsa lamentação, fazendo a mulher semicerrar os olhos para si ainda mais.
ㅡ Desça, eu quero que conheça alguém.
ㅡ Conhecer? ㅡ a garota indagou do banheiro alto. ㅡ quem?
ㅡ Desça e descubra. ㅡ respondeu dura, já caminhando de volta a porta. ㅡ não a tranque! ㅡ falou para Jaesun.
O garoto assentiu, vendo-a sair e descer as escadas, e apenas quando ouviu a mulher recepcionar quem fosse ao andar debaixo, fechou a porta sem fazer barulhos.
ㅡ Tudo limpo. ㅡ sussurrou na porta do banheiro.
Lucy saiu e bufou, já com as roupas que antes vestia nas mãos. Abaixou-se e guardou tudo outra vez na caixa, afundando-a debaixo da cama, guardando mais uma vez quem realmente era ali.
ㅡ Isso é um saco. ㅡ deitou-se na cama. ㅡ eu não aguento mais.
ㅡ Você deveria falar. ㅡ Jaesun também deitou, virando para fitar melhor a amiga. ㅡ ao menos ao seu pai. Você mesmo disse que ele te aceitaria se fosse gay. Por que não aceitaria assim?
ㅡ Eu sou o que sou, Jaesun, mas, não quero magoá-lo. Ser gay é diferente. Veja você, você não tem brigas internas por gostar de homens. Ver o filho vestido numa saia é totalmente diferente.
ㅡ E quem lhe disse isto? ㅡ indagou Jaesun, enraivecido. ㅡ Eu tenho brigas internas comigo todos os dias. Não é porque meus pais "aceitaram" ㅡ fez aspas. ㅡ Que eu me sinto livre para levar um namorado aos almoços de domingo. Eu vejo os olhares que mamãe tem sobre mim quando vê algum amigo meu namorando uma garota, ou quando meu pai finge quando perguntam se eu estou namorando e pegando muitas garotas. Mas o que acontece é que, eles são meus pais, e me amam acima de tudo. Eu tenho certeza que não era isso que eles queriam para mim, mas eu nasci assim, o que poderiam fazer? Me expulsar aos treze anos de casa?
A garota suspirou.
ㅡ Me desculpe. ㅡ pediu.
ㅡ Não. ㅡ Jaesun se aproximou mais ainda. ㅡ eu não quero que se desculpe, eu quero que se entenda. Você não vai acordar um dia e ver que ser uma garota foi uma opção sua e que não quer mais ser. Você nasceu assim e vai ser assim até o fim. Eu só não quero que você viva frustrada e presa como anda vivendo todos esses dias. Você merece ser livre, lu, e eu tenho certeza que o seu pai nunca deixaria de te amar por ser quem você é.
A garota tornou-se pensativa naquele momento e olhou para o garoto.
ㅡ Eu não consigo, Jae.
ㅡ Consegue sim. ㅡ sentou-se e a puxou. ㅡ agora vá, ponha seu laço que Ryeon já te espera.
A garota sentiu o borbulhar outra vez em sua barriga, em nervosismo ao lembrar que Ryeon e ela tinham um encontro para assistir às panteras e conversar sobre transexualidade.
Ela não sabia se estava pronta para ter essa conversa agora. Muito menos com Ryeon.
Mas pôs seu laço mesmo assim, amarrando seus cabelos em um rabo de cavalo e o pondo no topo, endireitando-o por fim, e buscando seu delineador em seguida.
ㅡ Vai pôr? ㅡ Jaesun se surpreendeu quando a viu assentir. ㅡ Garota rebelde, é assim que eu amo.
Com um fino delineado tipo gatinho, Lucy buscou uma de suas calças largas e escuras e vestiu-a. Pôs o top que costumava vestir sempre por debaixo da blusa para acostumar-se quando tivesse seios e finalizou com um pouco de gloss nos lábios e um perfume doce e suave.
Sua imagem não era bem o que ela imaginaria para si, mas, naquele fim de tarde, ela sentiu-se bonita.
Muito bonita.
Recolheu o celular e algumas notas de won que guardou para comprar besteira e comer com Ryeon, e desceu para o andar debaixo com Jaesun.
Ouvia sua mãe sorrir alto e também ouvia mais duas vozes femininas. Seu pai não estava em casa, então teria que ser rápida para sair de casa sem sua mãe lhe encher de perguntas.
ㅡ Woojin? ㅡ a mulher chamou. Lucy sorriu, aproximando-se e somente quando chegou à sala, é que viu sua mãe com duas visitas.
Ainda não conhecia os rostos ali, mas havia uma mulher mais velha, com mais ou menos a mesma idade de sua mãe, e ao lado, uma garota jovem. Muito jovem.
ㅡ Essa é Cho Yeo, nossa nova vizinha.
A garota sorriu, reverenciando ligeiramente a mulher.
ㅡ É um prazer conhecê-la, senhora Cho.
ㅡ E olhe, Woojin, essa é a filha dela. Cho Kimi. Não é uma graça?
Outra vez a garota sorriu, vendo a outra garota devolver o ato com timidez, olhando para o topo de sua cabeça logo em seguida.
ㅡ Gostei do seu laço, é bem bonito.
Lucy tocou sutilmente o laço.
ㅡ Obrigada. ㅡ sorriu.
Sun-ha olhou aquilo de modo duro, ficando de pé e retirando-o com pressa.
ㅡ Não liguem, Woojin quando está com seus amigos gosta de fazer bobagens.
Jaesun suspirou, dando a mão à garota, apresentando-se e vendo-a sorrir outra vez.
ㅡ Sou Jaesun, o amigo que faz os outros fazerem bobagens.
Piscou o olho, vendo a garota cobrir a boca com as mãos, e em seguida, buscou o laço da mão de Sun-ha, entregando-o a Lucy.
ㅡ Woah, seu cabelo é bem cumprido. ㅡ apontou Kimi. ㅡ É lindo. Seu delineado também, que perfeitinho...
Desta vez foi Lucy que ficou tímida, tocando nos fios e os jogando para somente um lado, amarrando a ponta com o laço outra vez.
ㅡ Você tem namorada? ㅡ perguntou Yeo, analisando Lucy de cima a baixo.
ㅡ Não. ㅡ respondeu sem filtros.
ㅡ E por que não?
ㅡ Porque estudar é mais importante. ㅡ intrometeu-se Kim. ㅡ A senhora não acha não?
ㅡ Ah, sim, com certeza.
ㅡ Kimi foi transferida para o mesmo colégio que o seu, meu anjo. ㅡ explicou Sun-ha para Lucy.
ㅡ Mas só temos mais dois meses para o fim. Entrará assim mesmo? ㅡ indagou Jaesun.
ㅡ É, mas, eu consegui conversar com o diretor e Kimi irá apenas revisar o assunto, já que é o mesmo que tiveram durante todo o ano.
ㅡ Você poderia ajudá-la a revisar Woojin.
Lucy assentiu, olhando as horas no relógio da parede.
ㅡ Eu preciso ir agora, mas, nos vemos no colégio. ㅡ disse. ㅡ Até logo senhora Cho.
Vendo mãe e filha se despedir, Lucy segurou a deixa para sair do lugar.
Suspirou quando enfim sentiu a brisa fria do vento bater contra si e foi rápida em voltar a ajeitar o cabelo do modo em como estava antes.
ㅡ Está bonito? ㅡ perguntou a Jaesun, prendendo outra vez o rabo de cavalo.
O garoto caminhava ao seu lado, já que a casa de Ryeon não era muito longe dali.
ㅡ Perfeita, Lu. ㅡ sorriu. ㅡ vê se dá uns beijinhos hoje.
ㅡ Aigoo, você acha mesmo que Ryeon vai querer dar uns beijinhos, oppa? Claro que não.
ㅡ Claro que sim. Ele está boiola por você e só você não vê.
ㅡ Até parece...
Pararam numa conveniência que tinha logo na esquina e gastaram todo o dinheiro com besteiras típicas para assistir a filmes.
Tinha pipoca, doces diversos e bebidas gaseificadas, tudo prontinho apenas para ser degustado.
ㅡ Vê se não vai ter mesmo um piriri lá, entendeu? Não come esse tanto de besteira de uma vez só.
A garota ouviu os conselhos do amigo enquanto o via roubar uma coisa de cada. Esperou até Jaesun fazer sua feira ali, e no fim, despediu-se.
ㅡ Me deseje sorte. ㅡ pediu.
ㅡ Eu desejo é sexo. ㅡ brincou. ㅡ ok, boa sorte.
Vendo a garota ir com seu rabo de cavalo balançando, ele sentiu o coração aquecer. Sentia que ela estava mesmo tentando.
Havia tentado durante a semana consigo e com a psicóloga no qual arrumou. Lucy sentou-se lá por uma hora, e se abriu para a mulher desconhecida.
Jaesun nunca sentiu tanto orgulho da amiga como havia sentido lá, e vê-la saindo com a certeza de que voltaria para uma nova consulta, enquanto um sorriso enfeitava seu rosto, só aumentou a sensação.
Então sabia que naquele ato de simplesmente aceitar a possibilidade de falar mais de si para o garoto cujo seu coração palpitava, era a tentativa da garota de voar.
Era um pequeno começo. Talvez insignificante ao ver de muitos, mas imenso ao ver de ambos.
E foi quando Lucy parou seus passos em frente à casa amarela e cheia de flores que ela sentiu que poderia desmaiar.
Buscou ligeiramente o celular, procurando o número de Ryeon em seu aplicativo de mensagem, e quanto o achou, demorou alguns minutos até realmente digitar algo.
Lucy:
|Estou em frente a sua casa.
Não tardou muito para que a garota ouvisse o movimentar da janela de cima. O quarto de Ryeon era o primeiro e ela sabia daquilo. Viu o garoto abrir ligeiro e olha-lá lá de cima, sorrindo com seus cabelos bagunçados e o rosto inchado.
ㅡ Desculpa, acabei de acordar. ㅡ falou Ryeon.
ㅡ Tudo bem, eu posso esperar.
Juntando as mãos à frente do corpo, a garota viu Ryeon fechar a janela sem dizer uma só palavra.
Escorou-se no muro baixo e tocou sutilmente as flores expostas no jardim dali. Sorriu ao ver uma pequena margarida prestes a desabotoar, e sentiu-se por breves segundos como a pequena flor.
Mas, alheia a tudo, a garota não ouviu a porta principal ser aberta. Muito menos viu quando seu amigo passou por lá enquanto ajeitava a roupa velha que usava naquele momento. Lucy sequer viu quando ele parou a sua frente.
Ela apenas notou Ryeon quando ouviu sua voz.
ㅡ Vem, entra.
Olhando-o ligeiramente, ela assentiu, segurando firme a sacola que carregava as guloseimas e passando por ele.
ㅡ Mamãe está fazendo bolo. ㅡ disse Ryeon.
ㅡ Oh, ela está em casa?
Geralmente, Park Roseanne, mãe de Ryeon, não ficava as tardes em casa. A mulher sempre saía cedo para trabalhar numa loja de roupas, onde atuava como vendedora e voltava aos inícios das noites. Muitas vezes era Ryeon quem ficava responsável por limpar a casa e fazer o jantar, mas, naquela tarde, a mulher fazia o cheiro do bolo de laranja espalhar-se por toda a casa.
E Lucy sentiu-o assim que chegou à sala.
ㅡ Filho? ㅡ a mulher chamou.
Ouviu os poucos passos dela na cozinha, e logo sua imagem apareceu na sala. A mulher usava um avental na cintura e seus cabelos cor de rosa amarrados em um coque alto.
Ela sorriu surpresa ao ver Lucy ali.
ㅡ Oh, quanto tempo! ㅡ falou aproximando-se. Lucy, ainda tímida, sorriu, mas foi abraçada por a mulher com força, sendo obrigada a devolver o toque.
ㅡ Mãe... 'tá apertando demais. ㅡ falou Ryeon, num tom baixo e tímido.
A mulher negou para o garoto, segurando Lucy pelos ombros e encarando o rosto da garota mais alta que si.
ㅡ Woah, como está bonito. ㅡ disse.
Ryeon sentiu-se estranho ao ouvir a mãe referir-se a garota por o masculino, mas Lucy sorriu tão grande e verdadeiro, que Ryeon sequer conseguiu focar em outra coisa.
ㅡ Obrigada, senhora Park.
ㅡ Oh, o que é isso, me chame apenas de rosé. ㅡ disse soltando-a. ㅡ Vocês vão ficar no quarto? ㅡ perguntou.
ㅡ Uhum, e sem intromissões. ㅡ disse Ryeon.
A mulher semicerrou os olhos para o filho e negou.
ㅡ Eu vou lembrar-me disso amanhã. ㅡ apontou o dedo.
ㅡ O quê? ㅡ indagou Ryeon. ㅡ A senhora não vai sair outra vez, e chegar só na madrugada, não é?
ㅡ Vou. ㅡ respondeu-o caminhando de volta à cozinha. ㅡ e sem intromissões.
Ryeon negou sorrindo, e Lucy olhou-o.
ㅡ Ela está namorando? ㅡ perguntou curiosa.
ㅡ Não, mas sempre sai com as amigas e volta com... Companhias. Semana passada mesmo trombei com um guarda. Ele estava fardado e tudo.
A garota negou sorrindo, e não pensou por um segundo julgar mal a senhora Park.
Sua mãe já estaria fazendo mil e um comentários ruins sobre aquele assunto, mas Lucy apenas via aquilo como liberdade.
A mulher era solteira, não tinha amarras. Lucy até achava engraçado e bem bonito o modo em como ela não ligava para nada ao redor. Saía e ia para onde bem quisesse, e sequer seu filho que já era um homem poderia falar algo a respeito.
Lucy queria poder fazer o que quisesse no futuro também.
ㅡ Vamos subir. ㅡ chamou Ryeon. ㅡ eu separei o filme.
ㅡ E eu trouxe besteiras. ㅡ ergueu a sacola.
Park olhou para aquilo e sorriu, já caminhando à frente.
A garota retirou seus sapatos e ouviu-o perguntar:
ㅡ Como nos velhos tempos?
Lucy suspirou, seguindo-o escada acima.
ㅡ Como nos novos tempos.
Ryeon achou a frase da garota engraçada, e abriu a porta do quarto para que ela entrasse primeiro.
ㅡ Não liga para a bagunça. ㅡ ele disse.
ㅡ Eu ligo sim. Que bagunça, Ryeon!
E realmente sentiam-se um pouco como nos velhos tempos. Lucy sempre reclamava das roupas jogadas no chão e os inúmeros skates espalhados de Ryeon. Ao canto havia um violão. Seu computador estava quase camuflado por uma toalha estendida sobre ele, e a garota odiava aquilo.
ㅡ Aigoo... ㅡ ela disse.
Mas sequer foi preciso continuar. Ryeon foi buscando coisa por coisa ali, juntando um a um e guardando do modo em como ficasse organizado.
ㅡ Tudo certo agora? ㅡ perguntou com um sorriso fajuto.
Lucy esticou o lençol sobre a cama e sentou-se no canto.
Ryeon fitou-a por breves segundos e disse:
ㅡ Seu laço é novo?
Lucy sentiu o peito aquecer, tocando o laço.
ㅡ Sim...
ㅡ Ficou muito bom em você, ele é bonito.
A garota não sabia como agir a comentários bons, muito menos comentários bons vindo de Ryeon. Mas park notou o rubro das bochechas dela, e desviando, buscou sua toalha e apenas falou:
ㅡ Vou tomar um banho rapidinho. Você pode ir pondo o filme, certo?
Lucy assentiu e buscou das mãos de Ryeon o notebook, pondo-o sobre sua coxa e abrindo-o.
ㅡ Qual a senha? ㅡ perguntou-o.
Ryeon mordiscou o lábio e sorriu sem jeito.
ㅡ Eu troquei ontem, é... Hm, liu123love
Os olhos de Lucy dobraram de tamanho e sequer Ryeon foi capaz de olhá-los. Adentrou tão rápido o banheiro que Lucy sequer conseguiu desviar os olhos.
Liu123love?
Ryeon falava de Liu? Lucy Liu? A mulher cujo nome de Lucy havia sido inspirado?
E porque Love?
Digitou a senha e viu a tela abrir.
Rapidamente levou a seta para a pasta filmes, e lá, clicou duas vezes no filmes das panteras.
ㅡ Já abri. ㅡ avisou. Olhou a sacola recheada de coisas que havia trazido à frente, e falou: ㅡ Vou buscar alguns potes lá embaixo.
ㅡ Potes? ㅡ perguntou Ryeon enquanto retirava a espuma de seus cabelos. Lavava-os para que nenhum pouquinho de cheiro de suor ficasse ali.
Queria ficar cem por cento limpo e cheiroso.
Talvez apresentável.
ㅡ É, para pôr as batatas em chips.
Ryeon assentiu para si, e murmurou um "ok" ainda dentro do banheiro. Lucy então escorou o computador no canto e ergueu-se, descendo os degraus correndo, assim como fazia desde criança.
ㅡ Senhora Park... ㅡ chamou tímida e viu a mulher olhá-la da mesa. Estava sentada mexendo em seu celular. ㅡ A senhora poderia me dar dois potes grandes, por gentileza?
A mulher sempre amou o modo educado cujo Woojin falava, e assentiu, erguendo-se e buscando em seu armário.
ㅡ Deixe-me adivinhar. Vocês irão assistir às panteras, acertei?
Lucy assentiu, ficando ainda mais tímida.
ㅡ Não sei como não enjoam. ㅡ falou rosé, entregando os potes. ㅡ Eu gostei muito do seu laço, ficou muito bonito no seu cabelo.
ㅡ Ah... ㅡ tocou outra vez no laço aquele dia. ㅡ muito obrigada.
ㅡ Acho que Ryeon também gostou muito, ele te disse isso?
A mulher conhecia seu filho. Mesmo que Ryeon não tivesse lhe dito nada em todos esses anos de amizade com Woojin, a mulher via todas às vezes em que sua face transmutava-se perto do outro. Sabia sim que Ryeon era gay, haviam tido aquela conversa há poucos meses atrás, mas sabia já há alguns anos, que seu filho carregava um apreço enorme por Woojin.
E ela compartilhava disso também.
E a garota assentiu, olhando para a mulher ao vê-la tocar-lhe sobre a bochecha num afago.
ㅡ Sinta-se à vontade aqui, certo? Não irei atrapalhá-los. Mas desçam caso queiram um pedaço de bolo quentinho.
Lucy assentiu, agradecendo os potes e tornando a subir para o quarto do outro.
Nunca havia sentido seu coração tão morno como sentia naquele fim de tarde.
Mas não era novidade que Lucy sempre se sentia confortável demais na casa de Ryeon.
Todas às vezes era bem tratada e podia ficar por horas com Ryeon. Sua mãe sempre pedia para que a porta ficasse aberta, mas apenas para pôr limites, já que ela nunca os interrompia.
E Lucy e Ryeon passavam horas conversando e ouvindo músicas.
A garota sentia um pouco a falta de momentos assim.
Mas, subindo outra vez correndo pela escada, Lucy adentrou alheia no quarto enquanto tamborilava os dedos nos potes.
Seu corpo apenas parou quando viu Ryeon a sua frente, vestido apenas numa cueca preta e passando uma bermuda por seus joelhos.
Lucy virou tão rápido que ficou tonta. Suas bochechas coraram instantaneamente, e Ryeon se desesperou.
Soltou um grito baixo, mas subiu rapidamente a bermuda. Buscou uma camisa e vestiu-a ainda vendo a garota de costas, e só quando estava cem-por-cento vestido é que coçou a garganta e disse:
ㅡ Põe as batatas no pote rosa.
Lucy ainda sentia seu coração bater de modo errôneo. Não sabia sequer como manter controlada a respiração. Mas virou-se, sem encarar Ryeon e buscando a batata e abrindo-a.
Ryeon buscou o computador e sentou na beirada da cama. Encostou-se à cabeceira enquanto seus olhos viam a garota fazer tudo muito rápido.
ㅡ Desculpa. ㅡ pediu.
Lucy ergueu os olhos e Ryeon viu as bochechas coradas.
ㅡ Tudo bem.
Servindo os potes, a garota entregou um a Ryeon e encheu outro com doces.
Sentou ao lado dele e viu-o dar play no filme. Começando a assistir juntos, mas com a sensação esquisita entre eles.
O filme deu início, e sequer uma palavra sobre como as mulheres podiam fazer tudo o que elas quisessem no filme fora dito.
Era a típica frase clichê, e Ryeon e Lucy sempre repetiam juntos, mas, naquele dia, ficaram em silêncio.
Os sons das batatas quebrando-se em suas bocas eram os únicos a serem ouvidos.
Minutos assim, até que Ryeon suspirou, fitando de relance Lucy e vendo os olhos da garota indo ao encontro do seu no mesmo instante.
O filme pausou. A luz única no ambiente era a que adentrava diretamente da janela. Tênue, leve, fazia-os sentir-se como se somente eles existissem sobre a planície terrestre naquele momento.
E de fato era aquele o momento certo.
ㅡ Eu sei o que você quer saber... ㅡ Lucy falou num fio ralo de voz, ainda presa a Ryeon.
ㅡ Eu já entendi como você é. ㅡ respondeu-a. ㅡ Mas, por que não me falou antes? É isso que ainda não entendo...
ㅡ Eu não podia, Ryeon. Eu sequer posso ainda, mas... ㅡ suspirou. ㅡ eu precisei.
ㅡ Você é uma mulher transgênero, não é? Eu entendi isso.
ㅡ Na verdade, sou uma mulher transexual. ㅡ sorriu sem jeito.
ㅡ Há diferença, então? ㅡ perguntou curioso.
Lucy assentiu.
ㅡ Uma mulher transgênero consegue se sentir como a mulher que é mesmo se seu corpo não for padronizado como manda a sociedade. Ela consegue se sentir bem do modo em como nasceu. Porque ela somente não se identifica com o gênero cujo lhe foi imposto ao nascimento.
ㅡ Mas você não se identifica, não é? Você não é um garoto...
Lucy viu o modo em como Ryeon tinha os olhos presos em si, e negou, respirando fundo e tomando um pouco mais de coragem para ir até o fim com aquele assunto.
ㅡ Não. ㅡ sorriu tímida. ㅡ Mas, o termo "transgênero" ㅡ faz aspas ㅡ, vai muito além. Ele é um termo utilizado para incluir pessoas de identidades divergentes, e ele engloba os que não se identificam com os gêneros de nascimento como te disse, mas, ele se encaixa também aos que têm identidade não-binária, que são os que não se identificam com feminino ou masculino, ou também serve para os que se identificam com mais de um gênero.
ㅡ Woah... ㅡ Ryeon falou baixo, olhando-a. ㅡ quanta coisa... Eu não fazia ideia.
ㅡ A maioria das pessoas não faz, Ryeon... Mas, Eu ㅡ olhou-o. ㅡ, me identifico como uma mulher transexual. Porque além do gênero cujo nasci, eu também não me identifico com o corpo que nasci. Eu quero e preciso mudá-lo para me sentir bem. Mas, eu acho que esse é o tipo de assunto que ainda é muito conversado e debatido, então, o melhor é entender e respeitar com o que cada um se identifica.
ㅡ Como eu, que sou um homem gay cisgênero. ㅡ brinca, arrancando uma risada baixa dela. ㅡ Quer dizer... agora, te ouvindo, eu não sei se me identifico mais assim.
ㅡ Não?
ㅡ Não. ㅡ Ryeon respondeu. ㅡ Enquanto estávamos aqui, quietos e em silêncio, o meu coração não desacelerou sequer por um segundo, e ele só batia assim com Woojin.
Lucy não soube o que dizer, não sentia indiferença no modo de agir que Ryeon tinha consigo, mas, sabia que talvez os sentimentos já não fossem mais os mesmos.
Porém, Ryeon continuou.
ㅡ Eu sempre ficava nervoso quando ouvia músicas com ele, ou quando sonhava com ele e acordava com saudade. Eu sempre ficava nervoso quando entrava no ônibus todas as manhãs e tentava me concentrar em qualquer coisa para não olhar por tempo demais para ele, e, eu senti medo quando fui vê-lo no hospital, após achar que havia o perdido para sempre.
Era claro que Ryeon amava Woojin, mas era ainda mais claro que Woojin nunca existiu.
ㅡ Mas... ㅡ o garoto suspirou, retirando o computador de cima de suas coxas e o colocando para o lado, apenas para virar-se para a garota. ㅡ O garoto cujo me apaixonei nunca existiu. Eu sempre achei que era gay porque me apaixonei por um garoto. Eu... Eu achava que tinha tido meu primeiro beijo com um garoto.
Lucy franziu o cenho.
ㅡ Mas você me disse que naquele dia havia beijado Sun.
ㅡ Eu realmente beijei a Sun naquele dia, e não foi a mesma sensação, então aquilo não foi um beijo verdadeiro para contar como o meu primeiro. Eu não senti nada, era tudo somente com ele. Mas eu queria beijar Woojin e puxar de dentro do meu peito aquilo que me atormentava há dias. Eu era tão novo e já me sentia doido por ele, então foi quando eu quis beijá-lo... e com ele eu tive a certeza que estava dando meu primeiro beijo de verdade. Meu primeiro beijo apaixonado.
ㅡ Você sempre gostou dele, não é? ㅡ perguntou-o, rindo baixo, triste. ㅡ me desculpe por te fazer passar por isso...
Ryeon, ainda a olhando nos olhos, segurou ambas as mãos gélidas, fazendo Lucy largar o pote rosa e encarar-lhe com os olhos redondos que tanto amava.
E então ele negou.
ㅡ Eu nunca fui realmente apaixonado por Woojin. Eu sempre fui apaixonado por você. Por isso acho que não sou gay, eu... sou só um homem apaixonado em uma garota agora.
Lucy riu baixinho, negando.
ㅡ claro que não, Ryeon...
ㅡ Claro que sim. Eu sei que rótulos não são tão legais, mas estou convicto disso agora. Sempre foi você, Lucy. E sabe como tenho certeza? Me diz: quem correu comigo até chegar ao centro quando comprei meu primeiro skate?
A garota desviou os olhos, ainda sentindo o toque de Ryeon sobre o seu.
ㅡ Eu.
ㅡ E quem ouviu música comigo no ônibus e depois fugiu?
Desta vez ela riu sem conseguir se controlar.
ㅡ Eu...
ㅡ E quem me deu aquele beijo?
A garota tornou a olhá-lo, sentindo desta vez algo lhe atingir. E foi o sorriso pequeno que Ryeon tinha no rosto.
O sorriso ainda era o mesmo de anos atrás.
ㅡ Também fui eu...
Ryeon riu, sentindo o peito explodir.
ㅡ Exato, você. Você me beijou, Lucy.
A lembrança do dia fazia-os sorrir, com seus corações acelerados num ritmo parecido
ㅡ Estávamos sobre a cama. ㅡ Lucy recordou-se ㅡ Falávamos sobre coisas bobas e sem sentido, e então...
ㅡ Eu te pedi para mostrar como era beijar, e você me beijou. ㅡ respondeu baixo.
ㅡ Eu te beijei... ㅡ repetiu Ryeon. ㅡ Eu te beijei, e me apaixonei. Eu te vi correr comigo até o centro e também te vi fugir de mim aquele dia. Eu fui te ver no hospital, e eu sorri como sempre sorri quando te vi bem. Porque o sorriso era pra você. Somente para você.
Lucy já não conseguia manter os olhos longe dos de Ryeon. Seu coração batia forte, mas isso já era uma característica comum de quando estavam juntos.
Ryeon umedeceu os lábios, soltando a mão direita da garota e afagando sua bochecha. Fazendo-a fechar os olhos em instantâneo e derretendo-se como sempre se derreteu.
ㅡ Eu sou e sempre fui apaixonado por você. Pelo que você é. Por seu sorriso e por suas palavras bobas. Por suas piadas sem sentido ou suas reclamações sobre minha bagunça.
Lucy abriu os olhos, sentindo como se um ímã aproximasse seu corpo do de Ryeon, e viu-o parar a centímetros de distância.
ㅡ Você gosta de mim? ㅡ perguntou Ryeon.
A garota assentiu sem protestar, rendida demais, e focada apenas nos lábios do outro.
Talvez, o pedido de Jaesun fosse atendido.
E Ryeon sentia seu corpo ferver, ansiando para tocá-la.
ㅡ Então, você não ficará brava comigo caso eu te beije, não é?
Lucy sorriu, fechando sutilmente seus olhos e fazendo as bolsinhas cujo Ryeon faltava para morrer de amores aparecer.
ㅡ Você está se referindo a mim no feminino.
Foi impossível para a garota não notar a sutil mudança. Fazia tanta, mas tanta diferença.
ㅡ Você pode me beijar. ㅡ confessou-o.
Ryeon então ergueu sua mão esquerda, prendendo Lucy ali, e sorrindo ao ver o sorriso dela outra vez.
As bocas tocaram-se sutilmente, em um selar casto.
Os pulmões de ambos liberaram o ar preso, e como impulso, as línguas tomaram passe para se encontrarem.
Lucy deleitava-se no toque sutil e calmo de Ryeon. Sentia-o afagar seu rosto com cautela, e sentia o modo em como suas mãos tremiam.
E foi então que ela decidiu tocá-la.
Tocou uma das mãos de Ryeon em si, confirmando o toque, e sorriu entre o beijo, totalmente boba.
Ryeon também sorriu, descendo a mão por a nuca livre dela, sentindo-a inclinar a cabeça e dar mais intensidade ao toque.
Tudo o que passava na mente da garota era como aquele toque era realmente o seu favorito no mundo todo.
Talvez no sistema solar todo.
Não queria mais largar da boca de Ryeon, e intensificava a cada vez que o toque tomava um rumo calmo.
Mas Ryeon precisava de ar. Já bastava o nervosismo completo que sentia, se faltasse o ar com certeza ele desmaiaria.
E ele não pretendia finalizar a noite com algo trágico, então ainda calmo, deslizou sua boca por a dela, finalizando com o lábio inferior da garota entre seus dentes, e um selar longo logo em seguida.
E Lucy ainda se mantinha inerte ao mundo.
Abriu os olhos ainda vendo Ryeon perto demais de si e não conteve o riso.
ㅡ Eu não sei como fiquei tanto tempo sem te beijar. ㅡ confessou Ryeon. ㅡ eu quero te beijar todos os dias.
Lucy negou, sorrindo mais, e afastando-se para prender atrás de sua orelha alguns fios de cabelo que haviam soltado com os toques de Ryeon.
ㅡ Você não pode. ㅡ falou.
ㅡ Eu sei. ㅡ ele disse, tornando a ajeitar-se. Vendo-a tornar ao seu semblante tímida. ㅡ Mas eu sou apaixonado por você, o que posso fazer?
Desta vez, a garota não conseguia mais fitar Ryeon de volta, pois sabia que ele estaria com seu sorriso cafajeste e conquistador.
Ela não conseguia resistir a nenhum dos sorrisos de Ryeon.
Mas sentiu-o segurar sua mão, entrelaçando os dedos, a fazendo olhar.
ㅡ Se não posso te beijar todos os dias, ao menos posso te beijar por mais alguns minutos hoje?
Lucy olhou para seu celular. Havia dito à sua mãe que retornaria à casa às dez, e as horas ali ainda marcavam seis.
Tímida, ela deu de ombros. Lucy ainda poderia beijar Ryeon por muitas horas, mas não falaria tal coisa a ele.
Mas Ryeon sorrateiramente voltou a aproximar-se, sorrindo ainda com a mão entrelaçada à dela, e roubou-lhe um selar na bochecha.
ㅡ Ainda quer assistir ao filme?
A garota negou de prontidão, olhando Ryeon de relance e beijando-o na boca em um selinho.
Um completo impulso seu.
E aquilo foi à deixa que Ryeon precisou para retomar os beijos que queria tanto dar.
A noite ainda teria muitas horas para chegar ao fim para ambos, mas os dois não estavam ligando muito para nada. Isso era até bom, já que teriam tempo suficiente para dar mais beijos.
E tudo o que eles queriam era isso. Apenas isso.
Queriam perder-se em suspiros e gostos, sorrindo a cada pausa, e saboreando-se a cada segundo.
Já que para eles, os segundos eram tudo o que tinham ali.