Capítulo 6 2.0 Capítulo - HEITOR

Estou correndo no parque ao lado de Baleia, meu cachorro não é muito disposto para corridas matinais, cansa fácil, típico da raça dele. Porém, desde filhote o acostumei com atividades físicas, sempre procurando levá-lo junto comigo, seja nas corridas ou apenas uma caminhada. Até porque, também preciso manter uma rotina com alguma prática esportiva.

As mulheres passam por nós lançando olhares apreciativos, e, bom, não sou nenhum santo, retribuo da mesma forma com uma piscadela e um sorriso galante. Um caso de uma noite, algumas ficadas durante a semana é o máximo de envolvimento que tenho tido. Na verdade, não quero nada, além disso, ainda não encontrei quem realmente valha meu tempo. Também não é como se eu estivesse procurando, já tive meus momentos de putaria, mas hoje confesso que estou mais seleto com quem durmo ou saio.

Chego ao meu apartamento cansado, destranco a porta e a abro. Baleia vai direto para sua caminha, e eu sigo direto para o chuveiro. Saio já arrumado para ir à faculdade e vejo uma chamada perdida de Tommaso, meu irmão mais novo. É incrível o quanto ele é parecido comigo, apesar de ter apenas vinte e seis anos e eu trinta Seu porte físico é bem parecido com o meu. Tommaso, assim como eu, tem olhos claros e cabelos em um tom escuro, seus são ombros largos, ressaltam um porte meio atlético que ao contrário do que pensam não é fruto de uma intensa rotina em academia, mas sim de longos anos trabalhando pesado na vinícola, puxamos isso do meu pai. Retorno sua ligação, deixando o celular no viva-voz sobre a mesa da escrivaninha, enquanto recolho no meu escritório algumas anotações que usarei nas próximas aulas.

- Alô?! - Ouço a voz do meu irmão do outro lado da linha.

- Fratello3! - falo, buscando no pequeno armário que guardo as atividades dos meus alunos o que usarei na aula hoje.

- Aleluia! Dio4 ouviu minhas preces! - dramatiza em um português meio arrastado apesar de nosso pai ser italiano, nossa mãe tem descendência brasileira e todos em casa aprenderam desde cedo a falar o idioma. Eu adquiri um pouco mais de fluência quando vim morar em São Paulo. Tommaso, meus avôs e Angelina falam com um pouco de dificuldade, mas ainda assim, compreendem tudo que lhes é dito.

- Sei uncoglione5, Tommaso!

- Idiota é você! Cazzo6! Custa atender o telefone?

- Tommaso, eu tenho uma vida no Brasil. Trabalho pra caramba, tenho um cachorro para cuidar e ainda consigo de vez em quando me divertir e ter uma vida social. Se queria falar comigo urgente, por que não avisou a mamma?

-Va bene! Não era nada tão urgente é só que está chegando a Vindimai7...

- Irmão, eu não vou! - Suspiro. Todo o ano é a mesma coisa! - Você sabe que não quero encontrá-la e ela vai estar lá. - Largo os papéis que estava olhando sobre a mesa, onde fica o computador e caminho até janela, observando a rua, lembrando-me daquele rosto que tinha as feições mais meigas do mundo, do seu cheiro que era o meu perfume preferido e que consigo lembrar até hoje. A forma como falava comigo, doce, desinibida e gentil, é impossível não se lembrar dela e não a odiar na mesma proporção

- Até quando isso, Heitor? Valentina está de casamento marcado, seguiu a vida dela, vai sempre ficar evitando a cidade onde nasceu e viveu por conta dela?

- Tommaso, você sabe...

- Sei! Eu sei mesmo como se sente, eu estive com você, lembra? Porra, Heitor, já vai fazer quatro anos. Já deveria ter superado isso! - Ouço seu bufo cansado. - Heitor, vovó e vovô te querem tomando conta do patrimônio que era do pappa.

- Você já faz isso muito bem, Tommaso, não precisam de mim aí. Eu tenho uma vida aqui agora. Você e Angelina podem fazer isso!

- Vá benne, mi fratello, tanta coisa para você puxar da mamãe e você herdou logo a teimosia - resmunga ao telefone. - Você pode ter escapado de mim, mas a nonna não deixará que falte a mais uma festa do vinho. Ainda mais que este ano, pretendo colocar um estande da nossa safra lá. Ela não deixará que você saia dessa sem que tenha uma boa desculpa. Aliás, pelo que ouço das conversas dela com a mamma, as duas estão ansiosas pra que encontre uma namorada logo. - Solta um riso.

- Ma vaffanculo8- Merda! Era só o que faltava, vovó voltar na tecla "namorada" novamente!

Converso com meu irmão sobre nossa nova safra de vinhos, pergunto sobre nossa irmã e nossos sobrinhos e em seguida desligo, pois tenho que ir trabalhar.