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- E então? Traz boas notícias? - Perguntou Leonora, colocando na mesa de centro da sala de estar, o livro que estava lendo.
A jovem estava bem acomodada na sala, apenas aguardando a chegada de seu irmão.
- A minha oportunidade de me aproximar da paulistinha, caiu do céu. - Respondeu Gallo, um pouco tenso, atravessando o ambiente para se acomodar ao lado de sua irmã. - Eu não sabia como chegaria até ela, estava próximo de sua casa, pensando em várias alternativas, quando vejo alguém à espreita.
- Não diga... - Leonora abriu os olhos, curiosa. - Um assaltante?
- Não sei o que pretendia, mas tinha uma arma, e iria usá-la contra as moças. O desgraçado do Sorrentino trabalha com serviços maiores, ele não é um simples assaltante de rua.
- O Sorrentino? Pensei que estivesse bem longe de Rosa Rosso.
- E deveria, porque se eu colocar as mãos nele... - Rosnou Gallo, torcendo os próprios punhos ao imaginar todas as atrocidades que faria, caso tivesse a oportunidade de um acerto de contas com o seu maior inimigo. - Ele matou o meu melhor amigo, Leonora. Agora capturar aquele demônio é uma missão de vida.
- O que será que o Sorrentino queria com a moça? - Perguntou Leonora, pensativa.
- Com a experiência que tenho nesse mundo, somando A + B, acho que alguém encomendou a alma da menina.
- Da Maria Beatriz? E por que acha isso?-
- A família dela foi assassinada em São Paulo, obviamente veio foragida para Rosa Rosso. Se a menina veio se esconder aqui, é porque corre perigo na cidade grande.
- Acha que a morte da família dela foi encomendada?
- Tudo indica que sim. Com todas as informações que coletei, eles já chegaram atirando, e roubaram poucas coisas apenas para disfarçar. Se eles já chegaram atirando, é porque tinham pretensão de matar. - Deduziu Gallo.
- Isso significa que casar com essa moça pode não ser boa coisa, Léo. Se ela estiver mesmo jurada de morte...
- Eu irei protegê-la.
- Você quer deixar essa vida, Léo. O intuito desse casamento não é justamente limpar o seu nome e regularizar os cassinos, como você vem repetindo mil vezes? Não quer se livrar dos seus clientes contrabandistas e meliantes, e atrair a nata da sociedade de Rosa Rosso?
- É o que quero. - Confirmou o homem.
- Como pode querer deixar o el diablo para trás, se metendo em uma nova confusão?
- O el diablo talvez sempre me acompanhe, Leonora, e se tiver que usar ele para salvar vocês, não irei hesitar.
- Acho que não está preparado para outra vida, meu irmão. Nenhum de nós estamos. Crescemos em um cassino clandestino, vendo nossa família fazer todo o tipo de sujeira. Com sete anos de idade o papai nos ensinou a atirar. Acha que de uma hora para a outra...
- Acho. Acho, Leonora, e maldição, já falamos sobre isso. O Marllon está morto, você quase morreu. Não quero correr o risco de perder mais ninguém que eu ame.
- Infelizmente sempre correremos esse perigo, Léo, faz parte da vida.
- Não, não faz. Faz parte da vida as pessoas morrerem por algum processo natural, não pela vida do crime. Quero que vocês tenham um futuro seguro, da forma que escolherem, e não que acordem um dia após o outro, sem saber se estará respirando no seguinte. Não quero isso mais.
- E se você perder dinheiro? Se não conseguir ganhar como antes?
- Teremos o dinheiro da Beatriz. Eu andei sondando. Ela estuda para assumir os negócios da família, o pai dela tem uma empresa de mineração de jóias preciosas. Ela tem uma rede de joalherias pelo país, e também fora daqui.
- Acha que aquela menina consegue cuidar de um negócio assim?
- Não sei, Leonora, não sei. A Beatriz é bastante inteligente, mas também é ingênua. Talvez precise de ajuda para não ser ludibriada.
- Casando com você, ela com certeza estará resguardada. - A moça mordeu os lábios, pensando novamente em outra questão. - Mas como acha que poderá esconder para sempre quem você é? Por mais que mude de nome, todos da cidade te conhecem.
- E quem disse que ficaremos em Rosa Rosso? A própria Beatriz falou que pretende voltar para São Paulo. Lá, poderei ser Thomás Fagundes pelo resto da vida.
- E se vocês acabarem ficando por aqui? Se por alguma circunstância, como essa que você mesmo apresentou, a Beatriz não possa voltar para São Paulo?
- Não sei, Leonora, não sei, pare de me atormentar com tantas perguntas. Certas coisas só o tempo dirá. Eu preciso fazer com que a Beatriz fique apaixonada o suficiente, para que faça o que eu quiser, sem hesitar ou contestar. Até lá, eu sou Thomás Fagundes, dono de uma exportadora de vinhos. Um homem honesto, classe média alta. Sem cassinos ou família mafiosa. Sem inimigos perigosos.
- Uma coisa eu fiquei surpresa, Léo. Você deixou o Sorrentino escapar?
O homem respirou fundo, pesaroso.
- Tentei acabar com ele, Leonora, mas não consegui. Como tudo tem uma primeira vez, pela primeira vez eu errei o alvo. O tiro não acertou o coração daquele maldito.
...
Beatriz ainda se divertia com os acontecimentos do jantar. Estava surpresa com a educação e a cultura de Leonardo. Ele era um homem muito inteligente, e os dois tiveram assuntos para uma noite inteira. Por sorte, ele não percebeu que Júlia continuava apreensiva. A garota mal conseguiu segurar o garfo de tão nervosa que estava.
Mas isso foi apenas um detalhes. Beatriz se flagrou ansiosa para encontrar com Leonardo no dia seguinte, na exportadora.
- Não estou gostando desse sorrisinho. - Observou Júlia, quieta do outro lado da grande cama de casal, que estava dividindo com sua prima. - Estou achando esse jogo muito perigoso para você. O el diablo é um homem vivido, experiente, que trabalha com negócios perigosos. Você é só uma menina rica de São Paulo que mal conhece os homens, quem dirá um como esse.
Beatriz suspirou, entusiasmada. Por mais que ouvisse as palavras da outra, não tinha dado muita atenção.
- Viu como ele é inteligente? Tem conteúdo e sensibilidade por trás de toda aquela beleza e poder.
- Viu? Não tem um dia que o conhece e já está suspirando. - Júlia arregalou os olhos ao perceber o que poderia estar acontecendo. - Beatriz! Você está se apaixonando por um mafioso.
- Não diga idiotices. Eu estou bem ciente do que quero. Não vou negar que ele é um homem encantador e que todo aquele cavalheirismo me atrai, mas não estou esquecida de quem ele é.
- O mais intrigante de tudo é o fato de ele estar mentindo. Por que não quer dizer quem é?
- E como posso saber, Júlia? Para isso, tenho que dar tempo ao tempo.
- O que está pretendendo fazer?
- Me aproximar do Léo Gallo. Quero fazer com que ele goste de mim, e daí, eu peço ajuda e descubro o porquê de estar mentindo.
- Não está pensando em fazer o el diablo se apaixonar por você, está? - Júlia levou uma das mãos a boca, horrorizada.
- Não acredito que Galló seja esse tipo de homem, não sou burra para subestimá-lo. Eu prefiro ser sincera e garantir uma boa aliança.
- No que está pensando, Beatriz? - Insistiu Júlia.
- Em algumas coisas, mas não é nada concreto. Digo quando tomar uma decisão, agora vamos dormir. Amanhã vou na suposta exportadora do Thomás, degustar alguns vinhos. Quer ir?
- Não vou te assistir flertar com um criminoso.
- Eu? Quem disse que eu estava flertando?
- Eu vi, Beatriz. O El diablo e você ficaram flertando durante todo o jantar.
- Ele estava jogando o jogo dele, eu estava jogando o meu.
- Eu não aguento mais ouvir isso de jogo. Parece que estou em uma partida de xadrez erótico.
- Boa noite, Júlia. - Foi tudo o que Beatriz disse, antes de se virar de costas, e fechar os olhos.
Ao perceber que sua prima tinha desistido de falar, a jovem tornou a abri-los. Não conseguia deixar de pensar nele.
...
- Ela chegou! - Informou Leonora, ficando um tanto agitada por ter que colocar em prática a farsa.
Estava acostumada a fazer coisas piores, mas nunca fingiu ser quem não era.
Léo, que estava bem instalado em uma das cadeiras do ambiente de recepção, ficou de pé, com um pulo, ao ver Beatriz entrando pela porta. A jovem estava escoltada com dois dos seguranças de sua casa, e a julgar pelo episódio que aconteceu no dia anterior, ele entendia o medo dela.
- Beatriz. - Léo foi de encontro a moça, e sem tirar os olhos dela, segurou uma de suas mãos para pousar um beijo no dorso.
- Thomás. É muito bom te ver de novo. - Respondeu a garota, sem desfazer o contato visual.
Beatriz ficou um pouco desconfortável ao perceber que estava falando a verdade. Será que com o tempo corria mesmo o risco de ficar apaixonada por um homem como Gallo?
Ela ainda não havia perdido o último fio de juízo.
- É um prazer te ter aqui, e já separei as melhores garrafas para você provar. São novidades, quero colocar em linha, portanto sua opinião será muito importante.
- Nossa, eu até fico sem jeito de você levar tão em conta assim a minha opinião. Mas será uma honra, eu amo vinhos, com certeza vou poder te ajudar.
Léo abriu um sorriso tão largo, que fez o coração de Beatriz acelerar. Ele levou uma de suas mãos grandes para a base das costas dela, a conduzindo para um outro compartimento, no qual ficava a sua gigantesca adega.
Beatriz observou o espaço, admirada com o tamanho. Já Léo, se apressou em servir duas garrafas. Seguindo as etiquetas, ele colocou um pouco para si, experimentou, e só então, colocou para a jovem.
Ela segurou a taça das mãos dele, levando a borda da taça para a boca. Pousou os lábios devagar, antes de deglutir a bebida.
Léo esticou o canto da boca em um meio sorriso, ao perceber o que ela estava fazendo. Talvez Beatriz fizesse sem perceber, ou talvez só estava brincando de seduzir. Embora Léo tivesse certeza de sua ingenuidade para muitas coisas, uma mulher sempre sabia quando era bonita o bastante para fazer um homem perder a cabeça.
Era um jogo bem perigoso, e talvez ela não soubesse das consequências que poderia causar. Léo poderia prendê-la em sua própria armadilha, se quisesse.
- E então?
- Mais frutado, não é tão concentrado em taninos, e por isso, não é seco. Vinhos assim, aqui em Rosa Rosso, deve vender aos montes.
- É um bom palpite, mas gostaria de saber o porquê. - Léo estendeu uma das mãos para segurar a taça vazia, que a moça o entregou.
- Porque aqui é uma cidade de grande influência italiana, a culinária predominante é a massa. Ouça o que digo, esse daqui vai te deixar rico.
Leonora, que estava logo atrás, deu um breve sorriso, imaginando que Beatriz não tivesse a menor noção de com quem estava falando.
Ali em Rosa Rosso, quiçá na América Latina, era difícil ter um homem mais rico do que Léo Gallo. - Anote isso, Leonora, estou gostando muito dos comentários dela.
Beatriz voltou-se para trás, não percebendo que tinha outra pessoa ali, ficou um pouco desconcertada.
- Pode deixar, irmão.
- Irmão? - Beatriz se voltou para o homem, com um olhar questionador.
A julgar pela grande semelhança entre os dois, dava para ver que não era mais uma das mentiras de Léo. Além do mais, Beatriz já tinha visto fotos da família Gallo. Aquela mulher era Leonora Gallo, a reconheceu no momento em que entrou. Mas já que, por algum motivo, ela fazia parte daquela brincadeira, Beatriz agiu como se não soubesse de nada.
- Perdão não ter apresentado. Essa é a minha irmã, Leonora.
- O Thomás falou de você, é um prazer te conhecer. - disse Leonora.
- Igualmente. - Beatriz apenas sorriu.
Se até Leonora estava participando da mentira, era porque algo aquele homem estava tramando.
Beatriz precisava descobrir.