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Naquela noite, fui informada que Rael se juntaria à mim no jantar. Liam arrumou a mesa para nós no andar debaixo e serviu uma refeição de peixe, arroz, vagens e bananas. Ele disse, em tom orgulhoso, que era uma receita
caribenha.
- Você vai jantar conosco? - perguntei, observando-o enquanto ele carregava os pratos até a mesa.
Eu tomei banho e vesti as roupas que Liam providenciara, outro conjunto de calcinha e sutiã de renda branca e um vestido amarelo com flores brancas. Nos pés, eu calçava sandálias brancas de salto alto. O traje era bonito e feminino, muito diferente das calças jeans e camisas escuras que normalmente eu vestia. Fazia com que eu parecesse uma boneca bonita.
Eu ainda não conseguia acreditar que me deixavam andar pela casa livremente. Havia facas na cozinha. Eu poderia, a qualquer momento, roubar uma delas e usá-la em Liam. Fiquei tentada, apesar de minhas entranhas se reviraram com a ideia de sangue e violência.
Talvez eu fizesse isso em breve, depois de ter a chance de descobrir um pouco mais sobre o lugar.
Eu descobrira algo interessante sobre mim mesma. Pelo jeito, não acreditava em gestos grandiosos, mas sem sentido. Uma voz fria e racional dentro de mim dizia que eu precisava de um plano, de uma forma de sair da ilha antes de tentar alguma coisa. Atacar Liam naquele momento seria idiota.
Como resultado, eu poderia ficar trancada ou coisa pior.
Não, assim era muito melhor. Era melhor que pensassem que eu era inofensiva. Assim, teria uma chance muito maior de fugir.Na hora anterior, eu estivera sentada na cozinha observando Liam preparar a comida. Ele era muito eficiente. E passar tempo com ele me distraía de Rael e do que estava por vir.
- Não - diz ele, respondendo à minha pergunta. - Estarei em meu quarto. Rael quer passar algum tempo sozinho com você.
- Por quê? Ele acha que estamos namorando ou algo assim?
Ele sorri.
- Rael não namora. - Não diga. - Meu tom foi muito sarcástico. - Por que namorar quando ele pode sequestrar quem quiser?
- Não seja ridícula - disse Liam em tom ríspido. - Acha mesmo que ele precisa forçar alguma mulher? Nem mesmo você consegue ser tão ingênua.
Eu o encarei.
- Você quer dizer que ele não tem o hábito de roubar mulheres e trazê-las para cá?
Liam balançou a cabeça negativamente.
- Além de mim, você é a única pessoa que veio aqui. Esta ilha é o santuário particular de Rael. Ninguém nem sabe que ela existe.
Senti um arrepio na espinha ao ouvir aquilo.
- E por que eu fui tão sortuda? - perguntei devagar, sentindo o coração bater mais forte. - O que me fez merecer esta honra tão grande?
Ele sorri.
- Você descobrirá um dia. Rael lhe dirá quando quiser que
você saiba.
Eu estava cansada daquela merda de "um dia", mas sabia que ele era leal demais ao meu sequestrador para me contar alguma coisa. Portanto, tentei descobrir outra coisa.
- Você deve sua vida à ele?
O sorriso dele desapareceu e sua expressão ficou mais dura. Em seu rosto, surgiram linhas duras e amargas.
- Isso não é da sua conta, garota.
E, pelos dez minutos seguintes, enquanto ele terminava de preparar a mesa, não falou mais comigo.
Depois de tudo pronto, ele me deixou sozinha na sala de jantar para esperar Rael. Eu estava nervosa e empolgada. Pela primeira vez, teria a oportunidade de interagir com meu sequestrador fora do quarto.Eu tinha que admitir que sentia uma fascinação doentia por ele. Ele me assustava, mas eu estava insuportavelmente curiosa.
Quem era ele? O que queria de mim? Por que me escolhera como vítima?
Um minuto depois, ele entrou na sala. Eu estava sentada à mesa, olhando para fora da janela. Antes mesmo de vê-lo, senti sua presença. A atmosfera ficou elétrica e pesada com ansiedade.
Virei a cabeça, observando-o se aproximar. Desta vez, ele estava vestindo uma camisa polo cinza e calças brancas. Poderíamos estar jantando em um clube no campo.
Meu coração bateu mais depressa no peito e senti a adrenalina nas veias.
Subitamente, eu estava muito mais ciente do meu corpo. Meus seios estavam mais sensíveis e os mamilos se enrijeceram sob a renda do sutiã. O tecido macio do vestido acariciou minhas pernas nuas, lembrando-me da forma como ele me tocara lá. Da forma como me tocara em todo o corpo.
Uma umidade quente se acumulou entre minhas coxas com a lembrança e odiei isso, eu era a vitíma ali, não estava ali por quê queria e sim contra a minha vontade.
Ele chegou perto de mim e abaixou-se, olhando dentro dos meus olhos.
- Olá, Vivian- diz ele ao endireitar o corpo, com os belos lábios curvados em um sorriso sombriamente sensual. Ele era tão bonito que fiquei incapaz de pensar por um momento.
O sorriso dele aumentou e ele deu a volta na mesa para se sentar à minha frente.
- Como foi seu dia, meu bichinho? - perguntou ele, pegando um
pedaço de peixe e colocando no prato. Os movimentos dele eram confiantes e estranhamente graciosos. Era difícil acreditar que o mal usava uma máscara tão bonita.
Eu me recompus.
- Por que você está me chamando assim?
- Assim como? Meu bichinho? - Eu assenti- Porque você me lembra de um gatinho - diz, com os olhos verdes brilhando com uma emoção estranha. - Pequena, macia e adorável. Sinto
vontade de acariciar você só para ver se ronronará nos meus braços.
Meu rosto ficou quente. Senti o corpo inteiro quente e torci para que o tom da minha pele escondesse a reação.
- Não sou um animal...
- É claro que não. Não gosto de bestialidade.
- Então do que gosta? - perguntei, recriminando-me mentalmente. Não queria deixá-lo bravo. Ele não era Liam. Ele me assustava.
Felizmente, ele só pareceu se divertir com minha ousadia.
- No momento - diz ele em tom suave -, gostei de você.
Afastei o olhar e peguei a travessa de arroz, com a mão tremendo ligeiramente.
- Me deixe ajudar você com isso. - Ele pegou o prato, encostando os dedos de leve nos meus. Antes que eu conseguisse dizer alguma coisa, meu prato estava cheio, com uma porção generosa de tudo que havia na mesa.
Ele colocou o prato à minha frente e eu olhei para a comida desolada.
Estava nervosa demais para comer na frente dele. Senti um nó no estômago.
Quando olhei para cima, percebi que ele não tinha esse problema. Comia com gosto, claramente gostando da comida de Liam.
- Qual é o problema? - perguntou ele entre uma garfada e outra. - Não está com fome?
Balancei a cabeça negativamente, apesar de ter estado faminta antes da chegada dele.
Ele franziu a testa, largando o garfo.
- Por que não? Liam disse que você passou o dia na praia e nadou bastante. Não deveria estar com fome depois de todo esse exercício?
Dei de ombros.
- Estou bem. - Não pretendia dizer que ele era a causa
da minha falta de apetite. Ele estreitou os olhos para mim. - Está fazendo algum joguinho comigo? Coma, Vivian. Você já é magra. Não quero que perca peso.
Engoli em seco nervosamente e comecei a comer. Havia algo nele que me dizia que não seria inteligente ir contra sua vontade naquele assunto.
Na realidade, em qualquer assunto.
Meus instintos diziam que aquele homem era extremamente perigoso. Ele não fora cruel comigo, mas havia crueldade nele. Eu conseguia senti-la.
- Boa garota - diz ele em tom aprovador depois que dei algumas
garfadas.
Continuei a comer, apesar de não sentir o gosto da comida e ter que forçá-la a descer pela garganta. Mantive o olhar sobre o prato. Seria mais fácil comer se não visse o olhar verde penetrante dele.
- Liam me disse que vocês se divertiram nadando - comentou ele depois que eu comera cerca de metade do que havia no prato. Assenti em resposta e ergui o olhar, vendo que ele me encarava. - O que achou da ilha? - perguntou ele, como se estivesse genuinamente interessado na minha opinião. Ele me estudou com uma expressão pensativa.
- É bonita - respondi com sinceridade. Depois, pausando por um
segundo, acrescentei: -Mas não quero ficar aqui.
- É claro. - Quase pareceu que ele entendia. - Mas você se
acostumará. Esta é sua nova casa, Vivian. Quando mais cedo aceitar isso, melhor.
Meu estômago se revirou e senti como se toda a comida que acabara de ingerir fosse voltar. Engoli em seco várias vezes, tentando controlar a náusea.
- E minha família? - As palavras saíram em tom baixo e amargo. - Como eles deverão aceitar isto?
Um toque de emoção surgiu no rosto dele.
- E se eles não acharem que você está morta? - perguntou ele baixinho, mantendo meu olhar. - Isso faria com que se sentisse melhor, meu bichinho?
- É claro que sim! - Eu mal consegui acreditar no que ouvi. - Pode fazer isso? Pode avisar a eles que estou viva? Talvez eu possa telefonar para eles e...
Ele estendeu a mão para cobrir a minha, interrompendo minhas palavras.
- Não. - O tom dele não deixou espaço para discussão. - Eu mesmo entrarei em contato com eles.
Engoli meu desapontamento.
- O que você dirá a eles?
- Que você está viva e bem. - O polegar dele massageou gentilmente a palma da minha mão. O toque dele me distraiu, transformando meus ossos em gelatina.
- Mas... - Quase gemi quando ele apertou um ponto particularmente sensível - Mas eles não acreditariam em você...
- Eles acreditarão. - Ele retirou a mão, me deixando estranhamente solitária. - Pode confiar em mim.
Confiar nele? Ah, claro.
- Por que você está fazendo isto comigo? - pergunto frustrada. - Foi porque falei com você no bar?
Ele balançou a cabeça negativamente.
- Não, Vivian. É porque você é você. Você é tudo que eu estive procurando. Tudo o que eu sempre quis.
- Você sabe que isso é loucura, não sabe? - Eu estava tão abalada que me esqueci de ter medo por um momento. - Você nem me conhece!
- Isso não é verdade - disse ele em tom suave. - Mas não preciso conhecer você. Só preciso conhecer o que eu sinto.
- Está dizendo que está apaixonado por mim? - Por algum motivo,
aquilo me assustou mais do que quando achei que ele só tinha preferências sexuais estranhas.
Ele ri, jogando a cabeça para trás. Eu o encarei, me sentindo
irracionalmente ofendida. Não queria que ele estivesse apaixonado por mim, mas precisava achar a ideia tão engraçada?
- É claro que não - disse ele quando parou de rir. Mas ainda estava sorrindo.
- Então do que você está falando? - pergunto.
O sorriso dele sumiu lentamente.
- Não importa, Vivian- diz ele baixinho. - A única coisa de que você precisa saber é que é especial para mim.
- Então, por que você simplesmente não me chamou para sair? - Eu me esforcei para compreender o incompreensível. - Por que teve que me sequestrar?
Ele respirou fundo e percebi que estava muito mais calmo.
- Não importa agora, Vivian. Eu queria você aqui, comigo, não lá fora. É muito mais seguro para você... e para aquele garoto.
- Mais seguro para Anton?
Rael assentiu.
- Já não posso garantir a mesma coisa, você é meu passaporte até ele. A espécie de uma bússola, que ira me guiar e me levar até ele. É bem simples na verdade, se você pensar melhor.
Ele estava falando completamente sério sobre matar Anton. Não era uma ameaça vazia. Pude ver isso em seu rosto.
Meus lábios estavam secos e passei a língua sobre eles. O olhar dele seguiu minha língua e percebi que sua respiração mudou. Minha ação simples claramente o deixou excitado.
Subitamente, uma ideia louca e desesperada me ocorreu. Ele obviamente me queria. Estava até mesmo disposto a fazer coisas para me deixar feliz,como avisar minha família de que eu estava viva. E se eu usasse esse fato a meu favor? Eu era inexperiente, mas não era totalmente ingênua. Sabia como flertar com rapazes. Eu conseguiria fazer aquilo? Conseguiria seduzir Rael para que me deixasse ir embora?
Eu teria que ter muito cuidado. Não podia mudar subitamente. Não podia agir como se o desprezasse em um minuto e apaixonada por ele no minuto seguinte. Ele precisava acreditar que poderia me levar para fora da ilha e que eu permaneceria ao seu lado pelo tempo que me quisesse. Que eu nunca mais olharia nenhum outro homem.
Eu teria que convencer Rael de minha devoção.
Pelo restante do jantar, continuei como se estivesse com medo e intimidada. Não era fingimento, pois era como eu me sentia. Eu estava na presença de um homem que falava casualmente sobre matar pessoas inocentes.
Como deveria me sentir?
No entanto, também tentei ser sedutora. Eram coisas pequenas, como a maneira como empurrava os cabelos para trás ao olhar para ele. A forma como mordia um pedaço de mamão que Liam cortara para a sobremesa e lambia o suco dos lábios.
Eu sabia que meus olhos eram bonitos e olhei para ele timidamente, com as pálpebras semi fechadas. Eu praticara aquele olhar na frente do espelho e sabia que meus cílios pareciam muito longos quando inclinava a cabeça no ângulo certo.
Não exagerei, pois ele não acreditaria. Apenas fiz coisas pequenas que ele poderia achar excitantes e atraentes.
Também tentei evitar outros tópicos controversos. Em vez disso, perguntei a ele sobre a ilha e como ele a conseguira.
- Encontrei esta ilha há cinco anos - explicou Rael, com os lábios
curvando-se em um sorriso charmoso. - Meu Cessna estava com um problema mecânico e eu precisava de um lugar para pousar. Por sorte, há uma área plana no outro lado, perto da praia. Consegui pousar o avião sem estragá-lo mais ainda e fazer os reparos necessários. Levei alguns dias e tive a oportunidade de explorar a ilha. Quando consegui ir embora, sabia que este lugar era exatamente o que eu queria. E eu comprei a ilha.
Arregalei os olhos e pareci impressionada.
- Fácil assim? Não foi cara?
Ele deu de ombros.
- Eu tenho dinheiro.
- Você vem de uma família rica? - Eu estava genuinamente curiosa. Meu sequestrador era um grande mistério. Eu teria uma chance muito melhor de manipulá-lo se o entendesse pelo menos um pouco.
A expressão dele ficou um pouco fria.
- Algo assim. Meu pai tinha um negócio bem-sucedido, que assumi depois que ele morreu. Mudei a direção e
expandi o negócio.
- Que tipo de negócio?
A boca de Rael se contraiu ligeiramente. - Importação e exportação.
- Do quê?
- Componentes eletrônicos e outras coisas - diz ele. Percebi que ele não revelaria mais do que aquilo por enquanto. Suspeitei que "outras coisas" era um eufemismo para alguma coisa ilegal. Eu não sabia muito sobre negócios, mas duvidava que vender TVs e aparelhos de música resultassem naquele tipo de riqueza.
Mudei a conversa para um tópico mais inócuo.
- O resto da sua família também usa a ilha?
O olhar dele ficou duro.
- Não. Estão todos mortos.
- Ah, sinto muito... - Eu não sabia o que dizer. O que poderia dizer para que ele se sentisse um pouco melhor? Sim, ele me sequestrara, mas ainda era um ser humano. Eu não conseguia imaginar sofrer aquele tipo de perda.
- Está tudo bem. - O tom dele não tinha emoção, mas senti a dor por baixo. - Aconteceu há muito tempo.
Assenti com simpatia. Eu me senti genuinamente mal por ele e não tentei esconder o brilho das lágrimas. Eu era muito emotiva. Leah dizia isso sempre que eu chorava em um filme triste. E não consegui evitar a tristeza que senti com o sofrimento de Rael.
Isso acabou funcionando a meu favor, pois a expressão dele ficou um pouco mais quente.
- Não sinta pena de mim, meu bichinho - diz ele baixo. - Eu já superei. Por que não me conta um pouco sobre você?
Pisquei lentamente, sabendo que o gesto atraía a atenção para os meus olhos.
- O que quer saber? - Ele já não descobrira tudo sobre mim enquanto me observava?
Ele sorriu. O sorriso fazia com que ele ficasse tão lindo que senti um aperto no peito. Pare com isso, Vivian. É você quem o está seduzindo, não o contrário.
- O que você gosta de ler? - Ele pergunta - Que tipo de filmes gosta de assistir?
E, pelos trinta minutos seguintes, ele ficou sabendo que eu gostava de livros de romance e histórias de detetive, que odiava comédias românticas e que adorava filmes épicos com muitos efeitos especiais. Depois, ele me perguntou qual era minha comida favorita e de que músicas gostava, escutando atentamente quando falei que gostava de pizza e de bandas dos anos oitenta.
De uma forma estranha, era quase lisonjeadora a forma como ele estava totalmente concentrado em mim, devorando cada palavra que eu dizia. A forma como os olhos azuis estavam fixados no meu rosto. Era como se ele realmente quisesse me entender, como se realmente se importasse. Mesmo com os outros, eu não tivera aquela sensação de que era algo mais além de uma mulher bonita de cuja companhia ele gostava.
Com Rael, senti que era a coisa mais importante do mundo para ele. Eu me sentia como se realmente importasse.