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Acordo com uma leve batida na porta e me sento bocejando
enquanto encaro o tempo do lado de fora que parece estar bastante
agradável, o que me deixa animada.
Me levanto, sigo em direção a porta e a abro dando passagem a
minha empregada, Lucy.
- Bom dia, senhorita Vargas.
- Bom dia, Lucy - respondo sorrindo.
Lucy é uma das empregadas da nossa casa e a escolhi como minha
confidente por nos identificarmos, além de termos muitas coisas em comum,
principalmente o amor pelos livros.
Por ser uma garota simples, Lucy, não tem muito recurso para
comprar livros e pelo que fiquei sabendo, ela envia para a mãe doente, que
mora na Alemanha, seu salário. Ela veio morar conosco, quando tinha
apenas dez anos, trazida por meu pai para ajudá-la. Nessa época, eu tinha
apenas seis anos, descobri que ela se interessava por livros, por isso permiti
que ela usufruísse da minha biblioteca e foi aí que nossa amizade começou.
Papai aceitou nossa amizade logo de início enquanto mamãe se opôs,
porém, com o tempo ela acabou aceitando. Por conta de morarmos na mesma
casa criamos algumas regras básicas, como não nos tratarmos com tanta
formalidade, pelo menos não quando estivéssemos sozinhas.
- Por que não trouxe meu café?
- Seu pai pediu para que viesse acordá-la porque quer muito falar
com você - diz cruzando os braços.
Vejo que ela assopra a mecha castanha que cai no seu rosto e suspira.
- E você sabe o que ele quer?
- Não consegui descobrir, mas pediu para sua mãe se reunir com
vocês no café, então acredito que deve ser algo importante.
- Com certeza é alguma coisa relacionada a empresa dele, talvez
queira que eu o ajude em algum discurso bobo, você sabe como papai é.
Lucy concorda sorrindo e se aproxima de mim, desmanchando o nó
das costas da minha camisola.
Me dispo e pego o roupão que está pendurado na porta do guarda-
roupa, o vestindo.
Lucy me segue até o banheiro luxuoso, prepara meu banho, enche a
banheira e coloca a colônia de jasmim que tanto adoro.
- Acredito que se fosse um discurso, ele não precisaria de você,
Laureen. - diz enfaticamente.
- Então terei que descer o mais breve possível para descobrir -
digo dando de ombros.
Damos risadas do meu jeito.
Entro na banheira me despindo completamente e esfrego minha pele
suavemente enquanto Lucy arruma meu quarto. Lavo meu cabelo, tiro o
embaraçado e analiso a situação.
O que papai quer de tão importante comigo?
Com certeza será algo e tanto, afinal, se não fosse, não iria pedir
para Lucy me chamar.
Para falar a verdade, vejo meus pais poucas vezes. Papai sempre
está na empresa, enquanto mamãe segue sua vida gastando com joias caras e
almoçando com suas amigas da alta sociedade.
Sempre achei isso tudo supérfluo, não que eu não gostasse de usufruir
dos bens que temos, mas preferia mil vezes pegar e dar a quem realmente
necessita, do que gastar com coisas fúteis.
Minha mãe, a senhora Elizabeth Vargas, não gostava muito disso,
dizendo que eu deveria me envolver com mulheres do meu nível para que um
dia eu pudesse encontrar um homem à minha altura para me casar.
Bem, se ela acha que em pleno século XXI eu irei me casar por
contrato, está enganada.
Nunca fui de me apaixonar, na verdade, a única vez que gostei de
alguém foi na época da escola, onde conheci um rapaz bastante gentil.
Chegamos a ficar algumas vezes, mas não passou disso, já que ele queria
algo que, naquele momento, não poderia dar.
E para ser sincera, ainda não havia dado para ninguém e nem
pretendia.
***
Saio do banho e me troco às pressas, coloco uma calça jeans que
marca meu corpo, uma blusa escura de gola alta, deixo meu cabelo solto,
apenas o penteando e finalizo com uma maquiagem leve. Olho para o relógio
e percebo que já passou uma hora desde que Lucy anunciou que meu pai
gostaria de falar comigo, com certeza ele estará bravo devido minha demora.
Calço meus tênis, apanho meu aparelho celular e noto que não tem uma
mensagem sequer. Para falar a verdade, nunca fui de ter muitas amizades, as
pessoas na escola me encaravam torto por ser filha de Jorge Vargas, como se
ter dinheiro fosse um crime. Por conta disso, preferia me manter focada nos
estudos e nos romances de época que lia junto com minha amiga, Lucy.
Muitas vezes propus a ela para que deixasse o emprego de
empregada na nossa casa e que continuasse a morar conosco sendo apenas
minha amiga. Ofereci uma parte da minha mesada para que ela ajudasse sua
mãe, mas Lucy se negou, dizendo que preferia estar perto de mim
trabalhando do que ser um peso nas minhas costas. Claro que ela nunca seria
um peso, mas entendi a sua posição e concordei, pois não queria deixá-la
desconfortável.
Saio dos meus pensamentos e me encaro no espelho, o reflexo de
uma mulher magra, cabelo loiro, pele clara, lábios grossos e nariz arrebitado
me encara e um enorme sorriso se forma em meu rosto, o que me faz analisar
meus dentes brancos e limpos.
Sigo em direção à porta e a abro, saindo de frente para um corredor
comprido. Ando por ele em silêncio, ansiosa para saber o que meu pai quer
conversar. Desço a escada, passo pelo hall, seguindo em direção a sala de
jantar, onde vejo papai sentado na cabeceira da mesa, com mamãe ao seu
lado, segurando sua mão.
Percebo que o olhar de ambos é sério, como se algo de ruim tivesse
acontecido. De repente, sinto um aperto no meu coração e uma sensação
estranha cobre cada célula do meu corpo.
O que está acontecendo, afinal?
- Laureen, você demorou - diz papai suspirando.
- Estava no banho, me desculpe - digo de maneira ardilosa para
que o pedido fosse aceito.
- Tudo bem, querida, sente-se, precisamos conversar.
Concordo e me sento ao seu lado enquanto uma das empregadas se
aproxima e serve uma xícara de café para mim. Vejo sobre a mesa diversas
frutas, pães, queijos e outras coisas. Me sirvo e enquanto como, encaro
mamãe que continua séria, sem proferir nenhuma palavra.
- Aconteceu alguma coisa, mamãe? - questiono erguendo a
sobrancelha.
- Você já vai saber, minha filha - diz suspirando.
Concordo voltando a comer, logo em seguida encaro meu pai que
continua sério.
- Como os estudos estão, Laureen? - meu pai questiona.
- Estão indo bem, eu acho, ainda não decidi que curso na faculdade
irei fazer, por enquanto, estou estudando um pouco de cada área que me
chama a atenção.
Ele concorda e repousa sua mão sobre a minha, a segurando.
Aperto a sua mão de volta, como um sinal de acolhimento e vejo seus
olhos demonstrarem uma tristeza enorme.
- Precisamos conversar sobre um assunto bastante delicado -
começa a dizer acariciando meus dedos.
- Estou ouvindo.
- Filha, você se lembra do Eduardo Brown?
- Bem pouco, ele não é um dos sócios do senhor ou algo parecido?
- Na verdade, não... Fomos amigos por alguns anos, ele se destacou
bastante no mercado de ações e acabou construindo um império e tanto.
- Assim como o senhor - digo sorrindo.
Vejo seu sorriso vacilar e fico sem entender.
- Não basta criarmos um império, precisamos saber mantê-lo - diz
enfaticamente.
- Entendo, e o que o Eduardo tem a ver com isso, por acaso ele está
quebrado e procurou o senhor para pedir dinheiro?
A hipótese disso ser verdade me deixa confusa.
Por que papai me chamaria para falar sobre um antigo amigo seu?
Vi pouquíssimas vezes Eduardo Brown, na verdade, o seu destaque
maior é nos telejornais, sempre falando do seu amplo conhecimento e da sua
riqueza.
- Na verdade, sou eu que devo... Precisei pedir dinheiro a ele
emprestado alguns anos atrás.
- Entendo - respondo realmente sem entender. - Aonde o senhor
quer chegar, papai?
- Você se lembra que o Eduardo tem um filho?
- Bem, na verdade, não. Nunca o vi e seria difícil me lembrar de
alguém que eu sequer conheço. - Dou risada.
O silêncio se instala no local e ao perceber isso fico sem graça.
- Não queria envolvê-la nisso, querida, mas temos um grande
problema. Nossas empresas estão indo de mal a pior.
Reflito ao ouvir isso...
Papai se destacou no mercado de ações ao fazer algumas empresas
quebradas retornarem ao mercado.
Como pode um especialista neste assunto, conseguir deixar sua
empresa ir de mal a pior?
- Teremos que economizar, é isso? Não vejo problema algum,
posso cancelar alguns eventos que mamãe insistiu em marcar para mim e
Lucy me ajuda a fazer as unhas e o cabelo, já que é muito talentosa.
- Não é sobre isso que seu pai quer falar, Laureen - responde
mamãe me encarando.
- E o que é?
- Você terá que cancelar sim todos os eventos e evitar qualquer tipo
de gastos à toa, mas vai além disso - responde papai suspirando. - Devo
muito dinheiro à Eduardo e o que temos na conta não pagaria, tivemos um corte enorme de funcionários na empresa e duvido que consigamos mantê-la
por muito tempo.
- E como isso aconteceu, papai, se os negócios do senhor estavam
indo tão bem? - pergunto me sentindo nervosa.
- Você precisa entender, minha filha, que às vezes necessitamos
fazer coisas que não nos agradam tanto, para conseguirmos outras.
- O que quer dizer com isso?
- Para chegar aonde cheguei, precisei derrubar muitos obstáculos,
entende? Pessoas são esses obstáculos.
- O senhor está me dizendo que chegou neste patamar porque
roubou de outras pessoas? - sussurro sem acreditar que possa ser verdade.
Papai não faria isso, não é?
- Isso não é da sua conta - diz de maneira brusca. - Me perdoe,
minha filha, mas realmente não está sendo fácil.
- Certo, e o que o senhor quer que eu faça? No que posso ajudar?
- O encaro, depois encaro mamãe e vejo o olhar dela triste.
- Eduardo me propôs um negócio para liquidarmos a dívida, ele
ficará com as ações da empresa, irá assumi-la, mas continuarei tendo uma
boa porcentagem nos negócios. Isso com certeza nos salvaria.
- E o senhor aceitou, não é?
- Bem, em partes, porque... - Ele faz uma pausa dramática, fecha
os olhos por um segundo depois volta a me observar. - Lembra que eu citei
o filho dele?
- Sim, o que tem?
- Ele propôs um casamento... Disse que a união das nossas famílias
iria nos ajudar muito, sem contar que salvaria nosso império.
- Casamento, com quem? - pergunto aflita.
- Com você, Laureen... Eduardo quer casar você com o filho dele...
É a única maneira de salvarmos os negócios e nos Salvamos.