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Os dias passam rapidamente, parecendo que duram minutos, o
que me deixa chateada a cada segundo. A cada hora que passa, o destino
escolhido pelos meus pais, está cada vez mais perto de acontecer.
Tento de tudo para ficar animada, visito a biblioteca, faço as provas
dos doces da festa, assisto filmes clichês na Netflix, mas nada me anima. Até
mesmo Lucy, que é a pessoa mais alto astral que conheço, não consegue me
animar nesses momentos tempestuosos que estou passando.
Meu pai e eu não estamos conversando, ele até tenta puxar assunto
comigo nas refeições, que é quando o vejo, mas o ignoro e deixo a mesa
antes mesmo de terminar de comer.
Pelo que venho observando, Eduardo cumpriu sua palavra, pelo
menos em partes. Mesmo que o casamento ainda não tenha acontecido, papai
está radiante em saber que, em poucos dias, não irá mais dever nada a
Eduardo Brown e terá dinheiro.
Esqueço isso e suspiro nervosa.
Decido tomar um banho desejando que a água leve todos os
pensamentos negativos da minha mente.
***
- Querida - minha mãe me chama.
Me viro e a vejo entrar no meu quarto.
- Sim? - digo prendendo meu cabelo em um coque frouxo.
- O vestido chegou, estão te esperando lá embaixo para prová-lo.
Fico quieta diante das suas palavras e apenas assinto sabendo que
não vai adiantar esbravejar, já se passou quase um mês desde o dia que papai havia me sentenciado à morte.
É isso que me parece este casamento, a própria morte.
- Pensei que demoraria mais - digo fitando o chão.
- Então foi por isso que você pediu um vestido do zero - diz
mamãe nada surpresa. - Você queria tempo.
- Sim, mas não adiantou muita coisa, acho que é melhor irmos logo
provar o vestido.
Ela apenas concorda com um movimento de cabeça e sai.
Eu a sigo andando com lentidão e assim que chegamos na sala, o
local que escolheram para fazer a prova do vestido, fico nervosa ao ver a
mulher parada, com o vestido embalado.
Me aproximo devagar com medo de tropeçar nos meus próprios pés
e respiro fundo quando o sorriso dela se alarga ao apontar para o plástico,
que cobre o tecido claro.
- Bom dia, senhorita Vargas.
- Bom dia, é....
- Cayenne - diz seu nome.
Concordo sem sequer me lembrar dela.
- Cayenne - repito. - Você foi rápida, pensei que demoraria
mais.
- Bem, sendo quem é, achei melhor dar prioridade - diz de
maneira polida.
- Claro - respondo dando um sorriso amarelo.
- Vamos lá?
Cayenne tira o plástico do vestido e quando o vejo fico boquiaberta.
Não posso negar que o vestido é espetacular, do jeito que imaginei a
minha vida inteira. Na frente há um decote com as pedras preciosas que
havia pedido, nas costas o vestido é aberto, com um tule simples para cobrir
e sua cauda é enorme, dando ainda mais charme a ele.
Fico admirada e sorrio ao pensar que este será o vestido que irei
usar no meu casamento. Casamento este que terei sem amor, afinidade ou
qualquer outra coisa com meu suposto noivo.
Irei me casar esplendidamente, no entanto, do que adianta tanto
glamour se serei infeliz pelo resto da minha vida?
Afasto o pensamento melancólico e minha mãe se aproxima,
colocando o braço no meu ombro.
- Vamos lá, está na hora de prová-lo.
Concordo já me despindo, ficando apenas de lingerie. Cayenne me
ajuda a vestir e fico admirada em como ele se emoldurou em meu corpo.
Fecho os olhos, me sentindo apavorada e assim que ouço o fecho nas costas,
os abro, me analisando no espelho a minha frente.
Estou linda, o vestido realça minhas curvas e deixa meus seios
avantajados, me causando uma sensação na boca do estômago.
Sorrio para mim mesma e dou uma volta, feliz com o resultado.
- O véu - Cayenne diz se aproximando e para na minha frente.
Me abaixo um pouco e ela prende o véu no meu cabelo com um
enorme sorriso no rosto.
Me observo no espelho sentindo vontade de chorar, tenho que admitir
que mesmo não me casando de livre e espontânea vontade, estou magnífica.
- É lindo - digo com a voz embargada. - É realmente muito
lindo.
Vejo mamãe emocionada e continuo me observando.
Mesmo sabendo que não quero fazer isso, não há como voltar no
tempo e meu casamento está ainda mais próximo.
***
Quando estou prestes a tirar o vestido, ouço passos vindo na direção
da sala, me viro conseguindo ver o exato momento que papai entra no
ambiente e me encara com um enorme sorriso no rosto. Noto que seus olhos
estão marejados e sinto sinceridade neles, sabendo que se ele tivesse outra
escolha, a faria.
- Papai - digo sentindo minha voz rouca.
- Nos deixem a sós por um momento, por favor - pede.
Cayenne rapidamente sai da sala, assim como mamãe, que me
observa uma última vez antes de deixar o local.
- Você está linda, minha filha, parabéns.
- Obrigada - balbucio sem muita emoção.
- Sei que esses últimos dias têm sido difíceis para você e vim aqui
justamente para me desculpar.
- Pelo o quê?
- Por permitir que isto esteja acontecendo - diz desviando o olhar
do meu. - Você sabe que se eu tivesse escolha, tomaria outra, mas
infelizmente não tenho.
- O senhor teve, papai, anos atrás... Poderia ter feito tantas coisas
diferentes, se estou aqui, neste vestido hoje, faltando pouco para me casar, é
porque o senhor tomou alguma decisão no passado que arruinou meu futuro.
- Eu sei, eu sei... Me arrependo disso, mas infelizmente não temos o
que fazer.
- E o que o senhor quer, afinal? Tenho quase certeza que não veio
me pedir perdão, sendo que está bastante decidido das suas decisões.
Ele anda de um lado para o outro, assente colocando as mãos nos
bolsos da calça social e volta a me encarar.
- O dia do casamento está cada vez mais próximo, com tudo
acertado, os convites serão encaminhados para as pessoas certas com uma
data próxima. - Ele fica em silêncio e suspira. - Quero te pedir que no dia
do seu casamento, ao menos finja que está feliz.
- Posso fazer isso, desde que aceite um acordo.
- Qualquer coisa.
- O senhor não me levará ao altar, eu irei sozinha. Já não basta toda
essa loucura de casamento arranjado, o senhor me levar até o altar seria a
coisa mais ridícula da minha vida. Então fique ciente que eu darei os passos
para o meu destino sozinha, sem ninguém ao meu lado.
- Mas isso é inadmissível, eu sou seu pai, estou vivo e quero ter a
honra de levá-la até o padre.
- Eu queria ter a honra de escolher meu marido, mas nada é
perfeito, não é mesmo? - Ele me encara e assente se dando por vencido.
- Tudo bem, pegarei um dos carros para ir com sua mãe e você vai
no novo sozinha, mas se pensar em fazer uma gracinha...
- Não se preocupe com isso. - O corto. - Sou jovem, mas uma
mulher de palavra, irei até o altar e o casamento que você tanto deseja se realizará.
Papai concorda.
O vejo dar um passo em minha direção e dou um passo para trás. Sua
expressão muda, como se estivesse arrependido e ele assente, saindo da sala
e me deixando sozinha.
***
Estou em uma sala clara, com janelas grandes e o sol refletindo sobre
elas. Ando para o nada e vejo que uso o vestido de noiva que Cayenne havia
preparado. Em minhas mãos, seguro um buquê de rosas brancas e nos pés um
sapato de salto alto.
Respiro fundo e continuo andando, olho o clarão se transformar em
uma igreja e rapidamente surgir pessoas que não conheço. Respiro fundo,
tentando controlar minha ansiedade e encaro o altar a minha frente. Observo
um rosto distorcido e inexpressivo. Conto até três mentalmente, tentando
assimilar seus traços, mas não consigo, apenas vejo o vulto de um corpo
grande masculino e a sombra dos seus olhos que são escuros como o breu,
quentes como o calor do fogo e ardilosos como um leão em busca da sua
presa.
Continuo andando e percebo que estou cada vez mais próxima do
homem com o rosto distorcido.
Por que só consigo visualizar seus olhos?
Como este homem é?
Me vejo parada ao seu lado, ele coloca sua mão no meu pulso e o
aperta sorrindo. Agora consigo ver seu sorriso, mas ao invés de ser bonito e
elegante, é sádico, doentio, perturbador e me causa arrepios.
- Você será minha para sempre - diz uma voz grossa e rouca.
Seus lábios não se mexem, mantendo o sorriso que me causa medo.
Tento me esquivar, me soltar dele, mas é em vão. Vejo que sua mão
me segura ainda com mais força, me machucando. Grito, mas é inaudível,
como se eu apenas abrisse a boca sem dizer nada. Volto a gritar, mais uma
vez sem som e me vejo derrotada.
Estou presa a este homem para sempre e ele vai destruir a minha
vida.
- NÃO! - grito assustada.
Dou um pulo da cama e percebo que estou no meu quarto. O suor
escorre pelo meu rosto e pinica minha pele, me deixando completamente
estarrecida com o que acaba de acontecer.
Tive um pesadelo, foi apenas isso, um pesadelo para lá de estranho
com o meu futuro noivo.
Tento relembrar seus traços, mas me recordo que não consegui ver,
apenas vi seus olhos sombrios e o sorriso sádico.
Sinto o medo tomar conta de mim e me encolho na cama tentando
reformular o que acaba de acontecer.
Que sonho mais estranho foi esse?
"Isso é porque você está receosa com este casamento, Laureen."
Respiro fundo, procurando por meu celular e assim que o acho, o
pego, decidida a pesquisar no Google sobre meu futuro marido, mas desisto
ao perceber que, se por acaso ver como ele é, ficarei ainda mais nervosa
com este casamento.
- O que me resta é esperar que a cerimônia aconteça logo para
acabar esse pesadelo.
Sei o quanto estou errada, mas me conforto com esse pensamento.
Quando eu me casar, o pesadelo deixará de ser sonho e passará a ser
real...
Algo muito pior.
Me levanto, pego sobre a mesinha que há no quarto um pouco de água
e bebo rapidamente, a fim de que isso ajude o susto passar.
Olho o relógio e vejo que passa das cinco da manhã, em breve o sol
surgirá para um novo dia...
Um dia a menos da minha liberdade.
Penso a respeito disso, analisando a situação mais uma vez.
Ultimamente tenho feito muito isso, analisar...
Como se isso fosse ajudar em alguma coisa.
Penso nas duras palavras que havia dito ao meu pai, sobre não querer
que ele me leve até o altar, pelo menos assim eu me sentirei mais confortável
em saber que me guiei sozinha para a sentença, mesmo que seja culpa dele.
Como tem sido constante, me pego pensando no meu futuro noivo.
O que será que ele estaria fazendo agora?
Será que está feliz com este casamento?
Com certeza ele está com alguma mulher mais bonita e sensual que
eu, desfrutando do desejo carnal que a vida nos dá.
Penso a respeito disso, eu nunca havia feito sexo com alguém e saber
que minha primeira vez será com uma pessoa desconhecida, me causa
sensações estranhas.
Eu teria mesmo que fazer isso?
Quem sabe eu posso tornar meu marido um aliado, dizendo a ele que
dormiremos em quartos separados e não teremos relações sexuais. Se ele
não estiver de acordo em se casar, com certeza apoiará esta minha decisão.
Sorrio com a ideia de que isso pode dar certo e volto para a cama,
adormecendo novamente.