/0/6500/coverbig.jpg?v=16117b9714b76206aed684e0ba37aa14)
A semana passa em uma lentidão que chega a me dar náuseas.
Não saio do meu quarto para nada, chateada por conta de tudo que está
acontecendo. Evito meus pais o máximo possível, mesmo me conformando
com a sentença que me deram, não consigo aceitar e fingir que nada está
acontecendo.
Como antes, não consegui procurar no Google nada sobre o meu
futuro marido, a dúvida em saber como ele realmente é, me deixa mais
confortável com isso tudo.
Lucy faz de tudo para me animar, me enchendo de sorvete, doces e
meus pratos favoritos, sendo repreendida por mamãe, que alega que preciso
estar magra para entrar no vestido.
Fico ainda mais triste e desanimada quando os preparativos do
casamento começam, com degustação de bolos, doces e outras coisas. Papai
escolheu uma orquestra para a festa, mesmo eu insistindo que seria
completamente desnecessário.
A lista de convidados foi outra briga, já que metade era de sócios
dele e a outra parte, sócios de Eduardo, já que mamãe não tem família e nem
ele. Eduardo com certeza escolheu seus sócios para se enaltecer no
casamento.
A cerimônia seria realizada na igreja católica, outra coisa que
critiquei, afinal, acredito que devemos nos casar em altares divinos quando
há amor de verdade, coisa que não é o caso. Porém, me conformei e aceitei
isso.
A festa seria cheia de comida boa, diversos convidados e uma noite
regada a sorriso forçados, coisa que detestei. Tudo isso me incomoda ao extremo, mas como não tenho escolha, acabo aceitando o que papai e mamãe
desejam, deixando-os bastante felizes.
O dinheiro de Eduardo é gasto com sucesso, meu pai faz questão de
comprar um carro novo para que eu vá até a igreja, já que a festa será na
nossa casa. Aliás, casa deles, porque em poucos dias, eu não pertencerei
mais aqui.
NA verdade, eu não pertencerei mais a lugar algum, somente a um
homem completamente desconhecido.
***
- Como se sente sabendo que agora não é mais uma empregada e
sim uma futura governanta? - pergunto para Lucy que está fazendo uma
trança embutida em mim.
- Bem, tirando as aulas chatas que sua mãe está me obrigando a ter
para entender como se governa uma casa, a sensação é boa. Não ter que
lavar privada é realmente bastante gratificante.
- Eu fico mais aliviada em ter você ao meu lado para enfrentar isso
tudo, assim poderei ter seu apoio nos momentos difíceis.
- Claro que terá, mas não se esqueça que muitas coisas vão mudar,
principalmente o fato de que não viveremos tão grudadas como agora. Você
terá um marido e precisará dar atenção a ele.
- Eu sei, mas só de saber que te terei por perto, é mais tranquilo
passar por isso tudo. - Sorrio e me encaro no espelho, analisando a trança
embutida. - Acha que ficaria legal este penteado para o casamento?
- Não, mas iremos cuidar disso no momento certo, anda, vá se
preparar, o jantar será colocado à mesa logo.
***
- Está animada, querida? - pergunta papai durante o jantar.
- Animada com o quê, papai? Seja mais específico, por favor.
Percebo que mamãe torce o nariz e continuo a comer enquanto os
ignoro como estou fazendo nos últimos dias.
- Pelo menos finja que está animada com este casamento - pede
me observando. - Por acaso vai se casar com essa cara de enterro?
- Se depender de mim, sim - respondo dando de ombros.
- Já chega, vá para o seu quarto agora!
Me levanto derrubando a cadeira para trás e o encaro.
- Sabe qual parte deste casamento vai ser boa, papai? É que não
irei mais conviver com senhor. - Saio antes mesmo de ouvir uma resposta
sua e apenas ouço os estilhaços dos pratos baterem na parede da sala de
jantar.
Me sinto completamente chateada com a situação e me tranco no meu
quarto, desejando que este casamento infeliz aconteça logo e que eu possa ir
embora de uma vez por todas desta casa.
***
Os preparativos continuam e sinto que está cada vez mais perto do
casamento acontecer.
Fico surpresa em saber que realmente meu noivo, que nem mesmo fiz
questão de saber o nome, não veio me conhecer e penso sobre a situação.
Será que ele também está infeliz com esta união?
Como foi para ele saber que se casaria com uma mulher
desconhecida?
Esqueço essas questões e finjo me concentrar no que a estilista fala
em relação ao vestido, dando dicas e mais dicas do que poderíamos fazer.
Disse a ela que poderia ser um vestido qualquer desde que fosse costurado
do zero.
Minhas medidas são tiradas e assim que tudo termina, me sento e
aceito a taça de champanhe que me é oferecida por um dos empregados. Vejo
a mulher negra gesticular, rir e conversar com minha mãe. Não presto
atenção em nada e nem faço questão disso tudo.
Como uma mente tão perturbada consegue desligar tudo que está à
sua volta?
Continuo degustando o champanhe e assim que termino, faço a prova
de um vestido simples para que a estilista tire o molde dele.
- Quero que tenha um decote frontal e que realce meus seios -
digo pela primeira vez em horas. - De preferência com pedras preciosas na
frente e que realce minhas curvas.
As duas me encaram e ficam espantadas, talvez por finalmente dar
palpite sobre algo.
- Certo, querida, você deseja mais alguma coisa nele? - pergunta
a mulher com um sorriso enorme nos lábios.
Analiso suas expressões e fico em silêncio.
Penso se ela sabe a verdade sobre eu não querer me casar de livre e
espontânea vontade.
- Acho que é só isso mesmo - respondo depois de um tempo. -
Tenho certeza de que você vai fazer o seu melhor, sem sequer pensar em
economizar.
- Bem, se a senhorita está me dando liberdade para isso, pode ficar
tranquila que farei o meu melhor - responde sorrindo.
Concordo e me troco encarando as duas.
- Se me derem licença e estiver liberada, irei para o meu quarto
descansar um pouco.
- Claro, fique à vontade, deve ser uma loucura preparar um
casamento assim às pressas - diz a mulher.
- Poderia ser pior, mas eu supero - digo forçando um sorriso.
Antes de dar as costas para sair, noto o olhar de desaprovação da
mamãe e me divirto com isso, indo o mais rápido possível para meu quarto e
me trancando lá dentro sem nenhuma perturbação.
***
Abro os olhos quando ouço a batida na porta e levanto, indo em sua
direção. A abro e vejo o olhar sério da mamãe me encarar.
- Posso? - pergunta apontando para o ambiente.
- A casa é sua - digo dando passagem.
Ela entra encarando detalhadamente meu quarto, vendo na
penteadeira as bonecas de porcelana que coleciono desde nova. Ela e vovó,
que já faleceu, me deram a minha primeira boneca quando tinha seis anos.
Desde então, todo aniversário, até os dezessete, eu ganhava uma boneca
dessas.
- Você cresceu tão rápido - diz pegando a primeira boneca. -
Lembro quando sua vó era viva e ela me ajudou a escolher este presente
para você.
- Sinto falta da vovó também - digo me aproximando e pegando a
boneca das suas mãos. - Ela faz muita falta.
- Sim, se estivesse viva, tenho certeza de que nos ajudaria a nos
livrar desta loucura de casamento.
- Eu te amo, mamãe, mas não finja que realmente se importa com
isso - digo observando suas expressões e o suor é visível em sua testa, que
está franzida. - Sei que está aliviada por eu ter aceitado este casamento,
mesmo que não seja minha vontade me casar com um desconhecido.
- Me perdoe, filha - diz cabisbaixa. - Não vejo outra opção a
não ser esta.
- Ouvi sua conversa com o papai - digo querendo ser sincera.
- Que conversa?
- Sobre ele ter te traído - respondo devolvendo a boneca para o
lugar. - Mamãe, papai tem a ver com a morte da mulher que falavam?
- Não fale besteira, Laureen - diz impaciente. - Seu pai me traiu
sim, mas isso faz muito tempo e você nem era nascida. Esqueça isso e finja
que nunca tivemos esta conversa.
- A senhora não parece ter esquecido, já que jogou na cara dele
isso.
- Não interessa, é algo entre seu pai e eu... Não se intrometa e faça
o que eu disse; esqueça de uma vez por todas, entendeu? Não quero que se
meta em mais problemas, já nos basta este casamento.
- E se eu fugisse, mamãe? Por que a senhora vai permitir que meu
destino seja com um homem que eu não conheço?
- Fugir? - Percebo que a palavra soa desesperada na sua boca. -
Deixe de ser ingrata, garota, seu pai e eu sempre fizemos de tudo por você,
tem os melhores estudos, teve os melhores cursos, agora é sua vez de
retribuir isso.
Fico chateada ao ouvir suas palavras duras, é como se tudo que eles
tivessem feito por mim, fosse apenas para que depois tivesse que retribuir de
alguma maneira. Agora está explicado o motivo deste casamento estar
prestes a acontecer sem meu consentimento.
- Sinto muito - digo.
- Eu também, minha filha... Me desculpe, não quis jogar na cara o
que fizemos por você, pois é nossa obrigação como pais. Só peço que ao
menos finja estar feliz com este casamento, no final, pode ser que você acabe
se apaixonando pelo seu noivo.
- Como se apaixonar por uma pessoa que sequer vi? - questiono
me sentando na cama.
Minha mãe senta ao meu lado e segura minha mão.
- As melhores histórias de amor acontecem quando menos
esperamos.
Dou de ombros, pensando que não adiantaria reclamar, choramingar
e esbravejar.
O meu destino é este, certo?
Agora é só esperar o momento para que aconteça.