Capítulo 7 Confronto

- Eu quero ir - digo com convicção. - Se o senhor me permitir, eu vou.

- Ok.

Dou as costas para ele, mas ele toca no meu ombro. Olho-o.

- Quero que tenha o meu número. Caso aconteça algo liga pra mim e para a polícia. Entendeu?

- Sim. - Pego o meu celular no bolso das calças e dou para ele. Ele anota o número e me entrega. Vejo o seu número e o seu nome, "Dominique". - Obrigada.

Saio do quartel, vejo Rubens parado no mesmo lugar com a sua filha. Ela já parou de chorar e está no chão, Rubens segura a mão dela. Vou até ele.

- Quer ver o seu filho? Veja, mas quero ver explicar pra ele porquê eu fui embora e dó de você se mentir. Eu te mato.

- Ficou mais arisca. - Ele sorri de lado e eu sinto meu estômago revirar...

Saímos do elevador do prédio e paramos em frente a porta da minha casa. Não tenho vontade de abri-la.

Ele me encara e respira fundo.

- Não vai abrir? - Espera eu responder, mas o ignoro. - A mãe dela morreu, sabia? - Ele olha para a menina no chão.

- Não e nem quero saber como.

Exito em tocar na maçaneta, mas querendo acabar logo com isso o faço. Abro a porta e nós entramos.

Joca está estudando sentado no sofá. Ele me olha, dá um grande sorriso e vem correndo até mim. Ia me abraçar, mas viu o pai e ficou apenas o encarando com curiosidade.

- Quem é ele, mãe? - Segura forte a minha mão. Acredito que se recorda pouco do rosto do pai. - É... Pai? - Ele olha atentamente para o rosto de Rubens e começa a chorar. - Pai?

- Vem cá! - Rubens se ajoelha e abre os braços, solta a bolsa e a menina. Também chora. Joca o abraça.

A menina olha a casa. Vai para trás do balcão da cozinha.

Vejo Rachel sair do quarto do Joca analisando a situação e vir até mim.

- Senhora, é o pai do Joca?

- É e... - Vou atrás da menina. - Essa é a menina dele. - Pego a garota e a bolsa. Entrego a garota para Rachel e coloco a bolsa na bancada. - Pode dar algo pra ela, por favor? Uma mamadeira? Ela estava chorando no metrô.

Olho para o Rubens e para o meu menino. Abaixo a cabeça sentindo os meus olhos arderem.

Joca está emocionado e eu sinto tristeza. Não imaginava doer tanto no seu coração a ausência do pai. Eu sou um monstro.

Rubens se levanta com Joca no seu colo.

- Mãe, o pai vai ficar com a gente agora?

Sorrio para o meu filho... O que eu falo?

- Essa é sua irmã! - Aponto para a criança. - Qual que é o nome, Rubens?

- Lídia. Tem 2 anos e 8 meses. Vai cuidar da sua irmã, não é?

- Sim! - Ele balança a cabeça.

Isso é muito para eu aguentar. É horrível tê-lo perto depois de tudo que eu passei. Digo:

- Filho, desce do colo do seu pai, eu preciso conversar com ele. - Abro a porta da frente. - Vamos para o terraço.

Ele coloca o Joca no chão e vem comigo para o terraço.

Olho para o céu e fecho os olhos. As lembranças ruins vêm à tona: assassinato, brigas, tapas...

Abro os olhos e o encaro.

- Nós nunca mais vamos ficar juntos. Você veio pra nada.

- Você vai voltar comigo - diz tranquilamente.

- Você é um assassino!

- Não. Sou parecido com um policial. Alguém desobedece às regras do Geraldo e eu dou um jeito. - Ele dá de ombros.

- Quero ver me obrigar a voltar. Você me bateu uma vez, vai me bater de novo?

- Você não tem noção, não é? - Ele aumenta o tom de voz, aproxima-se tentando colocar a mão em mim. Desvio-a com o meu braço e dou um soco no seu queixo. Ele dá dois passos para trás. Chuto a sua virilha com a minha canela. Ele curva o corpo para frente, geme de dor, e dou um soco no seu nariz.

- Eu deveria te matar e alegar legítima defesa, mas eu nem dei oportunidade de você tocar em mim. Como posso dizer que estava tentando me bater ou até mesmo matar? Quem sabe outro dia, outra hora. Agora eu quero que você vá embora!

Ele cospe sangue no chão. O seu olhar é puro ódio.

Digo tudo que ficou engasgado por anos:

- Eu me casei com um animal. Você é um inútil, falhou em ser marido e pai.

Entro no elevador e ele me segue.

- Você é uma praga! - Não consigo parar de xingá-lo. Sei que se continuar, ele acabará me batendo e se acontecer vai até ser bom, porque no elevador tem câmera. Vou matá-lo alegando legítima defesa e a câmera mostrará. - Não merece o meu amor e muito menos o do meu filho. Não importa se você me bater, se você me der um tiro ou uma facada, faça o que quiser comigo. Eu repito: só volto para Bahia dentro de um caixão. Para ter o meu filho vai ter que me matar, mas eu espero que tenha o mínimo de decência e entenda que o seu filho me ama mais-que-tudo. Então me deixe em paz e eu juro que ele vai lembrar de você como o melhor pai do mundo.

- Eu... preciso de um tempo. - Ele respira fundo. Está se controlando para não me bater. Aperta no botão para descer até o térreo e então sai do elevador. O vejo sair do prédio enquanto a porta do elevador se fecha. Aperto para ir ao terceiro andar e volto para o meu apartamento.

Meu filho vem até mim, carregando a sua irmã.

- Onde tá meu pai?

- Seu pai precisou sair, mas já volta. - Abaixo-me e dou um beijo na sua testa.

- Ela não é linda, mãe?

- Ela é muito bonita. - Passo a mão pelo cabelo crespo dela. O cabelo dela deve ser igual ao da mãe, pois os cachos são mais fechados que o do Rubens. É tão gordinha, deve se alimentar bastante.

Respiro fundo. Essa criança não deveria ter tido esse destino.

- Mãe, se ela é filha do pai... - Ele desvia o olhar. - Ela não é sua filha?

- Não, meu menino. Você sabe muito bem que a sua mãe não estava grávida. Ela é filha de outra mulher, mas ela já morreu.

- Você não pode ser a mãe dela?

- Ela tem uma mãe, só não está viva.

- Mas mãe... - Ele faz um bico.

- Sim? - Sento no sofá e Joca coloca a menina do meu lado.

- Ela pode ter mais de duas mães.

- Ah! Terminou os estudos de hoje, meu filho?...

Esse assunto era muito delicado e eu precisava que Rubens a levasse logo. Entretanto, passou uma hora e ele não voltou.

Liguei para ele, mas acho que aquele número de anos atrás não era mais o seu número. Decidi voltar para o quartel, porque não podia esperar mais.

O capitão foi atencioso comigo, não ligou para a minha demora.

Eu não sei se eu deveria ter voltado para cá. Rubens pode acabar voltando a qualquer momento para a minha casa. Não queria deixar ele sozinho com o meu filho e com a Rachel. Ela não deve ter se sentido confortável com a presença dele, principalmente porque sabe dos meus problemas.

Deito no gramado ao lado do quartel e fecho os olhos.

Eu poderia ter o matado, mas eu teria essa coragem? Além disso, meu filho o ama. Eu não poderia...

Escuto passos vindo na minha direção e abro os olhos. São dois homens de terno. Levanto-me.

- Boa tarde, senhora Dias. Sou o detetive Jones e esse é o detetive Smith. - Eles mostram os distintivos. - Precisamos que a senhora nos acompanhe até a delegacia.

- É sobre o Rubens?

- Sim, daremos maiores detalhes lá. Por enquanto, peço que nos acompanhe.

Imagino o que possa ter feito: matado ou agredido alguém. Rubens deve ter descontado a sua raiva em outra pessoa enquanto pensava em mim. Seja o que for, não terá o meu apoio e tomara que apodreça na prisão.

            
            

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