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Antonella Clifford
Ontem, meu pai faleceu. Hoje será o enterro, Luca, meu irmão, ficou com a organização.
Sinto uma dor horrível dentro de mim, a dor da perda é profunda. E lembro ter ficado assim quando eu perdi minha mãe, na época eu tinha 15 e ela 38 anos. Sofremos um acidente de carro, me falaram. Acordei num hospital sem saber o que havia acontecido, e então descobri que apenas eu sobrevivi. Não lembro do nosso último momento juntas, foi apagado da minha memória. Isso me dói até hoje.
Meu pai sempre foi muito atencioso e amoroso com meu irmão e eu. Quando Luca se assumiu gay, com 18 anos, meu pai deu o apio que ele precisava. Papai respeitou meu irmão em todas as escolhas feitas e o mesmo comigo.
O único motivo de nossas brigas era por eu não querer assumir a grande empresa dele, eu dizia que meu irmão lidaria melhor com isso, seria muita responsabilidade para eu assumir. Mas ele, por algum motivo, insistia que eu era a pessoa certa. Meu irmão nunca fez questão, talvez pelo mesmo motivo que eu.
Temos os mesmos gostos, até para homens... A diferença é que, quando criança, quem brincava de bonecas era ele, eu nunca gostava de brincar nos cantos, sempre fui ativa demais para isso. Gostava de correr, gostava de pular, sempre aparecia com um ralado diferente no corpo. Claro que eu evitava, mas sempre que acontecia eu simplesmente não ligava, sabia que era por alguma aventura minha e não me arrependia, justamente por ser livre. Nunca fui de chorar por qualquer coisa.
Eu adorava me aventurar, ser a garota descuidada. Foda-se o padrão, eu não ligava para nada. E agradeço eternamente ao meu pai, que me criou para ser livre. Mas muita coisa mudou, com o tempo veio as responsabilidades.
Sei que o luto vai demorar, meu pai era meu porto seguro. Ele não ia querer me ver chorar, sabia que se eu chorasse era por ser algo realmente difícil de lidar. Mas hoje é por ele, meu pai e amigo, o homem que sempre me apoiou e que alegrava a casa só com a sua chegada.
Agora estou no meu quarto. Moro sozinha no mesmo prédio que minha melhor amiga, que no momento, está comigo se arrumando para o enterro. Ela é a única pessoa que, nos dias de hoje, me vê chorar.
Meus olhos ardem, com um nó na garganta eu me arrumo, preguiçosamente, para ir à esse enterro. Preciso ter forças para aguentar todos os familiares e amigos vindo falar as mesmas merdas de quando um ente querido morre. Eu não ligo para o que eles falam. Eu não queria ouvir ninguém.
Estou com um vestido preto e óculos escuros, esperando minha amiga pentear seus cabelos longos e cacheados. Não demora muito. Ela é belíssima, toda magrinha, seus olhos são da cor mel, seios e bunda na medida certa de seu corpo, tem a pele negra. É uma mulher alta, bonita tanto por dentro quanto por fora.
Assim que terminamos, descemos para encontrar o motorista. Meu irmão já está a nossa espera dentro do carro. Quando eu entro no automóvel, o vejo de óculos escuros e com lágrimas descendo pela bochecha. Ele tenta seca-las, mas é em vão. Luca tem o cabelo loiro, puxou a nossa mãe, temos olhos verdes como papai. Ele é alto, tendo 1,80 de altura, já eu, tenho 1,73.
O motor do carro foi ligado, nos conduzindo para o local onde meu pai será enterrado.
Depois que minha mãe faleceu, metade da alegria da casa foi junto. Coisas pareciam não estar certas, mas fora papai quem nos levantou novamente, mesmo com aquela sensação de vazio, ele nos criou e protegeu. Seus métodos de proteção se baseava em nos ensinar a lutar e manusear armas. Ele fez quem somos hoje. Não será agora que iremos ser fracos.
...
O enterro acabou há algumas horas. Tive que aguentar parentes e amigos do meu pai por horas falando as mesmas coisas.
Já eram 23 horas e eu ainda estava no meu quarto, olhando para o teto sem sono e depois de descobrir por uma ligação do meu irmão que, meu pai realmente deixou a Clifford's para mim.
Não tenho dúvidas de que eu consigo lidar com isso, talvez meu pai soubesse que se tivesse deixado para meu irmão, o mesmo não ia curtir a vida, ia se afundar no trabalho. Como se o peso de toda a responsabilidade fosse só dele, o que era exatamente o que meu pai não queria.
Então deixou para mim, sabendo que eu vou cuidar e me divertir. Ninguém tira isso de mim. Eu não vou deixar de fazer o que faço, nunca.
Eu vou ter que ir à empresa amanhã para adiantar uns papéis e começar depois de amanhã, por escolha própria. Não vou conseguir ficar sem fazer nada, o trabalho iria me distrair.
Eu sei que estou pronta para assumir o lugar de CEO e vou realizar o desejo do meu pai, o deixando orgulhoso no lugar onde ele está.
Nunca foi meu sonho, eu teria escolhido outra profissão, talvez psicologia, mas fui preparada para ocupar o lugar de CEO.
No dia seguinte - não por animação - acordei mais cedo. A angústia tomando conta de cada pedaço do meu coração. Tinha que saír de casa às 8 horas.
Me arrumei lentamente. Vesti uma blusa social preta, de manga cumprida e uma calça da mesma cor. Deixei meu cabelo solto, pois o mesmo é um pouco acima do ombro, tenho o cabelo castanho claro.
Minha melhor amiga me chama de branquinha desde nossos 17 anos, houve uma época em que não saí de casa por semanas, ficando pálida por falta de sol, e quando me tocava ficava marcas na pele, desde então ela me apelidou assim. Mesmo que hoje eu esteja bronzeada. Temos apenas alguns meses de diferença, porém ela é mais velha. Alice é Brasileira, mudou-se para a Itália com 17 anos e sempre foi minha vizinha desde então. Mas saímos de casa juntas aos 21 anos, apenas não moramos no mesmo apartamento. Ela seria minha secretária na empresa.
Assim que terminei de fazer uma maquiagem simples nos olhos, e um batom nude, desci encontrando minha amiga à caminho do motorista que nós levou para o enterro, nós iremos juntas para a empresa.
– Bom dia, minha linda! Conseguiu dormir? – diz ela, sem muita animação.
– Bom dia! Tive uma noite difícil – digo normalmente, não preciso falar mais nada, ela me conhecia mais que eu.
– Eu também. O trabalho vai nos distrair. Luca me ligou, falou que está esperando a gente na empresa para contar uma novidade. – Alice fala, numa falha tentativa de distração.
– Já imaginava que ele estaria lá primeiro que nós duas. Vamos logo, para descobrir o que ele quer nos contar. Deve ser algo do namorado, com a morte do nosso pai, acho que Luca não vai ter cabeça para DR. - eu comentei.
– Tomara. Assim seu irmão arruma alguém melhor. Acredito que não será tão cedo, ele é o romântico do trio, mas a tristeza vai demorar para sair do coração de todos nós. – ela diz e, por fim, eu aceno em concordância, já dentro do carro.
Chegando lá, fomos direto para o elevador. Havia 26 andares e o meu era o último. Como minha secretária, a mesa da minha amiga fica no mesmo andar, de frente para o elevador, já o andar de Luca é o penúltimo. Ele ainda não contratou um secretário, pois só vai começar a trabalhar depois de uma semana. Não seria nada pesado. Eu falei para ele ficar em casa, não havia necessidade de ficar alí.
Quando o elevador parou no nosso andar, Alice foi direto para sua mesa deixar a bolsa e me acompanhou até minha sala, onde Luca já estava.
– Bom dia, meu loiro. - diz Alice, com a voz doce
– Conta logo. – eu o apresso.
–Bom dia. – ele diz, me ignorando.
– Vamos direto ao assunto, sei que se trata do seu namorado. – eu falo direta. Não estamos com empolgação alguma, somos três pessoas que se amam muito e que estão destruídas da mesma forma por dentro.
– Vou resumir para vocês, ele queria que eu dormisse na casa dele para me consolar – Começou. Eu já sabia que o namorado dele não o conhecia o suficiente, se conhecesse mesmo, saberia que meu irmão não ia querer sair de casa e que ele é romântico de mais para sair de casa nessa situação, ir atrás da pessoa para ser consolado. – Ele não estava fazendo nada em casa, apenas vendo filme, mas é preguiçoso demais para ir me ver, então, vou terminar com ele hoje mesmo. – Meu irmão finaliza.
– Para ser sincera, eu achei que já tinha terminado com esse traste, ele é muito preguiçoso, gostoso é, mas não valoriza você. – Alice fala.
Depois de conversarmos sobre o relacionamento de Luca, minha amiga foi para sua mesa, e meu irmão para casa com uma amiga para verem filmes românticos, só para se distrair um pouco.
Eu vou focar no trabalho agora, pois o dia vai ser longo. Já tenho uma reunião marcada, para fechar o contrato pois terei mais uma futura filial. Aqui a gente trabalha com produtos de beleza, é uma empresa das grandes e muito famosa, não tenho dúvidas de que meu pai cuidava dela tão bem. Antigamente era ele e minha mãe, mas ela se foi e ficou só ele. Agora somos meu irmão e eu. Seríamos fortes, nossos pais nos criaram assim, vamos conseguir ser felizes sozinhos. Eu tinha certeza.