Capítulo 4 O estágio

Mantendo a cabeça baixa, Camila buscou sua maleta médica às pressas. Ela limpou a garganta antes de oferecer a ele algumas dicas. Ela ainda era médica, afinal de contas.

"Por enquanto, você não deve deixar cair água nas suas feridas. Desinfete os curativos uma vez por dia e use camisas largas para não agravar os machucados." Ela produziu um frasco de comprimidos e um tubo de pomada, colocando-os sobre a mesa de cabeceira. "Vou deixar esses remédios para você."

Isaac murmurou em reconhecimento, mas ainda não se virou. Camila também não disse mais nada, retirando-se imediatamente da villa.

Quando a médica voltou ao hospital, já eram quase onze da manhã. Ela foi até a cantina para beliscar alguma coisa. Camila mal havia se acomodado em sua mesa de trabalho quando foi chamada à diretoria do hospital.

"Vou mandar Debora para o estágio no Hospital Central Militar", declarou o diretor em um tom firme, sem margem para discussão.

Camila ficou embasbacada. "Mas pensei que você já tivesse decidido que me enviaria?"

"Camila, tenho certeza de que você sabe que todo o equipamento de alta tecnologia presente em nosso hospital foi patrocinado pela Corporação Pamo. O presidente Johnston me pediu pessoalmente para tomar conta de Debora. Não posso me dar ao luxo de contrariar as instruções dele."

À menção do nome de Isaac, Camila não pôde conter sua irritação. Eles podiam ser casados aos olhos da lei, mas eles nunca haviam se conhecido oficialmente. Ela o via somente em revistas e, de vez em quando, em noticiários na TV. Então... ele e Debora?

O coração de Camila bateu fora de compasso, mas ela manteve a compostura. "Ah, é?"

"É, receio não ter muita escolha nesse assunto. Escute, Camila... Nós dois sabemos a dimensão das suas habilidades, mas..." O diretor quis reconfortá-la, mas não soube como proceder. Camila se destacava entre seus pares graças ao seu incrível talento e à sua ética profissional. Ele era quem mais a valorizava.

"Eu entendo", Camila murmurou baixinho. Ela disse a si mesma que não cabia a ela se sentir desapontada com o envolvimento de Isaac naquela situação. Ele havia sido forçado a se casar com ela. Certamente, ela não podia esperar que ele desse a mínima para ela.

"Ainda preciso me preparar para uma cirurgia, então peço licença", disse ela em tom resignado. Camila sabia que não havia nada que pudesse fazer para reverter a situação.

Só restou ao diretor suspirar e vê-la partir.

Camila mergulhou de cabeça no trabalho, na tentativa de esquecer o estágio. Ela finalizou sua segunda cirurgia sem o menor problema, em seguida, descartou seu uniforme cirúrgico e lavou as mãos antes de se jogar em uma cadeira, exausta.

Nesse momento, Debora entrou no salão. "Oi, Camila", ela a cumprimentou com um sorriso radiante. "Você está livre hoje à noite? Quero te convidar para jantar."

"Me desculpe, mas tenho que resolver algumas coisas mais tarde", Camila recusou de forma educada. Ela não tinha uma relação muito boa com Debora. Elas eram simplesmente colegas, não amigas.

As duas se formaram ao mesmo tempo e na mesma universidade. Mesmo naquela época, Debora já era uma figura e tanto. Ela era muito competitiva, sempre querendo se exibir e chamar a atenção de todo mundo. Camila, por sua vez, preferia se esconder em meio aos demais e se perder em seus livros. Era possível afirmar que as duas mulheres eram o completo oposto uma da outra. Como consequência natural, elas não se davam muito bem.

"Ah, que pena", lamentou Debora, por algum motivo parecendo encabulada. "Na verdade, eu queria conversar com você sobre algo."

Camila ficou em pé, dirigindo-se até seu armário para pendurar seu jaleco. Sem olhar para Debora, ela disse: "Pode falar."

O fato de Debora ter se envolvido com Isaac de uma forma ou de outra só fazia Camila querer se distanciar ainda mais da colega.

"Você já deve ter ouvido falar, certo? Eu sinto muito, de verdade. Eu não fazia ideia de que o diretor ia..."

"Tudo bem", Camila interrompeu.

Mas Debora ainda não tinha terminado. "Ah, e será que você também pode manter em segredo que você assumiu meu turno ontem à noite? Sabe, já que eu vou para o Hospital Central Militar, não quero que isso acabe dando algum problema."

Apesar de não ser um pedido muito incomum vindo de Debora, Camila não quis insistir no assunto.

"Não vou contar a ninguém."

De qualquer forma, não era tão estranho assim assumir o turno de algum colega. Era inevitável que eles se deparassem com emergências pessoais de vez em quando.

Nos terrenos do hospital.

Conforme escurecia, as luzes nos postes de rua começavam a ganhar vida, uma a uma. Forrest estava sentado no banco de trás de um carro preto que custava uma fortuna, estacionado perto dos portões. "Bem...", disse ele, com a voz cheia de orgulho. "O que você achou da minha protegida? Ela possui excelentes habilidades, não é?"

Ao lado dele, Isaac recostou-se no assento. Ele se lembrou da médica que o havia tratado antes, recordando-se do modo calmo e preciso com que ela conduzira suas ações. Ele estava, de fato, maravilhado com as habilidades dela.

"É a senhorita Griffith", Willie falou de repente.

Isaac baixou o vidro enquanto Debora se aproximava do carro.

As sobrancelhas de Forrest se ergueram em sua testa. "Debora?"

No banco do motorista, Willie girou o tronco. "Você a conhece?"

Forrest assentiu, com um brilho de curiosidade no olhar. "Ela foi minha caloura na universidade."

Isaac ficou curioso ao ouvir a informação. Então, além de salvá-lo ontem à noite, esta mulher também havia cuidado de seus ferimentos?

"Será que é o destino?", Willie exclamou. Será que o universo finalmente decidiu dar ao seu chefe uma chance no amor?

"Do que diabos você está falando?", Forrest perguntou, franzindo o cenho enquanto olhava para frente e para trás, encarando os outros dois homens. Mas ele não obteve resposta, pois Debora, parada do lado de fora do carro, interrompeu a conversa.

"Senhor Johnston."