Felizmente, ser a rainha do fogo tem seus benefícios. Há fogo correndo em minhas veias, estão, estou sempre aquecida. Lutarei para que um dia, eu simplesmente possa ficar na cama se quiser. Para que todo o meu povo possa. E esse me parece um sonho distante, embora eu acredite que o fim do que quer que esteja por vir, esteja próximo.
Pela manhã, o acampamento está a todo vapor. Ver minha gente uniformizada, aprendendo a se defender, sem conflitos e com o respeito reinando tem me feito bem. Todos usam as mesmas roupas, comem a mesma comida, têm a mesma importância. A harmonia tem se instaurado. Mesmo os Pássaros do Céu, não tiveram dificuldade para se adequar. Isso me faz mais bem do que eu imaginava.
Propósitos trazem satisfação.
Finalmente vamos nos reunir em um conselho de guerra e ouvir o que Cosmo, Lua e Sky tem para nos contar. Vamos ficar a par das terríveis verdades que descobriram sobre o Rei dos humanos e criar um plano a partir disso. Foi bom nos darmos esse tempo para respirar e deixarmos as coisas se assentarem, sinto que não haverá um dia de paz após essa reunião.
Me recuso a acreditar que essa pessoa é pai de Aidan. Para mim, ou esse rei é muito falso e criou um personagem para o filho, ou Kenom é um belo de um mentiroso. O mesmo se senta ao meu lado na mesa do conselho. Desde quando ele tem esse direito?
De ouvir tudo que eu escuto? De ter tamanha confiança investida nele? Essas são perguntas para as quais não tenho resposta. As coisas são o que são. Algo dentro de mim confia nele. Sente até – embora eu nunca vá admitir, uma afinidade sem explicação. Eu vejo calidez em seu olhar, honestidade e até um inconformismo. Mas deixo o assunto de lado quando Cosmo se senta à minha frente, sua expressão sempre amigável e risonha, agora trazendo a seriedade desse encontro.
Lua e Sky se sentam um de cada lado dele, enquanto Celeste se senta ao meu outro lado, e as meninas se acomodam nos lugares restantes. Todas usando longos vestidos de veludo e enroladas em peles. As bochechas, lábios e narizes vermelhos, queimados pelo frio. Genevieve, que é branca feito a neve, parece ser a mais afetada.
Lanço uma bola de fogo na lareira - já acesa, para que o fogo queime mais forte e não se apague. Passo os olhos pela tenda. Sinto falta de Lira. O que me faz lembrar que não vi Meme hoje. Pergunto para Gen:
- Onde está Merida?
- Ela está dormindo em nossa tenda, Senhora – ela responde em um tom de voz baixo.
Pela visão periférica, vejo os olhos do Homem Águia se cravando na Princesa. Interessante.
- Ótimo. – Volto meus olhos para Cosmo. - E então? O que há de tão terrível nos aguardando?
- Agradeça por estar sentada - Lua sibila. E seus olhos se voltam para mim com pesar.
- Desembuchem logo - Celeste ordena.
- Calma – Sky fala. - Nós vamos cumprir nossa palavra. Posso começar, pai? - é um pedido, mas não soa como um. Cosmo assente e Sky começa: - Vocês se lembram de quando contamos que fugimos por estarmos sendo escravizados, certo? - todos anuímos. - Eu sempre fiz a escolta pra proteger nosso povo, voei até o Rei Félix para ver o que ele vinha fazendo, tramando.
Sinto um frio subindo pela minha espinha. Ele continua:
- Nós rezamos para que nossa salvadora chegasse - salvadora, engulo o nó que se forma em minha garganta. - Sabíamos que a natureza logo trataria de equilibrar as coisas. Mas estávamos perdendo as esperanças, assistimos durante anos as atrocidades que fizeram as Bruxas, o rei escravizando seu próprio povo, transformando crianças em máquinas de matar, eu vi você matando tantas bruxas, e pensávamos que ele finalmente tinha conseguido o soldado perfeito – um sorrisinho de canto para mim. - Ele privilegia poucos e o príncipe amado deles - ele encara Kenom. - Se tornando uma pedra no sapato do pai, se metendo quando uma execução ia ser feita sem qualquer julgamento.
O ar fica suspenso quando ouvimos suas palavras.
O príncipe Kenom defendendo bruxas. Como isso repercutiu? Olho para o Príncipe da Terra que nada revela em seu olhar.
- O rei o colocou para trabalhar com os soldados, para ver se ele "aprenderia algo", o que ele não sabia era que estava jogando o próprio filho na toca do leão - Lua acrescenta.
- Ele odeia que eu seja tão "moralista". E obviamente ocultava suas atividades. Por que você acha que ele nunca veio atrás de mim? - Aidan me questiona.
Mas Sky responde antes que meu cérebro possa trabalhar:
- O que você acha que o ataque que sofreram significa?
Aidan desvia os olhos de mim para Sky.
- Mas... Não faz sentido, eles nem se aproximaram de mim - Kenom trata de se defender.
Sky solta o ar em uma risada de escárnio.
- Claro, quando ele ia esperar que seu filho estivesse sob a asa da Treze?
Os dois se encaram por um longo momento.
Ar inflamando o fogo.
- Isso não é tudo, infelizmente Majestade - Cosmo comenta, sua voz grave. - Quando Sky viu o primeiro lampejo de seu cabelo de fogo, quando a identificou cruzando Zéfiro com mais algumas, ele começou a reunir nosso povo. Quando sobrevoou todas as florestas, voltou para ver a reação do rei ao seu surgimento.
Sei que o pior estava por vir mas não esperava as palavras seguintes de Cosmo:
- Ele tem uma legião de bruxas infernais - ele me informa, pesar em seu olhar, quase derrotado.
- Não sei se ouvi direito - falo, minha voz sai com dificuldade, áspera.
- Você ouviu certo - ele me fala.
- E tem mais - Sky se intromete. - Eles tem a lealdade de Adamina.
Paro de ouvir. Minha cabeça está em um turbilhão e meus ouvidos zunindo. Bruxas Infernais e a Floresta da Terra? Me levanto de supetão, e sem qualquer aviso, deixo minha tenda.
Preciso sair daqui, o ar dentro da tenda estava me sufocando. Não aguento mais ouvir uma palavra sequer. Estamos perdidos. Se foi difícil derrotar o mago com seu piche, imagine uma legião, um exército de bruxas que anulam totalmente o meu, o nosso, poder.