Corro em direção às minhas terras, faz tempo que não tenho contato com a Floresta do Fogo, e preciso de ar puro. Começo a correr pensando em esvaziar minha mente. Logo, não sou nada. Corro como vento, sendo carregada por ele, feito uma bola de fogo.
Escuto passos atrás de mim, mas sei que cessarão assim que eu adentrar a floresta. Não convidei ninguém a entrar.
Quando vejo os galhos retorcidos e fumegantes meu peito se aperta de alívio e lágrimas escorrem pela minha face, levo a mão ao rosto e vejo que são pretas.
- Merda! - berro assim que estou segura entre as árvores. - Por que tudo tem que ser tão difícil sempre?!
Não bastava o rei e a quantidade exorbitante de monstros humanos treinados a seu comando. Agora descubro que a Floresta da Terra o protege e Bruxas Infernais lutam ao seu lado contra mim.
Esses monstros não tem poderes naturais, como nós, o combustível delas advém dos nossos poderes. Convertidos naquela coisa perversa que poderíamos chamar de magia negra. Letal. Fatal. Antinatural.
- Wena! - escuto a voz me chamando.
Apenas uma pessoa me chama assim. Será que estou delirando? Cerro o olhar ao perceber a curta distância que está a voz quando ela chama novamente.
Me viro na direção da mesma para ver Aidan Kenom caminhando pela Floresta de Noor.
Todo o meu desespero se esvai e é substituído por pura surpresa.
- O que você está fazendo aqui? - minha voz soa ríspida, e sai com dificuldade. - Como sequer está vivo a essa altura?
Caminho até ele e aperto levemente seu braço. Inteiro. Não há qualquer indício de que sua pele possa derreter.
- Eu vim atrás de você, não poderia te deixar sozinha depois de ver o desespero em seu olhar – ele ofega.
Desvio os olhos de seu antebraço para encarar seus olhos. Não consigo evitar o sorriso de escárnio e autodepreciação. Faço uma leve e forçada mesura.
- Bem-vindo ao meu inferno particular, Príncipe Kenom.
- Não precisa fingir aqui, estamos sozinhos - ele nem tenta disfarçar a mágoa em sua voz e olhar. - Eu sei que você está sofrendo. Eu vejo você - ele leva a mão em direção ao meu rosto.
Eu o afasto e desvio o olhar.
- Ah é? E o que você vê?
- Eu vejo...
Mal posso imaginar a imagem que estou transparecendo. Meu rosto manchado por lágrimas escuras, meus olhos... Não consigo imaginar. Me descontrolei e isso significa que posso ter assumido qualquer forma. Meus sentimentos ditam isso quando não estou no controle.
Ele se aproxima e coloca a mão novamente em meu rosto, secando minhas lágrimas.
- Você é linda - sussurra.
É uma sentença, não há espaço para dúvidas em seu semblante. E realmente, há adoração em seu olhar. Me pergunto como isso é possível.
Devo estar parecendo um bicho.
- Linda? - escorre sarcasmo da minha voz. - Mal posso imaginar minha aparência, mas se pudesse chutar, te diria que sou o diabo em pessoa.
Ele franze a testa e balança a cabeça com desaprovação.
- Não diga bobagens - ele segura meu rosto entre as mãos.
Me sinto tão pequena e frágil, sob seu toque. Quase delicada. E me permito por um momento.
- Não estou dizendo bobagens.
- Está. Sabe o que eu vejo?
Faço que não.
Ele afasta uma mecha do meu cabelo, flamejando em tons de laranja que não o queima, e à medida que fui me acalmando, que ele, foi me acalmando, fui voltando ao normal.
- Eu vejo olhos em brasa, negros e infinitos, apenas como os olhos que a Rainha de Noor poderia ter.
- Infinitos? - questiono.
- Sim - ele anui.
Seu olhar denota adoração, devoção e... algo a mais.
- Não vejo começo ou fim. E cabelos da cor do fogo, aliás, eu amo quando parecem uma chama viva, parecem lembrar a tudo e todos exatamente quem você é.
- Gosta mesmo? - eu não tenho problemas com a minha aparência, mas saber que ele gosta disso em mim desperta sentimentos profundos e intensos.
- Eu amo - ele acaricia meu cabelo superficialmente, em seguida adentra os fios com os dedos e faz massagem em meu couro cabeludo. - Você é o fogo em forma de pessoa. Em forma de rainha.
Isso me atinge diretamente no meio do peito. Forte e profundamente, feito uma flecha.Encaro seus olhos e não sei como responder, o que sentir, como reagir. Me sinto totalmente à sua mercê e tocada intimamente por ele.
Ele aproxima nossos corpos, e segura em minha nuca com uma mão, a outra... Ele delicadamente pousa em minha cintura. O contato me consome... Feito fogo. É exatamente o que sinto em minhas veias.
Mas dessa vez é diferente.
- O que você está fazendo? - pergunto. Minha voz sai esganiçada e não parece pertencer a mim, estou nervosa, e ansiosa pelo que está por vir.
- Eu estou... – ele faz uma pausa. - Me aproximando devagar, pra não te assustar - ele realmente parece tomar todo cuidado do mundo comigo.
Nem parece que sou Kendra, a rainha de Noor, e a bruxa mais perigosa de Kylanir. Já que estou aqui, totalmente à mercê de um principezinho. Ele me toca com gentileza e sutileza, ele me olha com adoração, seu semblante transparece ansiedade e algum tipo de necessidade desconhecida por mim.
Levo as mãos ao seu peito, de repente, tão próximo de mim. Seus músculos rígidos e tensos sob meu toque. Subo as mãos por seus ombros e sinto firmeza ali também. Um guerreiro. Ele tenta aproximar o rosto do meu, mas o mantenho no lugar, a distância.
- Para com isso, por favor - ele súplica.
- Parar com o que? De afastar um homem que é noivo de outra pessoa? Você sabe que me machucou.
Ele suspira exasperado.
- Sei, mas você sabe que não é assim.
- Não sei.
- Meu pai fez o contrato de casamento, não eu. Agora para de me afastar, você não vê que está machucando a nós dois?
- Eu não...
- Você sabe que sim. Você sabe que algo me atrai pra você desde que colocou os olhos em mim. E sei que é recíproco.
Eu abro a boca para falar, mas ele levanta a mão para me calar.
- Só deixa eu me aproximar de você, tá? Só dessa vez - sua voz denota cansaço.
Ele me puxa contra si e cola a testa na minha, e então solta um longo suspiro. Depois de alguns segundos, também relaxo, fecho os olhos e aprecio o contato. Eu me permito fazer isso pois é o que quero. É pelo que meu coração grita. Subo as mãos por seu braço e as levo até o pescoço, as entrelaçando ali.
Ele me acalma, me cativa, ele...
- Eu amo você, Rowena.
Fico totalmente em choque. E sinto meu corpo inteiro se retesar. Me afasto levemente para encará-lo.
- O que você disse? - sussurro.
- Que eu amo você. Acho que sempre te amei, eu não sei quando, ou onde. Só sei que não me lembro de um dia que eu não estivesse te amando, desde que...
Interrompo suas palavras esmagando sua boca em um beijo.