Capítulo 5 O Guardião das Sombras

Dante observava a vila através da grande janela do escritório. De onde estava, via cada detalhe – as ruas estreitas de paralelepípedos, as casas com suas fachadas gastas pelo tempo, e o imponente hotel que agora comandava com mão firme. Tudo ali era parte de um território que ele conquistara, peça por peça, depois de uma vida inteira sendo tratado como forasteiro, como alguém que nunca seria aceito.

Ele ergueu o copo de uísque aos lábios, saboreando o gosto amargo e quente que queimava em sua garganta. O controle que tanto prezava estava por um fio desde o momento em que vira Alícia novamente. Ver seus olhos, sentir o perfume que nunca conseguira esquecer... foi como ser atingido por um raio, e tudo voltou com uma intensidade que ele mal conseguia conter.

Mas Alícia era apenas parte de uma história muito maior. Dante fora criado na periferia da vila, filho de uma mãe que lutava todos os dias para manter o pouco que tinham. Crescer sob a sombra de famílias ricas e poderosas significava uma coisa: ou você se curvava ou lutava para sobreviver. Ele escolheu a luta. Desde pequeno, jurou a si mesmo que ninguém jamais o colocaria de joelhos.

O pai de Alícia foi o primeiro homem que Dante odiou de verdade. Um tirano, o tipo de homem que desprezava qualquer um que não fosse "digno" da posição que ele acreditava ocupar. Quando Dante e Alícia se apaixonaram, ele não viu nisso apenas amor; viu uma chance de destruir Dante. E quase conseguiu.

O dia em que tudo desmoronou ainda estava gravado em sua mente com cada detalhe cruel. Dante lembrava das ameaças, dos olhos de fúria do pai dela. Lembrava-se das promessas que não pôde cumprir, do ódio que queimava quando viu Alícia partir sem olhar para trás. Era um garoto tentando ser um homem. E fracassou. Mas ele jurou que jamais fracassaria de novo.

Os anos seguintes foram um inferno. Dante mergulhou na escuridão – negócios arriscados, alianças com homens perigosos, dívidas pagas com sangue. Tudo para construir seu próprio império. Ele voltou para a vila não como o garoto rejeitado, mas como um homem que ninguém ousava desafiar. Comprou cada pedaço de terra, cada propriedade que um dia fora símbolo de poder para aqueles que o desprezaram. Transformou o nome Ferrer em algo temido.

E então Alícia voltou. O destino tinha um senso de humor cruel, jogando-a em seus braços novamente quando ele achava que estava no controle de tudo. Mas bastou um toque, um olhar... e tudo o que ele enterrou com esforço voltou à superfície. Ele ainda a desejava, ainda a odiava por partir. Mas acima de tudo, odiava a si mesmo por não conseguir enterrá-la de vez.

Dante virou-se quando ouviu passos. Era Pietro, seu fiel assistente e talvez o único homem que sabia tudo sobre ele.

- Ela está aqui para ficar? – perguntou Pietro, com o tom cauteloso de sempre.

Dante estreitou os olhos, um músculo saltando em sua mandíbula.

- Ela acha que pode entrar e sair quando quiser. Mas dessa vez, será diferente. – A voz dele era fria, mas o coração batia forte. Alícia era uma ferida aberta que ele tentava costurar com controle e poder.

Mas Dante sabia a verdade: ainda queria Alícia com a mesma intensidade de antes. E isso o deixava furioso.

- Ainda há muito em jogo – alertou Pietro, sabendo que tocar naquele assunto era pisar em terreno perigoso. Mas Dante apenas assentiu, voltando o olhar para o ponto onde a vila desaparecia na neblina. Havia segredos que Alícia não sabia. Motivos que ele guardava com ferocidade.

O retorno dela ameaçava tudo. Não apenas seu controle, mas a verdade sobre os anos que passaram separados. Se ela soubesse o que ele fizera, se soubesse o que sacrificou... Não, ele não podia permitir que o passado ressurgisse por completo. Manter Alícia por perto era uma tortura, mas também uma necessidade. Precisava protegê-la – mesmo que ela nunca soubesse.

Quando Dante fechou os olhos, as imagens de Alícia retornaram. O corpo dela contra o seu, a boca queimada de desejo. Queria acreditar que poderia mantê-la à distância, que poderia ser imune ao que ela ainda fazia com ele. Mas no fundo, sabia que a batalha que travava não era contra o mundo; era contra si mesmo.

O destino o colocou de volta em jogo com a única mulher que poderia quebrá-lo. E ele não tinha escolha senão jogar.

                         

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