- Vitória! Minha filha! - Ele correu até elas e, ao ver Giulia segurando a criança, afastou-a rapidamente da mulher estranha. - O que você pensa que está fazendo com a minha filha?
Giulia ficou surpresa com a reação, ainda tentando processar o que havia acontecido.
- Eu só... - começou ela, mas ele a interrompeu.
- Só? Só colocou a vida dela em perigo, isso sim! - disparou o homem, o rosto vermelho de frustração. - Se você tivesse prestado mais atenção, isso nem teria acontecido!
- Mas... eu salvei ela. O carro quase... - tentou explicar, mas se calou sem acreditar na agressividade dele.
- Não venha me dizer o que quase aconteceu! - O homem, claramente irritado, lançou um olhar desconfiado. - Fique longe da minha filha!
Giulia sentiu a injustiça das palavras dele e, por um momento, pensou em retrucar, mas mordeu os lábios. O homem, abraçando a filha, a levou para longe, sem sequer agradecer, lançando um último olhar de desdém.
Giulia suspirou e, sem dizer mais nada, entrou no mercado, ainda processando a situação. Tentou se concentrar nas prateleiras à sua frente, pegando os itens de que precisava, mas o olhar cheio de desdém do cowboy ainda estava fresco em sua mente.
Do lado de fora, Carlos ajudou a filha a entrar na caminhonete, fechando a porta com um estalo, ainda com os nervos à flor da pele. Ele olhou para a filha no banco de trás, tentando ver se ela estava realmente bem.
- Você está bem, querida? - perguntou, suavizando a voz.
- Sim, papai. Foi só um susto - respondeu Vitória, com a voz ainda um pouco trêmula.
Carlos soltou um longo suspiro de alívio. Mas logo sua expressão se fechou novamente, a raiva e a confusão misturadas em sua mente.
- Aquela mulher é uma louca! - ele exclamou, mais para si mesmo do que para a filha.
- Não, papai! - Vitória o corrigiu rapidamente, o tom de voz um pouco mais firme. - Ela me salvou. Eu estava atravessando a rua e não vi o carro. Se ela não tivesse me puxado...
Carlos ficou em silêncio por um momento, processando as palavras da filha. Ele tinha agido por impulso, tomado pela adrenalina e pelo medo de perder Vitória. Agora, ouvindo a verdade de sua própria filha, sentiu um arrependimento crescente se espalhar em seu peito. Olhou para o volante e suspirou forte, lembrando de sua grosseria.
- Ela te salvou? - ele murmurou, como se tentasse se convencer daquilo. A culpa agora o corroía. - Eu... eu fui um idiota.
Ele virou-se para a filha, decidido.
- Venha, vamos encontrar aquela mulher.
Carlos desceu da caminhonete rapidamente, puxando a filha pela mão. Ele olhou em volta, procurando pela mulher que, agora, ele sabia que devia um pedido de desculpas.
Dentro do mercado, Giulia estava distraída, passando os itens para o carrinho, quando sentiu alguém se aproximar. Ela olhou para o lado e viu cowboy, acompanhado de Vitória, se aproximando de forma um pouco hesitante. Sua expressão não era mais de raiva, mas de culpa.
- Com licença... - Carlos começou, a voz um tanto baixa. - Eu... preciso falar com você.
Giulia o encarou, surpresa. Não esperava vê-lo novamente, muito menos tão rápido. A imagem dele a insultando ainda estava fresca em sua mente.
- O que foi agora? - ela respondeu, tentando manter a calma.
Carlos suspirou e olhou para a filha, que o incentivou com um pequeno sorriso.
- Eu... eu fui um idiota lá fora - ele admitiu, a voz cheia de arrependimento. - Eu agi por impulso e não percebi o que realmente aconteceu. Vitória me contou que você... você salvou ela.
Giulia ficou em silêncio, encarando-o com surpresa no olhar.
- Eu só estava tentando ajudar - respondeu ela, com a voz baixa.
- E eu fui grosso, mal-educado - Carlos continuou. - Eu só... eu pensei que você estivesse distraída, mas na verdade, você a salvou. Se não fosse por você... - Ele parou por um momento, respirando fundo, visivelmente desconfortável. - Não sei o que teria acontecido. Me desculpe. De verdade.
Giulia relaxou um pouco ao ouvir as palavras dele, e sua expressão suavizou. Ela olhou para Vitória, que ainda segurava a mão do pai, e depois para o cowboy, que agora parecia um homem bem diferente daquele que havia gritado com ela momentos antes.
- Está tudo bem - ela respondeu, finalmente. - Eu entendo. Só fiquei surpresa com a sua reação.
Carlos assentiu, parecendo aliviado por ela não ter rejeitado seu pedido de desculpas.
- Obrigado, de verdade. Eu... não sei como agradecer - disse ele, baixando o olhar por um momento, visivelmente arrependido.
Vitória sorriu para Giulia, e a mulher retribuiu o gesto com um sorriso tímido.
- Bom, pelo menos agora você sabe - Giulia disse, olhando para Carlos. - Não foi nada, só fiz o que qualquer um faria.
Carlos balançou a cabeça, quase rindo de si mesmo.
- Eu não sei se qualquer um teria agido tão rápido quanto você - ele disse, agora mais leve. - Se precisar de qualquer coisa... estou em dívida com você.
Giulia sorriu de leve, sentindo o peso da tensão diminuir.
- Eu estou bem, obrigada. - Ela hesitou por um momento, e depois continuou: - Só... Fique de olho nela, ok? Crianças são imprevisíveis, mesmo ela já sendo uma mocinha.
Carlos riu, mais relaxado agora.
- Pode deixar. Eu vou - ele disse, olhando para Giulia com mais atenção, notando algo que não havia percebido antes. Seus olhos recaíram sobre a mala ao lado do carrinho de compras e o sotaque leve em suas palavras. - Você é nova por aqui, não é? - perguntou, curioso. - E tem um sotaque diferente... Você é estrangeira?
Giulia suspirou, sentindo uma pontada no peito ao lembrar o motivo que a levou àquela pequena cidade do interior.
- Sim... - disse ela, após uma pausa. - Agora minha vida é aqui no Brasil, mas sou italiana.
Vitória, que até então estava quieta, arregalou os olhos, empolgada.
- Uau! Você é da Itália? - exclamou a menina, encantada. - Eu amo esse idioma! Sempre quis aprender italiano!
Carlos sorriu ao ver a empolgação da filha, e isso o fez se sentir mais à vontade.
- Bom, meu nome é Carlos Albuquerque. E você, como se chama?
- Giulia Ricci - respondeu ela, oferecendo um leve sorriso enquanto apertava a mão dele. A impressão inicial, ainda que tensa, agora parecia mais amigável.
Carlos refletiu por um momento, observando Giulia e a situação em que ela estava. Ele sabia que sua fazenda precisava de ajuda em várias áreas, especialmente com Vitória. Um pensamento surgiu em sua mente, e, sem hesitar, ele perguntou:
- Você está procurando um emprego, Giulia?
Ela olhou para ele, surpresa pela pergunta direta, mas a realidade é que sim, ela precisava de um trabalho para se estabelecer.
- Sim, estou - admitiu, um pouco cautelosa.
Carlos balançou a cabeça, como se estivesse tomando uma decisão.
- Bem, eu estou precisando de alguém para cuidar da Vitória. Seria como uma babá, sabe? E já que você fala italiano, talvez até possa ensinar o idioma a ela. O que acha?
Vitória saltou de alegria, puxando o braço do pai.
- Por favor, Giulia! Eu adoraria aprender italiano com você!
Giulia sorriu para a menina, tocada pela empolgação dela, mas ainda incerta.
- Eu adoraria ensinar, de verdade - começou ela, com delicadeza. - Mas, Carlos... ela já está grande para ter uma babá, não acha?
Carlos riu e coçou a nuca, parecendo um pouco constrangido.
- É, talvez você tenha razão. Mas tem coisas, sabe, coisas de mulheres, que eu não sei como conversar com ela. Eu sou viúvo, e tem momentos que... eu só não sei lidar com certos assuntos.
Giulia entendeu imediatamente. Não era apenas sobre cuidados práticos, mas também sobre a necessidade de alguém que pudesse guiar Vitória em momentos delicados, que fossem além das capacidades de Carlos.
- Eu entendo. - Ela olhou para Vitória, que a observava ansiosa. - Se for assim, aceito ser a babá dela... e a professora de italiano, claro.
Vitória comemorou, abraçando o pai.
- Oba! Vai ser incrível!
Carlos sorriu, aliviado com a decisão dela.
- E mais uma coisa - disse ele, olhando de forma um pouco mais séria. - Se você vai trabalhar comigo, pode morar na fazenda Albuquerque. Temos espaço de sobra. O que me diz?
Giulia ficou em silêncio por um instante, ponderando. O convite parecia uma boa oportunidade, e a fazenda seria um refúgio seguro, longe do caos que a fez fugir. Além disso, Vitória parecia uma garota doce e Carlos, apesar de seu comportamento inicial, agora mostrava um lado mais gentil e preocupado.
Ela finalmente assentiu, com um pequeno sorriso no rosto.
- Parece uma boa ideia. Eu aceito.
Carlos estendeu a mão novamente, dessa vez com um olhar de agradecimento.
- Bem-vinda, Giulia.
Ela terminou de fazer as compras e saiu do estabelecimento com Carlos, que carregava sua mala e as sacolas até o carro. Enquanto ambos entravam e se preparavam para sair, quatro homens surgiram de trás das árvores da praça. Eles os observavam há algum tempo.
- Vamos atrás deles!