Capítulo 2 Comandos e Contradições

[Ponto de vista: Noah]

Ele não dormiu naquela noite.

Mesmo deitado na cama king-size da cobertura no Itaim, rodeado pelo silêncio cortante das janelas blindadas e dos móveis de luxo, Noah Ferraz revirava os pensamentos como quem revira feridas. Estava irritado. E ele odiava estar irritado.

Mas o motivo do incômodo tinha nome.

Olívia Mendes.

Ela se movia como uma mulher que sabia o efeito que causava, mas não se importava. O vestido preto colado ao corpo desenhava curvas que não pediam aprovação - apenas atenção. E ele deu. Cada segundo. Cada centímetro.

A imagem dela se fixou como uma maldição em sua mente.

A pele tinha um brilho quente, como âmbar sob a luz do salão. Os ombros eram finos, femininos, mas firmes. O colo, irresistivelmente exposto no decote sutil, fazia seus olhos se demorarem. Os seios - médios, empinados, perfeitos para caber nas mãos dele. Não grandes demais. Nem pequenos demais. Exatos.

A cintura era estreita, e o vestido agarrado a ela tornava impossível não imaginar o que havia sob o tecido. A barriga lisa. A curvatura dos quadris. E, quando ela se afastava... Deus. A bunda dela. Alta, redonda, provocante. Cada passo parecia coreografado para deixá-lo no limite da insanidade.

Ela usava salto. O suficiente para deixá-la na altura exata de seus lábios. Ele lembrava de tê-la encarado e percebido que, com um passo, poderia empurrá-la contra a parede e beijar até apagar tudo ao redor. Mas se conteve.

O cabelo caía em ondas largas, castanho escuro com reflexos dourados sob a luz. Sedoso. Ele quis enfiar os dedos ali, puxar com força enquanto a prendia sob seu corpo. E os olhos... os olhos eram o golpe final. Um castanho profundo, quase pretos, que pareciam olhar direto para a alma - e, no caso dele, para o abismo.

E a boca...

Porra, aquela boca.

Carnuda. Bem desenhada. Levemente inclinada para cima no canto esquerdo, como se estivesse sempre prestes a zombar dele. Rosada, convidativa. Ele pensou nela nos piores momentos: entre os lençóis, entre suas pernas, entre seus próprios dentes. Quis morder. Quis sentir.

Ela não era só bonita. Ela era perigosa.

O tipo de mulher que você não come uma vez.

É o tipo que te assombra. Que te destrói.

E isso o deixava louco.

"Não me envolvo com homens que acham que o mundo deve se curvar aos seus pés."

Aquela frase voltava em looping. E ele se via perguntando: E se eu quiser que ela se curve pra mim? Só ela. Só uma vez. Só pra eu ver se esse fogo acaba ou aumenta ainda mais?

Mas no fundo, Noah sabia.

Não seria só uma vez.

Na manhã seguinte, vestiu-se como sempre - terno sob medida, gravata preta, sapatos italianos - e chegou ao escritório antes mesmo da secretária. Mas nem mesmo o conforto do próprio império o distraía.

No tablet, passou os olhos pelo relatório do evento. Reconheceu alguns nomes de convidados. E então viu o dela.

Olívia Mendes. Arquiteta. Convidada pelo Instituto Azevedo.

Fez uma busca rápida. Em segundos, tinha acesso ao currículo. Bolsista premiada. Mestre em restauração arquitetônica. Independente. Sem vínculos familiares. Sem sobrenome influente.

"Interessante."

Ligou para Lucas, seu irmão mais novo, e também seu braço direito em todos os negócios.

- Ache a ficha completa de Olívia Mendes. Quero saber onde trabalha, onde mora, com quem anda.

- Algum problema com ela?

- Nenhum. Ainda.

[Ponto de vista: Olívia]

Acordou tarde. O corpo ainda carregava a tensão da noite anterior - não por cansaço físico, mas por um tipo de exaustão mental que ela não sabia nomear.

Desde que perdera os pais no acidente, ainda na adolescência, Olívia aprendera a se proteger. Primeiro do mundo. Depois dos sentimentos. Mais tarde, dos homens.

E agora vinha aquele bilionário tatuado, arrogante, misterioso... e bagunçava tudo com um simples olhar?

Nem pensar.

Fez café preto, colocou uma camiseta larga, e sentou à frente do notebook para revisar os ajustes de um projeto de interiores que deveria entregar até o fim da semana. Mas não conseguia se concentrar.

Lembrou-se das palavras dele:

"Se você tocar em mim, talvez eu não consiga mais parar."

Arrepio. Tesão. Raiva. Curiosidade.

Respirou fundo.

O celular vibrou. Era Lara, sua melhor amiga.

- Amiga, você não vai acreditar. Me chamaram pra uma reunião com um novo investidor do projeto social da galeria. O cara quer ampliar o alcance do nosso trabalho com jovens arquitetos periféricos. E adivinha onde vai ser a reunião?

- Onde?

- Na sede da holding Ferraz. Hoje. Às 15h. E eu quero você comigo.

Olívia ficou em silêncio por dois segundos. A vontade era dizer "não, obrigada". Mas a outra voz, aquela parte dela que sempre quis provar que não se intimidava com homem nenhum, disse mais alto.

- Tudo bem. Eu vou.

[Ponto de vista: Noah]

Às 14h58, Noah já sabia que ela estava no prédio.

Viu pelas câmeras de segurança. Acompanhou cada passo. O salto fino. O vestido verde escuro colado ao corpo. A pasta de couro em mãos. O olhar sério. Profissional. Mas ainda assim... provocante sem esforço.

Na sala de reuniões, estava com Lucas e mais dois conselheiros. Mas quando Olívia entrou, com Lara ao lado, o ar pareceu se tornar denso.

Ela fingiu surpresa. Ele não fingiu nada.

- Senhoras - disse, levantando-se. - Que prazer vê-las.

- O prazer é todo nosso - respondeu Lara, sorrindo, sem notar a troca silenciosa de energia entre os dois.

Olívia apenas assentiu com a cabeça, mantendo a postura firme. Como se dissesse: "Não me abala."

Durante a apresentação do projeto, Noah mal ouviu as palavras. Observava a forma como ela gesticulava, como cruzava as pernas, como desviava os olhos dele como quem sabe que está sendo observada, mas não se dá o luxo de retribuir.

Quando a reunião terminou, ele se levantou antes que as duas saíssem.

- Olívia - chamou. - Pode ficar um minuto?

Ela parou, ainda na porta. Olhou para Lara, que fez sinal de "vai, tá tudo bem".

Ficaram sozinhos.

- Está me vigiando, é isso? - ela disse, antes que ele abrisse a boca.

- Digamos que... acompanho tudo que me interessa.

- Você é muito convencido.

- E você é muito... irresistível.

- Isso não é um elogio.

- Mas é verdade.

Silêncio.

- O que você quer de mim, Noah?

Ele deu um passo à frente. Depois mais um. Parou tão perto que ela sentiu o calor do corpo dele.

- Quero descobrir o que tem por trás dessa sua armadura. Quero saber até onde vai sua resistência. E quero ver o que acontece quando você para de lutar.

- E você acha que pode ter tudo o que quer?

- Não. Mas você é algo que eu não quero. Eu preciso.

Ela engoliu seco. O coração batia forte, e o perfume dele - amadeirado, quente - a invadia como uma droga.

- Não me provoque, Ferraz.

Ele sorriu, lento, predador.

- Você ainda nem viu o que é provocação.

            
            

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