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O Indomável - Capítulo 5: Encontros e Ultimatos
Vila Nova, 2025
O sol de Vila Nova brilhava forte naquela manhã, refletindo nos vidros espelhados dos arranha-céus e aquecendo as ruas de terra do bairro de São Lázaro. Na mansão Mendes, no Alto da Colina, a expectativa era palpável. Zeynep, a caçula da família, finalmente chegava após nove anos estudando em Londres. O portão de ferro se abriu, e um carro preto estacionou no pátio de cascalho. Zeynep desceu, os cabelos negros esvoaçantes, a pele clara contrastando com o vestido azul elegante que usava. Aos 21 anos, ela era ainda mais impressionante do que as fotos sugeriam: uma beleza refinada, com olhos inteligentes que pareciam analisar tudo ao redor.
Carlos e Helena aguardavam na entrada, ladeados por Bruno, Diego e Rafael. A família inteira estava ali, mas a tensão entre os irmãos era evidente. Zeynep abraçou os pais, o sorriso educado, mas contido.
- Bem-vinda de volta, minha filha - disse Carlos, a voz grave, mas com um orgulho visível. - Essa casa não é a mesma sem você.
Helena segurou o rosto de Zeynep, os olhos brilhando. - Você cresceu tanto, Zeynep. Uma verdadeira dama. Vila Nova vai te adorar.
Zeynep sorriu, mas havia algo reservado em seu olhar. - Obrigada, mãe, pai. É bom estar em casa. - Ela olhou para os irmãos, que a observavam com expressões que variavam entre curiosidade e desconfiança. - E vocês... ainda causando problemas?
Bruno riu, mas o som era seco. - Problemas? A gente só mantém as coisas funcionando, mana. Você é que vai ter que se acostumar com o ritmo de Vila Nova.
Diego cruzou os braços, o olhar desafiador. - Londres pode ter te ensinado muita coisa, mas aqui é outro jogo.
Rafael, sempre o mais charmoso, deu um passo à frente e beijou a mão de Zeynep. - Relaxa, irmãos. Zeynep é uma Mendes. Ela vai se sair bem.
Zeynep arqueou uma sobrancelha, sem se deixar intimidar. - Não se preocupem comigo. Sei me virar. - Ela olhou ao redor, absorvendo a mansão com seus lustres reluzentes e corredores imponentes. - Mas me contem, o que perdi nesses anos todos?
A conversa continuou na sala de jantar, com os irmãos atualizando Zeynep sobre os negócios da família - legítimos e nem tanto. Ela ouvia com atenção, mas seus olhos brilhavam com uma curiosidade que sugeria que ela tinha seus próprios planos. Zeynep não era mais a menina que partira aos 12 anos. Vila Nova a receberia como uma força a ser reconhecida.
...
Enquanto isso, em São Lázaro, a pressão sobre Ruya aumentava como uma tempestade prestes a explodir. Na pequena casa de alvenaria onde vivia com Lúcia e Antônio, o jantar daquela noite foi mais um campo de batalha. Lúcia, enquanto servia um ensopado de batata, não perdeu a chance de insistir.
- Ruya, filha, o Roberto é a nossa saída. Você viu o carro que ele dirige? A casa da família dele? - Ela suspirou, limpando as mãos no avental. - Ele pode tirar a gente dessa vida.Antônio, sentado à mesa, mexia no prato com pouco apetite. - Sua mãe tá certa, Ruya. A oficina mal paga as contas. O Roberto ofereceu ajudar, mas você precisa dar um passo.
Ruya segurou o garfo com tanta força que os nós dos dedos ficaram brancos. - Vocês não entendem? Ele não me ama. Ele quer me controlar! Eu não vou me casar com alguém assim, nem por todo o dinheiro do mundo!
Lúcia balançou a cabeça, frustrada. - Amor não paga as contas, Ruya. Às vezes, a gente precisa engolir o orgulho pelo bem de todos.
Ruya se levantou, as lágrimas ardendo nos olhos. - Então vocês querem que eu me venda? É isso? - Sem esperar resposta, ela saiu de casa, batendo a porta, o peso das palavras dos pais esmagando seu coração.
Na rua, o ar quente da tarde não aliviava a angústia. Ruya caminhava rápido, sem destino, quando ouviu o ronco de um motor. Era ele. Roberto Mendes, mais uma vez, estacionando seu carro preto ao lado dela. Ele desceu, o sorriso arrogante de sempre, bloqueando seu caminho.
- Ruya, por que você insiste em fugir de mim? - perguntou ele, a voz doce, mas com um tom que fazia a pele dela arrepiar. - Sabe que somos perfeitos juntos. Sua família sabe disso. Por que você não aceita?
Ruya parou, os olhos faiscando de raiva. - Perfeitos? Você não sabe nada sobre mim, Roberto! Eu não sou um troféu pra você exibir!
Roberto deu um passo mais perto, a voz endurecendo. - Você tá sendo ingrata. Eu ofereço tudo pra você e sua família, e você me trata como se eu fosse um monstro? Para de brincar, Ruya. Você vai ser minha, quer queira ou não.
A raiva explodiu em Ruya como uma onda. - Nunca, Roberto! - gritou ela, e, sem pensar, acertou um tapa forte no rosto dele, o som ecoando na rua silenciosa. Roberto cambaleou, surpreso, tocando a bochecha que ardia.
- Você vai se arrepender disso - murmurou ele, os olhos escurecendo, mas Ruya já estava correndo, as lágrimas escorrendo pelo rosto. Ela não olhou para trás, apenas correu até chegar a uma praça pequena, onde uma árvore frondosa oferecia sombra. Exausta, ela se sentou no chão, encostada no tronco, e deixou as lágrimas caírem, o corpo tremendo de raiva e desespero.
...
Foi então que Alaz apareceu. Ele estava em São Lázaro a trabalho, enviado por Miguel para supervisionar um dos negócios da família - algo vago sobre "entregas" que ele não questionava. Vestido com uma jaqueta de couro preta e jeans, ele caminhava pela praça quando viu Ruya, encolhida sob a árvore, o rosto molhado de lágrimas. Algo nele parou. Talvez fosse a vulnerabilidade dela, ou talvez a beleza que brilhava mesmo no sofrimento. Ele se aproximou, hesitante, mas com uma curiosidade que não conseguia ignorar.
- Ei - disse ele, a voz suave, mas firme. - Mulher bonita não chora. O que tá acontecendo?
Ruya levantou os olhos, surpresa, e enxugou o rosto com as costas da mão. - Quem é você? - perguntou, a voz ríspida. - Me deixa em paz.
Alaz sorriu, um sorriso torto que parecia desafiar a ordem dela. - Meu nome é Alaz. E, desculpa, mas eu sou meio teimoso. Não vou te deixar chorando sozinha numa praça. Qual é o problema?
Ruya bufou, cruzando os braços. - Não é da sua conta. Vai embora.
Mas Alaz não se mexeu. Ele se sentou no chão, a poucos metros dela, como se estivesse perfeitamente à vontade. - Sabe, eu também tenho dias ruins. Às vezes, sinto que tô preso numa vida que não escolhi. Mas chorar sozinho não resolve, né? Fala comigo. Quem sabe eu te faço rir?
Ruya olhou para ele, desconfiada, mas algo na sinceridade dos olhos dele a fez ceder. Aos poucos, ela começou a falar: sobre a pressão dos pais, sobre Roberto, sobre o peso de ser a "salvação" da família. Alaz ouviu, atento, e compartilhou um pouco de si - sobre crescer na sombra de Miguel, sobre os pesadelos que o perseguiam, sobre a sensação de que algo na sua vida não fazia sentido.
- Sabe o que eu faço quando tudo aperta? - disse ele, com um brilho travesso nos olhos. - Penso que Vila Nova é grande demais pra me engolir. E você, Ruya, parece o tipo de pessoa que não deixa ninguém te engolir.
Ruya riu, um som leve que surpreendeu até ela mesma. - Você é ridículo, sabia? - disse ela, mas o sorriso suavizou suas palavras. Pela primeira vez naquele dia, ela sentiu um alívio, como se o peso no peito tivesse diminuído, mesmo que só um pouco.
Os dois continuaram conversando, o sol se pondo lentamente, enquanto uma conexão nascia entre eles - frágil, mas verdadeira. Alaz não sabia que Ruya seria a chave para desvendar seu passado. E Ruya não imaginava que Alaz poderia ser a força que ela precisava para enfrentar seu futuro.
Enquanto isso, na mansão Mendes, a noite caía, e a família se reunia para discutir um plano ousado. Zeynep, já acomodada em seu quarto luxuoso, descia para se juntar aos irmãos na sala de estar. A conversa começou leve, com histórias sobre os anos dela em Londres, mas logo tomou um tom mais sério quando Carlos entrou, acompanhado por Helena.
- Roberto tem uma proposta - anunciou Carlos, olhando para os filhos. - Ele quer se casar com a Ruya, aquela garota de São Lázaro. E hoje à noite, vamos fazer isso oficial.
Zeynep franziu a testa, surpresa. - A Ruya? Ela concorda com isso?
Bruno riu, sarcástico. - Ela vai concordar, quando ver o que a gente pode oferecer.
Diego deu de ombros. - Ela é teimosa, mas ninguém recusa os Mendes por muito tempo.
Rafael, como sempre, observava em silêncio, mas seus olhos brilhavam com interesse. Zeynep, por outro lado, parecia incomodada. - E se ela não quiser? Vocês vão forçar?
Helena sorriu, fria. - Querida, às vezes as pessoas precisam de um empurrão para ver o que é melhor para elas.
A família Mendes, liderada por Carlos e Helena, saiu da mansão em seus carros reluzentes, rumo a São Lázaro. Quando chegaram à humilde casa de Ruya, Lúcia e Antônio abriram a porta, surpresos. Roberto, com seu sorriso arrogante, deu um passo à frente, enquanto Carlos falava com autoridade.
- Lúcia, Antônio, viemos fazer uma proposta - disse ele, a voz firme. - Roberto quer a mão da sua filha, Ruya. Em troca, garantimos estabilidade financeira para sua família. Uma nova casa, as dívidas pagas, uma vida melhor. O que dizem?
Lúcia e Antônio trocaram olhares, o peso da oferta pairando no ar. A noite de Vila Nova parecia segurar o fôlego, enquanto o destino de Ruya pendia na balança.