Ele não disse uma palavra, apenas trocava as compressas frias, media a temperatura, oferecia água.
Na manhã seguinte, quando ela acordou melhor, ele já tinha ido trabalhar, como se nada tivesse acontecido.
Agora, ele prodigalizava esse cuidado a uma estranha, uma cópia barata.
A dor da repetição, da substituição, era excruciante.
Sofia estava confusa.
Se Rafael também renascera, por que ele agia assim?
Ele não via a manipulação de Isa? Ou ele era cúmplice?
Será que o ódio dele por ela era tão grande que o cegava para a verdade?
Ou será que ele estava apenas se vingando, usando Isa como instrumento?
Ela precisava de respostas.
No dia seguinte, Sofia chamou o médico da família, Dr. Almeida.
Quando ele chegou, Isa se recusou a ser examinada.
"Não preciso de médico, Rafa. Estou bem. Foi só um mal jeito."
Ela se agarrou ao braço de Rafael, com uma expressão assustada.
O comportamento evasivo dela só confirmava as suspeitas de Sofia.
Sofia tentou persuadir Rafael.
"Rafael, é só um exame rápido. Para termos certeza de que não é nada grave."
Ela usou um tom preocupado, tentando apelar para o lado protetor dele.
Mas Rafael estava irredutível.
"Isa disse que está bem. Não vou forçá-la a nada."
A frustração de Sofia cresceu. Ele estava sendo deliberadamente obtuso.
Isa, sentindo que estava perdendo o controle da situação, começou a chorar.
"Por que você está fazendo isso comigo, Sofia? Eu não te fiz nada! Você quer me humilhar?"
A raiva de Sofia explodiu.
"Humilhar você? Você está mentindo! Você não machucou o tornozelo, está apenas se fazendo de vítima!"
Ela avançou em direção a Isa, determinada a expor a farsa.
Antes que Sofia pudesse alcançar Isa, Rafael a empurrou.
Com força.
Sofia cambaleou para trás, batendo as costas na parede.
A dor física foi aguda, mas nada comparada ao choque da agressão dele.
Rafael nunca, jamais, levantara a mão para ela. Nem mesmo na pior fase do casamento anterior.
Rafael pareceu perceber o que fez.
Seus olhos se arregalaram, e um pânico momentâneo passou por seu rosto.
Ele deu um passo em direção a ela, a mão estendida.
"Sofia, eu..."
Mas a expressão dele rapidamente se recompôs, a frieza retornando.
Sofia o encarou, os olhos cheios de lágrimas não derramadas.
E então, a pergunta que estava presa em sua garganta desde o renascimento escapou.
"Rafael... você também voltou, não é? Você também se lembra de tudo?"
O ar no quarto ficou pesado, carregado de eletricidade.
Rafael a encarou, o rosto uma máscara impenetrável.
"Voltei? Do que você está falando, Sofia? Você enlouqueceu?"
A negação dele foi fria, calculada.
Mas por um instante, Sofia viu algo nos olhos dele. Um lampejo de reconhecimento. De dor.
Ele estava mentindo.
A desilusão a atingiu com força total.
Ele se lembrava. E escolheu puni-la dessa forma cruel.
A tensão, a dor, a confusão. Tudo foi demais para Sofia.
Suas pernas fraquejaram. O mundo começou a girar.
Ela desmaiou.
Quando Sofia acordou, estava em sua cama. Dr. Almeida estava ao seu lado, medindo sua pressão.
Rafael estava encostado na porta, observando-a com uma expressão indecifrável. Isa não estava à vista.
"Ela está bem, Rafael. Foi só uma queda de pressão. Estresse, provavelmente."
Dr. Almeida se retirou, deixando-os a sós.
O silêncio era opressor.
Então, Rafael falou, a voz baixa, mas firme.
"Sofia, precisamos conversar. Sobre o divórcio."
De novo. Aquele assunto.
Sofia se sentou na cama, sentindo-se fraca, mas determinada.
"Rafael, eu sei que você se lembra. Eu vi nos seus olhos. Por favor, pare com isso."
Ela tentou convencê-lo de sua mudança, de seu arrependimento.
"Eu mudei, Rafael. Eu juro. Eu não sou mais aquela pessoa. Eu te amo."
As palavras saíram com dificuldade, mas eram sinceras.
Rafael não demonstrou reação.
"Eu já preparei os papéis do divórcio, Sofia. Serei generoso. Você terá tudo o que quiser. A cobertura, uma pensão gorda. Só preciso da sua assinatura."
A oferta era um insulto. Como se o amor dela pudesse ser comprado.
Ele realmente achava que ela se importava com dinheiro agora?
Sofia balançou a cabeça, as lágrimas finalmente escorrendo.
"Eu não quero seu dinheiro, Rafael. Eu quero você. Eu quero nossa família."
Ela rejeitou a oferta, reafirmando seu amor.
"Eu não vou assinar nada."
Rafael suspirou, um som cansado.
Ele caminhou até a janela, olhando para a cidade lá fora.
"Sofia, não torne as coisas mais difíceis. Eu... eu encontrei outra pessoa."
As palavras pairaram no ar, geladas, cruéis.
Isa. Ele estava falando de Isa.
Ele realmente a escolhera.
Ele se virou, e pela primeira vez, Sofia viu uma dor genuína nos olhos dele, uma dor que espelhava a dela.
Mas desapareceu tão rápido quanto surgiu.
"Acabou, Sofia. Aceite."
Ele colocou uma pasta com os documentos do divórcio na mesa de cabeceira dela.
E saiu.
Desta vez, ela não o seguiu.
Ela sabia que era inútil.
Sofia ficou ali, sozinha, o som da porta se fechando ecoando em seus ouvidos.
A dor da rejeição era excruciante.
Mas, por baixo da dor, havia algo mais.
Uma compreensão.
Ela sentia agora o que Rafael sentira por anos na vida anterior.
A dor de amar alguém que não a queria, que a rejeitava, que preferia outra pessoa.
Era uma ironia cruel do destino.
Ela merecia aquilo.
Mas não significava que doesse menos.