Acordei num quarto de hospital branco e estéril.
O cheiro a desinfetante era forte.
A primeira coisa que fiz foi levar a mão à minha barriga.
Estava vazia. Lisa.
Um vazio oco e doloroso.
Uma enfermeira entrou no quarto, o seu rosto era uma máscara de compaixão profissional.
"Lia, que bom que acordou. O seu marido e a sua sogra estão lá fora."
O meu bebé. Onde estava o meu bebé?
"O meu filho?" perguntei, a minha voz era um sussurro rouco.
A enfermeira desviou o olhar, e essa foi toda a resposta que eu precisava.
"Lamento muito," ela disse, suavemente. "Fizemos tudo o que podíamos. O stress e a hipotermia... induziram o parto. Era demasiado cedo. Ele não sobreviveu."
O mundo parou.
O som no quarto desapareceu, substituído por um zumbido agudo nos meus ouvidos.
Não chorei. Não gritei.
Apenas senti um buraco a abrir-se no meu peito, um buraco tão grande que me sugava todo o ar.
A porta abriu-se e o Marcos entrou, seguido pela mãe dele, Helena.
Ele tinha o cabelo húmido, a roupa amarrotada. Parecia cansado.
"Lia, meu Deus, que susto," ele disse, aproximando-se da cama.
A mãe dele ficou perto da porta, os braços cruzados, a olhar para mim com pena e reprovação.
"Onde estavas?" perguntei, a minha voz surpreendentemente firme.
Ele parou.
"Eu vim assim que soube. A Sofia ficou muito mal, tive de a levar ao hospital, a crise dela foi muito forte."
Ele ainda estava a mentir. Ainda estava a defender-se.
"O nosso filho morreu, Marcos."
As palavras saíram da minha boca, mas pareciam pertencer a outra pessoa.
Ele baixou a cabeça. "Eu sei. Sinto muito."
"Sentes?" repeti, uma risada amarga escapou-me. "Tu deixaste-me para morrer num túnel para ires cuidar da crise de pânico da tua amiga. E dizes que sentes muito?"