O funeral do meu avô foi um dia cinzento e chuvoso.
Pedro não apareceu.
Ele nem sequer ligou.
A minha sogra, a Dona Elvira, ligou. Mas não foi para dar os pêsames.
"Lia, a Inês está deprimida. Ela não come, não fala. Ela precisa de ti. Tens de vir cuidar dela."
A sua voz era exigente, como se fosse minha obrigação.
"A minha avô acabou de falecer." A minha voz estava vazia, sem emoção.
"Eu sei, querida, e lamento a tua perda. Mas a vida continua. A Inês é jovem, ela está a sofrer muito. Perder um bebé é terrível, tu sabes como é."
Sim, eu sabia.
E ninguém da família dela se importou quando eu perdi o meu.
"Não posso. Estou de luto."
"Luto? A tua avó era velha, era a hora dela. A Inês precisa de apoio. Como esposa do Pedro, é teu dever ajudar a família dele."
O dever. Sempre o dever.
"Não."
Disse a palavra com uma firmeza que me surpreendeu.
"O quê? Como te atreves a dizer-me não? Depois de tudo o que fizemos por ti?"
"O que é que fizeram por mim? Deram-me um marido que me culpa por tudo? Uma família que só me vê como uma criada?"
Houve um silêncio chocado do outro lado da linha.
"És uma ingrata. O Pedro tinha razão sobre ti. Não tens coração."
Ela desligou.
Olhei para a chuva a cair lá fora. Senti-me vazia.
O amor que eu tinha pelo Pedro tinha morrido. Tinha sido substituído por uma frieza gelada.
A promessa que fiz ao meu avô ecoou na minha mente.
Sê feliz. Deixa esse homem.
Sim, avô. Eu vou.