Diogo chegou a casa muito depois da meia-noite.
O cheiro dele era uma mistura de álcool, fumo de cigarro e um perfume floral adocicado que não era o meu.
Ele entrou no quarto e acendeu a luz, surpreendido por me encontrar acordada, sentada na beira da cama.
"Ainda estás acordada?"
A sua voz era áspera, irritada.
O seu olhar caiu sobre a pequena caixa de presente na mesa de cabeceira. O relógio que eu lhe tinha comprado para o nosso aniversário. Ao lado, o saco de papel da loja, amachucado no lixo. Ele nem sequer tinha olhado para o presente. Tinha-o descartado como se fosse lixo.
"O que é isto?" ele perguntou, apontando para a caixa.
"O nosso aniversário," eu disse, a minha voz vazia.
Ele franziu o sobrolho, a irritação a transformar-se em aborrecimento. Não havia um pingo de remorso no seu rosto. Apenas impaciência.
"Ah. Esqueci-me. Estive ocupado."
Ele despiu a camisa, atirando-a para o chão.
Houve um tempo em que ele era gentil. Um tempo em que, mesmo depois de um dia exaustivo, ele me abraçava e dizia que sentia a minha falta.
Essa ternura tinha desaparecido.
Lembro-me exatamente quando começou a mudar. Foi há cerca de seis meses. Ele recebeu uma chamada. A sua expressão mudou, uma mistura de surpresa e algo mais, algo que não consegui decifrar.
Depois dessa chamada, ele começou a chegar tarde. Começou a usar roupas mais caras. E começou a cheirar a esse perfume floral.
Ele dizia que eram ensaios, reuniões com a editora, eventos da indústria.
Eu acreditava. Ou fingia acreditar.
Agora, eu sabia. As suas ausências não eram por causa do trabalho. Eram por causa dela.
"Vais tomar banho?" perguntei, a minha voz a soar estranha aos meus próprios ouvidos. A preocupação era um hábito difícil de quebrar. "As tuas mãos. Precisas de cuidar delas, não podes deixá-las húmidas por muito tempo."
Ele olhou para as suas mãos, aquelas mãos perfeitas. Por um breve segundo, vi um vislumbre de culpa nos seus olhos. Durou apenas um instante.
"Sim, sim. Vai dormir. Pareces cansada."
Ele dispensou-me como se eu fosse uma empregada.
Quando ele estava no banho, o seu telemóvel vibrou na mesa de cabeceira. O nome "Isa" iluminou o ecrã.
Ele saiu do banho, enrolado numa toalha, e pegou no telemóvel. O seu rosto suavizou-se ao ler a mensagem.
Ele vestiu-se rapidamente, sem me dirigir uma palavra.
Pegou nas chaves do carro.
"Onde vais?" perguntei, embora já soubesse a resposta.
"A Isabella precisa de mim," ele disse, sem sequer olhar para trás. "Vou sair."
A porta fechou-se atrás dele, deixando-me sozinha no silêncio do nosso quarto.
Não éramos marido e mulher. Éramos colegas de quarto. Estranhos que partilhavam uma cama.