"Tivemos muita sorte este ano. Um ex-aluno fez uma doação muito generosa. Permitiu-nos comprar equipamento novo e financiar várias bolsas de estudo."
"Oh, a sério? Quem foi o benfeitor?"
perguntou Sofia, por cortesia.
"Um jovem rapaz brasileiro de uma família portuguesa. Tiago Costa. Estudou aqui há uns anos. Um talento notável, especialmente em fotografia."
O nome atingiu Sofia como um choque elétrico. Tiago Costa. O barman. O estudante. O rapaz daquela noite.
Ela disfarçou a sua surpresa.
"Interessante."
Mais tarde, enquanto caminhava pelos corredores da universidade, viu uma exposição de fotografia dos melhores trabalhos de alunos. E lá estava ela. Uma fotografia a preto e branco, dramaticamente iluminada, de uma mulher a cantar Fado num palco escuro. O rosto da mulher estava na sombra, mas a sua postura, a paixão no seu corpo, a forma como a sua mão segurava o xaile... era inconfundivelmente ela. Sofia, nos seus tempos de glória, antes do acidente.
A legenda dizia: "Saudade. Fotografia de Tiago Costa."
Ele tinha-a fotografado. Mas quando? Como? Ela nunca o tinha visto antes daquela noite no bar. A fotografia parecia ter sido tirada anos antes. Uma sensação estranha percorreu-a. Quem era realmente aquele rapaz?
A vida continuou. Para manter as aparências, Sofia e Diogo organizaram um grande evento de caridade na sua propriedade no Douro. Era uma performance, um espetáculo para o seu mundo. Eles sorriram para as câmaras, o casal poderoso, o pilar da indústria.
Sofia usava um vestido elegante, o seu sorriso polido e vazio. Ela sentia o olhar das pessoas sobre si, ouvia os sussurros sobre o "incidente" com Carolina.
Durante o evento, um parceiro de negócios mais velho e demasiado insinuante encurralou-a perto do jardim.
"Sofia, cada vez mais bonita. O Diogo é um homem de sorte. Mas um homem não consegue regar um jardim tão vasto sozinho, pois não?"
Antes que Sofia pudesse responder com uma réplica cortante, Diogo apareceu ao seu lado. Ele colocou uma mão protetora nas suas costas.
"Sr. Bastos. A minha esposa está ocupada. Se nos der licença."
A sua voz era fria, e o homem mais velho recuou imediatamente, pedindo desculpa.
Por um momento, Sofia sentiu uma ponta de gratidão. Mas depois viu a expressão no rosto de Diogo. Não era proteção. Era possessão. Ela era propriedade dele, e ninguém mais a podia tocar.
Mais tarde, escondida atrás de uma coluna, ouviu Diogo a falar com o seu melhor amigo.
"A Carolina está furiosa por eu estar aqui contigo esta noite."
disse o amigo.
Diogo suspirou.
"Ela é demasiado impetuosa. Precisa de aprender a ter paciência. Mas não a posso culpar. Ter de aturar a Sofia pode ser um teste à paciência de qualquer homem."
"A Sofia é uma mulher bonita e elegante, Diogo."
"Elegante, sim. Mas fria. Sem paixão. Não é como ela..."
Diogo hesitou.
"Ela quem?"
"A rapariga que te falei. A fadista que vi cantar há anos, antes de conhecer a Sofia. Aquela... aquela tinha fogo na alma. A Carolina, pelo menos, tenta ser como ela. A Sofia... é apenas um belo retrato pendurado na parede."
O coração de Sofia parou.
Ele não estava apenas a traí-la. Ele estava a compará-la com uma fantasia, um fantasma de uma mulher que ele nem conhecia. E Carolina era apenas uma imitação barata dessa fantasia.
E ela, a verdadeira mulher, a esposa dele, era considerada inferior a ambas.
Era o insulto final.