A noite no leilão de caridade piorou. Nicole, com o seu talento para o drama, conseguiu atrair a atenção de um grupo de playboys bêbados. Eles começaram a assediá-la, as suas palavras a tornarem-se mais grosseiras a cada bebida.
Hugo, sempre o cavaleiro de armadura brilhante para Nicole, interveio imediatamente.
"Deixem-na em paz," rosnou ele, empurrando um dos homens.
A situação rapidamente escalou para uma briga. No meio do caos, Hugo empurrou-me para o lado para chegar a Nicole. Perdi o equilíbrio e caí para trás, a minha cabeça a bater com força no degrau de mármore.
Senti uma dor aguda e o calor do sangue a escorrer pela minha nuca. Olhei para cima, atordoada, a tempo de ver Hugo a ignorar-me completamente. Ele levantou Nicole, que estava a choramingar por causa de um tornozelo torcido, e carregou-a para fora da sala, deixando-me no chão, a sangrar.
As pessoas olhavam, sussurravam. Senti o meu rosto a arder de humilhação. Um segurança ajudou-me a levantar, oferecendo-se para chamar uma ambulância. Recusei. A ferida na minha cabeça não era nada comparada com a ferida no meu coração.
No silêncio do meu quarto, limpei o sangue do meu cabelo. A indiferença dele doía mais do que a queda. Lembrei-me de uma vez, anos atrás, quando cortei o dedo a cozinhar. Hugo tinha entrado em pânico, tratando a pequena ferida como se fosse uma lesão fatal, beijando o meu dedo até eu parar de chorar.
Onde estava esse homem? Aquele que cuidava de mim? Ele tinha desaparecido, substituído por um estranho cuja única preocupação era Nicole Perry.
Dois dias depois, o meu telemóvel tocou. Era Hugo. A sua voz era fria como o gelo.
"Encontra-me no bar do hotel Emiliano. Agora. Temos de falar."
Quando cheguei, encontrei-o sentado numa mesa isolada com Nicole. O seu rosto estava pálido e os seus olhos brilhavam de raiva mal contida.
"Raelyn," começou Hugo, a sua voz cortante. "Nicole disse-me que contrataste aqueles homens para a assediarem no leilão."
Fiquei boquiaberta, incrédula. "O quê? Isso é ridículo. Porque é que eu faria uma coisa dessas?"
"Ciúmes, talvez?" disse Nicole, a sua voz um miado inocente. "Eu sei que deve ser difícil para ti, ver o quanto o Hugo ainda se preocupa comigo."
"Eu não acredito em ti, Raelyn," disse Hugo, a sua voz a não deixar espaço para argumentos. "As tuas ações foram desprezíveis. Vais pedir desculpa à Nicole. Agora."
Olhei para ele, para o homem por quem sacrifiquei sete anos da minha vida. Ele estava a olhar para mim com desdém, acreditando na palavra da mulher que o abandonou no seu pior momento, em vez de na mulher que o ajudou a sair da escuridão.
"Não," disse eu, a minha voz a tremer de raiva e dor. "Eu não fiz nada de errado."
Nicole sorriu, um brilho vitorioso nos seus olhos. "Hugo, querido, não sejas tão duro com ela. Talvez ela só precise de aprender uma lição. Que tal isto, Raelyn? Bebe um copo por cada homem que me assediou. Sete homens, sete copos. Bebe, e nós esquecemos isto."
Ela apontou para uma garrafa de cachaça na mesa, a mesma marca que Hugo produzia. E ao lado, um pequeno prato com malaguetas pimenta, uma das mais picantes do Brasil. Ela sabia. Ela sabia da minha alergia severa ao álcool, uma alergia que podia ser fatal.